Em 29/03/2018

CNJ - SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. FUNÇÃO PÚBLICA - CUMULAÇÃO - CARGO PÚBLICO. VACÂNCIA.


A incompatibilidade do exercício das atribuições de atividade notarial e de registro com outra de cargo público exige a escolha entre o exercício de um cargo ou outro. É dever do CNJ fiscalizar e desconstituir atos emanados por Corregedorias e Tribunais locais quando estes estiverem em desacordo com os precedentes do CNJ, da jurisprudência pacificada sobre o tema e em situação de flagrante inconstitucionalidade.


CNJ - PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS: 0007207-84.2017.2.00.0000
LOCALIDADE: Alagoas DATA DE JULGAMENTO: 06/03/2018 DATA DJ: 22/03/2018
RELATOR: João Otávio de Noronha
LEI: CF - Constituição da República - 1988 ART: 236 PAR: 3
LEI: LNR - Lei de Notários e Registradores - 8.935/1994 ART: 25
LEI: CF - Constituição da República - 1988 ART: 37 INC: XVI

RECURSO ADMINISTRATIVO. DETERMINAÇÃO DE VACÂNCIA DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO COM O EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO.

1. A incompatibilidade do exercício das atribuições de atividade notarial e de registro com outra de cargo público exige a escolha entre o exercício de um cargo ou outro.

2. É dever do Conselho Nacional de Justiça fiscalizar e desconstituir atos emanados por Corregedorias e Tribunais locais quando estes estiverem em desacordo com os precedentes do CNJ, da jurisprudência pacificada sobre o tema e em situação de flagrante inconstitucionalidade.

3. O reconhecimento tácito pela opção da função pública traz como consequência ao requerente a renúncia à serventia extrajudicial.

4. Recurso desprovido.

ÍNTEGRA

Autos: PEDIDO DE PROVIDÊNCIAS - 0007207-84.2017.2.00.0000

Requerente: OLIVAL VIEIRA GUIMARAES
Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS – TJAL
Advogado: AL4871 – CHARLES WESTON FIDELIS FERREIRA

RECURSO ADMINISTRATIVO. DETERMINAÇÃO DE VACÂNCIA DE SERVENTIA EXTRAJUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE CUMULAÇÃO DO EXERCÍCIO DA ATIVIDADE NOTARIAL E DE REGISTRO COM O EXERCÍCIO DE CARGO PÚBLICO.

1. A incompatibilidade do exercício das atribuições de atividade notarial e de registro com outra de cargo público exige a escolha entre o exercício de um cargo ou outro.

2. É dever do Conselho Nacional de Justiça fiscalizar e desconstituir atos emanados por Corregedorias e Tribunais locais quando estes estiverem em desacordo com os precedentes do CNJ, da jurisprudência pacificada sobre o tema e em situação de flagrante inconstitucionalidade.

3. O reconhecimento tácito pela opção da função pública traz como consequência ao requerente a renúncia à serventia extrajudicial.

4. Recurso desprovido.

ACÓRDÃO

O Conselho, por unanimidade, negou provimento ao recurso administrativo, nos termos do voto do Relator. Ausentes, justificadamente, os Conselheiros André Godinho, Maria Tereza Uille Gomes e Henrique Ávila. Presidiu o julgamento a Ministra Cármen Lúcia. Plenário, 6 de março de 2018. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Cármen Lúcia, João Otávio de Noronha, Aloysio Corrêa da Veiga, Iracema do Vale, Daldice Santana, Valtércio de Oliveira, Márcio Schiefler Fontes, Fernando Mattos, Luciano Frota, Rogério Nascimento, Arnaldo Hossepian e Valdetário Andrade Monteiro.

RELATÓRIO

Trata-se de recurso administrativo interposto por OLIVAL VIEIRA GUIMARÃES contra decisão da CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA que arquivou pedido de providências formulado pelo recorrente em desfavor do TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE ALAGOAS (TJAL).

A controvérsia versa, em suma, sobre o provimento, ou não, do Tabelionato do Cartório do Único Ofício Notarial e Registral de Campo Alegre/AL, CNS n. 00.409-3, declarado vago pelo Conselho Nacional de Justiça.

Aduz o recorrente que foi investido tanto no cargo de Escrivão, como no de Tabelião do Tabelionato do Cartório do Único Ofício Notarial e Registral de Campo Alegre/AL, em 19 de julho de 1973, por concurso público, nos termos da documentação acostada aos autos (Id 2258830).

Em agosto de 2008, foi aposentado compulsoriamente do cargo de Escrivão, permanecendo como titular da serventia extrajudicial privatizada da Comarca de Campo Alegre/AL.

Afirma que tal situação foi pacificada no âmbito do Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas (TJAL), por intermédio do Acórdão n. 5.351/03, nos autos do MS n. 02.001146-6, onde restou decidido pela legalidade da aposentadoria e a inexistência de acumulação de cargos, permitindo-se a continuação da titularidade da serventia extrajudicial.

Contudo, segundo o requerente, a Comissão instituída pelo TJAL para analisar a situação das serventias extrajudiciais do estado declarou a vacância do Único Ofício Notarial e Registral de Campo Alegre/AL, tendo entendido que houve opção tácita do titular pela função pública de escrivão do TJAL, não podendo cumular sua função pública com a delegação privada. O ato foi ratificado pela Portaria n. 717/2008.

A mencionada portaria foi questionada nos autos dos Processos n. 03972-0.2009.001 e 03359-1.2009.001, cujo pedido de reconsideração formulado pelo requerente foi acatado e a serventia extrajudicial foi, novamente, declarada provida.

Entretanto, o requerente afirma ter sido surpreendido com nova declaração de vacância da serventia, agora pelo CNJ, nos autos do PP n. 157842, Evento PARE365, por intermédio do Parecer 365/2011, datado de 28/10/2011.

Em decisão proferida em 5/10/2017, a Corregedoria Nacional de Justiça entendeu que a serventia de CNS 00.409-3 está, desde 28 de outubro de 2011, com status “VAGO” no Sistema Justiça Aberta, exercendo o requerente a titularidade na condição de interino. Por tal motivo, não houve como conceber a alegação de surpresa acerca da declaração de vacância sustentada.

Entendeu-se, também, que o reconhecimento tácito pela opção da função pública traz como consequência ao requerente a renúncia à serventia extrajudicial – ante a impossibilidade de acumulação da delegação com as atribuições do cargo escrevente-, a qual, segundo decidido, deverá permanecer vaga e disponibilizada no próximo concurso, amoldando-se ao art. 236, § 3º da CF/88.

Pontuou, por fim, que a aposentadoria do requerente em cargo pública ocorrida em 2008 transfere-lhe a exigência de prestar concurso público de provas e títulos para regular provimento de serventia extrajudicial. Não havendo concurso em momento posterior à aposentadoria, não há como atribuir-lhe a titularidade da serventia.

Diante do exposto, a Corregedoria Nacional de Justiça concluiu que o caso dos autos retrata pretensão manifestamente incabível, nos termos do art. 25, X, do RICNJ, razão pela qual determinou seu arquivamento – Id. 2272184.

Em 24/10/2017, o requerente interpôs recurso administrativo contra a decisão de arquivamento supracitada, aduzindo, em síntese, que: (i) não houve opção tácita do recorrente à função pública; (ii) a ordem jurídica inaugurada pela Constituição de 1967 permitia a acumulação de cargos em apreço, o que lhe concede um suposto direito adquirido; (iii) mediante pedido de reconsideração e recurso administrativo, teve da Presidência do TJAL decisão proferida declarando-o titular da serventia de CNS 00.409-3; e (iv) a decisão da Corregedoria Nacional de Justiça (Parecer 365/2011) constante dos autos do PP n. 0001578-42.2011.2.00.0000 não levou em consideração os fundamentos da decisão da Presidência do TJAL.

Após oficiar a Presidência do TJAL para que juntasse aos autos cópia de decisão que reconsidera apreciação feita pela CorregedoriaGeral do Estado de Alagoas, para, à época, declarar a serventia de CNS n. 00.409-3 como regularmente provida, verificou-se que a razão de decidir ali adotada não foi capaz de promover a mudança de entendimento pretendida, razão pela qual foi negado provimento ao referido recurso administro e determinada a manutenção da serventia de CNS 00.409-3 na relação geral de vacância para posterior oferta de provimento mediante concurso.

O recorrente interpôs novo recurso reiterando os argumentos apresentados inicialmente. Sustenta que o caso pede a alteração do status do Tabelionato do Cartório do Único Ofício Notarial e Registral de Campo Alegre/AL para provido ante a decisão exarada pela Presidência do TJAL reconhecendo o suposto provimento.

É o Relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, CORREGEDOR NACIONAL DE JUSTIÇA:

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço do recurso administrativo, passando a aprecia-lo abaixo.

Mantenho a decisão impugnada pelos seus próprios fundamentos, razão pela qual colaciono trecho do pronunciamento: (...) desde 1994, haveria de ser feita uma escolha ante a incompatibilidade do exercício das duas atribuições concomitantemente na atual ordem jurídica. Trazendo à baila trecho da decisão anterior (Id. 2272184), apesar de estar irregularmente ocupando o cargo de titular da serventia extrajudicial, o requerente ainda recebeu remuneração de cargo público, conseguindo, inclusive, aposentar-se no cargo, estando, ao que se sabe, até a presente data, recebendo os proventos da aposentadoria de escrivão judicial e exercendo a função de titular do Único Ofício Notarial e Registral de Campo Alegre/AL.

Ocorre que a deliberada omissão do recorrente fortalece entendimento da Corregedoria-Geral da Justiça do Estado de Alagoas. Segundo o Órgão Censor, houve a opção tácita em permanecer na função pública, uma vez que não se opôs ao recebimento da remuneração paga pelo Tribunal de Justiça alagoano.

Ademais, depreende-se dos elementos constantes dos autos que os fatos ora narrados já foram exaustivamente discutidos nos autos do PP n. 1578-42.2011. No Parecer 365 (Id 1278778), restou consignado que diante da vasta documentação apresentada pelo órgão censor local, é patente que o requerente, Sr. Olival Vieira Guimarães, assumiu interinamente a responsabilidade da serventia extrajudicial.

No referido ato foi ressaltado que o requerente jamais informou a cumulação da função pública (escrivão do TJAL) com a titularidade da serventia extrajudicial. Contudo, até o ato de aposentadoria, continuou percebendo remuneração paga pelo Tribunal de Justiça de Alagoas, como escrivão em decorrência de aprovação em concurso público.

Não é de mais salientar que a situação narrada nos autos é incompatível com o disposto no art. 37, XVI, da CF/88, bem como com o conteúdo do art. 25 da Lei nº 8.935/94, que dispõe sobre serviços notariais e de registro – “O exercício da atividade notarial e de registro é incompatível com o da advocacia, o da intermediação de seus serviços ou o de qualquer cargo, emprego ou função públicos, ainda que em comissão”.

Como exposto em decisão de Id. 2272184, “ainda que fosse possível rediscutir o caso dos autos, a opção do requerente em receber as quantias pagas pelo TJAL induz à duas conclusões básicas: ou realmente houve opção pela função pública, especial em relação à função privada, ou o requerente utilizou-se de má-fé, recebendo tanto do órgão público, como da serventia extrajudicial pela qual responde, devendo, neste último caso, ressarcir os cofres públicos pelo enriquecimento ilegal perpetrado”.

Por fim, consigne-se que a decisão proferida pelo TJAL que acatou o pedido de reconsideração do requerente foi proferida em 2010, sendo portanto, anterior à decisão proferida por esta Corregedoria Nacional de Justiça nos autos do PP 1578-42.2011.

Ora, é dever constitucional deste órgão censor a fiscalização e desconstituição de atos emanados das Corregedorias e Tribunais locais quando estes estiverem em desacordo com os precedentes do Conselho, da jurisprudência pacificada sobre o tema, e, como no caso, em situação de flagrante inconstitucionalidade.

Esclarece-se que o reconhecimento tácito pela opção da função pública traz como consequência ao requerente a renúncia à serventia extrajudicial, a qual, segundo decidido, deverá permanecer vaga e disponibilizada no próximo concurso, amoldando-se ao art. 236, § 3º da CF/88.

Ante o exposto, nego provimento ao pedido formulado pelo recorrente.

É como voto.

Brasília, 2018-03-20.

 



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