Em 07/08/2018

TJSP: Apelação – Mandado de segurança – ITBI – Cessão de direitos sobre a aquisição de propriedade imóvel


APELAÇÃO – Mandado de segurança – ITBI – Cessão de direitos sobre a aquisição de propriedade imóvel. Incidência do imposto, por expressa disposição constitucional. Recurso provido.


ACÓRDÃO
 
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação / Remessa Necesária nº 1000550-57.2016.8.26.0247, da Comarca de Ilhabela, em que é apelante PREFEITURA MUNICIPAL DE ILHABELA e Recorrente JUIZO EX OFFÍCIO, são apelados APARÍCIO NAVEGA CALDEIRA e SUSANA DE BARROS CALDEIRA.
 
ACORDAM, em 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento ao recurso. V. U.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.
 
O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores OCTAVIO MACHADO DE BARROS (Presidente) e HENRIQUE HARRIS JÚNIOR.
 
São Paulo, 28 de junho de 2018.
João Alberto Pezarini
 
RELATOR
 
Assinatura Eletrônica
 
Voto nº 27659 [digital]
 
Apelação nº 1000550-57.2016.8.26.0247
 
Apelante: Município de Ilhabela
 
Apelados: Aparício Navega Caldeira e outro
 
Comarca: Ilhabela
 
APELAÇÃO – Mandado de segurança – ITBI – Cessão de direitos sobre a aquisição de propriedade imóvel. Incidência do imposto, por expressa disposição constitucional. Recurso provido.
 
Cuida-se de apelação (fls. 123/135) em face de sentença (fls. 116/118) que, reconhecendo que a lavratura de escritura de cessão de direitos possessórios sobre bem móvel não constitui fato gerador do ITBI, concedeu a ordem para afastar a exigibilidade do imposto, declarando nulo o respectivo lançamento, confirmando a decisão liminar.
 
Preliminarmente, apontou ilegitimidade passiva do Secretário de Assuntos Jurídicos, porquanto o ato apontado como coator foi praticado pelo Secretário de Finanças. Sustenta, ainda, impossibilidade da utilização do mandado de segurança para afastar ato praticado de acordo com o ordenamento jurídico.
 
Defende a cobrança do imposto sobre a cessão de direitos, conforme expressamente previsto na lei municipal e na Constituição Federal.
Daí pleiteia reforma.
 
Contrarrazões às fls. 141/151.
 
A hipótese comporta reexame necessário, nos termos do artigo 14, § 1º da Lei 12.016/2009, sendo inaplicáveis as exceções previstas no CPC.
 
É o relatório.
 
Inicialmente, rejeita-se a alegação de ilegitimidade passiva, impondo-se, na hipótese, a teoria da encampação, vez que a autoridade coatora indicada na inicial apresentou ampla defesa, refutando a pretensão inicial, sem qualquer prejuízo para a administração.
 
Também não há que se falar em inadequação da via eleita, vez que os impetrantes utilizaram-se do mandamus para evitar que a autoridade coatora pratique atos visando a cobrança de créditos decorrentes de tributos cujo lançamento considera ilegal.
 
Contudo, no mérito, razão assiste ao Município.
 
Dispõe o art. 156, II da Constituição Federal:
“Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:…
II -transmissão ‘inter vivos’, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.
 
O texto constitucional acima transcrito, especialmente o destaque feito na parte final, deixa claro que o ITBI incide sobre qualquer ato negocial que tenha conteúdo econômico a revelar capacidade contributiva.
 
O ITBI, portanto, é devido sobre a transmissão da propriedade, que nos termos da lei civil ocorre somente com o registro do título aquisitivo, e sobre a cessão de direitos relativos a sua aquisição.
 
Na hipótese, restou evidente a realização de negócio jurídico, com conteúdo econômico próprio, afigurando-se devido, portanto, o ITBI em razão da cessão de direitos efetivada.
 
Quanto à incidência do imposto sobre cessão de direitos, destaca-se lição extraída da obra Comentários a Constituição do Brasil[1]:
 
“As cessões de direitos à aquisição de bens imóveis não são formas translativas da propriedade e, portanto, foram levadas ao âmbito de incidência do ITBI como forma de evitar-se a utilização desse subterfúgio como modo de elisão à incidência do ITBI. Salvo contrário poder-se-ia utilizar do expediente de sucessivas cessões sem a incidência do ITBI sobre a transmissão final. São exemplos de cessão de direitos: as de posse; de direitos hereditários; de compromisso de compra e venda, entre outros”.
 
Na mesma linha, esclarecedora lição de Aires F. Barreto:
“A abrangência constitucionalmente prevista teve em mira evitar que sucessivas cessões pudessem ficar sem tributação, incitante à fraude e à evasão. Previne, assim, a Magna Carta a possibilidade de sucessivas cessões de compromisso, por exemplo, ficarem fora do campo impositivo
 
(…)
Deveras, no caso de transmissão da propriedade imobiliária, bem como diante da transmissão de direitos reais sobre imóveis sendo, como vimos de ver, o critério material a ‘transmissão’ desses direitos -, não se pode considerar ocorrido o fato tributário senão a partir do instante em que se tenha operado a transmissão. E esta só ocorre quando da transcrição (inscrição, matrícula, registro) do título aquisitivo no registro imobiliário competente. (…) Há autores que defendem o nascimento da obrigação tributária no momento da formação do ato ou negócio jurídico que possibilita a transmissão (que só ocorre posteriormente).
 
(…)
“Estamos convencidos de que, a despeito da consideração que esses autores nos merecem, aceitar tal tese equivale a alterar a materialidade da hipótese de incidência para ‘imposto sobre a formalização de atos ou negócios tendentes à transmissão imobiliária’, em vez de mantê-la intacta como imposto sobre a transmissão. A formalização do ato só é demarcadora do momento de ocorrência do fato tributário, no caso de ‘cessão de direitos à aquisição de imóveis’, porquanto a materialidade da hipótese de incidência já não é mais a transmissão, mas apenas a cessão de direitos.”[2] (destacamos).
 
Nesse quadro, de rigor a reforma da sentença.
 
Posto isso, dá-se provimento ao apelo.
 
João Alberto Pezarini
 
Relator
 
Notas:
[1] JJ Gomes Canotilho, Gilmar Mendes, Ingo Wolfgang Sarlet e Lenio Luiz Streck, Editora Saraiva, 1ª Edição, 2013, p.1731.
[2] Curso de Direito Tributário Municipal, Editora Saraiva, 2009, p. 289 e 291 e verso.
Dados do processo: 
 
TJSP – Apelação / Remessa Necesária nº 1000550-57.2016.8.26.0247 – Ilhabela – 14ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. João Alberto Pezarini – DJ 01.08.2018


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