BE533

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Imóvel rural. Corregedoria paulista suspende provimento sobre comunicação ao Incra de desmembramento, parcelamento e remembramento de imóveis rurais.


Consulte o histórico completo daregulamentação da Lei 10.267/2002.

PROCESSO CG. Nº 2.863/2001 – CAPITAL

CORREGEDORIA-GERAL DA JUSTIÇA

DECISÃO:

Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e por seus fundamentos, que adoto, suspendo a eficácia do Provimento CG 10/02.

Expeça-se Provimento, conforme a minuta apresentada. Publique-se.

São Paulo, 19 de agosto de 2002.

(a) LUIZ TÂMBARA – Corregedor-Geral da Justiça.

PROVIMENTO N.° 17/2002

O DESEMBARGADOR LUIZ TÂMBARA, CORREGEPOR-GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO, no uso de suas atribuições legais, e

CONSIDERANDO o decidido no Processo CG. nº 2863/01;

CONSIDERANDO, sobretudo, a edição da Portaria MDA 55, de 1º de abril de 2002.

RESOLVE:

Artigo 1º - Suspender a vigência do Provimento CG 10/2002.

Artigo 2º - Este Provimento entrará em vigor na data de sua publicação.

São Paulo, 19 de agosto de 2002.
 



Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social começa no Paraná para 550 famílias.


A Caixa Econômica Federal assina nesta segunda-feira (26/08) o primeiro contrato do Programa de Subsídio à Habitação de Interesse Social (PSH). Inicialmente, serão beneficiadas duas cidades do Paraná. Em Londrina serão financiadas 450 moradias, com investimentos de R$ 3 milhões. Na cidade de Arapongas, a CAIXA vai financiar mais 100 unidades, no valor de R$ 700 mil. 

Os recursos do PSH serão direcionados às famílias com renda de até R$ 580,00, os quais serão destinados a viabilizar o acesso à moradia por meio de suas diversas modalidades. No PSH, os projetos imobiliários são realizados em parceria com governos estaduais e municipais, o que possibilita reduzir o custo médio de cada unidade, que varia entre R$ 3.000,00 e R$ 7.000,00.

Na cidade de Arapongas a comunidade optou pela construção no sistema de mutirão. As famílias beneficiadas foram selecionadas pela Secretaria de Ação Social da Prefeitura de Arapongas e são, na maioria, trabalhadores da Usina de Reciclagem de Lixo, catadores de papel,

"Os recursos do PSH são utilizados para complementar a capacidade financeira  do mutuário beneficiado pelo programa, proporcionando a ele a aquisição de uma moradia de valor superior ao que sua renda permite. Dessa forma, poderemos atender com financiamento da casa própria algumas famílias que, pelos critérios atuais, não teriam condições de acesso a um imóvel de melhor qualidade”, diz o diretor de Desenvolvimento Urbano da CAIXA, Aser Cortines.

Até outubro deste ano, já estão programados financiamentos de 8.264 unidades habitacionais do PSH em diferentes cidades brasileiras com investimento de R$ 45,6 milhões, dos quais R$ 30,9 milhões serão utilizados exclusivamente como subsídio.

Para este ano,  o Governo Federal destinou, dentro do Orçamento Geral da União (OGU), R$ 350 milhões exclusivamente ao PSH para famílias com renda de até R$ 1.000,00. Na CAIXA, serão priorizados os projetos de financiamento habitacional para famílias com renda  de até R$ 580,00, segmento populacional que concentra mais de 80% do déficit habitacional brasileiro.

O PSH foi criado pela Medida Provisória 2.212, publicada no dia 31 de agosto de 2001, com o objetivo de destinar recursos do Orçamento Geral da União - OGU -, para subsidiar o financiamento de casas populares, complementando a capacidade de pagamento dos adquirentes.

Parte dos recursos é usada também para assegurar o equilíbrio econômico-financeiro das operações realizadas pelas instituições financeiras, conferindo, dessa forma, transparência e visibilidade ao Programa, inclusive no que respeita à sua contabilização no OGU.

FAMÍLIAS A SER FINANCIADAS - O processo de inscrição, seleção e classificação das famílias a ser beneficiadas é realizado pelo Poder Público Local, por órgãos da administração direta ou indireta ou, ainda, por companhias de habitação, obedecendo aos seguintes requisitos mínimos:

- renda familiar bruta mensal de até R$ 580,00;

- não ser proprietário ou promitente comprador de imóvel residencial em qualquer localidade do país;

- não possuir qualquer tipo de financiamento imobiliário;

- não ter recebido benefícios da mesma natureza oriundos de recursos orçamentários da União.

HABITAÇÃO POPULAR - Desde 1995, quando o governo retomou os financiamentos à habitação, a CAIXA já aplicou R$ 26,9 bilhões em seus vários programas e financiou a casa própria para 2,1 milhões de famílias.

Desse total, uma grande parte foi destinada a famílias com menor renda. Nas linhas de crédito que utilizam recursos do FGTS, por exemplo, que hoje atendem a 88% da população (abrangendo todas as famílias com renda mensal inferior a R$ 2.000, para imóvel novo e usado, e inferior a R$ 4.500, para imóvel na planta e em construção), já foram financiadas, nos últimos sete anos, 1.225.174 moradias.

Além disso, o Programa de Arrendamento Residencial (PAR), que beneficia famílias com renda máxima de seis salários mínimos, já financiou, desde sua criação em 1999, a construção de 71.536 moradias, com recurso de R$ 1,4 bilhão (www.caixa.gov.br).
 



Funcionário. Cartório. Reclamatória. Competência.


Compete à Justiça do Trabalho processar e julgar a reclamatória trabalhista proposta por funcionário de cartório não oficializado, uma vez que o vínculo empregatício é estabelecido entre o tal funcionário e o titular do cartório, de quem recebia a remuneração. Precedente citado: CC 6.399-SC, DJ 24/6/1996. CC 32.874-PE, Rel. Min. Vicente Leal, julgado em 14/8/2002 (Informativo de Jurisprudência do STJ nº 142,  12 a 16/8/2002)
 



Testamento. Usucapião. Inalienabilidade.


A Turma, atentando para as peculiaridades do caso, entendeu que o bem objeto de legado com cláusula de inalienabilidade pode ser objeto de usucapião. O art. 1.676 do CC deve ser interpretado com temperamentos. Precedentes citados: REsp 10.020-SP, DJ 14/10/1996, e REsp 13.663-SP, DJ 26/10/1992. REsp 418.945-SP, Rel. Min. Ruy Rosado, julgado em 15/8/2002 (Informativo de Jurisprudência do STJ nº 142,  12 a 16/8/2002).
 



Locação. Fiança. Outorga Uxória. Meação.


Em contrato de locação, é nula de pleno direito a fiança prestada por fiador casado sem a outorga uxória, não havendo como considerá-la parcialmente eficaz para constranger apenas a meação marital (art. 235, III, CC). Precedentes citados: REsp 265.069-SP, DJ 27/11/2000; REsp 260.465-SP, DJ 4/9/2000, e REsp 76.399-SP, DJ 23/6/1997. REsp 343.549-SP, Rel. Min. Vicente Leal, julgado em 13/8/2002 (Informativo de Jurisprudência do STJ nº 142,  12 a 16/8/2002).
 



Inventariante. Testamenteiro Designado. De Cujus. Litisconsórcio. Prazo.


Trata-se de agravo de instrumento contra decisão do juiz que, embora os herdeiros respondessem à citação, nomeou como inventariante o gerente do banco onde o de cujus possuía conta corrente, o qual já havia sido designado também testamenteiro pelo pai falecido (aos 92 anos) em testamento manuscrito e sem testemunhas, revogando, inclusive, testamentos anteriores. A Turma não conheceu do recurso, pois o acórdão recorrido admitiu expressamente, diante da realidade fáctica e concreta, que os herdeiros necessários são capazes e estão em condições de assumir a inventariação, não havendo, portanto, razões para desobediência ao dispositivo legal. Afastou, também, a necessidade de intervenção do Ministério Público, por não existir nenhum interditado. Outrossim, formado o litisconsórcio no lapso temporal para o recurso, aplica-se o art. 191 do CPC. REsp 399.442-RJ, Rel. Min. Carlos Alberto Menezes Direito, julgado em 20/8/2002 (Informativo de Jurisprudência do STJ nº 143, 19 a 23/8/2002).
 



O falso documental no Direito e na História - J. Nascimento Franco


Na obra clássica que escreveu sob o título Teoria Giuridica del Documento, Paolo Guidi dedica um longo capítulo ao exame dos efeitos jurídicos do documento falso. E embora comece por salientar que sob muitos aspectos um documento pode ter, no juízo histórico, relevância igual à que apresenta nos tribunais, não aborda sequer um entre os grandes falsos documentais, nem os efeitos que produziram na área do Direito e da História. A omissão talvez se justifique pelo seguinte tópico: “Quello que più conta, ai fini della nostra indagine, è la constatazione che il documento, in ambedue i  procedimenti (o judiciário e o histórico), si presenta come cosa capace di fornire la rappresentazione permanente di un fato che  è fuori di esso: conserva cioè in ambedue i campi uguale essenza, uguale funzione. Nel  campo storico, però, il documento, più spesso, non rappresenta um fatto, di per sè, storicamente decisivo, capace  cioè,  da solo,  di fornire il fondamento del giudizio da emettere, mentre nel campo giudiziario è normale che rappresenti il fatto che è il diretto oggetto di acertamento da parte del giudice.”[i]1

Pena é que Paolo Guidi não tenha examinado alguns casuísmos históricos que sempre intrigaram e ainda continuam intrigando juristas e historiadores. Um deles, talvez o maior de todos, é o do Constitutum Constantini pelo qual o imperador Constantino teria doado ao Vaticano, ou, mais precisamente, ao Papa Silvestre, o Palácio de Latrão, Roma, além de toda as províncias e cidades da Itália e do Ocidente.

No Brasil, só encontrei notícia do tema na obra O Papa e o Concílio [ii]2, na qual, sob o pseudônimo de Janus e com a colaboração de J.N. Huber, o apóstata Dollinger arremeteu-se contra os dogmas da Imaculada Conceição e da infalibilidade papal, abrindo uma dissidência alemã na área do Catolicismo.

Prefaciando sua tradução, Rui Barbosa refere-se apressadamente à matéria, donde deduzo que desconhecia tanto o texto do Constitutum, como o livro de Lorenzo Valla, De Falso Credita et Ementita Constantini Donatione Demonstratio[iii]3, na qual o grande humanista desvendou a falsidade do documento. Sendo talvez o tradutor-prefaciador mais caudaloso do mundo, tanto que escreveu prefácio maior que a obra traduzida, Rui apenas de viés comenta o tema talvez mais intrincado da história do Vaticano, contra o qual ele deflagrou sua ira de neomaçom.

O Constitutum é, sem dúvida, a maior falsificação que se conhece, se mensurada pelos efeitos históricos e jurídicos que produziu[iv]4, senão também pela abundante bibliografia que inspirou nos últimos dois séculos. Somente Pietro de Leo consultou, para a elaboração de sua obra Ricerche sui Falsi Medioevali[v]5, publicada em 1974, nada menos que 80 obras, sendo 64 em alemão, seis em inglês, 11 em francês e o restante em italiano. E note-se que toda essa avalanche de obras surgiu nos últimos 100 anos, certamente porque o autor buscou fontes mais à mão para seu estudo.

Em obra de menor extensão, publicada em 1987, J.L. de Renaucourt[vi]6 reporta-se a 27 livros escritos de 1850 a 1984, numa demonstração de que a Donatio continua interessando até hoje os humanistas e pesquisadores nos maiores centros culturais do mundo.

Nem podia ser diferente, se consideradas a causa e a finalidade da suposta liberalidade do Imperador Constantino para com o Papado. Segundo Renaucourt, o pontífice romano precisava que sua autoridade fosse reconhecida sobre Roma, para que pudesse criar um estado pontifical  com peso político apto para completar sua legitimidade espiritual. Para documentar essa autoridade, prossegue o historiador, é que surgiu o Constitutum Constantini, segundo o qual o Imperador Constantino (312-337), que sofria de lepra, teve um sonho em que os apóstolos Pedro e Paulo o aconselharam a visitar o Papa Silvestre I e solicitar uma intercessão divina que o livrasse daquele mal. Curado, Constantino recebeu o batismo das mãos do Papa Silvestre e, retribuindo a graça que havia suplicado, outorgou-lhe o Constitutum, investindo-o e a todos seus sucessores, como vigários de Cristo e da Igreja Romana, no principado sobre as quatro sedes patriarcais do Ocidente,   assim como sobre todas as igrejas do mundo.

E, ainda segundo Renaucourt, para que o Papa pudesse ter moradia digna da nobreza de suas funções, o doador entregou-lhe também o Palácio do Latrão: “Concedemos não somente nosso palácio de Latrão, mas também a Cidade, mais todas as províncias e cidades da Itália e do Ocidente”. E reconhecendo a inconveniência de existirem duas autoridades no mesmo local, o doador dispôs: “Por isso, julgamos oportuno transferir nosso Império e nosso poder nas regiões orientais, e construir na província de Bisâncio uma cidade que terá nosso nome e será a capital do Império, porque não é justo que o Imperador exerça seu poder onde ficarão instalados os principatus sacerdotum e a capital da religião cristã”.[vii]7

Supostamente elaborado nos meados do século VIII, segundo Pietro de Leo, o Constitutum começou a ser questionado já no século IX. Mas quem realmente se esmerou em discutir-lhe a autencidade foi Lourenzo Valla, na obra publicada em 1442 e que é considerada como a matriz da crítica moderna. Essa obra deu início à pesquisa que ainda agora continua viva e provocante, tanto que em 1990 Marcello Caleo, professor de Filosofia na Universidade de Salermo, publicou, sob o título Verità e Certezza della Donazione di Costantino, um livro a que batizou por Polêmica com Lorenzo Valla. Contestando seu “opositor”, o “polemista” sustenta que a doação foi juridicamente válida, ainda que se admita a falsidade do documento, porque o Papa recebeu o que lhe havia sido  ilegalmente retirado: “Dunque la natura del crimine è immaginaria. Un crimine supposto, un  crimine pensato. E che sia tale lo dimonstra il termine che usa di “donazione”. II dono infatti, non è  reale, non è mai reale. Quello che vale nel dono  è l’animus. Tanto è vero che “gratuitamente si dà”. Ma ora, se nel dono quello che vale è l’animus, quale sia questo animus si vede próprio dalla cosa nominata. Pertanto, se si chiamano “possessi”: Roma, l’Italia, le Gallie, l’Occidente intero, questi non sono divenuti possessi per mezzo del dono. Erano “possessi” prima del dono e per mano dei Pontefici pagani. Pertanto se di crimine si deve parlare, non si pùo incolpare del crimine i Pontefici cristiani che hanno ricevuto in dono delle cose da altri illegalmente possedute. E se per quei doni i Pontefici cristiani hanno meritato l’accusa, significa che esse hanno anche pagato per i furti altrui”.[viii]8

Esta tese sempre foi sustentada pelo Vaticano, segundo escreveu Janus no O Papa e o Concílio: “Havia contudo muitos anos (desde 752), que os papas tinham nos seus escritos precaução de não falar em dádiva, mas em mera restituição, sendo que as cidades e províncias italianas deviam ser restituídas ora a S.Pedro, ora à república romana.[ix]9

Na sustentação dessa tese, a Igreja implicitamente admitiu a falsidade material do Constitutum, tendo-a, contudo, como válida, porque efetivamente representou “vontade de doar” coincidente com a de “receber a doação”.

Também tachado de materialmente falso, pelo menos quanto à sua autenticação, é o Tratado de Tordesilhas, pelo qual Portugal e Espanha partilharam o território descoberto por Colombo, incluindo o Brasil. O pesquisador Ricardo Ramon Blanco descobriu recentemente que falso é pelo menos o selo com o qual se procurou autenticar o instrumento do Tratado existente na Torre do Tombo, em Portugal. Isso porque o exemplar encontrado em Santos, no Mosteiro do Carmo, revela que o selo aplicado à via arquivada na Torre do Tombo é de Jaime, o Conquistador, que viveu no século XIII, dois séculos antes...[x]10

Outro falso que agitou o País inteiro foi o das cartas atribuídas a Artur Bernardes[xi]11 e que inseriam expressões agressivas contra os militares e principalmente contra Hermes da Fonseca, qualificado como sargentão sem compostura. O Clube Militar reagiu com violento manifesto à Nação, criou-se um clima a que se chamou de “nova questão militar”, as Forças Armadas protestaram e a imprensa teve assunto para muitos meses. Contestadas por Artur Bernardes, as cartas foram submetidas a perícia grafotécnica, que deu pela autenticidade, motivo pelo qual foram consultados peritos famosos. Na França o perito Locard, então considerado o maior do mundo em grafotécnica, confirmou a autoria num laudo sintetizado na frase “em toute évidence et en toute certitude, les deux lettres sont authentiques”. Emissários de Artur Bernardes partiram para a Itália, onde obtiveram laudo do não menos famoso Ottolenghi, logo depois secundado por Bischoff, diretor do Instituto de Ciência Política da Lausanne, ambos concluindo pela falsidade da letra e assinatura.

Para reforçar seu instrumental defensivo, Artur Bernardes obteve de Rui Barbosa parecer opinando pela falsidade, com base em presunções estritamente jurídicas, tais como o de que só merece ser questionado o documento suspeito de falsidade se tiver, pelo menos, procedência aceitável. Segundo Rui, esse foi o critério que levou o povo americano a rejeitar a imputação, ao presidente Washington, da autoria de sete cartas que ele declarou serem apócrifas: “Foi o que se deu com as cartas de Washington, a que já me referi. Provado o embuste da  preliminar, isto é, provado que Billy nunca fora feito prisioneiro pelos adversários – e muito menos no lugar e circunstâncias alegadas, - patente ficou logo que as cartas eram apócrifas. E, malgrado a assombrosa habilidade do falsário, que, aliás, nunca foi descoberto, o povo americano, com o seu admirável bom senso, deu-lhes, daí por diante, o crédito que mereciam, e não perdeu tempo em investigações posteriores. É o que, na minha opinião, e pelas razões acima declaradas, já devia ter acontecido, há muito, no Brasil, com este caso, em torno do qual estamos vendo girar, com tão inconcebível gravidade, a política nacional.”[xii]12

Enfrentando a celeuma, a candidatura de Artur Bernardes à Presidência da República foi mantida, não tanto porque ele negasse a autoria das cartas, mas porque a seu lado postou-se Washington Luís, com o peso que tinha como presidente de São Paulo. Realizada a eleição, Bernardes ganhou por 466.000 votos contra 317.000 dados a Nilo Peçanha, seu adversário.

Passado algum tempo, o País foi surpreendido com declaração de Oldemar Lacerda, confessando que por motivos políticos havia engendrado as cartas e encarregado da falsificação gráfica um tal de Jacinto Guimarães Edmundo. Apesar de tudo isso, em fins de 1980, os jornais noticiaram o encontro, no cofre da firma Hermann Stoltz, guardada pelo advogado Sidney Haddock Lobo, de uma carta de 26 folhas pela qual Jacinto Guimarães desmentiu o desmentido feito em 1921 e declarava que, na verdade, as cartas foram efetivamente escritas e assinadas por Artur Bernardes...[xiii]13

Outro falso atualmente confesso e, por isso inquestionável, foi o famoso Plano Cohen, com base no qual o general Góis Monteiro pediu a Getúlio Vargas, e obteve, a ruptura da ordem constitucional e a instituição do Estado Novo. Sabe-se agora que o Plano Cohen foi forjado pelo general Mourão Filho, para ser atribuído aos comunistas e justificar a deflagração de medidas repressivas contra eles. Sendo integralista, Mourão imaginou um esquema para guerrear os ferozes adversários dos “camisas verdes”. Mas o resultado foi além de seu projeto. Conta-se que o general Góis ficou com o documento e quando seu autor tentou recupera-lo, o superior hierárquico (na época Mourão era capitão) silenciou-o com esta advertência: “Você é oficial do Estado-Maior, tomou conhecimento deste documento aqui. Cale a boca e retire-se”. Os dias se passaram e tudo acabou na implantação do Estado Novo...[xiv]14

Cronologicamente, segue-se outro documento falso, a carta Brandi, dizendo que Jango Goulart havia importado ilegalmente da Argentina certa quantidade de madeira, por preço superfaturado, para ajudar no financiamento da campanha eleitoral de Getúlio Vargas. Depois de utilizar a Carta Brandi em violenta campanha na imprensa e na tribuna do Congresso, Carlos Lacerda reconheceu a falsidade.[xv]15

A assinatura do general Costa e Silva foi questionada em diversos documentos. Ao que sei, pelo menos uma delas chegou a ser objeto de decisão judicial. Em ação movida contra a União pelo capitão de corveta Dalmo Honaiser, sustentou-se que o general Costa e Silva já estava infartado em 26 de agosto e, assim, não podia ter assinado, no dia 27, o decreto reformando o autor. Decidindo a causa, o juiz Agosto Fernandes Dias da Silva admitiu que um chefe do Estado pode confiar a pessoas de sua confiança papel assinado em branco para posterior inserção do texto, razão pela qual julgou improcedente a ação. Depondo como testemunha, dona Yolanda Costa e Silva afirmou que, no dia 26 de agosto, seu marido sentiu-se mal, abraçou-a emocionado e tentou escrever alguma coisa, mas sua mão direita já estava paralisada. Perguntada se o general teria assinado antes algum papel em branco, d. Yolanda irritou-se e, para acalma-la, o juiz ponderou que o fato não teria maior gravidade se confiado o papel a pessoa de confiança do signatário.[xvi]16

Curioso também o caso do Decreto federal n. 94.233/87, em cuja publicação constou o nome do ministro Dílson Funaro, que, todavia, não o havia assinado. Por estar ausente, seu nome foi inserido “em confiança”, segundo registrou, na edição de 20.4.88, “O Estado de S.Paulo”, nas “Notas e Informações”, que é seu editorial mais importante, tanto que só vai ao prelo depois de passar pelo crivo da cúpula do jornal. Nesse editorial, verberou-se a omissão do ministro, que, mesmo diante da nulidade formal do decreto, revolveu assina-lo “a posteriori”, mediante promessa de ser logo depois revogado, já que o considerava danoso ao Tesouro Nacional. Como a revogação jamais aconteceu, o decreto acabou produzindo todos os efeitos, que o ministro julgava desastrosos...

Artifício de grande significação histórica  foi também o adotado pelo presidente do Congresso, Senador Auro Moura de Andrade, que, atendendo a sugestão do Senador Afonso Arinos, mandou parar o relógio do plenário para que pudesse ser votado “dentro do prazo”, que se vencia à meia noite, o projeto de reforma constitucional enviado pelo presidente Castelo Branco. Esse fato vazou para a imprensa, tanto que, também nas “Notas e informações”, o “Estadão” a ele se referiu nestes termos: “É fato histórico, por exemplo, que o Congresso, sendo obrigado, por Ato Complementar, a votar o projeto de Constituição enviado pelo presidente Castello Branco até meia-noite de determinado dia de 1966, o senador Auro Moura Andrade, presidente do Congresso,  parou o relógio do plenário para que os minutos não corressem e a votação pudesse ser concluída de maneira ordenada e da melhor forma possível para a democracia de então”.[xvii]17

E não se tem notícia de que alguém suscitasse a ineficácia da reforma constitucional votada fora do prazo...

Inúmeros são, como se vê, os documentos falsos, ou de duvidosa autenticidade, que produziram efeitos históricos e jurídicos irreversíveis, contrariando-se, portanto, o entendimento de que nulos, ou pelo menos ineficazes, são os atos decorrentes de documentos apócrifos. Ao contrário, parece que os efeitos se tornam tanto mais irreversíveis quanto maior a importância do documento falso... De fato, ninguém de bom tino seria capaz de argüir a nulidade dos efeitos produzidos durante séculos pelo Constitutum Constantini, pelo Tratado de Tordesilhas, e, excusez du peu, pelos textos legais mencionados, inclusive alguns que pudessem ter sido enxertados em papéis em branco assinados antecipadamente por um presidente da República enfermo e nas vésperas da total inconsciência...

Tão fascinante é o assunto que me abalancei a escrever sobre ele, menos com a intenção de esgota-lo do que para sugerir aos pesquisadores e aos doutos que o enfrentem com elementos mais fartos e com erudição que me falta.
 



A penhora, o Registro de Imóveis e o terceiro de boa-fé. - Julio Cesar Weschenfelder*


Introdução  

Este é um breve estudo que visa demonstrar a importância do registro da penhora como meio de garantia e de estabilidade das relações sociais.

Tem se notado o comportamento processualista de inúmeros profissionais do direito que, apegados ao formalismo processual, têm descurado da importância que determinados atos processuais, como in casu, a penhora, geram no meio social.

A falta de registro da penhora de imóvel no Ofício Imobiliário competente tem muito mais de danoso à sociedade que ao próprio credor.

Tem a sociedade o direito de conhecer a existência de tal constrição para que não seja o terceiro de boa-fé pego de assalto com a retirada de seu patrimônio de bem, cuja penhora não se havia assentado e que acabou por gerar ato de alienação compulsória em hasta.

Através deste breve enfoque doutrinário e jurisprudencial, discorrer-se-á sobre a importância do registro da penhora para a mantença da estabilidade social.


1. O Registro de Imóveis e a publicidade

Cumpre-nos definir Registros Públicos para alcançarmos a missão do Registro de Imóveis no seio da organização estatal à qual estamos vinculados pelo pacto social.

Trata-se de "instituição de Direito que se destina a tornar público o estado e a capacidade de pessoas, autenticar, no complexo das relações jurídicas, os atos dos indivíduos, perpetuando, através do cível do tempo, sua validade, a fim de permitir a comprovação dos fatos da vida social, no tocante à aquisição, transferência ou perda de direitos, como também de obrigações" [xviii]1.

A teor da Lei, são serviços destinados a garantir a publicidade, a autenticidade, a segurança e a eficácia dos atos jurídicos [xix]2.

Da conceituação exsurge a extensa gama de atribuições, fundadas em vários princípios garantidores de sua eficácia, dentre os quais os da fé pública, publicidade, obrigatoriedade, titularidade, territorialidade, continuidade, prioridade, reserva de iniciativa, tipicidade, especialidade, disponibilidade e legalidade.

A definição permite-nos concluir que os Registros Públicos, além de outras missões, têm a de outorgar a publicidade, função primordial que confere segurança às relações jurídicas que lhe são submetidas.

Para Nicolau Balbino Filho [xx]3, a publicidade é a alma dos registros públicos. É a oportunidade que o legislador quer dar ao povo de conhecer tudo o que lhe interessa a respeito de determinados atos. Deixa-o a par de todo o movimento de pessoas e bens.

A propósito, Eminente Des. Décio Antônio Erpen [xxi]4, enquanto Juiz do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, ao apreciar o fenômeno da publicidade, informou:

"É certo que não se está frente a uma verdade metafísica, uma verdade absoluta, mas há um máximo de probabilidade e um mínimo de dúvida de que houve uma comunicação capaz de gerar o conhecimento generalizado. Trata-se de uma ficção necessária como também o é aquela em que a ninguém é dado alegar a ignorância da lei, mesmo que se disponha a demonstrar o contrário."

E prossegue o Eminente jurista [xxii]5:

"As presunções – absolutas ou relativas – advêm, portanto, de uma exigência social, ante o acentuado inter-relacionamento humano, não se tratando de produto do artificialismo que não possa encontrar justificativa. A comunicação, visando gerar o conhecimento, insere-se no intercâmbio social, ultrapassando a esfera jurídica. A própria Filosofia cuida dela, assim que, no campo de Direito, o instituto da publicidade não advém de capricho do legislador, e que estaria a prestigiar exclusivamente a forma. Diante das mutações da vida, fatos e situações passam a ser gravados, para se perpetuarem e para serem acessíveis a uma comunidade em geral."

Este é, pois, o instrumento que oferece garantia e segurança para combater a clandestinidade. O resultado é a outorga de um conhecimento público previsível.

Admite-se que os direitos inscritos estão protegidos pelo regramento, sendo cognoscíveis por todos, o que acentua o apregoado efeito erga omnes.

O objetivo, marcantemente público, advém de um fenômeno social que visa ao pacífico inter-relacionamento humano. A publicidade não confiável abala o sistema, porque informa erroneamente desde o estado das pessoas até o mundo dos negócios, comprometendo-o. Eis uma das razões para a existência dos Registros Públicos, verdadeira emanação do Estado.

Aqui, o bem jurídico tutelado pela ordem estatal é a coletividade, podendo-se concluir que a publicidade é a verdadeira guardiã de direitos, outorgando segurança nas relações jurídicas, evitando desagradáveis surpresas e conflitos dispensáveis.

Os Registros Públicos erigem-se, pois, no marco inicial de um direito real, ao qual somente se podem opor: 1) outro de maior relevância ou prioritário, 2) um negócio jurídico viciado em sua substância ou 3) um defeito formal do registro, mas em todas as hipóteses não se prescinde de ação própria, com o ônus probatório a cargo do demandante [xxiii]6.

Logo, não basta, para que se possa pôr em dúvida a fé pública decorrente do sistema de publicidade, mera alegação. Há que se ter ação própria, onde o demandante tem de se desincumbir de produzir prova capaz da ineficácia ou da imprestabilidade do direito assentado no registro.


2. A penhora

O 2° Grupo Cível do Tribunal de Alçada do Rio Grande do Sul, ao apreciar Embargos Infringentes n° 27.445, acentuou a necessidade de se levar a registro a penhora de bem imóvel para caracterizar a fraude à execução em caso de alienação do bem.

O Registro de Imóveis, espécie do gênero Registro Público, é um instituto que tem sido freqüentemente subestimado por juízes e tribunais, ao argumento de se tratar de formalidade que não pode ser sistematicamente prestigiada, dizendo respeito mais aos registradores e seus respectivos ofícios que aos interesses coletivos.

No afã de prestigiar o processo em detrimento das normas materiais de conduta, a prática tem dado azo a danos injustos que muitos contratantes de boa-fé têm sofrido, gerando a descrença nas leis e na instituição guardiã e zeladora de sua aplicação.

É de se salientar que, enquanto ato do processo, a penhora se aperfeiçoa com o depósito em mãos do executado [xxiv]7. Contudo, enquanto requisito de eficácia para oponibilidade contra terceiros de boa-fé, esta somente se aperfeiçoa com o registro [xxv]8.

Destarte, se a penhora, que é ato de império, deve ser registrada mesmo quando a Fazenda Pública é exeqüente e, notadamente, porque o próprio legislador se submeteu à exigência legal, obviamente que ela não é facultativa e tem sua razão de ser. Foi feliz. Evita com isso que terceiros, adquirentes de boa-fé, venham a ser lesados.

Não há conflito entre o Código de Processo Civil e a Lei Registral, ao contrário, há perfeita harmonia. Basta uma leitura conjunta dos preceitos contidos nos artigos 167, I, 5, 169 e 240 da Lei n° 6.015/73, do art. 7°, IV da Lei n° 6.830/80 e do art. 659, § 4°, do CPC, para se perceber a evolução no sentido da obrigatoriedade do registro.

O eficiente comentarista da Lei dos Registros Públicos Walter Ceneviva [xxvi]9, ao analisar o disposto no art. 240 da Lei n° 6.015/73, demonstra a incoerência debitada à jurisprudência ao aceitar a fraude à execução sem o registro da penhora, verbis:

"Com esse caminho, introduz-se uma quebra inaceitável do sistema: afasta-se a predominância do direito real e se dá realce ao pessoal inerente à penhora não registrada. É interpretação contrária à letra do art. 240. Deste resulta a afirmação positiva de que só o registro da penhora faz prova, quanto à fraude, de transação posterior e de que, a contrário, enquanto inexistente o registro, não se pode alegar, por força da lei”.

O preceito contido no art. 240 da Lei 6.015/73 possui caráter substantivo ao asseverar: "O registro da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior”.

Da exegese resulta que, registrada a penhora, eventual ato de disponibilidade é afetado pela cominação da lei; do contrário, a prova da fraude deve ser feita por quem a alega.

Essa interpretação, além de ser harmoniosa com a atual sistemática, advém de preceito de ordem material, inserido na Lei de Registros Públicos e posterior à lei adjetiva de que se serviam os processualistas para sustentar a dispensabilidade do registro da penhora.

Com o advento da Lei n° 8.953/94, mediante a introdução de preceito processual que tornou obrigatório o registro da constrição (art. 659, § 4º, CPC), a discussão, não obstante ainda existente, perdeu seu substrato, haja vista que, se antes nada dispunha a Lei Processual acerca da necessidade do registro e esse era o seu "calcanhar-de-aquiles", agora, ela é inequívoca, apregoando tal necessidade.


3. A obrigatoriedade do registro em face do princípio da concentração

Tem-se apregoado que, ao adotar-se o sistema tabular no Brasil, deveria ele ser completo. A matrícula deveria, então, ser tão completa que dispensasse outras diligências em prestígio à cultuada segurança jurídica.

Para alguns, o art. 167 da Lei n° 6.015/73 possui enumeração exaustiva, ou seja, é numerus clausus. O apego a essa conclusão, contudo, não enriquece o sistema. Além disso, o art. 246 da mesma Lei, permite ilações outras, possibilitando maior elasticidade ao comando legal.

Outras leis produziram atos que devem ser submetidos a registro ou averbação, sem no entanto ter elastecido formalmente aquela enumeração, mas gerando, inequivocamente, a necessidade de assentamento destes atos registrais.

Assim, permitimo-nos concluir com Décio Antonio Erpen e João Pedro  Lamana  Paiva [xxvii]10 que  "nenhum fato jurígeno ou ato jurídico que diga respeito à situação jurídica do imóvel ou às mutações subjetivas pode ficar indiferente à inscrição na matrícula".

A matrícula deve, então, ser o repositório de todos os atos que digam respeito à situação jurídica do imóvel e suas mutações objetiva e subjetiva, possibilitando àquele que a ela acorra conhecer das nuances que envolvem os direitos assentados.    

Daí se conclui pela necessidade do registro da penhora, não para garantia processual, eis que processualmente a constrição existe formalmente, aperfeiçoando-se com o depósito em mãos do executado, nem mesmo para a constituição do próprio gravame, mas para garantia da estabilidade das relações sociais, precisamente, para que o terceiro de boa-fé – a quem o ordenamento jurídico tem o dever de proteger em sua hipossuficiência – não seja surpreendido, mesmo depois de tomar todas as cautelas legais que cercam a aquisição imobiliária, perdendo aquilo que pode ser fruto de economias de uma vida inteira.

O registro da penhora se faz necessário, além disso, pelo disposto na própria Lei de Registros Públicos, por força do princípio da obrigatoriedade, que impõe o necessário registro dos atos previstos em lei (art. 285, III, Prov. 01/98-CGJ).

A Lei nº 6.015/73, em seu art. 167, I, 5, impõe o registro da penhora compulsório por força de seu art. 169.

Refere o dispositivo:

"No Registro de Imóveis, além da matrícula, serão feitos:

I - o registro:

1)

...

5) das penhoras, arrestos e seqüestros de imóveis;"...

Estabelece o art. 169, a seu turno:

"Todos os atos enumerados no art. 167 são obrigatórios e efetuar-se-ão no cartório da situação do imóvel"...

Da dicção citada resulta que a compulsoriedade do registro é a base para a configuração de fraude à execução, conforme menção expressa do art. 240 da mesma lei:

"O registro da penhora faz prova quanto à fraude de qualquer transação posterior”.

O entendimento doutrinário evoluiu até ensejar a indução nos dispositivos relativos à obrigatoriedade do registro da penhora na Lei de Execução Fiscal.

A Lei n° 6.830/80, mais moderna e preocupada com a repercussão social da medida constritiva, estabeleceu a obrigatoriedade do registro em seu art. 7º.

Refere o art. 7°:

"O despacho do Juiz que deferir a inicial importa em ordem para:

I - ....

...

IV - registro da penhora ou arresto, independentemente do pagamento de custas ou despesas, observado o disposto no art. 14; e”...

Esta inclinação doutrinária teve por escopo a garantia registral da apreensão e sua publicidade, formalidade que torna pública esta apreensão, relativamente à constrição imobiliária.

Não obstante a legislação citada, também o Pergaminho Processual, alterado pela Lei n° 8.953/94, acedeu à moderna doutrina, que, preocupada com os aspectos sociais da medida, prestigia o registro da constrição como requisito para segurança jurídica, prescrevendo em seu art. 659, § 4°:

"A penhora de bens imóveis realizar-se-á mediante auto ou termo de penhora e inscrição no respectivo registro”.

Assim, ainda uma vez, o registro da penhora deve ser feito não para a validade da própria constrição em si, mas para garantia de todo o sistema de confiabilidade imobiliária implantado no Brasil, que é assentado, fundamentalmente, nos princípios da fé pública e da publicidade, que asseguram a paz social para o qual foram desenvolvidos e, em decorrência, a estabilidade das relações jurídicas.

Finalmente, para Décio Antonio Erpen e João Pedro Lamana Paiva [xxviii]11, além dos atos traslativos de propriedade, das instituições de direitos reais, à matrícula devem acorrer os atos judiciais, os atos que restringem a propriedade, os atos constritivos (penhoras, arrestos, seqüestros, embargos), mesmo de caráter acautelatório, as declarações de indisponibilidade, as ações pessoais  reipersecutórias e as reais, os decretos de utilidade pública, as imissões nas expropriações, os decretos de quebra, os tombamentos, comodatos, as servidões administrativas, os protestos contra a alienação de bem, os arrendamentos, as parcerias, enfim, todos os atos e fatos que possam implicar a alteração jurídica da coisa, mesmo em caráter secundário, mas que possa ser oponível, sem a necessidade de se buscar alhures informações outras, o que conspiraria contra a dinâmica da vida.


4. Fraude à execução

A fraude à execução é ilícita. Nela que incide o devedor que aliena ou onera bens quando sobre eles pender ação fundada em direito real, ou quando, ao tempo da alienação ou oneração, corria contra si demanda capaz de reduzi-lo à insolvência (art. 593 do CPC).

O direito registral, relegado a segundo plano em face à postura processualista de inúmeros profissionais do direito, tem, não obstante, função primordial para o acompanhamento da dinâmica constante da vida. Enseja soluções racionais e práticas para solver impasses, visando noticiar toda a real e correta situação jurídica da coisa, com todas as suas mutações subjetivas e objetivas.

A harmonia do direito com a notícia deve ser inquestionável e inequívoca para não gerar novas demandas. Isso revela a função primordial ínsita aos registros públicos, ou seja, a de outorgar a paz jurídica.

Não hesita-se em afirmar que a penhora não levada a registro é inoponível, por si só, frente a outro ato, judicial ou extrajudicial, que tenha logrado êxito junto ao Registro Imobiliário, salvo se em ação própria for demonstrada a má-fé do adquirente, mas que não se presume.

Pelo sistema imobiliário adotado no país, o adquirente de imóvel (penhorado nos autos de execução) sem a penhora registrada, ou ainda livre de outros ônus reais ou gravames, é sempre de boa-fé, pois o que comprova a oneração do imóvel é a certidão do Registro Imobiliário, documento obrigatório para a lavratura dos atos notariais relativos a imóveis (art. 1º, IV, Decr. 93.240/86).

As situações que envolvem o tema sinalizam dois caminhos. O primeiro, quando há alienação do imóvel penhorado sem registro correspondente, caso em que a penhora é adstrita ao processo e inoponível; e o segundo, com a penhora registrada, quando esta é conhecida do mundo jurídico e negocial, fazendo prova quanto à fraude de qualquer alienação que lhe seja posterior (art. 240 da Lei n° 6.015/73).

Como assegurar a paz social?

Sugere Sergio Sahione Fadel [xxix]12:

"No caso de a penhora recair em imóvel, deve o credor providenciar, através de certidão do auto, a inscrição dessa penhora no registro imobiliário, a fim de evitar os casos comuns de fraude de execução, em que o devedor aliena ou onera seus bens penhorados com o escopo de dificultar ou impossibilitar a execução, criando, com isso, incidente demorado e acarretando, em muitos casos, o envolvimento de terceiros, às vezes de boa-fé, no processo executivo."

Alcides De Mendonça Lima [xxx]13, também sensível à problemática, opina pela exigibilidade da inscrição:

"A formalidade da inscrição, no caso, gera apenas um dos efeitos que da mesma decorrem: a transferência de direitos reais e a publicidade, ou seja, apenas este último, como bem nota Amilcar de Castro. Com tal inscrição, que passa a acompanhar o bem imóvel sempre que for solicita



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