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DIADEMA JORNAL – 4/12/2005
Projeto busca regularizar 80% das moradias em áreas metropolitanas
Aprovação da nova lei poderá ajudar a solucionar boa parte dos problemas relativos à posse e propriedade de moradia
Messias de Queiroz
A administração municipal de Diadema pretende desapropriar três áreas públicas, para fins habitacionais, até março. Trata-se de um projeto-piloto no Brasil, mediante o qual as áreas serão desafetadas, ou seja, a finalidade de utilização do terreno poderá ser alterada, a fim de que seja vendido. Estes três lotes, que não foram devidamente identificados para não estimular especulação imobiliária, abrigarão em torno de 70 famílias. Os estudos ainda contemplam outros três loteamentos particulares, sem aprovação no Registro de Imóveis, situados no Centro, no Arco Íris e na Vila Paulina, que atenderão cerca de mil famílias.
Todas estas providências serão possíveis graças à lei 3.057/00 na Comissão de Desenvolvimento Urbano da Câmara dos Deputados, que vai permitir uma espécie de municipalização da regularização fundiária no país. A lei ainda terá que ir à votação em plenário e depois ser sancionada pelo presidente da República, mas a sua aprovação vem sendo saudada como uma modernização necessária, que ajudará a resolver os problemas de posse e propriedade irregulares, tanto no campo quanto nas cidades.
Atualização – A legislação, de um modo geral, exige contínua atualização, ainda mais quando se trata da questão da terra, uma das mais difíceis de serem resolvidas no país”, afirmou, quinta-feira (01), o secretário Municipal de Habitação de Diadema, Josemundo Dario Queiroz, o Josa.
A discussão em torno do assunto começou em 1983 no município, entretanto, somente agora, com a nova lei, poderá ser usado um mecanismo jurídico considerado essencial: a desafetação. Até então, áreas públicas que tinham determinado fim não podiam ser colocadas à venda e, com isso, o máximo que o morador conseguia era a Certidão de Posse. Contudo, com esse documento ele não podia vender ou mesmo usar a propriedade para fins de obtenção de empréstimo ou quaisquer garantias. Mediante a desafetação, ele poderá exercer o direito de compra, e conquistar o título de propriedade. Parte dos recursos provenientes da venda dos lotes será usada pela administração, por sua vez, em benfeitorias urbanas, como iluminação pública e pavimentação asfáltica.
Levantamento - Josa disse que até o fim de março a prefeitura espera ter um diagnóstico detalhado da situação fundiária na cidade. Sabe-se que há 206 áreas ocupadas, incluindo-se aquelas públicas, privadas ou mistas. Cerca de metade desses terrenos particulares invadidos já estava irregular antes da ocupação, seja por falta de registro, seja por ausência de autorização para o loteamento.
Prefeitura de Mauá emite 100 certificados individuais
A Prefeitura de Mauá emitiu ontem(03), 100 Certificados de Regularização Individual de Área para moradores de loteamentos irregulares dos bairros Sampaio Vidal, Cincinatto Braga, Chácara São Brás; Jardim Luzitano e Itapark. A cerimônia de entrega dos documentos foi pela manhã no Teatro Municipal, na Vila Noêmia.
Com a documentação, moradores de terrenos localizados em loteamentos clandestinos da cidade regularizarão sua situação, para pagamento de Imposto Predial (IPTU). A meta da administração municipal é emitir cinco mil certificados, atingindo os proprietários dos terrenos de 37 loteamentos do município em áreas particulares, que estão em condições irregulares. Em setembro, a prefeitura já havia regularizado 96 propriedades na região do Recanto Vital Brasil.
Decreto – A medida é possível graças ao decreto 6.692, estabelecido na atual administração. A medida permite a regularização de lotes em áreas que não oficializaram o parcelamento do solo junto ao governo do município na época de seu lançamento. Esses loteamentos, apesar de terem sido divididos e comercializados, estão registrados em nome dos antigos proprietários.
A regularização é feita a partir da medição dos terrenos e das construções, para efeito de IPTU. Sem os certificados, os moradores precisavam dividir o valor do imposto da área total do loteamento para fazer o pagamento. A partir do recebimento dos certificados, cada proprietário terá seu próprio carnê.
Para fazer a regularização dos lotes é necessário protocolar o pedido no Posto de Atendimento ao Cidadão do Paço, na avenida João Ramalho, 207. É necessário apresentar o contrato de compra e venda da área, cópia do IPTU do terreno maior, preencher o requerimento e pagar a taxa de R$ 29,60. O prazo para a emissão do contrato é de, aproximadamente, 30 dias.
Com o Certificado de Regularização Individual de Área em mãos, o morador pode, posteriormente, obter o Atestado de Regularização do lote, o que facilita um eventual processo de legalização dos loteamentos.
Moradores de loteamento irregular ficam até 22 dias sem água
A situação dos moradores do Sítio Joaninha, loteamento irregular em Diadema, na divisa com São Bernardo, é considerada “desesperadora e desumana” pelo secretário de Habitação, Josemundo Dario Queiroz, o Josa. Ele argumenta que a prefeitura está de mãos atadas, proibida de fazer melhorias em virtude de ação movida pelo Ministério Público (MP), que pede a remoção das famílias e preservação da área. “O ideal, que infelizmente não é opinião unânime, seria utilizar os mecanismos que existem – legislação, promotorias, poder público, comunidades de bairro – para tratar o que hoje é irregular, aos olhos da lei, e passível de regularização”, afirmou Josa.
O Sítio Joaninha se formou há mais de 20 anos, quando pessoas desinformadas adquiriram lotes numa área de mananciais, preservada por lei e no qual não se podia erguer edificações. Na época, o poder público não fiscalizou a área de mananciais como deveria e quando atentou para o fato pôde apenas evitar novas construções. “A última ligação autorizada foi a minha, em 1996”, afirmou a vice-presidente da Associação de moradores, Raimunda do Vale.
Ligações – Diante disso, proliferam as ligações clandestinas de energia, correndo risco de causar curtos-circuitos e incêndios. Com muito custo, os moradores conseguiram que a prefeitura enviasse caminhões-pipa. “Chegamos a ficar até 22 dias sem água”, conta Raimunda. O problema estaria resolvido se poços pudessem ser cavados. Contudo, um lixão clandestino – fechado há anos – contaminou o solo e deixou o líquido impróprio para consumo.
O morador Ailton Oliveira disse que outra preocupação constante é em relação à falta de posto de saúde ou escola, obrigando crianças e mulheres a caminharem até bairros vizinhos. De acordo com moradores, o Sítio Joaninha reúne em torno de 1.300 famílias, número contestado pela prefeitura, para a qual a quantidade é quase a metade. Outros loteamentos clandestinos sobre mananciais são os da rua Iguaçu, com cerca de 100 famílias, e do Amuhadi, com quase mil. (MQ).
Questão fundiária se aprofunda em problemas sociais
A ex-secretária-executiva do Ministério das Cidades, professora e arquiteta Ermínia Maricato, mesmo ressaltando que não há números fidedignos, aponta que em torno de 80% das propriedades em áreas metropolitanas estão irregulares, seja por invasão, seja por descumprimento das legislações federais, estaduais ou municipais.
Conforme Ermínia, a questão fundiária se aprofunda em problemas sociais, mantendo boa parte da população em uma fase de pós-modernidade. Em loteamentos irregulares, o poder público não chega e muitas vezes se omite, deixando os moradores sem iluminação pública, saneamento básico e demais benfeitorias. “É fato comprovado que onde a situação foi regularizada caíram os índices de violência”, disse a arquiteta, em recente entrevista para a TV Justiça. Ermínia afirmou que atualmente há em torno de 350 mil processos de regularização de imóveis em andamento apenas na esfera federal. Para a docente, em até quatro anos o país sentirá o impacto benéfico dessas medidas para a economia.
Alternativa – A aprovação da lei 3.057 foi acompanhada de perto por entidades, como o Instituto de Registro Imobiliário do Brasil (Irib), para o qual a melhor alternativa para o problema é a alteração na atual política vigente. Os administradores optam na atualidade por conceder certidões que permitem a posse da terra para os ocupantes, que englobam não apenas os mais carentes como todos aqueles que estão em propriedades sem o devido registro. O problema é que essa certidão concede o direito de posse, ou seja, de usufruto da área, mas não oficializa o imóvel sobre o terreno, o que só é permitido pelas leis brasileiras pela doação ou venda por parte do proprietário.
Sem a prioridade, os ocupantes se tornam inseguros e evitam investir em melhorias nas habitações, surgindo bairros inteiros com casas apenas na cor do tijolo baiano”, exemplificou a diretora do Irib, Patrícia Ferraz, responsável pelo Registro de Imóveis de Diadema. Ela destacou que os ocupantes irregulares também não conseguem obter empréstimos bancários, ou mesmo venderem seus imóveis mediante linhas de crédito bancadas por instituições governamentais.
Torna-se um ciclo vicioso”, afirmou Patrícia, detalhando que as comunidades também ficam relegadas ao segundo plano nas ações das prefeituras. “As administrações, em muitos casos, não podem investir em melhorias por que poderia atrair mais ocupantes”.
Proposta desburocratiza e acelera registro
A lei 3.057/2000, do deputado Barbosa Neto (GO), facilita a regularização fundiária de várias formas. Primeiro, porque permite que ela seja feita através das prefeituras e Registros de Imóveis, sem necessidade de processos judiciais, salvo quando houver conflitos. Depois, porque flexibiliza as regras urbanísticas e ambientais, de forma a trazer essas propriedades da zona da irregularidade para dentro da “cidade legal”. E por permitir que haja compensações de áreas para atendimento dos padrões urbanísticos garantidores da manutenção de espaços públicos, a fim de instalação de escolas, postos de saúde, áreas verdes e de lazer, além de sistema viário.
Esse projeto tem uma característica fundamental: olha para o problema da ocupação do solo urbano de vários pontos distintos e o trata de forma sistêmica, de tal sorte que, inclusive, promove alterações na Lei de Registros Públicos, de forma a aprimorar o sistema de Registro Imobiliário, possibilitando que as transações ganhem celeridade e segurança jurídica. Nesse ponto, aliás, o PL é de notável modernidade e apuro técnico, trazendo para o Brasil inovações que já funcionam muitíssimo bem em outros países.
Concentração – Tal como ocorre na Espanha, este projeto prevê a concentração no Registro de Imóveis dos fatos relativos a esses bens e a impossibilidade de usar contra o adquirente, que de boa-fé por ele pagou, informações não estejam cadastradas. Assim, o cidadão, o empreendedor, as instituições financeiras, ou seja, qualquer um que tenha interesse em um bem de raiz, poderá, apenas com uma certidão do Registro saber tudo o que há em relação ao imóvel: quem é o seu real proprietário, se existem hipotecas sobre o bem ou não, ou se sobre ele há qualquer limitação administrativa, judicial, contratual, urbanística e ambiental. A avaliação do risco do negócio imobiliário, portanto, será muito mais fácil, rápida e barata, e estará encerrada a fase da peregrinação em busca de certidões do imóvel e de seu patrimônio, explicou a diretoria do Irib.
Com a aplicação dessas inovações, os ocupantes de imóveis irregulares terão efetivas chances de se transformar em proprietários dos terrenos que ocupam e de ingressarem em um sistema imobiliário muito mais fortalecido, rápido e seguro. (MQ).
(Diadema Jornal/SP, 4/12/2005).
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