BE2208

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ACONTECE

O Diretor de Ensino do Irib, Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, nos dias 17 e 24 de novembro e 1 de dezembro ministrou aulas na Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro, EMERJ, no curso de pós-graduação de Direito Notarial e Registral.

Na série de aulas, o diretor do Irib focalizou diversos aspectos de direito registral. Em primeira mão, divulgamos as aulas ministradas pelo Professor Eduardo.

Georreferenciamento e registro Torrens  
Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza*


1) A publicidade como fim dos sistemas registrais.

José Manuel García García conceitua a publicidade registral como “la exteriorización continuada y organizada de situaciones jurídicas de trascendencia real para producir cognoscibilidad generalerga omnes, y con ciertos efectos jurídicos sustantivos sobre la situación publicada”.

Alvaro Delgado Scheelje apresenta conceito semelhante: “la publicidad jurídica registral es la exteriorización sostenida e ininterrumpida de determinadas situaciones jurídicas que organiza e instrumenta el Estado a través de un órgano operativo, para producir cognoscibilidad general respecto de terceros, con el fin detutelarlos derechos y la seguridad en el tráfico de los mismos”.

A publicidade, efetivamente, é o fim de todos os sistemas registrais, elemento comum a todos e sua razão de existir [1].

A segurança jurídica completa, abarcando tanto a segurança estática quanto a dinâmica, deve ser o fim almejado pela publicidade registral. O titular do direito inscrito dele não pode ser privado sem seu consentimento ou sem determinação judicial (segurança estática), e o adquirente de um direito subjetivo imobiliário deve estar a salvo de qualquer ataque por elementos que não constassem do registro por ocasião da aquisição (segurança dinâmica). A segurança no tráfico imobiliário, com a proteção daqueles que confiaram no teor dos registros, se atinge com a publicidade registral a permitir potencialmente o conhecimento geral do que se publica, com efeitoserga omnes.

2) Classificação dos sistemas registrais imobiliários quanto ao valor da publicidade.

A conceituação de Direito Imobiliário Registral não é pacífica. Discute a doutrina, inclusive, se goza ou não de autonomia este ramo do Direito.

Aparecem do Direito Civil algumas especificações, “novos corpos ou sistemas denormas, destinados a disciplinar, de maneira própria, determinadas relações e situações jurídicas”, segundo Miguel Reale, em Lições Preliminares de Direito, Saraiva.

Atentos à tendência desagregadora do direito (com o surgimento do Direito Agrário, do Trabalho, Urbanístico, etc.), Lacruz Berdejo e La Rica, citados por J.A. Mouteira Guerreiro (Noções de Direito Registral, Coimbra Editora), defendem a autonomia do Direito Registral dentro do Direito Civil, ao contrário de Roca Sastre e Sans Fernández. E a defendem também porque no Direito Registral “se integram normalmente normas administrativas, processuais, mercantis e não apenas civis”. Com efeito, pode-se atribuir ao Direito Registral, como assevera o citado doutrinador português, “uma componente mista de direito público e privado”.

O Direito Imobiliário Registral engloba normas de direito material, ordenando a matéria dos direitos reais imobiliários, e de direito formal, quanto ao procedimento para se atingir a publicidade registral, com todas as suas conseqüências, observados os efeitos conferidos pela legislação ao registro.

Diante de todo o exposto, conclui-se: embora predominem regras de Direito Privado, há também componentes de Direito Público no Direito Imobiliário Registral (processuais, administrativos, tributários); não cuida o Direito em tela apenas de aspectos materiais, mas também formais; merece o Direito Imobiliário Registral, portanto, inclusão na tendência desagregadora do direito para ser admitido como disciplina jurídica independente. Tem gênese no Direito Civil, mas suas peculiaridades o conduzem à autonomia.

Disciplina nova, e bastante abrangente, o Direito Imobiliário Registral pode ser conceituado como osistema de normas privadas e públicas, com predominância das primeiras, que ordena os diretos reais sobre imóveis, quer quanto ao aspecto substantivo, quer quanto ao aspecto formal, regulando ainda o acesso ao fólio real das garantias de determinados direitos pessoais e de crédito.

Regulando o Direito Imobiliário Registral a propriedade sobre bens imóveis, interessa-nos neste esboço a publicidade e seu valor, que varia conforme os efeitos que lhe são atribuídos.

A publicidade imobiliária, nos sistemas modernos, está organizada através dos registros imobiliários, instituições fundamentais para alcance da segurança jurídica, estática e dinâmica. Em razão de tal organização, os sistemas imobiliários são denominados sistemas registrais imobiliários.

Angel Cristóbal Montes, em Direito Imobiliário Registral, Safe, 2.005, classifica os sistemas registrais imobiliários “tomando como módulo diferencial o valor jurídico que se atribua aos assentos praticados no registro...; isto é, de um ângulo ou enfoque substantivo”. O mencionado autor afirma que “o registro da propriedade é o instrumento da publicidade imobiliária, e esta constitui o objetivo mínimo e comum de todos os sistemas imobiliários, pelo qual é mais correto classificar os mesmos em razão da maior ou menor eficácia civil, atribuída à publicidade registral dos direitos reais sobre bens imóveis”.

Adotado tal critério, Angel Cristóbal Montes classifica os sistemas imobiliários registrais em três grupos:

a) sistemas que atribuem à publicidade registral simples força negativa preclusiva (oponibilidade do inscrito): a aquisição e constituição do domínio e demais direitos reais ocorrem independentemente do registro, que apenas publicam as titularidades reais formadas extra-registralmente sem acrescentar-lhes qualquer eficácia civil especial. Para evitar a clandestinidade dos encargos e as duplas alienações, estabelece-se que quem inscreve seu título aquisitivo no registro fica a salvo de quaisquer reclamações que formulem aqueles que em data anterior ou ao mesmo tempo adquiriram o mesmo direito ou outro incompatível com o inscrito e não procederam ao seu registro.

A este grupo pertencem, dentre outros, os sistemas francês, belga, italiano, português e holandês;

b) sistemas que atribuem à publicidade registral eficácia convalidante: neles o direito real também “nasce fora do registro, pelo qual este igualmente se dirige, em princípio, a dar publicidade aos direitos reais já constituídos. Porém, os efeitos de tal publicidade não se limitam a tornar oponíveis os atos registrados frente aos que podem prejudicar, mas que, de forma muito mais ampla, incidem sobre a substância mesma do direito real dando lugar, por um lado, à presunçãojuris tantum de que aquilo que o registro publica é exato (legitimação registral) e, por outro, convalidando irrebativelmente em benefício do titular, que contratou fundando-se de boa-fé nos pronunciamentos registrais, os direitos inscritos (efeito sanativo da titularidade do transmitente, fé pública registral)”.

O sistema espanhol e os hispano-americanos nele inspirados (Porto Rico, Cuba) se incluem neste grupo.

c) sistemas que atribuem à publicidade registral efeitos constitutivos: neles o registro é requisito para a constituição e nascimento dos direitos reais.

A eficácia constitutiva é, contudo, variável, o que permite fazer uma distinção dentro do grupo quanto à maior ou menor eficácia constitutiva que se dê à publicidade registral.

Nos sistemas alemão e suíço o registro está dotado de valor constitutivo, acompanhado de requisitos prévios (consentimento, título). Os pronunciamentos registrais, salvo quanto a terceiros adquirentes que reúnam as circunstâncias legalmente exigidas para isso, estão subordinados à legitimidade dos requisitos prévios, de modo que, ainda presumindo-se a exatidão do registro, caso se demonstre sua inexatidão, vence a realidade jurídica extra-registral.

No sistema australiano a publicidade registral tem um valor constitutivo absoluto. O acesso ao registro significa uma situação jurídica inatacável (força probante ou eficácia formal do registro).

Registre-se, por fim, que a tendência moderna é atribuir ao registro efeitos civis mais importantes na esfera dos direitos reais imobiliários.

Efetivamente, o sistema que adote o princípio da inscrição (ou o registro obrigatório), dando visibilidade a todos os direitos reais, ônus ou gravames referentes a um imóvel, fazendo-o outrossim sob o fólio real, com a garantia da prioridade (prevista ainda a reserva de prioridade) e nele vigorando o princípio da fé pública registral, estará apto a conferir a tão desejada segurança jurídica, estática e dinâmica.

3) O cadastro.

O sistema da Lei 6.015, com a introdução da matrícula e do fólio real, tem o imóvel como o núcleo do registro, o que permite dizer que há no registro imobiliário um sistema cadastral, embora não seja o registro a instituição que se encarregue do cadastro. O art. 176, § 1º, II, 3, inclui, como requisito da matrícula,a identificação do imóvel. O dispositivo foi alterado pela Lei 10.267/01 (que determina o georreferenciamento). Sua redação anterior era: “II – são requisitos da matrícula: ... 3) a identificação do imóvel, feita mediante indicação de suas características e confrontações, localização, área e denominação, se rural, ou logradouro e número, se urbano, e sua designação cadastral, se houver”.

A ausência do cadastro é recorrentemente citada como uma das razões da não adoção da fé pública registral pelo legislador de 1916. Efetivamente caminha-se para uma integração cadastro-registro, para que o imóvel, descrito e caracterizado na matrícula (especialização), encontre no cadastro sua correspondente planta. Cabendo o cadastro dos imóveis urbanos aos municípios, o dos imóveis rurais é de atribuição do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária - INCRA. Pela Lei 10.267/01 foi criado o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais - CNIR, determinada a obrigação de atualização do cadastro sempre que houver alteração nos imóveis rurais, o georreferenciamento de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro, e o intercâmbio mensal de informações entre os serviços de registro de imóveis e o INCRA - integração cadastro-registro. Apesar de dificuldades técnicas que estão sendo enfrentadas para implementação dos comandos legais, é evidente a evolução do sistema como um todo.

Recentemente, no Congresso do CINDER, realizado de 7 a 10 de novembro em Fortaleza, foi apresentado para publicação trabalho defendendo a necessidade de uma lei nacional de cadastro, a exemplo do que ocorre em outros países.

A Dra. Andrea F. T. Carneiro, da Universidade Federal de Pernambuco - Departamento de Engenharia Cartográfica, abordou o tema e referiu-se à lei que determina o georreferenciamento: “É inegável o valor das informações cadastrais para a gestão de um país. A necessidade de um aproveitamento eficiente de recursos cada vez mais escassos justifica a adoção de ferramentas que permitam a tomada de decisões baseada em critérios técnicos que levem a uma melhor relação custo-benefício.

As informações espaciais em âmbito cadastral são utilizadas em aplicações que incluem a tributação territorial, o planejamento rural e urbano e ações de regularização fundiária, considerando também as questões ambientais, visando o desenvolvimento sustentável. Nesse aspecto em particular, as ocupações desordenadas dos grandes núcleos urbanos e a especulação imobiliária voltada para os remanescentes de ambiente natural exigem que as ações governamentais sejam cada vez mais precisas, baseadas em informações confiáveis.

Uma análise de sistemas cadastrais internacionais permite concluir que todos os cadastros que apresentam uma certa eficiência possuem uma estrutura legal e administrativa específica para a realização das atividades cadastrais. As diretrizes gerais para o funcionamento dos sistemas cadastrais são estabelecidas através de leis nacionais de cadastro. Os recentes avanços obtidos no Brasil com a Lei 10.267/01, que estabeleceu o intercâmbio sistemático de informações entre Cadastro e Registro de Imóveis, e os convênios existentes em áreas urbanas com o mesmo objetivo (Carneiro, 2000), indicam que é importante que se estabeleça, o quanto antes, diretrizes nacionais que orientem o funcionamento do cadastro, como ocorre em muitos países”.

Como se verifica, dentro de todo este contexto está o GEORREFERENCIAMENTO.

4) Lei 10.267/01.

De acordo com o afirmado no tópico anterior, pela Lei 10.267/01 foi criado o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais - CNIR, determinada a obrigação de atualização do cadastro sempre que houver alteração nos imóveis rurais, o georreferenciamento de acordo com o Sistema Geodésico Brasileiro, e o intercâmbio mensal de informações entre os serviços de registro de imóveis e o INCRA - integração cadastro-registro, dentre outras disposições.

A Lei 10.267 altera dispositivos das Leis 4.947/66 (Fixa normas de Direito Agrário e dispõe sobre o sistema de organização e funcionamento do Instituto Brasileiro de Reforma Agrária), 5.868/72 (Cria o Sistema Nacional de Cadastro Rural), 6.015/73 (Lei dos Registros Públicos), 6.739/79 (Dispõe sobre a matrícula e o registro de imóveis rurais) e 9.393/96 (Dispõe sobre o Imposto sobre a Propriedade Territorial Rural - ITR, sobre pagamento da dívida representada por Títulos da Dívida Agrária e dá outras providências). Foi regulamentada pelo Decreto 4.449, de 30/10/2.002.

A regulamentação da Lei 10.267 criou uma série de perplexidades e sua efetiva implementação, quanto ao georreferenciamento, demonstrou-se inviável nos prazos fixados. Diversas discussões surgiram no cenário registral imobiliário levando o Poder Executivo a editar um novo decreto, de nº 5.570, de 1º de novembro corrente, alterando o Decreto 4.449 e fixando novos prazos para exigência do georreferenciamento.

Há necessidade de um cadastro confiável e de que a descrição dos imóveis nas matrículas corresponda à realidade, sem sobreposição de áreas e permitindo a localização do imóvel. Kátia Duarte Pereira e Moema José de Carvalho Augusto, em texto intitulado “O sistema geodésico brasileiro e a lei de georreferenciamento de imóveis rurais”, publicado no Boletim do IRIB em Revista, novembro e dezembro de 2.004, nº319, mencionam que a CPI da grilagem apurou que em Babaçulândia, Tocantins, “a área registrada dos imóveis representa o dobro da área do município”. Contudo, e apesar de restar induvidosa e imperiosa a necessidade de aperfeiçoamento do sistema, envolvendo o cadastro e o registro, não estão presentes ainda todas as condições para o georreferenciamento.

A identificação do imóvel rural, nos termos da lei, deve conter as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro, cabendo ao INCRA certificar que não há sobreposição. O Sistema Geodésico Brasileiro (SGB) começou a ser implantado pelo IBGE em 1.944 e georreferenciar ao SGB, de acordo com as autoras citadas no parágrafo anterior, “significa identificar inequivocamente o imóvel, descrevendo-o pelas coordenadas do sistema de referência do mapeamento oficial adotado no país, que é de responsabilidade do IBGE”. Sucede que não há ainda os pontos de “amarração” em todo o território nacional, a rede de pontos ao longo do território (rede planimétrica brasileira) não está completa. Os prazos foram, portanto, prorrogados.

5) O Decreto 4.449/02, com as alterações do Decreto 5.570/05.

O Decreto 4.449/02, como já afirmado, fixou prazos insuficientes para que os imóveis se adequassem à exigência do georreferenciamento, o que levou o Poder Executivo a alterá-lo através do Decreto 5.570/05. A principal razão para a nova redação do Decreto 4.449/02 eram os prazos exíguos. Contudo, pelo Decreto 5.570/05 foram aperfeiçoados outros dispositivos do regulamento da Lei 10.267/01.

O regulamento anterior previa que as informações INCRA-Registro fossem encaminhadas por escrito, o que não constava quanto às informações Registro-INCRA. A expressão “por escrito” foi excluída, permitindo que a troca de informações ocorra por sistema informatizado, o que é de todo recomendável em um quadro que caminha para o registro eletrônico.

O Decreto 5.570/05 se refere a dispositivos do art. 213 da Lei de Registros Públicos, alterado pela Lei 10.931/04, evidenciando tratar-se o georreferenciamento de uma forma de retificação de registro, à qual se aplicam regras do referido art. 213 e as normas específicas do georreferenciamento, previstas na Lei 10.267/01, seu regulamento e atos normativos do INCRA.

O imóvel georreferenciado terá, nos termos do § 5º do art. 9º do Decreto 5.570/05, uma nova matrícula, encerrando-se a anterior. As retificações são averbadas na matrícula do imóvel, contudo o regulamento determina a abertura de nova matrícula, para a qual devem ser transportados todos os ônus, gravames e atos de constrição que onerem o imóvel.

No que pertine aos prazos, para as hipóteses de desmembramento, parcelamento, remembramento e transferência de propriedade, será exigido o georreferenciamento após decorridos:I - noventa dias para imóveis com cinco mil ou mais hectares;II- um ano para imóveis com mil a menos de cinco mil hectares;III- cinco anos para imóveis com quinhentos a menos de mil hectares;IV- oito anos para imóveis com menos de quinhentos hectares. Os incisos III e IV do Decreto 4.449/02 foram alterados pelo 5.570/05. O dia 20/11/2.003 foi fixado como data para início da contagem dos prazos.

Decorridos os prazos definidos pelo art. 10 do regulamento, o registrador não poderá praticar os seguintes atos registrais (em sentido amplo) sem o georreferenciamento: desmembramento, parcelamento, remembramento, transferência da propriedade (total ou parcial, embora o Decreto se refira a “transferência de área total”), e criação ou alteração da descrição do imóvel, resultante de procedimento judicial ou administrativo. Verifica-se que os atos de constituição de direitos reais não foram incluídos nas vedações, podendo o imóvel, por exemplo, ser dado em garantia hipotecária ainda que não georreferenciado.

O art. 2º do Decreto 5.570/05 determina, quanto aos imóveis ruraisobjeto de ação judicial, o imediato georreferenciamento, qualquer que seja a dimensão da área, nas ações ajuizadas a partir da publicação do decreto, e a observância dos prazos do art. 10 nas ações aforadas anteriormente.

Ponto que merece realce é a utilização da expressão “transferência de área total”, que consta do inciso II do § 2º do art. 10, no rol de atos cuja prática está vedada ao registrador após o decurso dos prazos fixados. O registrador Eduardo Agostinho Arruda Augusto, no Boletim Eletrônico do IRIB (Instituto de Registro Imobiliário do Brasil), nº 2.124, de 1º/11/05, critica o uso da expressão alegando que “o novo texto pode levar à falsa interpretação de que agora é possível a alienação de fração ideal de imóvel com prazo carencial já vencido”, prosseguindo para dizer que o uso da expressão se deu em contrapartida ao inciso I que se refere a desmembramento, ou seja área “parcial”, já que “para o INCRA e para vários doutrinadores, desmembramento de área rural somente é permitido para fins de alienação”. Como já dito, decorridos os prazos está proibido o registro de qualquer ato de transferência, total ou parcial.

Cabe ao INCRA, em todas as hipóteses de georreferenciamento, a certificação do memorial descritivo (§ 9º do art. 9º do Decreto 4.459, com redação do Decreto 5.570).

Releva mencionar o importante trabalho desenvolvido pelo IRIB na alteração do decreto regulamentador. Promoveu o Instituto, de 9 a 11 de julho de 2.004, em Araraquara, São Paulo, o 19º Encontro Regional de Oficiais de Registro de Imóveis, denominado Geo-Araraquara, ali sendo redigida a Carta de Araraquara com diversas proposições a respeito do Decreto 4.459/02, várias acolhidas pelo Decreto 5.570/05. 

Editado o novo decreto, com ampliação dos prazos e aperfeiçoamento de outras disposições, resta agora a todos os envolvidos no processo (IBGE, INCRA, Registradores, Receita Federal) o empenho necessário para a efetiva aplicação da Lei 10.267/01, que resultará indubitavelmente em aprimoramento do sistema registral brasileiro, além das demais conseqüências benéficas em outras áreas (cadastro, sistema tributário).

6) Registro Torrens

A abordagem do registro Torrens deve ser introduzida pela análise da publicidade, fim dos sistemas registrais, o que fizemos nos itens 1 e 2, pois se trata de sistema que confere efeitos absolutos à publicidade, significando o acesso ao registro uma situação jurídica inatacável.

O sistema foi idealizado pelo irlandês Robert Richard Torrens, que lhe deu o nome. É adotado na Austrália e em algumas partes dos E.U.A. (os sistemas registrais norte-americanos variam de acordo com a legislação de cada estado).

Foi introduzido no Brasil em 1.890 por influência de Rui Barbosa (Decreto 451-B, regulamentado pelo Decreto 955-A), e compreendia inicialmente imóveis urbanos e rurais. A legislação atual o regula nos arts. 277 a 288 da Lei 6.015, restringindo-o aos imóveis rurais. Os imóveis urbanos submetidos ao sistema na legislação anterior assim o permanecem.

Atualmente o registro Torrens tem pouquíssimo uso no Brasil, pelo desconhecimento, pelos custos e sistemática complexa – há notícia de uso no Rio Grande do Sul, Goiás, Mato Grosso e Pará.

Segundo Afrânio de Carvalho, o sistema caiu em desuso, “só restando agora à lei lavrar o seu atestado de óbito”.

Para a submissão de um imóvel rural ao sistema Torrens, exige-se requerimento instruído com prova do domínio do requerente; prova de atos que modifiquem ou limitem a propriedade; memorial com encargos do imóvel, nome dos ocupantes, confrontantes e quaisquer interessados; planta com memorial (georreferenciada ); publicação de edital; oitiva do Ministério Público e decisão judicial (processo expurgativo). Há, como se vê, todo um procedimento que permite conferir à publicidade presunção absoluta. Coexistem no sistema registral brasileiro a presunção relativa, que é a regra, e a presunção absoluta, decorrente do registro Torrens e referente, na legislação vigente, apenas a imóveis rurais submetidos ao sistema.

O § 1º do art. 278 da Lei 6.015 dispõe sobre as regras da planta que deverá instruir o requerimento de submissão do imóvel ao registro Torrens. Depreende-se da análise do dispositivo que havia preocupação do legislador em se obter uma precisão posicional do imóvel, indispensável para que o registro atinja a presunçãojuris et de jure. Por tratar o sistema Torrens de imóveis rurais, e por ser necessária a identificação inequívoca do imóvel, deve a planta obedecer às regras do georreferenciamento, aplicando-se os prazos do art. 2º do Decreto 5.570/05.

Segundo Maria Helena Diniz, a ação do registro Torrens tem natureza real, por objetivar a tutela de um direito real; é contenciosa, porque a propriedade alegada será apreciada por sentença definitiva com força de coisa julgada; é constitutiva, porque a sentença consolida definitivamente o domínio do imóvel rural na pessoa do requerente; a sentença que julgar procedente o pedido valeráerga omnes, como decorrência lógica da estrutura do processo do registro Torrens (procedimento edital).

Deferido o pedido, registra-se a decisão no Livro 2 – Registro Geral (pratica-se um ato de registro em sentido estrito na matrícula do imóvel). Com o registro, surge a presunção absoluta, tornando o título inatacável por qualquer ação, exceto rescisória.

Notas

*Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza é Tabelião e Registrador do 2º Ofício de Teresópolis, R.J. Palestra proferida em 17 de novembro de 2005 – EMERJ

[1] A publicidade registral, segundo Alvaro Delgado Scheelje (“La Publicidad Jurídica Registral en el Perú. Eficácia material y Princípios Registrales”, Revista Crítica de Derecho Inmobiliario, año LXXV, n° 650. Madrid, 1.991), não é apenas um princípio, senão é “objeto mismo de la función registral, la razón de ser de todo registro público y la base sobre la cual se apoyan todos y cada uno de los principios registrales”.

Miguel Maria de Serpa Lopes, em Tratado dos Registros Públicos, Vol. I, Brasília Jurídica, 1.997, afirma que “o registro imobiliário é um instituto nascido da necessidade social de publicação da transferência da propriedade”.



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