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Indisponibilidade  eletrônica  de bens e o registro de imóveis 
(artigo 185-A do CTN, acrescido pela Lei Complementar nº 118/2005) 
Fabio Martins Marsiglio *


No dia 9 de fevereiro do corrente, foram publicadas duas leis de extremo interesse nacional.

A Lei nº 11.101, de 9 de fevereiro de 2005 (D.O.U. de 9/2/2005), regula a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária. Trata-se de um grande marco no ordenamento jurídico nacional, fruto dos anseios não recentes de modificação do sistema de recuperação e/ou quebra das empresas.

Por seu turno, a Lei Complementar nº 118, também de 9 de fevereiro de 2005 (publicada no mesmo D.O.U.), provocou inúmeras alterações na Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, o Código Tributário Nacional. Seu artigo 2º acrescentou o artigo 185-A ao CTN, disciplinando a decretação de indisponibilidade, em todas as execuções fiscais, de bens do executado, na hipótese de não pagamento do débito, seguida de ausência de indicação de bens à penhora e a localização destes restar infrutífera.

O referido artigo merece uma atenta leitura dos registradores imobiliários, pois demanda imediata adequação da classe aos anseios do legislador. Vejamos sua transcrição:

“Art. 2º A Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, passa a vigorar acrescida dos seguintes arts. 185-A e 191-A:

"Art. 185-A. Na hipótese de o devedor tributário, devidamente citado, não pagar nem apresentar bens à penhora no prazo legal e não forem encontrados bens penhoráveis, o juiz determinará a indisponibilidade de seus bens e direitos, comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros de transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis e às autoridades supervisoras do mercado bancário e do mercado de capitais, a fim de que, no âmbito de suas atribuições, façam cumprir a ordem judicial”.

“§ 1º A indisponibilidade de que trata o caput deste artigo limitar-se-á ao valor total exigível, devendo o juiz determinar o imediato levantamento da indisponibilidade dos bens ou valores que excederem esse limite”.

“§ 2º Os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido”.

A leitura inicial e desavisada do novo dispositivo pode causar perplexidade, pois apresenta, como pressuposto da decretação da indisponibilidade de bens, três requisitos: não pagamento do débito; ausência de apresentação de bens à penhora; e busca infrutífera de bens penhoráveis. Poderá, então, surgir o questionamento: se não foram encontrados bens, o que será objeto da decretação de indisponibilidade?

Preliminarmente, cabe destacar que a indisponibilidade poderá atingir não só bens presentes, como bens futuros do devedor. Este o motivo pelo qual os registradores mantêm um livro próprio para o lançamento de indisponibilidades, realizando rígido controle acerca das tramitações imobiliárias de sua serventia, visando averbar a indisponibilidade assim que se realizar o registro aquisitivo.

Outro fator relevante, considerado pelo legislador, é a vastidão da atividade registral, espalhada pelas milhares de serventias instaladas pelo território nacional. Sem um mecanismo de comunicação centralizado, é praticamente impossível se afirmar, com necessária segurança jurídica, que não foram localizados bens do devedor.

Constata-se, na prática, que em processos judiciais a busca de bens limita-se à circunscrição territorial da comarca ou, quando muito, do Estado. Não atinge os demais Estados da Federação, salvo raríssimas hipóteses de intercomunicação das Corregedorias Gerais de Justiça, por intermédio dos clássicos ofícios e comunicados publicados nos órgãos oficiais, expediente que, não obstante tenha suas qualidades, possui limitações pela própria natureza.

A leitura do caput do novo artigo 185-A do CTN nos revela uma brutal mudança no panorama atual, pois clama pela criação de um mecanismo central de busca e indisponibilidade de bens, sob pena de cair por terra a nobre intenção do legislador. O artigo prevê que “(...) o juiz determinará a indisponibilidade (...)” dos bens e direitos do devedor, “(...) comunicando a decisão, preferencialmente por meio eletrônico, aos órgãos e entidades que promovem registros e transferência de bens, especialmente ao registro público de imóveis (...)”.

Seguindo o mesmo dinamismo do caput, o § 2º do novo artigo determina que: “os órgãos e entidades aos quais se fizer a comunicação de que trata o caput deste artigo enviarão imediatamente ao juízo a relação discriminada dos bens e direitos cuja indisponibilidade houverem promovido”.

Constata-se, de plano, a intenção do legislador de se valer de um mecanismo ágil, preferencialmente por meio eletrônico, para a distribuição e resposta às ordens de indisponibilidade que, nos termos da lei, serão promovidas pelos registradores. Os atuais mecanismos à disposição dificilmente suprirão os anseios do legislador, pois não são imediatos, mas morosos e complexos.

Nós, registradores, devemos nos preparar para receber uma avalanche de pedidos de buscas de bens e de decretação de indisponibilidade destes, sendo que a única maneira de administrar a nova e enorme demanda que surgirá é a centralização e distribuição eletrônica deste novo fluxo de informações. Devemos aproveitar a oportunidade para demonstrar que somos aptos a desempenhar, de maneira rápida, eficiente e segura, toda e qualquer atribuição que vier a ser delegada pela lei.

A criação de pequenas “centrais de indisponibilidades”, que é o que atualmente se constata nas serventias, pulveriza as informações e, se até aqui funcionou a contento, com certeza não suportará o novo fluxo de informações que está por vir. Estaremos preparados?

* Fabio Martins Marsiglio é Registrador de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de Piedade-SP e Diretor-Adjunto de Assuntos Agrários do Irib;.

Nota do editor.

A central de indisponibilidade localizada num portal dos registradores foi efetivamente proposta pelo Irib nos debates que tivemos ocasião de manter ao longo do ano passado com órgãos do Executivo Federal – nomeadamente o Ministério da Justiça e o Ministério das Cidades. A percepção, que já se fazia clara então, da imperiosa criação de um mecanismo de centralização de informações, tornou-se cristalina e consenso entre os interlocutores.

Na tramitação do PL. 3057 tivemos ocasião de oferecer essa proposta concreta, que acabou redundando no desenho de um micro-sistema de informações incorporado ao projeto – o que pode ser visto aqui , na apresentação do Substitutivo pelo Dep. Dr. Evilásio dispondo sobre a criação da central de indisponibilidades no Irib.

A questão que nos toca enfrentar agora, como muito bem ponderado pelo Diretor-Adjunto do Irib, é superar essa visão desintegrada, atomizada, desarticulada dos registros prediais brasileiros, ultrapassando o modelo das “centrais de indisponibilidade” locais e organizando um mecanismo ágil e seguro de manter, processar e difundir informações que virão inevitavelmente de várias instâncias judiciais para uma multidão de cartórios país afora.

A criação de um portal dos registros é uma idéia acalentada pelo Irib – agora impulsionado pelas demandas crescentes da sociedade por agilidade, certeza e segurança a custos toleráveis.

O aspecto mais importante, contudo, é que não se trata exclusivamente de dotar as decisões judiciais de maior eficácia – notadamente em âmbito executório – o que, por si só é muito importante. A lei inaugura um marco que deve ser aplaudido, mas é preciso ver que os efeitos dessa concentração da publicidade registral extrapolam a visão estática – de afetação de eventuais bens à execução – e alcança círculos muito mais amplos, sinalizando à sociedade e ao mercado as circunstâncias e vicissitudes que gravam determinado bem imóvel. É a função dinâmica da publicidade registral, concebida justamente para amplificar os efeitos limitados da publicidade processual. Com a regra, torna-se mais simples o conhecimento da situação jurídica dos imóveis, dando maior segurança e certeza às transações que tenham por objeto esses bens.

A lei instaura uma demanda que não tem um caráter local. A resposta a esse desafio não pode ser presidida tão-só por uma regulação estadual. A arquitetura de uma “central de indisponibilidade” deve ser desenvolvida como uma rede, alcançando cada Estado, cada comarca, cada registro.

O desafio está lançado. O debate está inaugurado” (Sérgio Jacomino, editor e Presidente do Irib).



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