BE1446

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Reflexões pontuais sobre o Sistema Registral Espanhol
Aline Manfrin Molinari *


Ao término de duas semanas intensas de aulas práticas e teóricas, visitas e valiosas conversas com os demais colegas participantes deste curso de especialização registral, minha impressão, não só do sistema registral espanhol, como principalmente do sistema de registro do Brasil, é a melhor possível. Explico-me.

Primeiramente, é necessário tecer breves comentários sobre a atividade registral na Espanha.

A experiência espanhola demonstrou um sistema registral seguro, no qual o registro tem por fim a declaração de direitos reais e demais encargos referentes ao imóvel (registro com efeito declarativo, salvo com relação às hipotecas, cujo efeito registrário é, por exceção a regra, constitutivo), tendo como base a qualificação jurídica dos títulos, feita com independência e responsabilidade pelo registrador.

Os limites desta qualificação, que são muito amplos, estão diretamente ligados à responsabilidade pessoal do registrador. Somente se concebe a idéia de responsabilidade pessoal do registrador se a este é dada plena autonomia de atuação. Porém, autonomia e independência fundadas na lei.

A atividade registral é uma atividade essencialmente jurídica, na qual o registrador determinará, motivadamente, se um título tem ou não ingresso no fólio real.

Qualifica-se não só o título sob o ângulo formal, mas também as cláusulas dele constantes, havendo a previsão legal de cindibilidade de um mesmo título, quando não for possível a inscrição de todas suas cláusulas, desde que não haja comprometimento do conteúdo jurídico do negócio. Ou seja, somente com relação a cláusulas não essenciais.

Este exame fica a cargo do registrador, que será responsabilizado pelos eventuais prejuízos causados pela desqualificação parcial ou total do título (artigo 322 da lei Hipotecária espanhola).

Interessante a definição de qualificação feita por Manuel Peña Bernaldo de Quirós, em Derechos Reales. Derecho Hipotecario , 4ª edición, tomo II, pag. 520:

“Calificar es decidir si el hecho, del cual solicita el asiento, llega al Registro con los requisitos exigidos para que sea registrable; es decir, es determinar si, conforme a la ley, procede o no practicar respecto de ese hecho el asiento solicitado”.

O mesmo autor, à página 484 da citada obra, ao classificar a natureza jurídica da atuação do registrador, definiu-a como sendo uma função “quase jurisdicional”, nos seguintes termos:

“Se trata de una función cuasijurisdiccional: tiene como finalidad primordial proclamar oficialmente situaciones juridicas. Responde, pues, a la idea etimológica del vocablo (“juris dictio”). Estas declaraciones tienen prima facie , según veremos, cierta eficacia análoga a las sentencias y, como ellas, son, en principio, inconmovibles (cfr art. 1ª - III LH).”

Ou seja, a atuação do registrador imobiliário é valorizada e fortalecida, trazendo-se ao âmbito registrário questões jurídicas de alta indagação, como, por exemplo, proteção ao consumidor, restrições urbanísticas e ambientais, os direitos de personalidade frente à publicidade do registro, dentre outros. Questões estas que somente podem ser valoradas por um profissional do direito, dotado de responsabilidade e independência em sua atuação qualificativa.

É nesse ambiente que reflito sobre a grande transformação que o registro imobiliário do Brasil vem vivenciando atualmente, tanto com as inovações legais, que seguramente fortalecem a atuação do registrador, como também com relação aos temas hoje discutidos na atividade, tais como os limites da qualificação registral, a função social do registro, regularização urbana, dentre outros.

Nossa realidade, felizmente, é bem diferente de muitos países latinos, vez que nossa atividade encontra-se amparada em comando constitucional e a condição de profissional do direito reconhecida em Lei Federal.

Hoje também se pode falar em um sistema registral, no Brasil, que proporciona a segurança jurídica necessária para o desenvolvimento sócio-econômico do país.

Estamos no caminho certo!

*Aline Manfrin Molinari é Registradora Imobiliária em Viradouro – SP



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