BE1054

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Parcelamento do solo - Audiências públicas embasam reformulação de antiga Lei
 
Os parlamentares da CDUI ouvem, em quatro Audiências Públicas,...
 
...os mais diferentes interessados na revisão da Lei 6.766, de 1979
 
A proliferação de loteamentos clandestinos, o parcelamento do solo, as dificuldades para regularização dos lotes, a crescente privatização das cidades com a implantação de condomínios fechados, separando pobres e ricos e ferindo o direito de ir e vir, contratos e registros de imóveis 
 
foram os temas discutidos nas quatro Audiências Públicas promovidas em outubro e novembro de 2003 pela Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior. 
 
A iniciativa foi da deputada Terezinha Fernandes (PT-MA) e do deputado Dr. Evilásio (PSB-SP), relator do Projeto de Lei 3.057/00, de autoria do deputado Bispo Wanderval (PL-SP), que altera a Lei 6.766/79, sobre o parcelamento do solo urbano. 
 
O parcelamento do solo e sua regularização é um dos maiores desafios urbanos a ser vencido, para evitar a acelerada deterioração da vida nas cidades e o deslocamento da população de baixa renda para as periferias distantes, sem qualquer infra-estrutura. 
 
A deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), presidente da CDUI, disse ao abrir o Ciclo de Debates, que a aprovação da matéria é uma prioridade, “devendo ter grande importância para acabar com o caos no setor”. Ela elogiou a disposição do Dr. Evilásio em debater com representantes de movimentos populares, notários e registradores, empreendedores e sindicatos 
 
de compra e venda de imóveis e loteadores, prefeituras, vereadores, ONGs, juristas, bem como do Ministério Público e das Cidades, urbanistas e acadêmicos. 
 
Dr. Evilásio garantiu, ao final da última Audiência, que está analisando as sugestões apresentadas, para que seu Substitutivo represente os anseios dos vários segmentos da sociedade, contribuindo para criar uma espécie de Lei de Responsabilidade Territorial nos moldes da Lei de Responsabilidade Fiscal. 
 
Ele reconhece a necessidade da atualização urgente da lei que regula o parcelamento do solo urbano, após seus 24 anos de vigência, período em que a realidade urbana mudou muito. Para o relator, é preciso definir regras que obriguem o ajuste dos loteamentos à demanda, definindo áreas públicas para equipamentos comunitários. 
 
O deputado critica também a segregação dos condomínios fechados, que contaminam o meio ambiente, oneram a administração municipal e estimulam a especulação imobiliária, sem garantir a segurança que seus moradores buscam: “A nova lei deve obrigar o pagamento de compensações tributárias, a entrega de espaço no entorno com a construção de obras sociais em favor da vizinhança e livre acesso aos bens públicos.” 
 
4ª Audiência Pública 
 
“Desburocratizar sem facilitar a fraude”
 
A deputada Maria do Carmo Lara preside Audiência sobre o parcelamento do solo
 
A necessidade de legislar também sobre a regularização dos loteamentos, unificar os procedimentos dos cartórios e as exigências de documentação, compatibilizar as bases cartoriais com as cadastrais, reconhecer a “fé pública” das Prefeituras, desburocratizar os processos, mas estimular as escrituras públicas, foram algumas das teses defendidas na quarta e última Audiência Pública promovida pela CDUI sobre os problemas do solo urbano. 
 
O Ciclo de Debates para discutir o Substitutivo do deputado Dr. Evilásio (PSB-SP), relator do Projeto de Lei 3.057/00, de autoria do deputado Bispo Wanderval (PL-SP), que altera a Lei 6.766/79, sobre o parcelamento do solo urbano, foi encerrado dia 25 de novembro, abordando o tema ‘Contratos e Registros’. 
 
Carlos Eduardo de Matos Barroso, da Associação de Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), advertiu que é preciso tomar cuidado com as medidas de simplificação e de documentação do  registro e regularização de lotes. 
 
“É preciso desburocratizar mas sem facilitar a fraude, é importante valorizar o instrumento público e  importância da escritura”, ele advertiu. 
 
Matos Barroso elogiou o projeto em discussão por valorizar as soluções de pendências entre loteadores e compradores, destacando que a necessidade de regularização é vital, “mas sem esquecer que a lei vem antes de tudo”. 
 
Responsabilidade dos empreendedores 
 
Após encaminhar uma série de sugestões à Comissão, Guilherme Fernandes Neto, da Promotoria de Justiça de Defesa do Consumidor do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, cobrou do Substitutivo em elaboração a responsabilidade dos empreendedores em relação à conclusão dos projetos, lembrando que o consumidor enfrenta graves problemas devido à falta de complementação da infra-estrutura. Concordou com o estímulo às escrituras públicas e pediu exigência sobre a idoneidade dos loteadores, inclusive quanto a crimes contra os consumidores e a economia popular. 
 
Ele sugeriu ainda a criação de uma conta específica para o empreendedor, como já acontece com os consórcios, para facilitar a identificação e a fiscalização. Disse que é imprescindível insistir na responsabilidade dos cartórios que fazem registros de imóveis já construídos e hipotecados, com a aplicação de sanções administrativas se for o caso. Registrou que o problema aconteceu com vários prédios da Construtora Encol, que depois acabou falindo. 
 
Caio Portugal, do Sindicato das Empresas de Compra, Venda, Locação e Administração de Imóveis de São Paulo, criticou a excessiva burocratização e o prazo em torno de um ano de negociações para licenciar projetos de implantação de loteamentos, “gerando gastos excessivos e perda de tempo, sendo preciso racionalizar e acelerar o processo”. Sugeriu ainda que já no momento da venda se providencie o registro do lote, garantindo também sua infra-estrutura. Quer o aperfeiçoamento do registro da cessão de direitos e concorda que os loteamentos fechados ou de acesso limitado sejam apenas temporários. 
 
4ª Audiência Pública 
 
Ministério das Cidades quer parcerias 
 
Na continuação da Audiência Pública que encerrou o Ciclo de Debates da CDUI sobre o solo urbano, Edésio Fernandes, do Ministério das Cidades, afirmou que não se deve aprovar lei federal apenas para o parcelamento, mas também para sua regularização e fazendo distinção entre os critérios de registro para um e outro. Lamentou que poucos municípios têm condições de registrar os lotes decorrentes de programas para loteamentos irregulares. 
 
Fernandes enumerou ainda uma série de problemas, como o custo do registro e as dificuldades para se chegar a esse estágio, criticando os procedimentos adotados pelos cartórios, “sendo que cada estado trata o assunto de uma maneira e, dentro do mesmo município, cada cartório segue critérios diversos e exige documentos diferentes, além de haver um verdadeiro abismo entre as bases cartoriais e cadastrais”. 
 
Critério único 
 
Edésio Fernandes considera imprescindível uma parceria entre cartórios, Prefeituras, Ministério Público e associações de moradores, “justamente o que o Ministério das Cidades está conseguindo estabelecer agora com a Anoreg, que já prometeu também, aqui mesmo na CDUI, o primeiro registro da regularização sem qualquer custo”. Ao defender a unificação dos critérios de registro em todo o Brasil, sugeriu a criação de um Conselho Nacional Normativo dos Cartórios. 
 
Para ele, não se pode tratar as Prefeituras Municipais como se fossem empreendedores privados, “pois atualmente os cartórios as vêem quase como grileiras, embora elas devam ter ‘fé pública’ e não se deve exigir reconhecimento dos documentos que emitem”. Pediu ao final que se refletisse sobre a caducidade de registro dos loteamentos aprovados há 20, 30 ou 40 anos e nunca implementados nem vendidos. 
 
Sobre a questão das parcerias, Ângela Regina Lima, coordenadora de Regularização Fundiária da Prefeitura do Rio de Janeiro, comentou que os cartórios cariocas resistiam muito a colaborar, mas oito anos depois da criação da Secretaria de Habitação, “já temos oficiais como parceiros no registro da regularização, o que tem sido fundamental”. 
 
Ângela Regina reforçou o pedido para que o projeto defina bem a questão dos parcelamentos e a documentação necessária para o registro e legalização, lamentando que a licença urbanística expedida pela entidade parceladora não esteja bem definida em seu texto.
 
Edésio Fernandes, do Ministério das Cidades (à dir.): diversidade de regras
 
Definição dos documentos 
 
Helvécio Castello, do Instituto de Registros Imobiliários do Brasil, defendeu durante os debates que para os loteamentos consolidados há mais de 20 anos, não deva ser exigido nada para o registro, “exceto para áreas de risco, mananciais etc.” 
 
Ele pediu a criação do usucapião administrativo, mas o promotor Guilherme Fernandes Neto argumentou que a medida pode contribuir para gerar processos simulados. 
 
O deputado-relator Dr. Evilásio repetiu, ao final da Audiência, que continuará aberto ao diálogo e recebendo sugestões. “Não se trata de uma peça terminativa, deve passar por várias mãos e depois ainda vai ao Senado; portanto, não temos pressa e preferimos fazer o melhor e mais consensual possível”. 
 
3ª Audiência Pública 
 
Todos pedem a simplificação
 
Debatedores defendem redução do usucapião e isenção de algumas taxas
 
Desburocratização com a simplificação das exigências de contrato e para o registro do lote – que inicialmente seria gratuito, isenção de algumas taxas, diminuição do usucapião extraordinário de 20 para 10 anos e participação da comunidade foram medidas defendidas na Audiência Pública sobre ‘Regularização Fundiária de Assentamentos Informais’, no dia 11 de novembro. 
 
Foi a terceira reunião da série de debates sobre o Substitutivo do deputado Dr. Evilásio (PSB-SP), relator do Projeto de Lei 3.057/00, de autoria do deputado Bispo Wanderval (PL-SP), que altera a Lei 6.766/79, sobre o parcelamento do solo urbano. 
 
O representante do Ministério das Cidades, Edésio Fernandes, garantiu que o projeto e a questão da regulamentação dos loteamentos são prioridades do governo, “o problema não pode mais ser contornado e sim enfrentado, o momento de revisão na legislação é este”. O objetivo não é apenas evitar problemas daqui para a frente, “mas enfrentar todo o passivo sócioambiental de décadas na área”. Citou a necessidade urgente de se criar em condições jurídicas para alavancar os programas de regularização, implantar Lei de Parcelamento do Solo e estudar as restrições urbanísticas, ambientais, burocráticas e tributárias. 
 
Relator quer lei de responsabilidade
 
Fernandes: prioridades do governo
 
A representante do Centro de Estudos, Articulação e Referência sobre Assentamentos Humanos (Cearah – Periferia), Olinda Marques, lamentou que só agora a regularização entrou na pauta dos movimentos populares, apesar de Fortaleza ter 620 assentamentos irregulares, sendo 79 em áreas de risco. Foi criado o Fórum Permanente de Regulamentação Fundiária para debater os  problemas, buscar sugestões e gestão participativa, “mas enfrentamos a falta de vontade política, a burocracia administrativa e a pequena participação do Ministério Público na região”. 
 
Vicente Amadei, do Sindicato das Empresas de Compra e Venda de Imóveis (Secovi), elogiou a iniciativa da CDUI, presidida pela deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), pedindo que o Projeto contemple a todos e busque um consenso. 
 
Ponderou que se as famílias de baixa renda tiverem financiamento, “é claro que vão adquirir os lotes regulares acessíveis e não os clandestinos”. Para ele, a exigência de infra-estrutura completa encarece o loteamento, que fica inacessível para os pobres. 
 
Ary José de Lima, da Associação de Notários e Registradores do Brasil (Anoreg), concordou que a desburocratização é imprescindível, desde que não se abra mão da segurança jurídica. Aceitou a gratuidade do primeiro registro, “para os lotes saírem da informalidade, mas coma União, estados e municípios abrindo mão também de algumas taxas”. 
 
A discussão final envolveu os convidados e representantes das Prefeituras de Vitória e Belo Horizonte, IPEA e das Associações de Moradores de Goiânia. Foram sugeridas a criação de banco de lotes, feitura simultânea do registro e da checagem dos assentamentos, usucapião coletivo, punir severamente os loteadores irregulares, coibir condomínios fechados etc. 
 
O relator se comprometeu a analisar com cuidado todas as propostas, “porque o objetivo é que a tessitura do Substitutivo seja feita com critério, responsabilidade e a ajuda de muitas mãos, descentralizando a discussão ao máximo e criando uma espécie de Lei de Responsabilidade Territorial nos moldes da Lei de Responsabilidade Fiscal”. 
 
3ª Audiência Pública 
 
Desmembramento é uma das saídas 
 
Evangelina Pinho, da Prefeitura de São Paulo, defendeu que a regulamentação técnica independa da total regularidade do título e do apossamento das áreas, “mas não o apossamento administrativo, que geraria processos de indenização”. 
 
Criticou as exigências contratuais exageradas,que dificultam a futura regularização, sugerindo sua simplificação e que os recibos sejam admitidos como forma de quitação. Ela disse que uma saída para os loteamentos é o desmembramento, sem burlar, entretanto, a necessidade de áreas públicas. Evangelina considera importante a reserva de faixas onde não se pode edificar, principalmente ao longo dos cursos d’água. 
 
Rosângela Staureghi, do Ministério Público de São Paulo, disse que o importante é saber a cidade que queremos. “Não pode ser algo que castigue os pobres e privilegie os ricos, como nos burgos murados da Idade Média, que deixava os miseráveis de fora junto com o esgoto e a peste”. 
 
Rosângela reconheceu que a recuperação ambiental dos loteamentos causa problemas, mas que é preciso “regulamentar com certa sustentabilidade”. Mostrou a importância da participação comunitária na regularização fundiária, como tem mostrado sua experiência de 11 anos em São Bernardo do Campo. Após muito diálogo, a população de áreas de proteçãoplantou grama e árvores, comprometendo-se a não expandir os loteamentos e ajudando a fiscalizar. 
 
2ª Audiência Pública 
 
Privatização das cidades em xeque
 
Criticas aos condomínios fechados
 
A ‘Regularização de Condomínios Urbanísticos e Horizontais’ foi o tema da segunda Audiência Pública promovida pela CDUI, dia 4 de novembro, na série de debates sobre o Substitutivo do deputado Dr. Evilásio (PSB-SP), relator do Projeto de Lei 3.057/00 , de autoria do deputado Bispo Wanderval (PL-SP), que altera a Lei 6.766/79 , sobre o parcelamento do solo urbano. 
 
As maiores críticas foram dirigidas aos condomínios fechados, também chamados de ‘blindados’. 
 
De acordo com a maioria dos participantes, eles segregam pobres e ricos, ferem o direito de ir e vir ao privatizar o espaço urbano, não preservam e contaminam o meio ambiente, isolam áreas públicas, oneram a administração municipal e estimulam a especulação imobiliária, “sem dar a tão sonhada segurança que seus moradores buscam”. 
 
DF tem 529 loteamentos irregulares 
 
O representante da União no Conselho da Terracap, José Roberto Bassul, denunciou que o Distrito Federal já tem 529 loteamentos clandestinos, em terras públicas ou de proteção ambiental. Sugeriu que a extensão territorial contínua máxima de um condomínio não supere três hectares, enquanto a distância mínima entre condomínios vizinhos seja de cinco hectares, “para evitar sua sucessão infindável que conspurca a concepção das cidades”. 
 
Ele quer que os empreendedores instalem sistemas de drenagem e iluminação pública, fazendo a manutenção das áreas comuns, ruas e equipamentos comunitários, até a edificação de 50% das unidades autônomas. Sugeriu que a legislação estabeleça que, nos casos de parcelamento ilegal ou irregular do solo, a justa indenização implique a avaliação da gleba como rural e o ressarcimento das perdas do Poder Público. “Não é justo perdoar ou premiar quem comete crime”.  
 
Para o professor da UFRJ, Marcelo Lopes de Souza, “o loteamento fechado fere totalmente a legislação e não deve ter anistia, é inaceitável a tese de “o que passou, passou”. 
 
Lembrou que os condomínios horizontais proliferam ao arrepio da legislação ambiental e do planejamento urbano. Comentou que os loteamentos fechados e condomínios horizontais são uma solução individual, parcial e ineficiente para o desafio da violência urbana. 
 
2ª Audiência Pública 
 
Condenada volta da “cidade medieval” 
 
A Secretária Executiva do Ministério das Cidades, Ermínia Maricato, destacou a importância do debate promovido pela Comissão, reconhecendo que o tema é complexo: “Assim, é preciso desejar muita felicidade e bons fluidos ao Dr. Evilásio no seu relatório. Nós queremos colaborar e apresentar sugestões”. Para ela, o Brasil tem capacidade regulatória do discurso,mas é incapaz de controlar o solo. “Não devemos chegar com normas muito rígidas, mas encurtar a distância entre lei e prática”. 
 
Ermínia comentou que tranqüilidade e segurança todos querem, mas não fechando as comunidades. “A água e a energia vêm de fora, o esgoto vai para fora, então não é o caso de que tudo se resolve ali”. A secretária disse que não se pode fechar o que é público e está consolidado: Os loteamentos fechados têm que passar por lei municipal, que dirá se eles são possíveis, onde e qual o tamanho. Não podemos admitir uma cidade como a soma de loteamentos murados. E a eleição de Lula é a oportunidade de recuperar o espaço público urbano perdido”. 
 
O debate foi movimentado e envolveu representantes dos condomínios, IPEA, Prefeitura de Palmas, Instituto Horizonte e outras entidades. 
 
O relator reconheceu que a nova lei é um grande desafio, “mas com as discussões e sugestões, que podem ser enviadas também para nosso sítio ([email protected]), vamos procurar errar o mínimo possível, sem esquecer que a cidade é obra dos homens, não de Deus”. 
 
Ele disse que é preciso mudar a tendência de se voltar à Idade Média, com seu conceito de uma cidade dentro de outra, “onde as pessoas se enclausuram atrás de altos muros, como se fossem proprietárias do município”. 
 
Proposta CPI para investigar fechamento de praias
 
Freitas: “Constituição está sendo violada”.
 
O representante do Ministério Público de São Paulo, José Carlos Freitas, na Audiência Pública que discute a Lei 6.766/79 (Parcelamento do Solo Urbano) condenou os loteamentos que ocupam área urbana desproporcionalmente grande em relação à área do município, que fica sem condições de assumir seus serviços públicos. 
 
“Isto propicia a criação de verdadeiros guetos, enquanto os lotes não vendidos ficam isentos de IPTU e os retomados também”, argumentou o procurador. 
 
Freitas apontou a existência de loteamentos em Guarujá, na Baixada Santista, e outras cidades/balneários, “que estão privatizando as praias e já merecem a criação de CPI para investigar esta flagrante violação da Constituição”. 
 
O representante do Ministério Público Paulista citou casos de pessoas que moravam em ruas abertas, que foram fechadas posteriormente, obrigando-as a pagar taxa de condomínio. “Trata-se de uma ilegalidade, porque a associação ou não é um direito, é livre”. Ele sugeriu que os condomínios sejam obrigados a pagar compensação tributária, entregar o espaço em seu entorno, construir obras sociais em favor da vizinhança, proteger o meio ambiente e dar acesso aos bens públicos.
 
Fernanda Costa: defesa do direito de ir e vir.
 
Fernanda Carolina Costa, do Instituto Pólis, propôs a revisão da Lei dos Condomínios (4.591/64) e a capacitação dos municípios para regularem áreas rurais, em que a Lei 6.766/79 não pode ser aplicada. 
 
Ela defendeu a busca de soluções nos condomínios já criados, “porque não se pode violar o direito de ir e vir e de circulação”. 
 
Loteadores têm participação discreta
 
Luiz Eduardo Camargo
 
O representante da Associação das Empresas de Loteamento, Luiz Eduardo Camargo, teve participação discreta nos debates, sugerindo que o PL 3.057/00 deve prever formas de controle de acesso, o papel das associações de moradores e os critérios de continuidade dos loteamentos, “principalmente os populares”. 
 
Concordou com a fixação de parâmetros urbanísticos para não degradar as cidades e que os serviços públicos sejam instalados pelos emprendedores e mantidos pelo condomínio. Advertiu, porém, que isto é muito difícil nos loteamentos para população de baixa renda. 
 
1ª Audiência Pública 
 
Urgência ao parcelamento do solo 
 
A Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior promoveu Audiência Pública dia 16 de outubro para debater o Substitutivo do deputado Dr. Evilásio (PSB-SP), relator do Projeto de Lei 3.057/2000, de autoria do deputado Bispo Wanderval (PL-SP), que altera a Lei 6.766/1979, sobre o parcelamento solo urbano. 
 
A presidente da CDUI, deputada Maria do Carmo Lara (PT-MG), disse, ao abrir os debates sobre ‘Critérios e Diretrizes dos Novos Parcelamentos do Solo’, que o objetivo é conseguir aprovar com urgência a matéria, “da maior importância para acabar com o caos no setor”. A Audiência foi sugerida pelos deputados Terezinha Fernandes (PT-MA) e Dr. Evilásio e complementada por outras três. 
 
Para a secretária de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, Raquel Rolnik, o tema passa pelas leis ambientais, Estatuto da Cidade e pelos parâmetros dos novos parcelamentos não devem se restringir ao solo urbano. Outras preocupações são a legalização de parcelamentos irregulares e dos condomínios. 
 
Ela acha importante apresentar formas concretas para dizer “não” a alguns loteamentos, que precisam se ajustar à demanda aos Planos Diretores e ter áreas públicas para equipamentos comunitários. Rolnik quer acabar com a idéia de cidades partidas: “Não é possível adotar um parcelamento para os ricos e outro mais barato para o resto, sou radicalmente contra”. 
 
O Coordenador do Fórum Nacional de Reforma Urbana, Nelson Saule Júnior, criticou o Substitutivo por não vincular o parcelamento com o Plano Diretor, não estabelecer os padrões máximos de parcelamento e nem deixar clara a competência para legislar sobre o assunto, “que, pela  Constituição é do município”. 
 
Saule Júnior sugeriu que a implantação dos condomínios deve ter o módulo máximo de dois hectares e que o empreendedor seja responsável pela infra-estrutura. Quer a supressão no Substitutivo do usucapião urbano, “que entra em choque com a Constituição e o Estatuto da Cidade”. 
 
Regulação forçada 
 
A jurista e urbanista da Prefeitura de Porto Alegre, Betânia Alfonsin, contestou em parte a secretária de Programas Urbanos sobre alguns conceitos em relação à diferenciação de tratamento para a classe média e as camadas mais populares, e apresentou o programa ‘Urbanizador Social’. Para ela, o poder público deve buscar o empreendedor clandestino e tentar fazer parceria com ele, forçando uma regularização controlada pelo município e incentivandoa produção de lotes regulares para a população de baixa renda. 
 
O ‘Urbanizador Social’ prevê a assinatura de um termo de compromisso pelo poder público e os empreendedores: produção de lotes ou unidades habitacionais a preços compatíveis, urbanização progressiva, apresentação de planilha de custos, doação de percentual de lotes ao município ou desconto no preço final e reserva de terrenos para finalidades públicas. Betânia defende a revisão do processo de gestão, dizendo que estas experiências foram aplicadas com sucesso pelo governo petista na capital gaúcha. 
 
Lotes vazios 
 
Ricardo Moretti, professor da PUC-Campinas, defendeu o parcelamento associado à edificação e os condomínios urbanísticos de pequeno porte, como a casa de frente-fundos, “que representam 36% das moradias da cidade de São Paulo e poderiam ser regularizadas”. Para incentivar a construção e não deixar o loteamento vazio e se deteriorando, a responsabilidade pela manutenção deve ficar a cargo dos empreendedores, “pelo menos até que 50% dos lotes sejam edificados”. Sugeriu também a revisão das exigências de infra-estrutura e equipamentos em parceria com o poder público e concessionários. 
 
Nídia Inês Albesa de Rabi, do Instituto Brasileiro de Administração Municipal, alertou para “o incrível número de lotes vagos existentes desde Manaus ao Sul do País”. Comentou a proliferação de loteamentos irregulares e recomendou o não engessamento dos processos municipais,  considerando que parcelamento é uma atividade econômica importante e uma prática fundamental na função social da cidade”. 
 
Sistemas paralelos 
 
O deputado Ary Vanazzi (PT-RS) destacou a importância da parceria entre poder público e iniciativa privada, do financiamento federal, da gestão pública e de se produzirem lotes urbanizados, “já que a cidade legal está ficando desabitada”. 
 
Raquel Rolnik insistiu que não se podem construir dois sistemas paralelos, “dizer que o lote mínimo é de 300 metros quadrados, mas para o pobre é só 100, o problema é que sobram lotes e falta acesso a eles”. 
 
A Audiência foi acompanhada por representantes de movimentos populares, prefeituras, ONGs e vereadores. Alguns apresentaram críticas e sugestões, como AntônioVeríssimo, do Núcleo de  Regularização de Loteamentos da Prefeitura do Rio, Patrícia Gazzola, da Prefeitura do Espírito Santo e Sandra Mello, do Ministério do Meio Ambiente. 
 
Ao final, o deputado-relator, Dr. Evilásio (PSB-SP), disse que seu Substitutivo é um pré-projeto e que vai ouvir outros segmentos nas Audiências, aproveitando muitas das sugestões que foram e serão feitas. 
 
Por que mudar a Lei 6.766? 
 
Dr. Evilásio Farias  *
 
“O parcelamento do solo urbano é um problema que não podemos mais contornar com atitudes paliativas, mas enfrentá-lo de frente, fazendo uma profunda revisão”.
 
A resposta é lógica e simples: transcorridos 24 anos da Lei que regula o parcelamento do solo urbano, as relações entre o que consideramos urbano e rural são muito diferentes. Isto nos faz chegar à conclusão de que a Lei – que já passou por modificações – encontra-se mais uma vez desatualizada. 
 
Não há como tratar da questão do parcelamento sem considerar os processos decorrentes do crescimento das cidades. Isto ocorreu de forma muito dinâmica, no século passado, marcando sobremaneira todas as cidades brasileiras. Na década de 30, apenas 20% da população brasileira viviam na área urbana. No início dos anos 50, já eram 36% e, três décadas depois, a população urbana chegava a 70%. 
 
Foi num cenário complexo, em que as cidades tinham suas periferias ocupadas por loteamentos clandestinos ou irregulares, que surgiu a lei, trazendo uma série de considerações importantes quanto à necessidade de ordenar a ocupação territorial. Hoje, ela está defasada, exigindo novas abordagens, que passam por regras ambientais e sua própria adaptação ao Estatuto da Cidade. 
 
É preciso definir regras que obriguem o ajuste de loteamentos à demanda, definindo áreas públicas para equipamentos comunitários, eliminando as “cidades partidas” e, em conseqüência, com a injustiça social que isso representa. É urgente abordar a situação dos condomínios fechados, que segregam pobres e ricos, ferindo o direito de ir e vir ao privatizar o espaço público. 
 
Muitos condomínios são responsáveis pela contaminação do meio ambiente, oneram a administração municipal, estimulam a especulação imobiliária e, apesar de serem fechados, não garantem a segurança de seus moradores. Trata-se de uma solução individual, parcial e ineficiente. Eles consomem energia elétrica e água produzidas fora, devolvendo esgoto não canalizado. É uma volta à Idade Média, com conceitos de uma cidade dentro de outra, com pessoas enclausuradas por altos muros. 
 
A nova lei deve obrigar o pagamento de compensações tributárias, a entrega do espaço no entorno, a construção de obras sociais em favor da vizinhança, a proteção do meio ambiente e o livre acesso aos bens públicos. 
 
Definitivamente esse é um problema que não podemos mais contornar com atitudes paliativas. Devemos enfrentá-lo e estamos no momento da revisão. E isso não significa apenas evitar problemas daqui em diante, mas ter a coragem de olhar de frente todo o passivo sócio-ambiental. Precisamos urgentemente criar as condições jurídicas para alavancar os programas de regularização, implantar a Lei e estudar as restrições urbanísticas, ambientais, burocráticas e tributárias. 
 
O Substitutivo ao PL 3.057/00, que está sob a nossa responsabilidade, ainda é um pré-projeto. Estamos ouvindo vários segmentos da sociedade, por meio de Audiências Públicas, com total abertura para acatar sugestões, com critério, responsabilidade e ajuda de muitos de nossos pares. Objetivamos descentralizar a discussão ao máximo e criar uma espécie de “Lei de Responsabilidade Territorial” nos moldes da Lei de Responsabilidade Fiscal. 
 
Nesse momento, lembro um preceito que diz: “Deus não muda o destino de um povo até que o povo mude o que tem na alma”. Portanto, cada um de nós, poder público, legisladores, empresários, entidades representativas de classe, profissionais liberais e a sociedade em geral, somos igualmente responsáveis pela transformação da alma dos nossos campos, praias, ruas, bairros, cidades, enfim, de nosso país. 
 
(Cidade Cidadã – Informativo da Comissão de Desenvolvimento Urbano e Interior; Câmara dos Deputados, 19/1/200404; ano VI,  edição especial).
 


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