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Ainda sobre o compromisso de compra e venda e a alienação fiduciária - José de Mello Junqueira[i]*


Quando de meu parecer, adotado pela ARISP, omiti duas questões que, agora, considero-as essenciais ao deslinde de todas essas apreciações, todas ponderadas e respeitadas, ainda que com algumas não concorde. Cumpre, principalmente, rever minha afirmativa ao assegurar à Securitizadora, adquirente dos créditos e direitos dominiais sobre o imóvel compromissado à compra, os direitos decorrentes dos artigos 26 e 27 da Lei 9514, de 1997, embora reafirme possível a alienação fiduciária do imóvel e seus direitos por parte do compromitente vendedor, despicienda qualquer discussão sobre a posse, como bem apreciou os Doutores Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner, Michael Altit e Eduardo Messias Altemani. 

1) Inexiste óbice legal ou jurídico de o promitente vendedor alienar o domínio sobre o imóvel e conseqüentes direitos da promessa de venda. Detém ele a propriedade do bem, ainda que restrita, porquanto, ao final do recebimento de seu crédito, está obrigado, ou por terceiro a quem transferiu seus direitos, a outorgar a escritura definitiva de venda ao compromissário comprador. 

A transmissão do imóvel prometido vender é legalmente admitida. Basta verificar o disposto no artigo 1418 do atual Código Civil. 

O tema foi exaustivamente apreciado nesta Audiência Pública (III) e todos estão concordes na possibilidade de o promitente vendedor transmitir o domínio do imóvel prometido e seus direitos de crédito e obrigações, dentre eles o de transmitir a propriedade, definitivamente, ao compromissário comprador, satisfeitas todas as prestações. 

Considerando a possibilidade dessa transmissão, não vejo óbice se concretize como garantia, por meio da alienação fiduciária, constituindo-se a propriedade fiduciária em favor de uma instituição financeira ou securitizadora. Na hipótese o fiduciário receberia a propriedade fiduciária do domínio, ainda que restrito e os créditos titulados em favor do promitente vendedor. 

Constituída a propriedade fiduciária o promitente vendedor-fiduciante continua com a posse indireta relativamente ao compromissário comprador, transmitindo-a idêntica ao fiduciário. 

É o que ocorre nas hipóteses de alienação fiduciária e constituição da propriedade fiduciária de imóveis locados ou sobre eles instituído usufruto. 

Na alienação fiduciária de bem locado, o proprietário-locador tem, tão só, a posse indireta do imóvel, mantendo a posse direta o locatário, que não poderá se valer do direito de preferência, por não se caracterizar a alienação fiduciária uma venda. O locador fiduciante, no caso, transmite ao fiduciário a posse que detém, a posse indireta, permanecendo a posse direta em mãos do locatário. 

É expressa a lei na admissão da constituição da propriedade fiduciária de imóvel locado (art. 27, § 7o e art. 37-B). 

Mesma situação se observa no caso de usufruto, como salientam os advogados Carlos Eduardo, Altit e Altemani. 

O artigo 23, parágrafo único, da Lei 9514/97 não impõe requisitos para a constituição da alienação fiduciária, obrigando, sempre, a posse direta do fiduciante e indireta do fiduciário. 

A posse originária direta do fiduciante é necessária, do contrário não a teria transmitido ao locatário, usufrutuário e, agora, ao compromissário comprador. Na relação entre essas pessoas contratantes sempre haverá uma posse direta de quem a transmite, reservando-se a indireta. 

Se a companhia securitizadora adquirir o crédito e domínio do imóvel compromissado à venda, na qualidade de propriedade fiduciária, duas situações poderão ocorrer: 

a) o pagamento integral de todas as prestações pelo compromissário comprador, hipótese que se resolve a propriedade fiduciária do imóvel e, diante do termo de quitação fornecido pelo fiduciário, efetuar-se-á o cancelamento respectivo no Registro de Imóveis; a propriedade volta ao promitente vendedor original que terá a obrigação de outorgar a escritura definitiva ao compromissário comprador, com o pagamento do imposto inter vivos. Para maior segurança do compromissário comprador, pode, no ato da constituição da propriedade fiduciária, o promitente vendedor (fiduciante) outorgar ao fiduciário, mandato com a finalidade deste transmitir definitivamente a propriedade ao compromissário comprador, paga a dívida. 

b) não pagamento e vencimento, no todo ou em parte, da dívida devida pelo compromissário comprador; na hipótese, constituído o fiduciante-promitente vendedor em mora, consolidar-se-á a propriedade restrita do imóvel em nome do fiduciário, com as mesmas características que a recebeu. O fiduciário, agora, na qualidade de compromitente vendedor, estará legitimado a promover a cobrança e resolução do contrato. 

Nesta última hipótese, se houve emissão de CRI ou CCI, o fiduciário, como lembra Melhim, terá condições de recuperar os direitos sobre o imóvel prometido vender, mantendo, por essa forma, o lastro e podendo, sem objeção, recolocar o imóvel no mercado para recompor o fluxo de pagamento dos subscritores de títulos. Por esse modo, confere-se à securitizadora poder de disposição sobre o imóvel e autonomia para promover as medidas necessárias à recomposição do fluxo de pagamento dos títulos. 

Ressalte-se a impossibilidade de, no inadimplemento da obrigação pelo compromissário comprador, utilizar-se o fiduciário dos meios e procedimentos da execução extrajudicial prevista na Lei nº 9514/97. Isto, por óbvio, porque não participou o compromissário comprador do contrato de alienação fiduciária. 

Cyberhemeroteca 

Confira ainda sobre o tema: 

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[i]* José de Mello Junqueira é Desembargador aposentado do Tribunal de Justiça de São Paulo e consultor do Irib.  



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