BE885
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Delegação - investidura originária e sucessão - Temas de interesse dos notários e registradores
Publicamos abaixo a importante decisão prolatada pelo Senhor Corregedor-Geral da Justiça de São Paulo, aprovando parecer do ilustre magistrado Cláudio Bueno de Godoy.
O tema rende importantes discussões em nosso meio, razão pela qual publicamos, além da R. decisão da CGJSP, a resposta da representação que teve curso pela Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo.
Logo abaixo, reunimos uma pequena amostra das decisões e parecer sobre o mesmo tema (SJ).
Excelentíssimo Senhor Doutor Juiz de Direito da 1ª Vara de Registros Públicos de São Paulo
Processo:Pedido de Providências nº 000.03.031974-9
Requerente:Conselho Regional de Química da IV Região
O 13º Oficial de Registro de Imóveis desta Comarca de São Paulo, em atenção ao r. despacho de folha 19, proferido por Vossa Excelência, em 08/04/2003, no processo em referência, vem, respeitosamente, a esse d. Juízo, prestar as informações abaixo.
Inicialmente, necessário salientar, com todo respeito, que falta uma das condições da ação no presente procedimento, a legitimidade de parte (legitimatio ad causam), pelas razões que passo indicar.
O presente pedido de providências é movido em face do 13º Registro de Imóveis de São Paulo. Contudo, como explicado adiante, o requerido – 13º Registro de Imóveis de São Paulo – não tem personalidade jurídica, seja própria ou imprópria. Senão vejamos.
Trata-se de serviço público de execução indireta, exercido em caráter privado pela pessoa física do respectivo titular aprovado em concurso público, por meio de delegação outorgada pelo Estado (Constituição Federal de 1988, art. 236).
Em obediência ao citado preceito constitucional, o art. 3º da Lei Federal nº 8.935/1994 define o notário, ou tabelião, e o oficial de registro, ou registrador, como “profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro.”
Portanto, por ser o serviço público de Registro de Imóveis exercido pela pessoa física do titular da delegação, não há que se falar em personalidade jurídica do 13º Registro de Imóveis de São Paulo como ente autônomo dissociado da pessoa do titular. Há, e isto não se pode negar, capacidade jurídica do Delegado do Registro de Imóveis (pessoa física) para administrar a respectiva Serventia, ativa ou passivamente, judicial ou extrajudicialmente. É, como dito, a pessoa física do Registrador que é responsável pelas atividades desenvolvidas nas correspondentes Serventias Extrajudiciais.
Desta forma, sempre respeitosamente, inexiste personalidade jurídica do 13º Registro de Imóveis de São Paulo. Assim, há ilegitimidade passiva de parte.
A exemplo, decidiu o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais na Apelação Cível nº 147.221/6, da Comarca de Belo Horizonte, relatada pelo Desembargador Corrêa de Marins, no sentido de que “sendo a atividade notarial de foro extrajudicial um serviço público exercido por delegação e fiscalizado pelo Estado, não possuem os cartórios de notas personalidade jurídica capaz de figurar no pólo passivo da obrigação fiscal, não estando submetidos ao pagamento de tributo e nem à cobrança de taxa de licenciamento, pelo que é de todo ilícito exigir-se-lhes o cadastramento fiscal de pessoa jurídica.” (destaques acrescidos).
Quanto à devolução dos emolumentos objeto deste pedido de providências, necessário esclarecer que, ressalvado superior juízo de V. Exa., este oficial não é parte legítima para suportar a pretensão da requerente.
De acordo com o registro nº 1, feito em 20/01/1999, na matrícula nº 39.589 (folha 8) desta Serventia Registrária, o requerente – Conselho Regional de Química – IV Região – adquiriu o imóvel da referida matrícula consoante escritura pública de compra e venda lavrada em 05/01/1999, no livro 3862, página 365, do 11º Tabelião de Notas local (folha 7).
Em 03/04/2003, foi prenotado sob o nº 170700, requerimento firmado pelo Conselho Regional de Química da IV Região, solicitando a restituição dos valores pagos pelo referido registro nº 1, feito em 20/01/1999, na matrícula nº 39.589, corrigidos monetariamente, em razão de sua condição de autarquia federal (folha15).
Por conseqüência, foi elaborada a nota devolutiva datada de 11/02/2003, cujo teor peço vênia para transcrever abaixo:
“Ressalvado superior juízo, a devolução das custas e dos emolumentos pagos pelo registro nº 1, feito em 20/01/1999, na matrícula nº 39.589, não é possível por este 13º Oficial de Registro de Imóveis (Armando Clápis), vez que, na época, em que o pagamento foi efetuado, respondia pelo expediente vago desta Serventia o Sr. Waldeci Wanderley Rosada, designado pela Egrégia Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo (Portaria nº 40, de 02/05/1996 – cópia anexa).”
Na época em que praticado o citado registro nº 1, na matrícula nº 39.589, respondia pelo expediente vago desta Serventia Registrária o Senhor Waldeci Wanderley Rosada, nomeado pela Egrégia Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo em 02/05/1996, consoante Portaria nº 40/96, assinada pelo então Corregedor Geral da Justiça – Doutor Márcio Martins Bonilha (folha 17).
Como é do conhecimento de Vossa Excelência, o atual oficial desta 13ª Serventia Registrária – Armando Clápis - foi investido na respectiva delegação no dia 11/04/2000, após aprovação no 1º Concurso Público de Provas e Títulos para Outorga de Delegações de Notas e Registro, como demonstra a cópia não autenticada do Título de Outorga de Delegação, expedido em 04/04/2000, pelo então presidente do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Desembargador Doutor Marcio Martins Bonilha (doc.# 1).
Neste sentido, sendo a responsabilidade do oficial de caráter pessoal em razão da natureza jurídica das delegações extrajudiciais, registra-se, por oportuno, ressalvado superior entendimento de V. Exa., que o ressarcimento dos emolumentos pagos pela requerente na forma que se pretende, decorrentes da prática do referido ato de registro nº 1, feito na mencionada matrícula nº 39.589, deverão ser propostos em face daquele que respondia pelo expediente vago deste Registro Imobiliário à época, visto que além de ter sido quem efetivamente recebeu os valores pagos “indevidamente” como afirma a requerente, não ocorre sucessão de um titular para o outro, pois o atual oficial – Armando Clápis - foi investido originariamente no cargo. Senão vejamos.
O MM. Juiz de Direito da 2ª Vara de Registros Públicos de São Paulo – Dr. Márcio Martins Bonilha Filho já decidiu, em algumas ocasiões, não haver sucessão de responsabilidades de um titular para outro. Permita-me, com todo respeito, transcrever abaixo algumas dessas decisões:
“Processo 000.01.066939-6 - Pedido de Providências - J.E. - T.N.C. - Fls 77/80 - CP 67/01-TN - tópico final da sentença: Sem embargo da conclusão pericial, que apurou a existência de distúrbios gráficos, demonstrando a presença de escrita grafopatológica do testador, forçoso é convir que, no âmbito notarial, o ato está formalmente aperfeiçoado e consumado (fls. 33/36), tanto que registrado, cumprido e inscrito, na forma do artigo 1.126 do Código de Processo Civil, pelo r. Juízo da 1ª Vara Cível da Comarca de Americana (fls. 19vº). Deferida a dilação probatória consistente na realização de perícia grafotécnica, verifica-se que, no aspecto das formalidades extrínsecas, o testamento foi outorgado por Osvaldo Elias, que efetivamente subscreveu o ato. A dúvida relacionada com a higidez mental ou capacidade de discernimento do outorgante, não tem a relevância entrevista, certo que a matéria reclama, se for o caso, anulação do ato, cujo procedimento não tramita perante a Vara de Registros Públicos. O requerente já obteve a cópia do testamento, lavrado em diligência, no dia 15 de maio de 1.984, anotado que eventual pedido de invalidação do ato jurídico já aperfeiçoado não tem curso nesta Vara. Vale dizer, a apreciação do pedido refoge do âmbito de atribuições do exercício da Corregedoria Permanente dos Tabelionatos de Notas da Capital, que se desenvolve na esfera administrativa nesta 2ª Vara de Registros Públicos. Nem se argumente que a dúvida apurada no laudo grafotécnico autoriza a dilação probatória almejada. A assinatura aposta, a despeito da constatação verificada, proveio do punho do testador. Logo, as questões envolvendo a capacidade ou a higidez mental ficam relegadas para análise em demanda própria, de natureza jurisdicional, sob o crivo do contraditório. Aliás, ainda que se positive a existência de falha ou infração notarial, a ocorrência não dá margem à instauração de procedimento administrativo, inexistindo responsabilidade funcional apta a ser apurada na esfera censório-disciplinar. À época dos fatos (1.984), a serventia contava com o Tabelião Antonio Albergaria Pereira, já aposentado. Logo, não há atribuição desta Corregedoria Permanente para processar o antigo Tabelião por eventual falha disciplinar, no âmbito administrativo, por força do regime disciplinar instituído pela Lei 8.935/94, em quadro onde a responsabilidade funcional, na esfera administrativa, não se transfere ao atual titular da Delegação. Por conseguinte, rejeito a pretensão formulada (fls. 45), determinando o arquivamento do feito. Comunique-se a decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça.” (D.O.E. de 08.11.2001 – grifou-se).
“Processo 000.02.183934-4 - Pedido de Previdências - I.N.S.S.I. - O.R.C.D.P.N.S.I. - Fls 22/23 - CP 837/02-RC - tópico final da sentença: A autenticação é falsa. O carimbo não corresponde àquele utilizada à época. Aliás, no âmbito disciplinar não há medida correcional a ser adotada, dado que sobreveio recente alteração no comando da serventia, com designação pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça de novo responsável pelo expediente, inexistindo, destarte, responsabilidade funcional a ser apurada. Por conseguinte, determino o arquivamento dos autos. Com cópia de todo o expediente, oficie-se à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça, para conhecimento.” (D.O.E. de 11.10.2002 – destaques acrescidos).
“Processo 000.02.194644-2 - Pedido de Providências - C. G. J. - Fls 15/16 - tópico final da sentença: De qualquer forma, o 21° Tabelionato de Notas da Capital conta com titular da delegação investido muito tempo depois dos fatos, inexistindo, destarte, responsabilidade funcional a ser apurada. Por conseguinte, determino o arquivamento dos autos. Com cópia de todo o expediente, oficie-se ao Corregedor Permanente da unidade indicada a fls. 13, para conhecimento e consideração que possa merecer. Comunique-se a decisão à Egrégia Corregedoria Geral da Justiça.” (D.O.E. de 07.01.2003 – grifou-se).
Como se sabe, para se ocupar o “cargo” de notário ou registrador, o interessado deve, necessariamente, ser aprovado em concurso público regulamentado previamente por lei (Constituição Federal, art. 236). O candidato aprovado em concurso público, com a conseqüente outorga da delegação e a investidura, adquire o direito subjetivo ao exercício do “cargo”. A “nomeação” é o ato de provimento do “cargo” que se completa com a posse e o exercício.
De acordo com o doutrinador Hely Lopes Meirelles, “a investidura do servidor no cargo ocorre com a posse. A posse é a conditio juris da função pública. Por ela se conferem ao servidor ou ao agente político as prerrogativas, os direitos e os deveres do cargo ou do mandato. Sem a posse o provimento não se completa, nem pode haver o exercício da função pública. É a posse que marca o início dos direitos e deveres funcionais, como, também, gera as restrições, impedimentos e incompatibilidades para o desempenho de outros cargos, funções ou mandatos” (Direito Administrativo Brasileiro, Malheiros, 28º edição, 2003, pág. 414) (grifou-se).
Ainda segundo o administrativista, há duas espécies de investidura: originária e derivada. A investidura derivada depende de vínculo pré-existente do agente com a Administração Pública, e, como exemplo, ocorre nas promoções e nas transferências, que normalmente se faz por seleção interna pelo sistema de mérito e tempo de serviço (a carreira da magistratura enquadra-se nesta espécie). Já a investidura originária vincula inicialmente o agente ao cargo, ou seja, é o marco inicial da relação jurídica entre o agente e a Administração Pública, que, como dispõe o art. 37, inciso II, da Constituição Federal, ocorre com aprovação em concurso público.
O ingresso na atividade notarial e registrária enquadra-se na espécie de investidura originária, a qual, como dito acima, pressupõe aprovação em concurso público e o legislador constituinte, atento à regra geral estabelecida no citado art. 37, inciso II, impôs esta condição (concurso público) no § 3º do art. 236 da Carta Maior.
Em respeito ao preceito constitucional que determina o ingresso na atividade notarial e registrária mediante aprovação em concurso público, o Supremo Tribunal Federal, na ação direta de inconstitucionalidade nº 2379, do Estado de Minas Gerais, relatada pela Ministra Ellen Gracie, decidiu o seguinte:
“EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade. Lei nº 13.724/00, do Estado de Minas Gerais, que estabelece requisitos para que notários e registradores possam obter delegações efetivas no cargo sem concurso público - Ofensa ao disposto no art. 236, § 3º da CF. Precedentes: ADIns nºs 363-1/DF, 690-8/GO, 552-9/RJ e 417-4/ES. Liminar deferida com efeitos "ex tunc" para suspender os efeitos da referida norma legal.”
No mesmo sentido, decidiu o Superior Tribunal de Justiça, no recurso ordinário em mandado de segurança nº 14261/MG, relatado pelo Ministro Hamilton Carvalhido, da Sexta Turma, cujo acórdão, respeitosamente, transcrevo abaixo:
“Acórdão ROMS 14261 / MG ; RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2002/0000970-0
Fonte DJ DATA: 19/12/2002 PG:00429
Relator Min. HAMILTON CARVALHIDO (1112)
Ementa recurso ordinário em mandado de segurança. Cartório. Titularidade. Artigo 208 da constituição federal de 1967, com a redação conferida pela emenda constitucional no 22/82. Artigo 236, parágrafo 3°, da constituição da república de 1988. Investidura. Necessidade de concurso público. Direito adquirido inexistente. Improvimento.
1. "Fica assegurada aos substitutos das serventias extrajudiciais e do foro judicial, na vacância, a efetivação, no cargo de titular, desde que, investidos na forma da lei, contem ou venham a contar cinco anos de exercício, nessa condição e na mesma serventia, até 31 de dezembro de 1983" (artigo 208 da Constituição Federal de 1967, com a redação dada pela Emenda Constituição no 22/82).
2. "O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de seis meses." (artigo 236, parágrafo 3°, da Constituição da República de 1988).
3. Tendo sido o(a) impetrante designado(a) "(...) para assumir as funções de Oficial-Substituto do Registro de Títulos e Documentos e Pessoas Jurídicas de Cataguases, até a realização do concurso público de provas e títulos, ou de remoção, preconizado no artigo 236, § 3°, da Constituição Federal", não há necessidade de qualquer outro ato administrativo emanado da autoridade que a designou para viabilizar a abertura do certame.
4. Cuida-se, pois, de designação a título precário, encontrando a almejada delegação efetiva, assim, óbice na exigência constitucional de concurso público de provas e títulos para o ingresso na atividade notarial e de registro (artigo 236, parágrafo 3°, da Constituição da República).
5. É firme o entendimento do excelso Supremo Tribunal Federal no sentido de que o substituto de serventia, invocando o artigo 208 da Constituição Federal de 1967, com a redação dada pela Emenda no 22/82, não tem direito adquirido a ser investido na titularidade do cartório cuja vacância tenha ocorrido após a promulgação da Constituição da República de 1988, dependendo o preenchimento do cargo, pois, da realização de concurso público de provas e títulos.
6. "Em que pese o art. 15 da Lei 8.935/94 dispor que o concurso para ingresso na Atividade Notarial e de Registro será realizado com a participação, em todas as suas fases, da Ordem dos Advogados do Brasil, do Ministério Público, de um notário e um registrador indicado pela ANOREG, verifica-se que o seu § 10 esclarece que o concurso será aberto com a publicação do edital. Neste diapasão, a elaboração do instrumento convocatório constitui mera atividade preparatória do certame, prescindindo, assim, da participação de toda a Comissão Examinadora nesta fase." (RMS 13.457/MG, Relator Ministro Gilson Dipp, in DJ 29/4/2002).
7. A abertura de concurso público de provas e títulos é mandamento constitucional. Todavia, a desídia do agente em realizá-lo no prazo determinado pelo artigo 236, parágrafo 30, da Constituição da República, se por um lado pode ser objeto de responsabilização administrativa, por outro não tem o condão de consolidar situação jurídica constituída de forma precária, sem a observância dos requisitos próprios.
8. Recurso improvido.
Data da Decisão 11/06/2002 - Órgão Julgador T6 - SEXTA TURMA Decisão
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da SEXTA TURMA do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro-Relator. Os Srs. Ministros Paulo Gallotti, Fontes de Alencar, Vicente Leal e Fernando Gonçalves votaram com o Sr. Ministro-Relator.” (grifou-se).
Portanto, como visto, o delegado de serventia extrajudicial de notas ou de registro para ser investido em suas funções necessita ser aprovado em concurso público de provas e títulos como determina a atual Constituição Federal e a Lei Federal nº 8.395/1994.
Assim, investido o delegado de forma originária - com aprovação em concurso público -, não possui qualquer relação com atos administrativos decorrentes do cargo que assumiu e que foram realizados antes de sua posse, vez que seu vínculo com a Administração Pública inicia-se, tão-somente, como dito, com a investidura e é a partir daí que decorrem suas responsabilidades.
Ou seja, não ocorre sucessão de responsabilidade, qualquer que seja a natureza, de um delegado para outro investido de maneira originária. Eventuais nomeações que ocorram nas situações de vacância do cargo, ocorrem de maneira precária e transitória para que não haja interrupção na prestação do serviço público.
Neste sentido manifestou-se o Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região em decisão proferida no recurso ordinário nº 904/2000, relatado pelo Juiz Douglas Alencar Rodrigues e julgado pela Terceira Turma, que peço vênia para reproduzi-la abaixo:
"CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS - Atividade delegada do Poder Público. Inexistência de personalidade jurídica própria. Ilegitimidade passiva ad causam. O cartório de registro de imóveis, ainda que desenvolva, por expressa previsão constitucional (art. 236), atividade delegada pelo Poder Público ligada à garantia da publicidade, autenticidade, segurança e eficácia de atos jurídicos - art. 1° da Lei 8935/94) não possui personalidade jurídica própria (CC, art. 16, c/c o art. 12 do CPC). Cabe a seu titular, por isso, na perspectiva da melhor qualidade dos serviços, a responsabilidade pelo gerenciamento administrativo e financeiro da serventia inclusive no que concerne às despesas de custeio, investimento e pessoal (art. 21 da Lei 8935/94). Não detendo aptidão para atuar como sujeito de direitos e obrigações não poderá o cartório celebrar contratos de trabalho, pelo que a legitimidade para demanda judicial dessa natureza pertencerá exclusivamente a seu titular, na forma aliás prevista nos arts. 69 e 81 da L. 8. 185/91, que dispõe sobre a organização Judiciária no âmbito do Distrito Federal. Cartório de registro de Imóveis. Delegação extinta pelo evento morte do agente público delegado. Princípio da continuidade dos serviços públicos. Designação judicial, em caráter precário e transitório de pessoas físicas para responderem pela serventia. Inocorrência da sucessão. Ilegitimidade passiva ad causam pessoas delegadas. Operando-se a extinção da delegação do serviço notarial efetivado pelo Poder Público em face da morte de seu titular e processadas designações sucessIvas de serventuários para responder, em caráter transitório, pelo ofício - por imposição legal ditada pelo interesse público na continuidade daqueles serviços art. 39 da L. 8935/94) - não há como conceber a legitimidade passiva ad causam dos servidores interinos designados, que não podem ser equiparados os agentes públicos delegados, tanto pelo caráter precário das designações recebidas e de suas origens judiciais, quanto pela própria necessidade de concurso público para legitimar as questionadas investiduras art. 236, parágrafo 3° da CF). Nessa situacão. eventuais lesões a direitos trabalhistas cometidas durante o período laborado para o antigo titular da delegação pública, que veio a falecer, haverá de ser demandada contra seu espólio ou sucessores (CPC arts. 12. V e 43). com a ressalva de que o próprio debate sobre a responsabilidade do futuro titular, por forca do instituto da sucessão (CLT arts. 10 e 448), quando ainda não processada a substituição por concurso público (CF art. 236 par. 3°), restará prejudicada pela própria interrupção da titularidade daquele serviço notarial, a qual se confunde com a continuidade das atividades por ele desenvolvidas, e mesmo pela própria possibilidade de lesão aos postulados constitucionais e da ampla defesa." (destaques acrescidos).
Os usuários, nas hipóteses de danos causados por delegados do serviço público e que não consigam ser reparados por estes, poderão, por meio da via jurisdicional, pleitear suas indenizações ao Poder Delegante, o Estado.
Portanto, tendo em vista a necessidade de aprovação em concurso público de provas e títulos para ingressar na atividade notarial e de registro (Constituição Federal, artigos 37, inciso II, e 236, § 3º; e Lei Federal nº 8.935/1994, art. 14, inciso I), com posterior ato administrativo do Poder Público de outorga de delegação e conseqüente investidura que ocorre com a posse (doc.# 1), sendo esta investidura de espécie originária, cuja característica principal é a de instaurar o marco zero na relação entre o agente e a Administração Pública, conclui-se, com todo acatamento, que não há sucessão de responsabilidades, seja qual for a espécie e natureza, entre o atual oficial concursado – Armando Clápis - e aquele da época em que foi praticado o registro que o requerente pleiteia o ressarcimento dos emolumentos pagos – Waldeci Wanderley Rosada.
Assim, com a devida vênia, este oficial solicita sua exclusão do polo passivo deste procedimento, bem como sejam incluídos o responsável pelo expediente da época – Waldeci Wanderley Rosada - e o Estado de São Paulo que promoveu a nomeação deste.
O ressarcimento dos “valores pagos indevidamente” pela requerente em 20/01/1999 por este Oficial implicará, com todo acatamento, enriquecimento sem causa atualmente positivada em nosso ordenamento, nos artigos 884 a 886 do Código Civil de 2002.
Estas as razões que me permito submeter à superior apreciação de Vossa Excelência, servindo-me do ensejo para renovar os protestos de elevada estima e consideração, bem como para colocar-me à disposição para informações e esclarecimentos adicionais eventualmente necessários ou convenientes.
São Paulo, 16/04/2003
Alexandre Laizo Clápis
Substituto
Custas e emolumentos – isenção – autarquias federais. Delegação – sucessão - concurso.
PROCESSO CG- 855/2003 - CAPITAL - CONSELHO REGIONAL DE QUÍMICA - 4ª REGIÃO - Advogado: EDMILSON JOSÉ DA SILVA, OAB/SP Nº 120.154 - Parecer nº 309/03-E
Serviço extrajudicial - Reclamação quanto a custas cobradas - Isenção desrespeitada - Pretensão de devolução não pode se voltar contra atual titular da delegação - Ausência de sucessão - Recurso improvido
Cuida-se de recurso interposto por entidade autárquica, inconformada com negativa de devolução de custas e emolumentos que havia pago, a despeito de isenção que, segundo aduz, lhe favorecia, mercê da incidência do item 4.1 das Notas Explicativas anexas à tabela constante da Lei 10.710/00, então em vigor, pela sentença reputado aplicável apenas às autarquias estaduais.
É o relatório.
OPINO.
Assente-se, de início, a atribuição desta Corregedoria para conhecer e deliberar sobre a matéria suscitada no recurso, se atinente a pretensão de devolução de custas indevidamente cobradas, tal como está na atual Lei n. 11.331 (art. 30), já estava na Lei n. 10.710/00 (art. 11) e, historicamente, vem constando das seguidas leis que tratam de custas e emolumentos.
De resto, salvo melhor juízo de Vossa Excelência, não se entende esteja a sentença a merecer deslinde diverso, ainda que não, propriamente, pelo fundamento lá exposto, respeitada a convicção de seu I. prolator.
É que, na verdade, o item 4.1 das notas explicativas das tabelas trazidas pela Lei 10.710, então vigente, dispunha sobre isenção que se considera também aplicável às autarquias federais. A propósito, basta ter em conta que, na dicção do dispositivo, a União e o Estado, bem como suas respectivas autarquias e fundações por eles mantidas, gozaram da benesse lá instituída. Ou seja, tanto as autarquias quanto as fundações, então, fossem elas federais ou estaduais, ficavam beneficiadas com a isenção se o preceito citado, depois de referir as autarquias, seguia exigindo, quanto às fundações, que fossem mantidas pela União ou pelo Estado (...por eles mantidas...).
O problema todo se concentra, todavia, e especificamente com relação ao caso em tela, no fato de que a cobrança indevida se fez quando os serviços registrários estavam a cargo de preposto designado, portanto antes de sua assunção pelo atual delegado concursado.
A rigor, esta questão não é nova e envolve a discussão sobre se há sucessão, pelo novo titular de serviços extrajudiciais, em obrigações anteriores, o que, na esfera trabalhista, se vinha decidindo pela positiva, isto é, no sentido da responsabilização do delegado, de forma predominante, mas o que, nem mesmo lá, se pode dizer hoje unânime, inclusive conforme aresto colacionado na resposta do registrador.
E, ao que se acredita seja a sistemática imposta pelo regime da delegação do exercício do serviço de registros e notas, não se há de impor ao novo titular obrigações que tenham origem em período que preceda sua investidura, como se ele assumisse um cartório, com todo o ativo e passivo que lhe fosse concernente.
Logo depois de editada a Lei 8.935/94, na esteira do que já previa o artigo 236 da Constituição Federal, esta Corregedoria Geral fixou, em caráter normativo, os exatos contornos e características da prestação dos serviços públicos extrajudiciais, legados ao exercício do particular Decisões Administrativas, RT, 1995, n. 24, p. 73), valendo inclusive anotar que suas conclusões foram submetidas ao crivo jurisdicional e, enfim, mantidas pelo Superior Tribunal de Justiça (ROMS N. 8.931-SP, 2a t., rel. Min. Peçanha Martins, j. 06.10.1998, DJU 19.04.1999).
Pois lá se verberou que o regime instituído para prestação dos serviços de registros e de notas pressupôs remanescesse sua titularidade com o Poder Público, que outorgava - como de fato outorga - seu exercício à pessoa de um profissional do direito, a tanto concursado. Sem que, destarte, a partir da Lei 8.935 se possa identificar um cartório, criado por lei, ocupado por servidor titular de cargo, de um lugar na Administração. Ao contrário, evidenciou-se o exercício de um serviço público por um particular a quem, por concurso, se delega o seu exercício.
Se é assim, não se pode cogitar de uma unidade com personalidade própria a quem sejam afetos direitos e obrigações, menos ainda comunicáveis a seus titulares. As obrigações atinentes ao serviço extrajudicial quem as possui é a pessoa do delegado ou, na vacância, o Estado, afinal seu titular. Nunca o novo titular, que, sem dúvida, aprovado no concurso recebe investidura originária.
Com efeito, o particular a quem se confere, mercê de regular concurso, a delegação para exercício dos serviços extrajudiciais, não os recebe por transmissão do anterior titular, de forma derivada, ou como se assumisse uma unidade com personalidade própria e, assim, dívidas próprias. Ele ingressa naqueles serviços sem vínculo anterior que o faça responsável por obrigações precedentes.
Quando muito só haveria a ressalvar o acerto que novo e anterior titulares devem fazer quanto ao mobiliário necessário à prestação do serviço. E isto, de um lado, se tencionar o novo titular ficar com este acervo e, a duas, mais a reforçar que estas relações são todas pessoais com e entre os delegados.
E mais. Importante não olvidar que o delegado, quando submetido a concurso, exatamente pelo quanto se está a expor, não é informado ou avisado de que, acaso aprovado, deverá arcar com débitos anteriores. Vale dizer, se enfocada a questão sob a perspectiva do concurso prestado, o delegado recebe originariamente seu exercício por investidura originária. Mas, mesmo examinada a matéria à semelhança do que se dá na concessão, também inocorreria, anotada a natureza contratual que se lhe empresta, a responsabilização do concessionário por obrigações precedentes sem que isto se tenha ajustado. Ou, por outra, as condições da entrega da execução do serviço ao concessionário operam nos termos do que contratado (v. a respeito, Hely Lopes Meirelles, Direito Administrativo Brasileiro, RT, p. 313).
E não é só. Mesmo durante a concessão, o usuário tem direito exercitável diretamente contra o poder concedente se o concessionário por qualquer motivo não responde ou não tem como responder. Tanto mais, então, quando, extinta a concessão, ocorre o fenômeno da reversão, ou seja, reverte ao concedente o serviço concedido (v. a propósito, Hely Lopes Meirelles, op. cit., p. 325/327, e Diógenes Gasparini, in Direito Administrativo, Saraiva, 2001, p. 312).
Portanto, sob qualquer que seja o prisma de cognição da matéria debatida, não se vislumbra como possa o atual delegado responder por débitos anteriores. Se sob o ponto de vista da forma da outorga, que se dá por concurso, sua nomeação é originária, sem vínculo anterior ou transmissão de obrigações. Se a questão se examina, analogicamente, ao influxo das regras de concessão, já que se outorga, a particular, a execução de serviço cuja titularidade permanece com o Poder Público, igualmente não se ajustou qualquer responsabilidade, com o delegado, por débito anterior, o que também em lei não se previu. Por fim, de tudo já se viu inexistir cartório enquanto unidade dotada de personalidade jurídica, à qual afeto débito que persiste independentemente de quem seja seu titular.
Uma última ressalva. É que não cabe argumentar com eventual prejuízo ao usuário, afinal consumidor que, premido pelo pagamento de verba indevida, não teria contra quem repeti-la. Como já se afirmou, na vacância dos serviços eles revertem ao seu titular, no caso o Poder Público, que responderia inclusive se provida a serventia, na forma também já exposta e, aí sim, a bem da proteção ao consumidor. Sem contar a possibilidade de reclamo direto contra quem recebeu o valor indevido.
Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, se submete à elevada apreciação de Vossa Excelência, é no sentido de ser mantida a sentença proferida, negando-se provimento ao recurso contra ela manifestado.
Sub censura.
São Paulo, 9 de setembro de 2.003
(a) CLAUDIO LUIZ BUENO DE GODOY
Juiz Auxiliar da Corregedoria
DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Auxiliar da Corregedoria e, por seus fundamentos, que adoto, nego provimento ao recurso. Publique-se na íntegra o parecer. São Paulo, 18 de setembro de 2003 - (a) LUIZ TÂMBARA - Corregedor Geral da Justiça (D.O.E. de 16.10.2003)
Veja também:
Cartório. Vínculo de emprego. Regime laboral.
PODER JUDICIÁRIO - Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região
Acórdão nº: 20020064610 nº de pauta:256 - Processo TRT/SP nº: 20010180065
Recurso Ordinário - 03 VT de São Paulo
Recorrente: 1. Anita Kazuko Enjoji. 2. 5º Oficio de Registro de Imóveis da Capital
EMENTA: Cartório. Vínculo de emprego. Cartório não exerce atividade comercial, não apropria capital de giro, não gera bens ou serviços privados, não é categoria econômica e não tem fundo de comércio. O Oficial não é dono dos livros de lançamentos, não tem clientela (na acepção própria que o comércio emprega ao termo), nem tem a liberdade para dispor sobre o que e como registrar. Não há, enfim, desempenho de uma atividade empreendedora (própria da atividade privada), nem aplicação de capital sob a condição de risco do negócio. Toda a sua atividade é controlada pelo poder público (o Judiciário; CF/88, art. 236, § 1º). A outorga de delegação é, também, ato complexo, que exige aprovação em concurso público (público, enfatize-se), além da individuação do agente delegado, da função delegante e da serventia por onde se fará passar a delegação. A Lei 8.935/94, ao assegurar à autora o direito de opção pelo regime trabalhista, veio a afirmar, precisamente, que esse tipo de trabalhador não é empregado. Seria incongruente afirmar que alguém tem o direito de optar por algo que já adquiriu.
ACORDAM os Juízes da 6ª TURMA do Tribunal Regional do Trabalho da Segunda Região em: por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso do réu, para julgar IMPROCEDENTE a ação que ANITA KAZUKO ENJOJI manifesta em face do 5º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL, absolvendo este de todo o pedido e ficando aquela condenada a reembolsar as custas pagas pelo réu, com correção.
São Paulo, 05 de Fevereiro de 2002.
MARCOS EMANUEL CANHETE
PRESIDENTE REGIMENTAL
RAFAEL E. PUGLIESE RIBEIRO
RELATOR
ROVIRSO APARECIDO BOLDO
PROCURADOR (CIENTE)
Ementa: Cartório. Vínculo de emprego. Cartório não exerce atividade comercial, não apropria capital de giro, não gera bens ou serviços privados, não é categoria econômica e não tem fundo de comércio. O Oficial não é dono dos livros de lançamentos, não tem clientela (na acepção própria que o comércio emprega ao termo), nem tem a liberdade para dispor sobre o que e como registrar. Não há, enfim, desempenho de uma atividade empreendedora (própria da atividade privada), nem aplicação de capital sob a condição de risco do negócio. Toda a sua atividade é controlada pelo poder público (o Judiciário; CF/88, art. 236, § 1º). A outorga de delegação é, também, ato complexo, que exige aprovação em concurso público (público, enfatize-se), além da individuação do agente delegado, da função delegante e da serventia por onde se fará passar a delegação. A Lei 8.935/94, ao assegurar à autora o direito de opção pelo regime trabalhista, veio a afirmar, precisamente, que esse tipo de trabalhador não é empregado. Seria incongruente afirmar que alguém tem o direito de optar por algo que já adquiriu.
Sentença: procedente em parte. A autora recorre postulando a gratificação por tempo de serviço e licença prêmio, como também uma indenização compatível com a quota do PIS. Para haver os dois primeiros, diz que ao tempo da relação o seu enquadramento jurídico resultava da "aplicação de comando legal existente" antes mesmo da sua admissão. Diz que não se tratam de dois regimes jurídicos, mas um só, o da CLT, subsidiado com vantagens criadas por instruções administrativas oriundas da Corregedoria de Justiça. Também recorre o réu, alegando que é parte ilegítima e que não houve sucessão. Alega a prescrição e sustenta que o relacionamento entre as partes não se desenvolveu sob a disciplina trabalhista; diz que o vínculo não era privado e que a autora não exerceu a opção permitida pela Lei 8.935/94; afirma que, na verdade, a autora está buscando vantagens nos dois regimes jurídicos, o estatutário e o celetista, aquinhoando-se de ambos, quando, na verdade, ela já se encontra aposentada, auferindo proventos pagos pelos cofres públicos (IPESP Instituto de Previdência dos Servidores Públicos do Estado de São Paulo). Sustenta, mais, que a prescrição do FGTS não é trintenária, como também são insubsistentes as diferenças salariais que, de qualquer modo, em caso de condenação, haveria a incidência do INSS e IRPF. Contra-razões apresentadas, de parte a parte. O Ministério Público teve vista dos autos (fl. 854), sem pronunciamento de mérito.
VOTO:
1. Apelos aviados a tempo e modo. A guia de depósito identifica a autora, a Vara e o número do processo (fl. 773). A guia de custas identifica a Vara e o número do processo. A finalidade está atingida. Rejeito a preliminar suscitada pela autora e tomo conhecimento do apelo.
RECURSO DO RÉU:
2. Relação de emprego. A atividade notarial e de registro é fundamentalmente pública, não privada. O que o art. 236 da CF/88 afirma é exatamente isso. A atividade pública é exercida, por delegação, em caráter privado. Não será exato supor que um notário (como também um Oficial de Registro) possa lavrar um ato-tipo de certificação com fé pública, exercendo atividade privada. Os seus atos são essencialmente administrativos (portanto não privados), passíveis de impugnação pela via administrativa.
Não é por outra razão que o art. 236, § 2º, da CF/88, determina que a "lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos notários, oficiais de registro e seus prepostos", vale dizer: a responsabilidade das pessoas (notários e oficiais de registro), numa clara dissociação da pessoa do Oficial com a unidade de lotação (Cartório).
Cartório não exerce atividade comercial, não apropria capital de giro, não gera bens ou serviços privados, não é categoria econômica. Cartório não tem fundo de comércio. O Oficial do Cartório não é dono dos livros de lançamentos, não tem clientela (na acepção própria que o comércio emprega ao termo), nem tem a liberdade para dispor sobre o que e como registrar. Além disso, não será exato afirmar que o Oficial Maior é "dono" do Cartório, ou que o tenha adquirido pela aplicação de dinheiro seu, com aquisição de um fundo de comércio que não existe. Não há, enfim, desempenho de uma atividade empreendedora (própria da atividade privada), nem aplicação de capital sob a condição de risco do negócio. Toda a sua atividade é controlada pelo poder público (o Judiciário; CF/88, art. 236, § 1º). A outorga de delegação é, também, ato complexo, que exige aprovação em concurso público (público, enfatize-se), além da individuação do agente delegado, da função delegante e da serventia por onde se fará passar a delegação.
Dispondo a norma constitucional que a atividade cartorial é fiscalizada pelo Poder Judiciário (CF, art. 236, § 1º), deixa a ver que a função delegada é oriunda do Judiciário. A atividade notarial é conferida pela Constituição Federal ao Poder Judiciário de cada estado da Federação (e ao Distrito Federal), e é este Poder Judiciário que se incumbe da delegação, com a óbvia incumbência de fiscalizar o agente delegado.
Essas considerações põem em relevo a circunstância de que o réu não pode ser considerado "empregador" (CLT, art. 2º), nem a ente assim equiparado (CLT, art. 2º, § 2º). E, mesmo sob a ótica da nova Lei Federal 8.953/94, são o notário e os Oficiais de Registro quem podem contratar sob o regime trabalhista. O vínculo de emprego, sob a nova disposição legal, é formado intuitu personae, com a pessoa física do notário ou do Oficial.
Mas também a autora não pode ser considerada empregada, pela simples circunstância de que foi investida em função pública, de conformidade com a legislação vigente ao tempo dessa investidura (em 1.965). A Lei 8.935/94, ao assegurar a esse servidor o direito de opção pelo regime trabalhista, veio a afirmar, precisamente, que esse tipo de trabalhador não é empregado. Seria incongruente afirmar que alguém tem o direito de optar por algo que já adquiriu.
É a afirmação legislativa. É a lei que nega à autora a classificação como empregada. O art. 48 permitiu a opção pela CLT. A autora não exerceu essa opção. Logo, não era e não é empregada. A autora, aliás, aposentou-se pelo IPESP (autarquia estadual), auferindo proventos de aposentadoria como servidora pública. O que ela pretende, agora, é a cumulação de vantagens de vários regimes, chegando, mesmo, a recorrer contra a sentença que, muito embora lhe tenha deferido parcelas trabalhistas, ainda pretende aquinhoar-se de títulos próprios do regime estatutário (licença prêmio e gratificação por tempo de serviço). A autora quer, contraditoriamente, as duas coisas.
Afirmo prejudicadas as demais questões suscitadas no apelo do réu, como também fica prejudicado o apelo da autora.
Conclusão:
Dou provimento ao recurso do réu, para julgar IMPROCEDENTE a ação que ANITA KAZUKO ENJOJI manifesta em face do 5º OFÍCIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL, absolvendo este de todo o pedido e ficando aquela condenada a reembolsar as custas pagas pelo réu, com correção.
Dr. Rafael E. Pugliese Ribeiro
Juiz Relator - 6ª Turma
Vide também:
A restauração da moralidade. Boletim Eletrônico - Jurisprudência - São Paulo, 14/09/2001 - n. 374 . A restauração da moralidade" Decisão do Sr. Corregedor-Permanente Processo 997.000.01.079055-1
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Registro Jurídico - Boletim Eletrônico IRIB/ANOREG-SP - São Paulo, 05/03/2001 - n. 291 - Cartório - criação, extinção e transformação
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