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Penhora. Alegação de fraude de execução. Ausência de registro. Desconstituição da penhora.


A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) deu provimento ao recurso de J.A.M. e sua esposa, M.I.M., em embargos de terceiros (ação destinada a excluir bens de terceiros que estejam sendo, ilegitimamente, objeto de apreensão judicial) opostos pelo casal contra M.H. e outras, objetivando a desconstituição de penhora realizada sobre seu imóvel. Para a ministra Nancy Andrighi, relatora do processo, evidenciada a ausência de conhecimento do casal de demanda capaz de reduzir o devedor à insolvência, não há de se falar em fraude de execução.

O casal adquiriu de P.P., por meio de contrato de compra e venda, um imóvel rural. Entretanto, durante o processo de execução movido pela família de M.H. contra P, foi penhorado o imóvel. De acordo com M., ao tempo que adquiriram o imóvel, a execução achava-se satisfeita, tanto que o Juízo permitiu a P. que levantasse diferença que lhe coube, não tendo ocorrido fraude à execução. "O casal não tinha ciência da execução, uma vez que a pendência de tal processo nunca foi registrada em cartório pelas credoras e estas não lograram provar, por outros meios, que o casal sabia da existência da demanda executiva", alegou a defesa de M..

De acordo com o raciocínio da família de M.H., o caráter fraudulento da alienação do imóvel viria do fato de que efetuada após o início do processo executivo (a demanda teve início em 16 de outubro de 1988, ao passo que o imóvel foi vendido em 26 de outubro de 1989), e em virtude da venda do bem os executados teriam sido levados à insolvência.

O Juízo de primeiro grau julgou improcedente o pedido, mantendo subsistente a penhora e determinando o prosseguimento da execução. O casal apelou e o Primeiro Tribunal de Alçada Civil do Estado de São Paulo também negou entendendo "caracterização da fraude à execução, pois a alienação se deu após a citação válida do devedor que, com a alienação foi reduzida à insolvência". Inconformado, recorreu ao STJ.

Ao decidir, a ministra Nancy Andrighi ressaltou que a jurisprudência do STJ há muito tempo vem se encaminhando no sentido de que, para a declaração de ineficácia de negócio jurídico em decorrência de fraude de execução, não basta a simples existência da demanda contra o alienante capaz de reduzi-lo à insolvência, é necessário também o conhecimento pelo adquirente de demanda com tal potência. "Em harmonia com diversos precedentes jurisprudenciais, presume-se esse conhecimento se existente o devido registro da ação, penhora ou do arresto no cartório apropriado, ou então se impõe ao credor da execução a prova desse conhecimento", disse a ministra.

No processo em exame, afirmou a ministra Andrighi, é necessário relevar que inexiste qualquer registro, no referido cartório de registro de imóveis, de ação, penhora ou arresto com aptidão para levar o devedor-vendedor à insolvência e as credoras não comprovaram que o casal tinha qualquer conhecimento nesse sentido. Assim, a ministra deu provimento ao recurso para julgar procedente o pedido dos embargos de terceiros e afastar a penhora sobre o imóvel, de forma a privilegiar a necessária segurança que deve permear a celebração de contratos de compra e venda de imóvel. Cristine Genú (61/ 319-6465). Processo:  RESP 439418(Notícias do STJ, 3/10/2003 – STJ: Ausência de conhecimento de demanda pode afastar penhora sobre imóvel).
 



TJ/RS padroniza procedimento para mudança de regime de bens


Buscando uniformizar o procedimento judicial para que não haja prejuízo ao princípio da segurança jurídica, a Corregedoria-geral da Justiça (RS) estabeleceu as regras para a modificação do regime de bens do casamento. A medida considera a permissão de alteração introduzida no atual Código Civil. As diretrizes estão descritas no Provimento no 029/03-CGJ, publicado no Diário da Justiça de 17/9.

De acordo com o instrumento, a transformação do regime deve ocorrer mediante autorização judicial, motivada por pedido voluntário de ambos os cônjuges. Após apuração da procedência das razões do casal será publicado o edital de mudança, com prazo de 30 dias. A publicidade tem o objetivo de salvaguardar os direitos de terceiros.

Pelo regramento, é necessário também que o Ministério Público valide a troca do regime. Determina também que após o trânsito em julgado da sentença, os Cartórios de Registro Civil e de Imóveis, averbem a mudança. Sendo uma das partes empresária, o Registro Público de Empresas Mercantis deverá fazer a anotação da transformação. Por fim, estabelece como competente para a modificação, o Juízo da Vara de Família da respectiva Comarca onde se efetuar a mudança. (TJ-RS)

(Fonte: revista Consultor Jurídico, 2/10/2003: Novo procedimento. Modificação do regime de bens do casamento é padronizada).
 



Custas e emolumentos. Financiamento. COHAB - CDHU. FGTS.


Ementa

O art. 21, §2o da Lei no 8.692/93 foi derrogado pela Lei Geral de Custas. Os Oficiais de Registro de Imóveis do Estado de SP elaborarão os cálculos de custas e emolumentos para o registro e averbação dos contratos integrantes de programas habitacionais (COHAB e CDHU) e os contratos de aquisição imobiliária quando financiados pelo FGTS de acordo com o disposto na Lei Estadual no 11.311/02 (item 1.1 da Tabela II Dos Ofícios de Registro de Imóveis).

Íntegra

Poder Judiciário

Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo

Corregedoria Geral da Justiça

Processo CG no 5.089/2003 (288/03-E)

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

A ARISP – Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo, por seu advogado, pretende reexame da matéria decidida nos presentes autos, argumentando em síntese que o Plenário do Supremo Tribunal Federal apreciando a ADI 1.667-9-DF, em que se discutia a constitucionalidade do §2o do art. 21 da Lei no 8.692/93, com a redação que lhe foi dada pela Lei no 10.150/00, julgou prejudicado o pedido, por entender que a norma foi derrogada por lei posterior, qual seja a Lei 10.169/00. A petição veio acompanhada de cópias de votos mencionados.

É o relatório.

Opino.

Examinando no presente pedido de providência promovido por instituições ligadas a setores da atividade imobiliária, decidida como consulta, concluiu-se pela vigência e eficácia do estabelecido no art. 21, §2o da Lei no 8.692/93, com a redação que lhe foi dada pela Lei 10.150/00, devendo ser observados os limites nele fixados para a cobrança de emolumentos decorrentes do registro e de averbação de contratos de financiamentos para moradia, nas hipóteses previstas.

A matéria, como consignado no parecer acolhido por Vossa Excelência, já fora objeto de apreciação nesta Corregedoria Geral da Justiça, sempre entendendo prevalecer os dispositivos, até porque insertos em lei subjetivamente especial.

A alegação de que ação declaratória de inconstitucionalidade proposta por entidade representativa dos notários e registradores, fora julgada prejudicada por decisão monocrática do eminente ministro relator, foi também enfrentada em várias oportunidades, concluindo-se que por não conter o julgamento apreciação de mérito, além de não proferido pelo órgão colegiado, ressalvado o respeito ao posicionamento adotado na decisão singular, não irradiara eficácia a ponto de gerar vinculação.

O pedido de reexame ora apresentado está calcado em decisão da Plenária do Supremo Tribunal Federal proferida na ação direta de inconstitucionalidade 1.677-9-DF, ajuizada pela Anoreg/BR, relativamente ao art. 21 §2o da Lei no 8.692/93, restando claro o posicionamento do Pleno da Suprema Corte, no sentido de que a Lei no 10.169/00, que expressamente vedou a fixação de emolumentos de registro em percentual sobre o valor dos negócios jurídicos derrogou o dispositivo questionado.

Sem embargo de não ter sido apreciado o mérito da ação direta de inconstitucionalidade, ainda que se pudesse sustentar a não vinculação da decisão que deu por prejudicado o pedido inicial, há que se render à evidência de que os Eminentes Ministros do Supremo Tribunal Federal firmaram entendimento no sentido de que se verificou a derrogação do dispositivo e que, portanto, não pode irradiar efeitos.

O julgamento pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, em que fundamentado o pedido de reexame, deve ser acatado, impondo a reconsideração do posicionamento antes adotado, reconhecendo-se, portanto, a derrogação do art. 21, §2o da Lei no 8.692/93, com a redação decorrente da Lei no 10.150/00. Assim, os contratos integrantes de programas habitacionais (COHAB e CDHU) e os contratos de aquisição imobiliária quando financiados pelo FGTS, terão o cálculo das custas e emolumentos elaborados com observância do disposto na Lei Estadual no 11.311/02 (item 1.1 da Tabela II Dos Ofícios de Registro de Imóveis).

Diante do exposto o parecer que, respeitosamente, submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de, acolhendo o pedido de reexame, reconhecer a derrogação do art. 21, §2o da Lei no 8.692/93, devendo os Oficiais de Registro de Imóveis do Estado elaborarem os cálculos de custas e emolumentos para o registro e averbação dos contratos integrantes de programas habitacionais (COHAB e CDHU) e os contratos de aquisição imobiliária quando financiados pelo FGTS de acordo com o disposto na Lei Estadual no 11.311/02 (item 1.1 da Tabela II Dos Ofícios de Registro de Imóveis).

Sub censura.

São Paulo, 18 de agosto de 2003.

Oscar José Bittencourt Couto
Juiz Auxiliar da Corregedoria
 



Sociedade Limitada. Novas regras exigem reflexão em sucessão patrimonial. - Luciano Amaral Jr.*


O novo Código Civil, ao incluir o cônjuge supérstite na condição de herdeiro legítimo ou necessário do falecido, acenou com interessantes alternativas para o planejamento sucessório patrimonial, especialmente para os casados no regime da comunhão parcial de bens, que é o regime legal brasileiro desde o advento da Lei 6.515 de 26 de dezembro de 1977, e para os casados no regime da separação absoluta de bens.

Neste respeito interessa mais de perto, neste breve comentário, a questão do planejamento sucessório nas Sociedades Limitadas com o objetivo maior de, sendo da vontade dos cônjuges, conservar tanto quanto possível o controle da empresa nas mãos do consorte sobrevivente ao invés de diluí-lo entre filhos e netos, ou mesmo entre pais e avós do falecido.

Isto porque o permissivo da nova lei, de modo geral, tem passado despercebido na comunidade dos empresários, provavelmente em razão de más reminiscências do Código revogado, cujas regras, neste respeito — planejamento sucessório patrimonial entre cônjuges - eram muito rígidas, não dando azo a uma pré-ordenação mais detalhada da sucessão do casal.

Sendo hoje, no entanto, muito mais flexíveis as normas reguladoras da sucessão patrimonial entre os cônjuges, entendemos ser do interesse de todos a prática de alguns exercícios com vistas em melhor entender este tópico, muitas vezes causador de irreparáveis desavenças familiares. Desentendimentos estes, nunca será demais insistir, facilmente evitáveis com a adoção de adequados cuidados estratégicos.

Destarte, vale lembrar que no regime anterior o cônjuge sobrevivente era herdeiro facultativo e nesta condição somente herdaria em não havendo os necessários, tais sejam, parentes da classe dos descendentes ou dos ascendentes. A única forma de obviar tal obstáculo, na lei civil anterior, era incluir o cônjuge entre os herdeiros, através de testamento.

Mesmo assim, registre-se, havia, como ainda há, limitações ao direito de testar. Isto porque havendo herdeiros necessários (ascendentes ou descendentes) o testador está livre para dispor apenas, no máximo, de 50% do seu patrimônio, o que significa que o cônjuge supérstite, quando muito, herdará por força de testamento até o limite de 50% do patrimônio do de cujus.

Suponhamos, para maior facilidade de entendimento a seguinte situação: na vigência do Código Civil revogado, quando do falecimento do marido, sem que houvesse testamento, a mulher somente herdaria na falta de descendentes (filhos e netos) ou de ascendentes (pais e avôs) do falecido. Ou seja, em havendo descendentes ou ascendentes do falecido o cônjuge supérstite (na ausência de testamento) nada herdaria, sujeitando-se, ocasionalmente, a ficar sem meios adequados para a própria sobrevivência.

Nos dias de hoje, no entanto, é possível que o cônjuge disponha de seus bens de maneira mais livre, de forma que parte mais substancial do seu patrimônio, quando do falecimento, seja transmitido ao consorte sobrevivente. A razão disto é que, com o advento do novo Código Civil, profundas alterações foram introduzidas no universo da sucessão patrimonial.

A primeira e talvez a mais importante delas foi ter o novo diploma civil alçado o cônjuge sobrevivente à qualidade de herdeiro necessário do patrimônio próprio deixado pelo finado, desde que tenha sido casado no regime da separação absoluta não obrigatória de bens ou no regime da comunhão parcial de bens.

Assim, nos dias de hoje, na hipótese de falecimento de um dos cônjuges, o sobrevivente, tendo o finado deixado bens próprios, concorrerá em igualdade de condições com os descendentes. Aliás, melhor dizendo, atualmente o cônjuge sobrevivente poderá até concorrer com os descendentes em condições mais vantajosas.

De fato ele concorrerá, como regra, em igualdade de condições com os descendentes do falecido, cabendo a todos iguais quinhões na partilha de bens. No entanto o cônjuge sobrevivente concorrerá em condição mais vantajosa se for ascendente dos herdeiros com quem concorrer, quando então sua quota parte não poderá ser inferior à ¼ da herança.

Assim, se forem quatro os filhos a herança do falecido será dividida em cinco partes iguais entre o cônjuge sobrevivente e os quatro descendentes.

Se, no entanto, o cônjuge sobrevivente for ascendente dos quatro herdeiros (mãe e filhos, por exemplo), a eles caberá a divisão de apenas ¾ da herança, posto que ¼ é a quota mínima, nesta circunstância, do cônjuge sobrevivo.

Note-se, neste particular, que se o falecido não tinha bens particulares - tal como ocorre no casamento no regime da comunhão universal de bens, onde cada um dos cônjuges é titular da metade ideal do patrimônio do casal - o cônjuge sobrevivente não será herdeiro necessário, mas terá assegurado sua meação, isto é a metade dos bens do casal. Meação, como se recorda, não é sucessão.

Em não havendo descendentes - sempre na hipótese do falecido haver deixado bens próprios - o cônjuge sobrevivente concorrerá com os ascendentes, ficando com 1/3 da herança se concorrer com o pai e a mãe do falecido e com a metade da herança se concorrer ou com o pai ou com a mãe do finado ou com o avô do de cujus.

Feitas estas considerações preliminares examinemos a situação hipotética do marido e da mulher sócios em Sociedade Limitada, pretendendo eles que, a após a morte de um deles, o seu controle permaneça o mais concentrado possível nas mãos do sobrevivente.

Em face do Código Civil anterior, havendo herdeiros necessários (ascendentes ou descendentes) o cônjuge sobrevivente estaria excluído da sucessão, salvo se houvesse testamento em seu favor. E mesmo assim - na hipótese de haver testamento - em face das limitações da reserva aos herdeiros legítimos, no máximo 50% dos bens de um cônjuge poderia ser transmitido por sucessão testamentária ao outro.

Supondo-se, para melhor entender, que os únicos bens do marido, em sociedade conjugal com três filhos, no regime do antigo Código Civil, fossem 200 quotas sociais de uma Sociedade Limitada, mesmo havendo testamento em favor do outro cônjuge, o máximo que este receberia por sucessão testamentária seriam 100 quotas sociais eis que as remanescentes 100 quotas teriam obrigatoriamente de ser transmitidas aos filhos, herdeiros legítimos e necessários.

Logo, possuindo o cônjuge sobrevivente, neste cenário, 50% do capital da empresa e os filhos os restantes 50%, o controle da Sociedade Limitada não ficaria nas mãos do sobrevivente. É sabido, em face do novo Código Civil, que a maioria das deliberações sociais, salvo algumas exceções, haverão que ser aprovadas ou por ¾ do capital social ou por ao menos a metade mais um do capital social. Ou seja, o cônjuge sobrevivente, nesta hipótese, teria de se compor, no mais das vezes, com pelo menos um dos filhos herdeiros para fazer aprovar as deliberações sociais.

Não obstante, por força do novo Código Civil, esta situação antes descrita, limitante do exercício do controle societário, pode ser significativamente alterada, se assim for a vontade do casal.

À luz do novo direito, o cônjuge sobrevivente, a mulher na hipótese em exame, passou a ser herdeiro necessário do finado marido, concorrendo obrigatoriamente com os descendentes - 3 em nosso exemplo - tendo hoje assegurada uma participação igual à dos filhos comuns, tal seja ¼ dos bens deixados pelo finado.

Desta combinação de fatores, sendo o cônjuge, herdeiro necessário, também nomeado herdeiro testamentário da totalidade das quotas disponíveis, ou sejam 100 quotas, posto que as restantes 100 constituem a legítima e serão repartidas em partes iguais entre os herdeiros necessários, resulta que o sobrevivo passaria a ser quotista majoritário da Sociedade Limitada, detendo 125 quotas de um total de 200, sendo 100 delas recebidas a título de sucessão testamentária e as restantes 25 em decorrência da sucessão legal, cabendo a cada um dos filhos 25 quotas sociais.

Logo, detendo o sobrevivente mais da metade do capital social, precisamente 62,50% do seu total, terá ele votos suficientes para aprovar toda e qualquer matéria objeto de deliberação societária, excetuadas as previstas nos item V e VI do Artigo 1.071 do Código Civil, ou seja, a modificação do contrato social e a incorporação, a fusão e a dissolução da sociedade ou a cessação do estado de liquidação.

Veja-se, sob este prisma, que se fosse apenas um o descendente, e sendo o sobrevivo herdeiro testamentário de 50% dos bens do de cujus, chegará ele ao controle de ¾ do capital social (100 quotas recebidas através da sucessão testamentária e 50 quotas recebidas através da sucessão legal) o que configurará a maioria qualificada de votos, ensejando a ele o controle quase que absoluto das questões deliberativas.

Logo, fica evidente, em face das novas disposições do Código Civil, a necessidade de maior reflexão por parte dos cônjuges sócios de Sociedades Limitadas em face da estratégia a ser adotada no planejamento sucessório patrimonial, especialmente em uma cultura como a nossa onde a disposição de bens por via de testamento é de estrema raridade.

Embora isto não se refira propriamente à estratégia do planejamento sucessório nas Sociedades Limitadas, os cônjuges, em face da nova lei civil, certamente deverão também começar a levar em conta, entre outras questões, o destino dos frutos das aplicações financeiras feitas pelo casal, com vistas em proporcionar um rendimento adequado após a aposentadoria.

Isto porque com a morte de um deles e a conseqüente divisão dos rendimentos financeiros entre os herdeiros necessários, o cônjuge supérstite pode ver frustradas todas as suas expectativas de uma vida economicamente mais tranqüila na terceira idade.

Vislumbre-se, ilustrativamente, a situação do casado titular de um rendimento mensal de R$ 10.000,00, produto de ativos financeiros, que, com a morte do cônjuge, tem o benefício reduzido, por falta de planejamento sucessório, para ¼ do total em face da sucessão mortis causa.

Mais um motivo, portanto, para que o planejamento sucessório passe a ser conveniente sopesado por todos aqueles que dispõem de patrimônio, com vistas em evitar dissabores futuros facilmente contornáveis. (Revista Consultor Jurídico, 25/9/2003).

* Luciano Amaral Jr. é mestre em Direito pela PUC-SP, advogado em São Paulo, especializado em consultoria empresarial.
 



As associações e o novo Código Civil - Graciano Pinheiro de Siqueira*


Dispõe o artigo 53 da lei 10.406, de 10 de janeiro de 2.002 (NCC), que “constituem-se as associações pela união de pessoas que se organizem para fins não econômicos”.  Esse conceito, agora legal, incorporou o pensamento da doutrina, que definia a associação como sendo a sociedade civil sem fins lucrativos, à época em que vigorava o Código Civil de 1916, que, aliás, não fazia qualquer distinção entre sociedade e associação.

De acordo com o novo codex, a associação, a sociedade simples ou empresária e a fundação são espécies do gênero pessoas jurídicas de direito privado (artigo 44), sendo que a aquisição da personalidade jurídica se dá com o registro de seus atos constitutivos –  estatuto ou contrato social – no órgão de registro público competente, qual seja, o registro civil das pessoas jurídicas, em se tratando de associação, fundação e sociedade simples, e o registro público de empresas mercantis, a cargo da junta comercial, em se tratando de sociedade empresária. Ver, sobre o tema, especialmente o disposto nos artigos 45, 985 e 1.150 do NCC; os artigos 114 a 121 da lei 6.015, de 31/12/73 (LRP); e, a lei 8.934, de 18/11/94, que dispõe sobre o registro público de empresas mercantis e atividades afins, regulamentada pelo decreto 1.800, de 30/1/96.

Segundo Darcy de Arruda Miranda, “a associação propõe-se a outras finalidades que não as econômicas ou, quando visa vantagens materiais, elas não se destinam precipuamente aos seus associados. Colima objetivos altruístas, morais, religiosos, de interesse geral, em benefício de toda a comunidade ou de parte dela e não dos sócios particularmente”. Daí diferenciar-se da sociedade que, segundo a regra do artigo 981 da nova legislação civil pátria, consiste na união de pessoas (físicas e/ou jurídicas) que, reciprocamente, se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilhar, entre si, os resultados. A sociedade, seja simples, seja empresária, procura alcançar lucros e distribuí-los entre seus sócios. É constituída por pessoas que se reúnem com o objetivo de conseguir para si benefícios materiais, de modo que, por sua finalidade, tem caráter privado e as anima um interesse econômico particular.

A associação não pode ter proveito econômico imediato, o que não impede, contudo, que determinados serviços que preste sejam remunerados e que busque auferir renda para preenchimento de suas finalidades.

Enfim, qualquer atividade lícita, sem intuito econômico e que não seja contrária, nociva ou perigosa ao bem público, à segurança do Estado e da coletividade, à ordem pública ou social, à moral e aos bons costumes pode ser buscada por uma associação.

A propósito, cabe aqui observar que a Constituição federal de 1988, ao dispor sobre as associações, estabelece que: a) é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar (artigo 5o, XVII); b) a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento (artigo 5o, XVIII); c) as associações só poderão ser compulsoriamente dissolvidas ou ter suas atividades suspensas por decisão judicial, exigindo-se, no primeiro caso, o trânsito em julgado (artigo 5º, XIX); d) ninguém poderá ser compelido a associar-se ou permanecer associado (artigo 5o, XX); e, e)  as entidades associativas, quando expressamente  autorizadas, têm legitimidade para representar seus filiados judicial ou extrajudicialmente (artigo 5o, XXI).

No NCC, por sua vez, a matéria sobre associações é tratada, ferindo, inclusive, o princípio da ampla liberdade de associação consignado na CF, basicamente, em seus artigos 44, 46 e 53 a 61, destacando-se, dentre eles, os artigos 54, 55, 59 e seu parágrafo único, 60 e 61.

Pela regra do artigo 54, o estatuto das associações deverá conter, sob pena de nulidade, os seguintes itens: I- a denominação, os fins e a sede da associação; II- os requisitos para a admissão, demissão e exclusão dos associados; III- os direitos e deveres dos associados; IV- as fontes de recursos para sua manutenção; V- o modo de constituição e funcionamento dos órgãos deliberativos e administrativos (conselho deliberativo, conselho fiscal, diretoria, etc.); e, VI- as condições para a alteração das disposições estatutárias e para a dissolução.

No tocante à exclusão, esta só será admissível havendo justa causa, obedecido o disposto no estatuto; sendo este omisso, poderá também ocorrer se for reconhecida a existência de motivos graves, em deliberação fundamentada, pela maioria absoluta dos presentes à assembléia geral especialmente convocada para esse fim (art.57). Da decisão do órgão que, de conformidade com o estatuto, decretar a exclusão, caberá sempre recurso à assembléia geral (parágrafo único do art.57). De qualquer modo, é fundamental que o associado que se pretende excluir tenha ampla defesa.

O artigo 55, por sua vez, estabelece que todos os associados devem ter iguais direitos, mas o estatuto poderá instituir categorias com vantagens especiais. Discute-se, por exemplo, em razão desse dispositivo, se todos os associados devem ter direito a voto. Há quem entenda que sim e há quem entenda que não, principalmente se se tratarem de pessoas agraciadas, pela associação, com o título de associados “honorários” ou “beneméritos”, os quais, em regra, não contribuem pecuniariamente com a mesma. Parece-me justo que somente tenham direito a voto aqueles associados que, de modo efetivo e diretamente, contribuam, por qualquer forma, para com a entidade.

Já o artigo 59 traz uma importante novidade ao determinar que compete privativamente à assembléia geral eleger e destituir administradores, aprovar as contas e alterar o estatuto. Trata-se, segundo Sílvio de Salvo Venosa, de um princípio cogente, de ordem pública, que não admite disposição em contrário pela vontade privada. Para ele, “tudo é no sentido da obrigatoriedade ou imperatividade dessa norma, tendo em vista o advérbio peremptório privativamente colocado no caput. O legislador não deixou dúvida a esse respeito”. Assim sendo, para o citado jurista, aquelas associações, mormente clubes sociais e esportivos que sempre elegeram os diretores por meio indireto, através de um Conselho ou órgão assemelhado, não mais poderão fazê-lo. As eleições deverão ser sempre diretas.  Com isso, evitar-se-á que  apenas alguns poucos sócios detenham o poder, eternizando-se nos cargos que ocupam dentro da entidade,  impedindo a renovação e o surgimento de novas lideranças. É inegável que o dispositivo contém importantíssima e salutar inovação no direito associativo, que certamente implicará em alteração de atitude de grande número de associações no país.       

Há quem sustente, entretanto, que a assembléia geral, como órgão soberano que é, poderia delegar os poderes que lhe são conferidos, pela lei ou pelo estatuto, a qualquer outro órgão da entidade. Neste caso, o conselho deliberativo, por exemplo, que também seria eleito pela assembléia geral, poderia eleger, por delegação desta, a diretoria. Dessa forma, ficaria preservado o direito dos associados de decidir livremente sobre o processo de administração mais conveniente aos interesses da entidade, preferindo a eleição indireta de seus diretores.

Para a destituição de administradores e alterações de estatuto o novo Código exige a presença da maioria absoluta dos associados para deliberação em primeira convocação e de um terço dos associados nas convocações seguintes, com aprovação por dois terços dos presentes (parágrafo único do artigo 59). Isso significa que um número mínimo de associados deverá participar da votação para que a decisão seja legítima, o que, na prática, poderá, de um lado, inviabilizar as atividades de associações com grande número de participantes, como os clubes, por exemplo, que terão dificuldade para reunir milhares de associados para votar.

De outro lado, porém, impedir-se-á que assuntos fundamentais para a vida da entidade sejam tratados por um número reduzido de associados, muitas vezes com interesses pessoais acima dos sociais.  A norma inserida no parágrafo único do art. 59 não especifica, contudo, o quorum necessário para a eleição de administradores e aprovação de contas, deixando a cargo do estatuto tal determinação.

O artigo 60 trata das convocações das assembléias gerais. A novidade aí é a garantia concedida a um quinto dos associados de as convocar.

Pela regra do artigo 61, tem-se que, uma vez dissolvida a associação, o remanescente do seu patrimônio líquido, depois de deduzidas, se for o caso, as quotas ou frações ideais de que o associado for titular, será destinado à entidade de fins não econômicos designada no estatuto, ou, omisso este, por deliberação dos associados, à instituição municipal, estadual ou federal, de fins idênticos ou semelhantes. Por cláusula do estatuto ou, no seu silêncio, por deliberação dos associados, podem estes, antes da destinação do remanescente acima referido, receber em restituição, atualizado o respectivo valor, as contribuições que tiverem prestado ao patrimônio da associação. Não existindo no Município, no Estado, no Distrito Federal ou no Território, em que a associação tiver sede, instituição nas condições indicadas, o que remanescer do seu patrimônio, se devolverá à Fazenda do Estado, do Distrito Federal ou da União. Observe-se que, atualmente, não existe, no Brasil, nenhum Território.

Finalmente, observe-se que o parágrafo único do artigo 44 do NCC introduziu uma interessante inovação, consistente na possibilidade de aplicação das disposições concernentes às associações, subsidiariamente, às sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial do Código (sociedade simples, sociedade em nome coletivo, sociedade em comandita simples, sociedade limitada, sociedade anônima, sociedade em comandita por ações e sociedade cooperativa). Tal regra, entretanto, a meu ver, terá pouca ou quase nenhuma aplicabilidade, já que os tipos societários retro mencionados têm suas normas próprias, devendo, nas omissões, seguir, por indicação da própria lei, as disposições de outro tipo societário. É o caso, por exemplo, da sociedade limitada, que é regida pelos artigos 1052 a 1089 da lei 10.406/2002, e que, nos casos omissos, socorrer-se-á dos dispositivos da sociedade simples pura (artigo 1053 do NCC), previstos nos artigos 997 a 1038 da mesma lei, ou, então, das regras da lei 6404/76 (Lei da S.A.), se assim determinar o contrato social (parágrafo único do citado artigo 1053).

*Graciano Pinheiro de Siqueira é especializado em Direito comercial pela faculdade de Direito da USP e substituto do 4o Oficial de Registro de Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica de São Paulo, capital: [email protected]



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