BE837
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Custas e emolumentos – isenção – ANATEL – agência reguladora. Autarquia federal. Emolumentos – taxa.
1. O valor cobrado pelas serventias extrajudiciais, a título de custas, emolumentos e contribuições, possui natureza tributária, se ajustando à forma vinculada de oneração fiscal, tipificando verdadeira taxa de serviço.
2. As imunidades conferidas aos Entes Públicos, inclusive às Autarquias, dizem respeito apenas aos impostos (art. 150, inciso IV, da Constituição), não se expandindo ou atingindo as taxas.
3. As Leis Federais (v.g. Lei 9.028/95 e MP 2.180-35/2001) não têm aptidão para instituírem isenção sobre tributo estadual, por afronta direta ao princípio federativo, que não comporta tergiversação ou abrandamento de seu conteúdo.
4. O direito da ANATEL se circunscreve a isenção da parcela que toca ao Estado e aos fundos específicos. Deve recolher o correspondente valor dos emolumentos, sobre o fundo destinado ao judiciário e sobre as contribuições.
Processo nº: 000.02.199032-8
Vistos, etc...
Cuida-se de procedimento administrativo provocado pelos Oficiais de Registro de Títulos e Documentos e Civil, que apresentam postulação da ANATEL – AGÊNCIA NACIONAL DE TELECOMUNICAÇÕES, que invoca direito à ISENÇÃO das custas, emolumentos e contribuições.
A ANATEL, por seu turno, sustentou que possui direito à isenção decorrente do art. 2º da Lei 4.476/84, o qual se encontra perfeitamente ajustado aos padrões do art. 236 da Constituição Federal.
Intervindo no feito, a FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO esclareceu que não existe qualquer fundo ou provisão para que o Estado responda por isenções ou por reduções tributárias.
É o relatório.
DECIDO:
Trata-se de consulta formulada com esteio no art. 9º., da Lei Estadual 4.476/84, combinado com o disposto no art. 29, da Lei Estadual 11.131/02, [sic. O correto seria Lei Estadual 11.331/02] que franqueia aos Oficiais Registradores postulação tendente a aclarar, esclarecer e declarar dúvidas sobre o exato valor e forma de recolhimento das custas, emolumentos e contribuições pelos usuários dos serviços extra-judiciais.
No caso a consulta considerou a situação da ANATEL, que cumprindo desígnios de "agência reguladora", se encontra constituída sob a forma de Autarquia Federal. Entende e postula a Autarquia Federal, o reconhecimento do seu direito à ISENÇÃO, na forma apresentada e contemplada pelo art. 2º., da Lei 4.446/84.
É de se observar que a ANATEL na condição de AGÊNCIA REGULADORA, deve cumprir desígnios específicos, FAZENDO o exato LIAME entre os usuários dos serviços públicos de telefonia e a concessionária. Em tal mister deve desempenhar funções de NORMATIZAÇÃO, TARIFAÇÃO e FISCALIZAÇÃO, nesta incluída a indeclinável tarefa de estruturação de seu contencioso administrativo. Desempenhando funções TÉCNICAS, deveria a ANATEL ter seus quadros internos preenchidos por CONCURSO público, que é a forma constitucional de se conferir isenção para desempenho de funções públicas, contudo sua lei instituidora, copiando modelo Norte-Americano que não se ajusta a nossa realidade jurídica, estabeleceu uma forma de contratação por indicação, para cargos desempenhados por MANDATO. Tal desvio já foi detectado e declarado pela mais alta Corte de Justiça do país, contudo a irregularidade subsiste.
A ANATEL, na condição de ente Autárquico, ostenta a condição de AUTARQUIA ESPECIAL, não por uma excepcional outorga, mas apenas por desenvolver atribuições diferenciadas, não realizando SERVIÇOS ou OBRAS PÚBLICAS, como normalmente atuam tais entidades da Administração descentralizada, mas cumprindo desígnios distintos, procedendo a um mero CONTROLE dos prestadores de serviço público concedidos. Destarte, de ESPECIAL a ANATEL tem apenas as suas peculiares atribuições, não ostentando qualquer prerrogativa, qualquer direito, qualquer privilégio extravagante ou extraordinário.
Lançadas tais considerações, é de se frisar que o valor cobrado pelas SERVENTIAS EXTRAJUDICIAIS, a título de custas, emolumentos e contribuições, possui insuperável natureza tributária, se ajustando à forma VINCULADA de oneração fiscal, mais precisamente, tipificado verdadeira TAXA de serviço.
A mais alta Corte de Justiça do país, na ADIN 1378-5, proclamou e patenteou esta natureza jurídica, não cabendo mais qualquer indagação, qualquer dúvida no que tange a seu exato enquadramento jurídico. Portanto, não há mais dúvidas ou questões no que se refere à definição ou delimitação da NATUREZA JURÍDICA da cobrança das custas, emolumentos e contribuições feita pelas serventias extra judiciais.
Denominar a cobrança de EMOLUMENTOS, em absoluto atende ou responde a questão jurídica, na medida em que o termo EMOLUMENTOS não encerra, como seria de rigor, qualquer INSTITUTO JURÍDICO, não enfeixando a necessária malha de obrigações e deveres que deve acompanhar e amoldar todas as COBRANÇAS COERCITIVAS ou IMPOSITIVAS.
Também o enquadramento como PREÇO PÚBLICO, se mostra deficiente, na medida em que a exigência não tem caráter CONTRATUAL, posto inexistir qualquer manifestação volitiva, mormente no que afeta a área REGISTRAL. Como é sabido, o "preço público" encerra uma cobrança decorrente de um ajuste ou acerto de vontades, entre o prestador de serviço e o usuário, o que não ocorre na espécie.
Assim, absolutamente inconteste o enquadramento conferido pelo SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL a esta modalidade de cobrança.
Ademais, as DECLARAÇÕES DE INCONSTITUCIONALIDADE, proclamadas por "ação" podem, de certa maneira, vincular todos os demais TRIBUNAIS e instâncias, na forma como é exigido nas ações declaratórias de constitucionalidade (§ 2º, inciso III, do art. 102). Ademais, como anotado, não haveria qualquer outro INSTITUTO JURÍDICO a albergar tal cobrança, conquanto não existe em nosso ordenamento jurídico "instituto" que discipline e preveja os mecanismos de "emolumentos", representando este, mero nome sem conteúdo jurídico definido. Frise-se, em compasso com o entendimento da mais Alta Corte de Justiça do país, que não se pode admitir, em Direito Público, qualquer imposição que não esteja escorada em "instituto" bem delineado e adequadamente estruturado.
Tratando-se de TAXA, certo é que sua cobrança deve seguir padrões bem definidos e restritivamente delineados na CARTA POLÍTICA.
As "taxas", cobradas e exigidas em decorrência da prestação de um SERVIÇO PÚBLICO específico e divisível, devem ser dimensionadas em atenção aos custos e despesas envolvidas na própria prestação de serviço.
Há uma correlação necessária entre o valor da base de cálculo da "taxa de serviços", e o valor ou custo ou dos dispêndios do serviço. Este liame não pode ser desfeito ou desconsiderado pela LEGISLAÇÃO INFRA-CONSTITUCIONAL, posto que marca e estrutura o próprio instituto desenhado na Carta Política.
Tal peculiaridade impede que um USUÁRIO pague TAXA de valor maior ou dissociado do custo do SERVIÇO. A legislação que institui o serviço deve quantificar o valor exigido, em respeito à esta "equação" ( - custo dos serviços, mais acréscimos pertinentes como investimentos peculiares a este = valor da taxa - ).
Os chamados tributos VINCULADOS, se encontram direta e umbilicalmente atrelados ao princípio da "isonomia" entre contribuintes. Todo usuário e contribuinte deve responder pelos "CUSTOS" próprios e divisíveis do serviço que lhe é disponibilizado ou efetivado. Nada mais do que isto.
Flagrante, destarte, que as TAXAS não se afeiçoam a qualquer mecanismo configurador de PARAFISCALIDADE, tal como a "progressividade" de alíquotas, redução de base de cálculo, ou qualquer outra forma de cobrança que exija e imponha certo "desnivelamento" entre os contribuintes ou usuários.
Destarte, como um contribuinte ou USUÁRIO não pode pagar pelo "custo ou serviço" de outro usuário, em respeito ao padrão constitucional, impróprio seria o emprego de qualquer mecanismo de ajuste ou compensação entre os contribuintes (um usuário pagando por parcela do serviço prestado a outro).
Também as desonerações, como isenções, reduções e gratuidades, não podem ferir esta regra isonômica. O custo das isenções não pode ser repassado para outros USUÁRIOS ou outros CONTRIBUINTES. A CONSTITUIÇÃO assegura a cada contribuinte o DIREITO de pagar apenas pelos CUSTOS do serviço específico e divisível a ele prestado pelo PODER PÚBLICO, CONCESSIONÁRIO ou DELEGADO.
Reforçando a dicção constitucional, a Lei Federal nº 10.169/2000, que ostenta nítido caráter de REGRA GERAL, exige em seu artigo 1º, parágrafo único, respeito a tal desiderato, estabelecendo que "o valor fixado para os emolumentos deverá corresponder ao efetivo custo e à adequação e suficiente remuneração dos serviços prestados", deixando bem evidente e patenteado que eventual "isenção" concedida a um usuário não pode ser repassada para outros usuários.
Desta forma, as ISENÇÕES concedidas não são cobertas pelos valores cobrados aos demais USUÁRIOS. Isto indica e significa que a ISENÇÃO deve ser custeada por FUNDO ESPECIAL, criado para tal propósito e finalidade, posto que a EQUAÇÃO criada pela LEI ORDINÁRIA instituidora da cobrança, responde apenas pelo cálculo direito (CUSTO DO SERVIÇO = TAXA).
Como se trata de COBRANÇA DELEGADA a particular, nos termos do art. 236 da Constituição Federal, evidente que o PODER que instituiu a cobrança deve criar o "fundo" ou qualquer mecanismo de COMPENSAÇÃO.
Fosse cobrança realizada diretamente pelo PODER PÚBLICO, tais isenções e reduções se compensariam automaticamente pelo mecanismo contábil interno. Entretanto, cuidando-se de exigência feita por DELEGADOS que PRIVADAMENTE exploram e realizam o serviço público, a compensação não se opera automaticamente.
A situação, portanto, exige que se aceite ou se crie instrumentos para que este ajuste se materialize, mediante a criação de FUNDO PRÓPRIO, ou para que seja admitido formas de compensação, pois todas as desonerações devem ser custeadas pelo ESTADO.
Destaque-se, outrossim, que as IMUNIDADES conferidas aos Entes Públicos, inclusive às Autarquias, dizem respeito apenas aos IMPOSTOS (art. 150, inciso IV, da Constituição), não se expandindo ou atingindo as TAXAS.
Pois bem, na composição dos valores exigidos pelos REGISTRADORES e NOTÁRIOS, parte é destinada ao ESTADO (cerca de aproximadamente 32% é destinada a diversos fundos - que em verdade deveriam ser destinados ao Judiciário, pelo exercício do controle e fiscalização permanente por suas Corregedorias). Afora este valor a LEI ESTADUAL prevê a parte que toca diretamente aos serventuários extrajudiciais e a parcela da contribuição, destinada a compor fundos para o custeio dos inativos.
Em especial a parte que toca aos notários e registradores, encontra escora constitucional, de tal forma que não pode ser EXCLUÍDA ou DESONERADA sem a previsão imediata e completa de mecanismo de COMPENSAÇÃO.
Nesta conformidade as ISENÇÕES conferida às AUTARQUIAS, em especial à ANATEL, possuem direta e imediata aplicação na parte que toca ao ESTADO e demais FUNDOS estranhos e dissociados com a prestação de serviço. Contudo, para ser efetivada sobre as demais verbas (emolumentos e contribuições, que compõe parte intrínseca da taxa), depende de previsão de compensação, sob pena de afronta aos padrões constitucionais.
Destaque-se que a Lei de Responsabilidade Fiscal conferiu uma nova noção, um novo padrão acerca das REGRAS ORÇAMENTÁRIAS. Exigiu a materialização de direta contrapartida, para qualquer tipo de gastos ou despesas, impedindo, destarte, os "devaneios administrativos" em prejuízo dos fundos públicos, instaurando uma idéia própria e justa do que deve ser entendido por RESPONSABILIDADE FISCAL.
Esta noção não pode deixar de participar do contexto da presente discussão, posto que não se pode exigir que os NOTÁRIOS e REGISTRADORES, sem previsão de recomposição de seus custos e despesas, arquem com uma gama bastante elevada e "indeterminada" de serviços, como se estes dispusessem de outras fontes ou fundos.
Se eventualmente os NOTÁRIOS e REGISTRADORES estão conquistando ganhos superiores ao que seria o necessário para a recomposição de seus custos e seus gastos com a prestação do "serviço público", a LEI instituidora da TAXA, deve ser repensada e remodelada, para que o USUÁRIO, que é a preocupação maior do Poder Público, não seja injustamente desfalcado de seus recursos e suas economias. A correção neste caso deve seguir o caminho político.
Contudo eventual desacerto da EQUAÇÃO arquitetada com a TABELA legal, não autoriza, em contrapartida, que se desfalque e mutile os serviços, através de ISENÇÕES INOPERANTES e INCONSTITUCIONAIS.
Toda isenção conferida pelo ESTADO, deve vir acompanhada do respectivo FUNDO (custeados pelos impostos), recompondo o desfalque, sem o que, a isenção ou redução não pode operar efeitos.
Quanto às Leis Federais (Lei 9.028/95 e MP 2.180-35/2001), estas não tem aptidão para instituírem ISENÇÃO sobre TRIBUTO ESTADUAL, por afronta direta ao princípio FEDERATIVO, que não comporta tergiversação ou abrandamento de seu conteúdo. O Pretório Excelso em recente ADIN proclamou que tais normas editadas pelo CONGRESSO NACIONAL, somente podem influir na legislação Estadual como NORMAS GERAIS, sem aptidão para deflagrar isenções.
Aliás sublinhe-se que não foi sem comemoração que se apagou, na Carta Constitucional de 1988, os últimos resquícios de aviltamento das autonomias dos ENTES FEDERADOS, obstruindo-se a FÓRMULA anteriormente franqueada, que possibilitava a concessão de isenção pela União, através de lei complementar, de tributos Municipais. Não há, sob a égide de nossa Constituição de 1988, qualquer possibilidade de manipulação, pela UNIÃO, de tributos Estaduais ou Municipais, de forma que as leis federais invocadas, se mostram inoperantes e impróprias para isentar ou reduzir o valor de tributo ESTADUAL.
Por fim, para que a questão não resultasse restrita, foi intimada a PROCURADORIA GERAL DO ESTADO, que se manifestou nos autos, destacando que não existe qualquer fundo ou forma de compensação das isenções da TAXA EXTRAJUDICIAL, de forma que os ENTES PÚBLICOS isentos, devem ser agraciados apenas com a parte que toca ao próprio ESTADO, até porque, se trata de verba de aparência inconstitucional.
Como sublinhado, não se pode cobrar TAXA por serviço não prestado, e o EXECUTIVO ESTADUAL, que recebe parcela significativa do valor cobrado aos USUÁRIOS dos serviços extra-judiciais, não realiza QUALQUER serviço, nem tampouco a FISCALIZAÇÃO, que fica a cargo do Poder Judiciário, de forma que o valor que recebe se mostra indevido. Poderia, em hipótese, ser caracterizado como IMPOSTO, contudo tal configuração não ajudaria ou faria superar a aparente INCONSTITUCIONALIDADE, na medida em que os ESTADOS-MEMBROS não receberam ou dispõem de "competência tributária" para tal imposição (os Estados não dispõem da competência RESIDUAL somente outorgada à UNIÃO).
O MINISTÉRIO PÚBLICO deve ser chamado para fiscalizar tal anomalia, em defesa dos "consumidores - usuários" deste serviço, estudando o aforamento de ação de inconstitucionalidade contra a parte da LEI estadual que destina ao EXECUTIVO ESTADUAL parcela que não corresponde ou diz respeito ao CUSTOS do serviço (emolumentos) ou aos serviços de fiscalização e controle (exercido pelo Judiciário), composta pelo valor destinado ao ESTADO DE SÃO PAULO, AO PROGRAMA DO CENTRO DE REFERÊNCIA E APOIO À VÍTIMA E AO PROVITA – PROGRAMA DE PROTEÇÃO A TESTEMUNHA DO ESTADO DE SÃO PAULO e ao CUSTEIO DOS ATOS GRATUITOS DO REGISTRO CIVIL (que também é custo do Estado e não dos Usuários).
Esta parcela que toca ao EXECUTIVO, portanto, não sendo custo (não sendo TAXA), não compondo a equação (custo dos serviços – cobrança da taxa), não necessita de FUNDO DE COMPENSAÇÃO, de forma que nesta parte a ISENÇÃO pode operar efeitos, visto que, enquanto não declarada a INCONSTITUCIONALIDADE da cobrança da LEI ESTADUAL "por ação", o valor deve ser cobrado e exigido. Apenas aos detentores de ISENÇÃO é que deve ser franqueado a desoneração no que é permitido e factível, que é unicamente a parte que não compõe os custos do serviço público.
Destarte, a ANATEL, na condição de AUTARQUIA ESPECIAL, poderá se beneficiar de isenção parcial, limitada às verbas que prescindem de COMPENSAÇÃO ou da criação de FUNDO PRÓPRIO.
Ante o exposto, declaro que o direito da ANATEL se circunscreve a ISENÇÃO da parcela que toca ao ESTADO e aos FUNDOS específicos. Deve recolher o correspondente valor dos "emolumentos", sobre o "FUNDO DESTINADO AO JUDICIÁRIO" e sobre as CONTRIBUIÇÕES. Cientifiquem-se os consulentes e a ANATEL. Dê-se vista ao MINISTÉRIO PÚBLICO, também para estudo e análise do aforamento de ação direta de inconstitucionalidade, se o caso.
P.R.I.C.
São Paulo, 12 de Agosto de 2003.
Venício Antonio de Paula Salles
Juiz de Direito Titular
NE: sentença extraída diretamente do sistema do TJSP em 18/9/2003.
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