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Igreja católica – personalidade jurídica - João Baptista Galhardo
No Boletim Eletrônico #507, de 28/6/2002, publicamos interessante sentença, de lavra do magistrado Sérgio Araújo Gomes, então judicando na comarca de Serra Negra (SP), enfrentando o problema da personalidade jurídica da Igreja Católica Apostólica Romana.
Retomando o tema, o registrador araraquarense e Secretário Geral do Irib, João Baptista Galhardo, ofertou ilustrado parecer em processo administrativo que teve curso pela Corregedoria-Permanente daquela comarca e cujo desenlace abraçou as teses esposadas pelo registrador paulista.
Publicamos abaixo seu parecer, com os agradecimentos pela colaboração (SJ).
Processo 09/2003 - Corregedoria Permanente
Meritíssimo Juiz:
A requerente quer que se averbe na margem da transcrição número 23.434, que a proprietária Fábrica da Igreja Matriz de Araraquara teve sua razão social alterada para Mitra Diocesana de São Carlos (fl.02).
Concordo que se faça uma averbação, mas de outra forma e por razões diferentes:
A Igreja tem personalidade jurídica. Reconhecida até mesmo pelo Decreto n. 119-A, de 7 de janeiro de 1890 (art. 5o)do Governo Provisório da República do Brasil.
Fábrica da Igreja deve ser entendida como o conjunto de bens destinado a dar renda para a sua manutenção.
E fabriqueiro seria o encarregado de receber as rendas da Fábrica de uma Igreja e de cuidar das suas alfaias, paramentos e administração.
Muitos imóveis foram adquiridos ou recebidos em doação e transcritos em nome da Fabrica da Igreja tal, Igreja de Bom Jesus, Paróquia de Santa Terezinha, Mitra Diocesana, Diocese tal, Arquidiocese, Nosso Senhor do Bonfim, Nossa Senhora da Aparecida e em nome de alguns Santos.
A própria Igreja criou essa confusão, que ainda persiste em registros imobiliários, mas que deve ser analisada para o adequado entendimento.
Seja qual for daqueles nomes que estiver no registro imobiliário, deve ser entendido como bem imóvel da Diocese do território onde se encontra, porque a intenção (e a vontade das partes deve ser respeitada) foi receber em doação ou adquirir em nome da Igreja Católica Apostólica Romana.
Assim, Igreja, Paróquia, Fábrica, devem ser entendidas como extensões da Diocese à qual estão subordinadas dentro da respectiva circunscrição territorial. São comunidades de fiéis, constituídas estavelmente na Igreja, ao cuidado pastoral de um pároco, sob a autoridade do Bispo Diocesano, conforme Código Canônico (Cân. 515, § 3o).
E a Diocese, que é uma circunscrição territorial administrada eclesiasticamente, é prolongamento ou a longa manus da Cidade do Vaticano, que é um Estado Soberano. Pessoa Jurídica de Direito Público Externo.
Esse Estado desconcentra a sua administração através das suas dioceses, que são criadas, separadas, fundidas ou extintas através de Bula Papal.
Desta forma todos os imóveis da Igreja Católica Apostólica Romana, dentro de um determinado território, mesmo em nome de “Paróquia”, “Igreja”, “Fábrica”, “Santo”, pertencem, ipso jure, à respectiva Diocese que por sua vez representa a Santa Sé, cuja Carta Magna é o Código de Direito Canônico (Codex Iuris Canonici). Tanto é que o Padre não pode alienar ou onerar bens móveis ou imóveis paroquiais sem autorização expressa da respectiva Diocese, porque age em nome desta.
Bom também esclarecer que a discrepância na nomenclatura utilizada para Arquidiocese, Diocese ou Mitra Diocesana é irrelevante, uma vez que todas essas expressões têm um sentido único, referindo-se à mesma entidade. Referem-se à Diocese criada e delimitada por aquele decreto do Sumo Pontífice.
Afere-se, por tudo, que a personalidade jurídica da Diocese é de Direito Público. A Igreja é entidade eclesiástica, mas com personalidade jurídica de Direito Público em razão, principalmente, do Estado Soberano que representa. Não é associação, sociedade, fundação e muito menos empresa. Nem associação religiosa. Dispensável o seu registro como pessoa jurídica de direito privado. Segue regras do Direito Canônico. A CNBB, por exemplo, é uma associação de Direito Privado, mas a Igreja Católica é de Direito Público, embora especial, ou sui generis.
Desta forma não há que se falar em “alteração da razão social” como pedida. A Igreja não tem e nunca teve razão social. Nem mesmo pela circunstância de estar obrigada a ter CNPJ, exigência, hoje, para todas as pessoas jurídicas, de Direito Privado ou de Direito Público. A Igreja da Matriz de Araraquara, não passou a se denominar Mitra Diocesana de São Carlos, nem esta alterou a sua denominação. Cada uma continua no seu lugar e com o respectivo nome.
A Diocese de São Carlos foi criada em 1908 (fl.18/33) abrangendo Araraquara, onde se situa o imóvel adquirido em 1924, pela transcrição 23.434, em nome da Fábrica da Igreja Matriz de Araraquara, pertencendo, a propriedade, portanto, à Mitra Diocesana de São Carlos ou Diocese de São Carlos.
Portanto, concordo com o pedido, mas de outra forma – o que não altera a pretensão. Que se averbe na mencionada transcrição, nos termos do artigo 246 da Lei 6015/73, que a titular daquela aquisição é a Mitra Diocesana de São Carlos, entidade religiosa, com sede em São Carlos, na rua 9 de Julho, n. 1529, portadora do CNPJ n. 45.356.292/0001-38.
Este o parecer que submeto à censura do digno Representante do Ministério Público e Curador dos Registros Públicos e dessa Egrégia Corregedoria-Permanente. E também ao digno e ilustre pároco subscritor da petição inicial.
Araraquara, 06 de março de 2003.
João Baptista Galhardo
1o Oficial de Registro de Imóveis
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