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Imóveis rurais, Lei 10.267/2001 e Decreto 4.449/2002 na berlinda. - Irib participa de Audiência Pública na Câmara Federal.


No dia 8/4/2003, o Presidente do Irib participou de importante evento em Brasília, mais precisamente na Câmara Federal, onde, a convite dos Srs. Deputados, respondeu a várias dúvidas e expôs à seleta e atenta platéia os problemas que atualmente afetam os registradores, especialmente na interpretação e cumprimento da novel Lei 10.267/2001, Decreto 4.449/2002 e normas baixadas pelo Incra.

O debate estendeu-se por toda a tarde envolvendo autoridades governamentais, parlamentares, ruralistas e juristas especialmente interessados na questão agrária.

O Departamento de taquigrafia, revisão e redação - Núcleo de Redação Final em Comissões - reduziu as manifestações em texto cuja redação final apresentamos aos nossos leitores.

A AP foi proposta pelo Dep. Nelson Marquezelli (SP) na Comissão de Agricultura e Política Rural da Câmara Federal (Audiência Pública N°: 0236/03), tendo início às 14h29min e término às 17h10min, com duração total de 02h41min.

Os convidados participantes da audiência foram:

LUIZ ALFEU MOOJEN RAMOS - Representante da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil — CNA.

HILÁRIO GOTTSELIG - Secretário-Geral da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura — CONTAG.

PETRUS EMILE ABI-ABIB - Diretor-Executivo do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária — INCRA.

SEBASTIÃO AZEVEDO - Procurador-Geral do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis — IBAMA.

Selecionamos a parte da manifestação do Presidente do Irib, disponibilizando aos interessados o inteiro teor da transcrição aqui.

Presidente do Irib depõe em Brasília

SÉRGIO JACOMINO - Presidente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil — IRIB.

O SR. SÉRGIO JACOMINO – Boa-tarde a todos. Sr. Presidente, Deputado Nelson Marquezelli, Srs. Deputados, Srs. Expositores, senhoras e senhores. Acompanhei atentamente a manifestação dos meus colegas e verifiquei que, em grande parte, os debates e as manifestações consumiram-se na questão da ratificação de títulos de imóveis na faixa de fronteira.  

Permito-me fazer um desvio do eixo, porque está dentro das atribuições dos registradores imobiliários do Brasil aplicar concretamente os preceitos da Lei nº 10.267, de 2001, e do Decreto nº 4.449, de 2002.  

O IRIB teve a honra de ter sido convidado, de maneira informal, pelo INCRA a participar das discussões que se faziam, nos idos de 1999, a respeito de um módulo cadastro rural. Naquela ocasião, recebemos uma carta-convite, assinada pela Sra. Sílvia Elisabeth Cardim, para apreciar o desenvolvimento e a implantação do Sistema de Informações Rurais — SIR, à luz do projeto de modernização cadastral.  

Desde então, envolvemo-nos com muito interesse nos debates. Posteriormente, recebemos convite oficial, por parte do INCRA, mediante portaria do Sr. Ministro de Estado do Desenvolvimento Agrário, para que fizéssemos parte de um grupo de trabalho com o objetivo de abrir um canal, a fim de que as demandas específicas do registro imobiliário chegassem até o INCRA e também, de certa forma, para expressar as perplexidades do profissional que atua nessa área a respeito do seu relacionamento com o INCRA e com as entidades governamentais, como é o caso também do IBAMA.  

A partir de 2001, tivemos participação muito intensa nos debates e contribuímos no transcurso dos trabalhos com a minuta da lei que culminou na Lei nº 10.267 e também com o debate, de maneira muito interessada, para a edição do Decreto nº 4.449.  

Mas essas discussões estão in itinere, sendo encaminhadas. Não se chegou a uma conclusão definitiva a respeito das dificuldades pelas quais temos passado. O problema que enfrentamos concretamente é que as discussões não culminaram com o perfeito estabelecimento de normas procedimentais que vão vigorar na inter-relação dos cartórios com o INCRA e, via oblíqua, com os demais órgãos do Governo.  

Estávamos, desde cedo, muito empenhados com o problema das denúncias de fraudes que, de forma genérica, são atribuídas quase exclusivamente aos cartórios de registro de imóveis deste País. Estávamos convencidos de que somente com a criação de um cadastro que identificasse perfeitamente as parcelas e os imóveis poderíamos dar um passo decisivo para superar o problema, que não envolve somente a má-fé e as fraudes perpetradas pelos cartórios, mas principalmente a inadequação instrumental e infra-estrutural do sistema de registro, que padece do grave defeito de não ter uma base cadastral confiável.  

Ficamos muito interessados em aprofundar esse tema com o INCRA, que nos deu acolhida muito calorosa e permitiu nossa contribuição com a realização de debates. E chegamos, no final do ano passado, a um elenco de problemas tópicos que precisariam ser superados para darmos condições materiais objetivas e viabilizarmos a aplicação da Lei nº 10.267.  

Verificamos que havia preocupação muito grande com as agências internacionais que financiavam projetos análogos na América Latina – principalmente Banco Mundial, no Leste Europeu e no nosso caso o Banco Interamericano de Desenvolvimento. Sabia-se que o impulso das atividades econômicas relativas às propriedades rural e urbana e a segurança nas transações econômicas dependiam da instituição de um sistema registral eficiente, mas sem esquecer que, ao lado deste, era preciso também um cadastro eficiente e organizado de maneira precisa, a fim de proporcionar um inter-relacionamento adequado, e a sociedade fazer suas transações econômicas. E discutíamos essa demanda e essa preocupação com o INCRA.  

No entanto, para resolver os problemas, no final do ano passado, encaminhamos ao INCRA uma pauta que continha a seguinte proposta: o instituto deveria baixar uma portaria para definir que as hipóteses de desmembramento, parcelamento e remembramento, previstas no art. 176, § 3º, da Lei nº 6.015, se enquadrassem no cronograma do art. 10, do Decreto nº 4.449. Por quê? Porque o referido artigo dizia respeito apenas a algumas das hipóteses em que o georreferenciamento deveria ser feito: no caso de alienação do imóvel, como previsto na lei. Imaginávamos, então, que as hipóteses de desmembramento, parcelamento e remembramento deveriam se enquadrar naquele cronograma, uma vez que, se valiam para quaisquer hipóteses de alienação do imóvel, deveriam valer também para todas as mutações que o imóvel sofresse no que diz respeito à sua feição física. Verificamos, portanto, essa contradição no decreto — quem sabe um defeito que deveria ser resolvido pelo INCRA, porque cabia ao instituto regulamentar concretamente as normas procedimentais de troca de informações.  

Propusemos também que o INCRA baixasse uma portaria definindo que as informações a serem encaminhadas pelos serviços registrais, previstos na Portaria nº 955, de 13 de novembro de 2002, deveriam ser enviadas no prazo estipulado pelo art. 10 do Decreto nº 4.449. Isso porque o § 7º do art. 22 do Estatuto da Terra está plenamente em vigor com a Lei nº 10.267, de tal maneira que os cartórios deveriam, desde o primeiro instante, depositar no INCRA todos aqueles formulários que haviam sido discutidos e que, afinal, não foram distribuídos para as unidades municipais básicas e para os registradores.  

Desse modo, saberíamos como enviar essas informações e não criaríamos um colapso de informações, porque, se não há estabelecimento de uma norma procedimental, os cartórios do Brasil começarão a enviar papéis ao INCRA, que muito provavelmente não saberá como processá-los. Seria irracionalidade consentir que o processo continuasse sem tomarmos cuidado com esse aspecto.

Solicitamos esclarecimento de aparente discrepância verificada entre o art. 5º da Instrução Normativa nº 8 e o roteiro instituído pela Portaria nº 955 no que concerne ao local de entrega das declarações. Recomendamos a edição de portaria do INCRA estabelecendo a forma procedimental para a certificação prevista no art. 9º.  

Esse dispositivo é interessante e diz que caberá ao INCRA certificar que a poligonal objeto do memorial descritivo não se sobrepõe a nenhuma outra constante de seu cadastro georreferenciado e que o memorial atende às exigências técnicas conforme ato normativo próprio. Essa forma de procedimento não está definida. Então, somos demandados porque somos o balcão.  

O proprietário rural comparece ao cartório e pergunta como fazer o georreferenciamento e se pode apresentá-lo para averbação no cartório. Se não tivermos certificação preliminar do INCRA, correremos o risco de dar ensejo a sobreposições de glebas, problema grave cuja responsabilidade os cartórios, infelizmente, acabaram trazendo para si. Em outras palavras, os “cartórios tinham culpa no cartório”. E não é bem assim. Se verificarmos, os procedimentos judiciais de usucapião, de retificação de registro, demarcatórias não passam pelo crivo do cartório. Em grande medida, é pela via judicial que muitas fraudes são perpetradas sem sequer haver conhecimento dos juízes que dirigiam o feito. Por quê? Porque há deficiência estrutural, como disse inicialmente: falta de um cadastro organizado. E essa responsabilidade é do INCRA e tem de ser assumida por ele, único órgão com condições materiais, tecnológicas e humanas para viabilizar esse desafio.  

Por essa razão, estamos diretamente envolvidos, empenhados e politicamente engajados para que esse cadastro apresente frutos. Não podemos assumir a culpa por esse desajuste infra-estrutural do sistema brasileiro: a falta de cadastro. O INCRA ainda está nos devendo essa regra para certificação.  

Precisamos saber como isso será encaminhado ao órgão e o prazo que ele terá. Esse será um procedimento complexo. Quando se apresentar um memorial georreferenciado, o INCRA terá de integrar esses dados à sua base cadastral e, mais do que isso, terá a responsabilidade legal de verificar se não há superposições. Quer dizer, quem vai declarar a situação real do imóvel não é o Registro de Imóveis. Como registrador imobiliário, não tenho capacitação técnica nem instrumentos para verificar se aquela parcela está aqui ou ali, quem sabe até registrada no mesmo cartório, sem a precisão exigida para determinação técnica.  

Propusemos a retificação da Portaria nº 955 para contemplar a atuação do notário na recepção do memorial georreferenciado e na consolidação da nova descrição na lavratura do ato. Vejam bem. O sistema é dependente da atuação do tabelião, que vai recepcionar as partes para lavrar o instrumento de compra e venda, hipoteca, alienação, usufruto, enfim, qualquer que seja o direito real. Pois bem, o memorial georreferenciado tem de ser apresentado ao notário. Este, por sua vez, tem de reduzir o memorial descritivo ao ato notarial, porque, afinal de contas, trata-se de identificar claramente qual imóvel rural está sendo objeto de transação econômica e jurídica. Por isso era preciso incluir o tabelião.  

Solicitamos que se precise, com linguagem técnica adequada, a expressão “retificação de área”, substituindo-a por “retificação de registro”, por questão de coerência sistemática com a própria lei. Também pedimos que se substitua a expressão “respectivas matrículas imobiliárias” por “respectivos registros imobiliários”, visto que algumas modificações não serão feitas nas matrículas, mas nos antigos livros fundiários. É provável que muitas propriedades estejam registradas nos antigos livros de registro e não nas matrículas. Portanto, sugerimos também esse aperfeiçoamento.  

Também deve ser melhorada a redação do item 3.4 da portaria para que seja encaminhada unicamente a certidão expedida na forma do § 1º do art. 19 da Lei de Registro Público. Tivemos uma experiência de comunicação ao INCRA que não foi muito proveitosa, porque hoje os cartórios, além do problema de deficiência cadastral, não têm regulamentação federal, de tal forma que pode haver tantas normas procedimentais quantos forem os juízes das comarcas do País. Pasmem Vossas Excelências mas é isso o que está na Lei nº 8.935/94 (art. 30, XIV). Talvez, preocupados em criar um conselho de notários e registradores — pensando que, com isso, se entregaria o futuro da atividade nas mãos dos próprios notários e registradores —, se preferiu pulverizar a atividade, e a lei diz que caberá ao juízo competente baixar normas procedimentais. Então, sem que haja definição de um roteiro preciso, não teremos como cumprir a regra.  

E o resultado é que o output, a saída do nosso sistema, será uma algaravia para o próprio INCRA, que vai precisar de dezenas de técnicos para fazer a leitura do que lhe chega através de cópias de certidões, matrículas, certidões vintenárias para daí extrair os elementos que vão povoar o cadastro.  

Não quero me estender muito nesse assunto, mas existe incongruência de linguagem. Se tivermos de traduzir essa montanha de papel que vai chegar ao INCRA em pontos georreferenciados ou em uma descrição minimamente precisa, vamos despender tempo extraordinário, energia vital para viabilizar a própria idéia da Lei nº 10.267.  

O que propomos então?  

Iniciativa muito bem-sucedida que a Secretaria da Receita Federal teve com a declaração de operações imobiliárias, em que todos os dados relevantes foram reduzidos a variáveis. Ou seja, foi estabelecido padrão de linguagem que fundamentou um programa de software, e hoje encaminhamos as informações relevantes à Receita Federal, de qualquer ponto do País, pela Internet.  

Estamos fazendo essa proposta ao INCRA porque acabamos de receber a certificação pelo SERPRO.  

Imaginem a economia de custo e a contribuição que estaremos dando ao INCRA no tocante ao cadastro. É necessário urgentemente abandonar aquela concepção de vinculação de cadastro que se faz por mera declaração do usuário, que declara qualquer coisa e que muitas vezes está divorciada do registro e da própria realidade. E não se trata de má-fé, senhores. Dependendo dos critérios tecnológicos adotados para determinação da parcela, teremos descrições contraditórias. Precisamos reduzir essa babel a um denominador comum. E se não fizermos isso de maneira coordenada com os órgãos da Administração Pública Federal, não vamos lograr oferecer à sociedade a segurança jurídica tão necessária para o desenvolvimento dos negócios.  

Também dissemos que era preciso republicar a Instrução Normativa nº 9, que contém evidentes erros. Acho que não foi republicada. Propusemos a alteração, em ato normativo conjunto, das regras de preenchimento do DOI.  

Por fim, nos credenciamos no INCRA para ser porta-vozes do instituto, pois temos mecanismo de comunicação muito ágil com todos os registradores brasileiros. À falta de um órgão de feição federal que estabeleça normas procedimentais, o IRIB se viu na contingência histórica de se aventurar na auto-regulamentação. E tem sido bem sucedido. Temos uma publicação, a Revista de Direito Imobiliário. Pedi ao nobre Presidente que distribua um exemplar a cada Deputado desta Comissão para acompanhar o desenvolvimento da discussão.  

O registro imobiliário passa por profunda transformação. Sabemos que os registros imobiliários existem em todos os países do mundo. É uma grande falácia, uma inverdade, um mito dizer que registro de imóveis ou cartórios só existem no Brasil. Isso não é verdade. Essas experiências que temos no INCRA, de forma análoga, acontecem em outros registros de imóveis, nomeadamente da Alemanha. Representantes do registro imobiliário daquele país estiveram no Brasil, a nosso convite, para mostrar como é a integração entre o cadastro e o registro imobiliário. O da Espanha também esteve aqui.  

Enfim, vários países têm essa mesma estrutura. Temos experiência internacional que pode ser muito útil para o desenvolvimento dos nossos trabalhos.  

Muito obrigado, Sr. Presidente, Srs. Deputados.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Agradeço, pela presença, ao Deputado Valdir Colatto, atualmente na direção do escritório do Governo de Santa Catarina, em Brasília. Concedo a palavra ao primeiro Deputado inscrito para o debate, Moacir Micheletto.  

O SR. DEPUTADO MOACIR MICHELETTO – Sr. Presidente, Sras. e Srs. Deputados, senhores palestrantes: em primeiro lugar quero congratular-me com V.Exa., Sr. Presidente, pela aprovação do requerimento de realização desta audiência pública para tratar de dois relevantes assuntos para o Brasil.

Quanto ao cadastro dos imóveis, ouvi o Sr. Sérgio Jacomino e trarei alguns argumentos.  

A presença de V.Sa. foi de real importância pelo feedback de sua exposição ao Governo brasileiro, principalmente ao INCRA.  

Há quatro anos queríamos aprová-lo nesta Casa e não conseguimos, devido à posição do PT, hoje governo. Graças a Deus, agora que o Partido dos Trabalhadores é governo, poderemos concretizar o que queremos em termos de cadastramento de imóveis rurais no Brasil.  

Esta é a Casa do contraditório. Não consegui ouvir o Sr. Luiz Ramos, companheiro da CNA. Escutei 30% da exposição do companheiro Hilário Gottselig, da CONTAG, e ouvi atentamente o Sr. Petrus Emile Abi-Abib, ex-superintendente do INCRA no meu Estado. Sou do Paraná — por sinal, pequeno produtor rural, com 70 hectares, e jamais me encaixei em algum programa de governo, porque essa área, na minha região, é considerada latifúndio. Ouvi atentamente os Srs. Sérgio Jacomino e Sebastião Azevedo.  

Vou fazer um comentário bem rápido para depois voltar ao registro de imóveis rurais em faixa de fronteira. Não vou falar muito sobre a faixa de fronteira por ser o maior absurdo ratificar imóveis nessa área.  

A faixa de fronteira começou com 30 quilômetros; depois passou, parece-me, para 80 quilômetros; e no regime militar, por questão de segurança nacional, para 150 quilômetros. Fiz um cálculo com o Deputado Colatto. Pergunto: como ficam os imóveis no Paraná — sou do oeste do Estado, onde o minifúndio impera —, por exemplo, na cadeia dominial, se passaram 150 quilômetros para cá? Essas propriedades também não vão ser ratificadas, se os outros estão na mesma cadeia dominial? Que absurdo! Vou encerrar pedindo que nos deixem trabalhar. Deixem os pequenos proprietários trabalharem numa economia familiar. Queremos programas de economia familiar. Na minha região, na economia de escala, se o pequeno não se unir em cooperativa não sobrevive. Esta é a realidade. Há três anos estamos solicitando a prorrogação do prazo, porque o INCRA não tem estrutura para fazer ratificação. No ano que vem, vamos pedir novamente a prorrogação por mais um ano, na medida provisória que vai tratar da ratificação.  

Este é o país dos absurdos. Converso com agricultores cujas famílias estão na faixa de fronteira há cem anos. Será que agora vão ter de ratificar o título, para saber se o título é deles ou do Estado? Não vou entrar nessa questão. Vou ficar por aqui, na faixa de fronteira. Faço um apelo ao INCRA no sentido de que nos dê estrutura para que não precisemos, mais uma vez, no final do ano, pedir a prorrogação. Estou aqui na qualidade de agricultor e de Vice-Presidente da Federação da Agricultura do Estado do Paraná.  

No meu Estado também estamos bastante preocupados com o problema da ratificação, que agora exige do pequeno proprietário averbação da reserva legal. Isso está criando muita confusão. A lei tem de ser cumprida. Ela foi feita para ser cumprida. Sr. Presidente, como eu disse, esta é a Casa do contraditório.  

Temos de ter coragem para assumir nossas posições. Vou pagar um preço por isso. Nem precisava falar sobre o assunto, porque o Sérgio já disse tudo. Falta um cadastro organizado no INCRA — ele usou mais um termo, depois — que dê segurança jurídica. Não foi isso que você disse, Sérgio? (Pausa.) Está gravado. Ouvimos aqui a opinião de cada um dos palestrantes. O INCRA mostrou o aspecto da fração do território. Na sua visão, a propriedade está classificada em micropropriedade, em minipropriedade, em pequena propriedade, em média propriedade, em grande propriedade; e ainda existem o módulo fiscal e o módulo rural. Essa é a classificação da fração territorial no Brasil.  

Qual cadastro que nos dá as condições necessárias? Temos milhares de miniproprietários, de microproprietários. Na minha região, sou pequeno produtor rural. Como foi dito aqui, na economia de escala, o pequeno produtor só sobrevive, só passa a ser grande quando se agrega a uma cooperativa. Há agricultores que têm um hectare e não se enquadram no PRONAF ou em qualquer programa de agricultura familiar do Governo, nem do meu Estado, porque já têm um galinheiro naquela propriedade e a receita deles já não é mais do pequeno nem do micro. Mas, em termos de território, ele é micro, é pequeno, pois só tem um hectare de terra. Estou bastante confuso.  

Temos sete classificações dadas pela estrutura do INCRA. Não acreditamos quando nos dizem que a discussão do módulo rural ou do cadastro rural não é filosófica e ideológica. Ouvi atentamente o Dr. Petrus dizer que no meu Estado, na faixa de fronteira, não existem 10% de propriedades acima de 100 hectares.  

Tenho esses dados no meu gabinete. Quando tratávamos da medida provisória, fizemos esse levantamento. No momento, não estou com esses dados, mas posso fornecê-los, se for preciso. Isso está criando pânico na nossa região. Um chefe de escritório do INCRA, em Cascavel, disse que o agricultor que não fizer sua averbação até tal hora não vai mais poder fazer sua ratificação, e aí o Estado passa a ser dono da propriedade. Criou-se um pânico. Precisamos dizer aos agricultores que isso não é verdade. Estamos tentando a prorrogação da ratificação.  

Conforme eu disse, o INCRA mostrou a sua visão sobre fração da terra. Como foi muito bem exposto pelo Dr. Sebastião, o IBAMA vai ter de analisar a propriedade pela visão ambiental. Não há como não agir dessa forma. Mas isso não nos satisfaz. Estão falando do efeito e não da causa. A nossa causa é a classificação da fração do território de um país que tem mais de 8 milhões de quilômetros quadrados. Em Mato Grosso, a situação fundiária é diferente da do meu Estado, que é de pequenas propriedades fundiárias. Não vou condenar o Sebastião por ter exposto a ótica ambiental. Ele estaria correto. Mas o que vai fazer, na ótica ambiental, numa micropropriedade, numa micropropriedade? Na visão ambiental, algumas coisas básicas têm de ser cumpridas. Mas é preciso haver uma política ambiental para aquela propriedade, que não pode ter 20% da sua área em reserva legal. Estou tentando dar um exemplo. Ouvi as entidades, ouvi o Hilário. Segundo as observações do Dr. Petrus, as posições da CNA e da CONTAG convergem. Não assisti à palestra do companheiro da CNA. É lógico que a CNA e o produtor vão ter uma visão sob a ótica da produção. Vou analisar o meu território. O que dá renda? O arranjo e a combinação dos fatores produtivos: terra, capital e mão-de-obra. A terra, para mim, pode ser limitante. Se tenho um pequeno pedaço de terra e mão-de-obra disponível, preciso de linhas de crédito ou programas de governo que atendem à pequena propriedade. Essa é a visão econômica. A CNA não podia analisar o tamanho da propriedade como uma fração, em termos de produção. O Sérgio lavou a minha alma. Ele também tem uma visão cartorial. Há fraudes, falta cadastro. Em que vamos nos basear? É isso o que está faltando. Quero deixar claro que há necessidade, Sr. Presidente, de não ficarmos apenas nesta audiência pública. O INCRA está cheio de "pepinos" para resolver. O IBAMA, a CNA e a CONTAG também. O que vai sair de concreto desta audiência pública? É preciso metodologia para fazer o recadastramento no Brasil, conforme foi dito pelo Sérgio. Qual é o retrato do Brasil, em termos fundiários, nestas sete classificações: micro, mini, pequeno, médio, grande e ainda módulo fiscal e módulo rural? Estamos falando do efeito, mas queremos agir na causa.

Precisamos de um cadastro, até para criar políticas de desenvolvimento para as políticas ambiental, florestal, agrícola e agronômica. Os programas de governo de Estados e Municípios têm de se basear nesse diagnóstico. Precisamos ter um cadastro. Acredito que haja clima para discutir a questão. Agora, o Governo não vai ser contra, vai ser favorável. O núcleo agrário do PT nesta Casa deverá concordar conosco.  

Precisamos saber que é necessário ter um cadastro, com metodologia científica. Vamos reunir todos numa mesa. O Brasil precisa ser recadastrado, para que se tenha um retrato dele. O que nós somos? Fica a briga entre o grande e o pequeno. Não podemos ficar nos dois extremos. Queremos colaborar com o Governo. O INCRA tem extraordinária estrutura, companheiros valentes, um quadro técnico preparado para isso.Dr. Petrus, V.Sa., que conheceu o interior e que agora está em Brasília, vai ter condições de falar com o nosso Presidente do INCRA.  

Espero que esta Casa possa colaborar, sem extremismo de um lado ou do outro.

Posso até estar falando coisas sem importância e desagradando as pessoas, mas é com sentimento de brasileiro. O maior documento que um produtor rural tem é a escritura da sua terra. Meu avô veio da Itália. A escritura da sua terra é a sua vida. Tanto faz a escritura de um hectare quanto a de mil hectares.

Então, precisamos ter um cadastro para não ficarmos na situação em que nos encontramos. Precisamos achar uma solução para o problema. Sr. Presidente, na minha opinião, V.Exa. teve a ousadia de propor o debate. Mas não devemos ficar num debate vazio. Talvez eu não esteja colaborando, mas estou falando como brasileiro, como agricultor. Tenho a escritura de 70 hectares de terra na minha mão. Tenho meu diploma de agrônomo. Sou filho de um pequeno produtor rural, que tinha apenas um alqueire de terra para viver com mais de seis filhos. Lutamos para isso, e consegui chegar a esta Casa. Não quero saber de esquerda, de direita, de centro. Quero saber qual a solução que vamos encontrar no cadastramento dos imóveis no Brasil. Vamos ter de entender o que é micro, o que é mini, o que é pequeno, o que é grande. O que é grande na Amazônia e o que é grande para nós, no Sul? Cem hectares de terra, na Amazônia, são um módulo; na minha região, são considerados uma grande propriedade.  

Ouvi atentamente as pessoas capacitadas que aqui se encontram.  

Conheço o Dr. Petrus. Ele tem experiência, o que vale muito mais. Gostaria que ele fosse o nosso instrumento no INCRA para tentar mudar a situação.  

O INCRA tem corpo técnico, tem estrutura para isso. Avance e nos convoque, pois poderemos ajudar. Esta Casa vai ajudar no que for possível. Será preciso destinar recursos no Orçamento, porque é caro fazer um levantamento dessa natureza. Um cadastramento nacional não é feito de um dia para o outro. Precisamos ter esse retrato fiel, que vai espelhar a realidade fundiária brasileira. Aí, sim, acho que sairemos dessa situação. Sr. Presidente, agradeço-lhe a ousadia de ter possibilitado a realização desta audiência. Há com poucos Deputados nesta reunião. Os que aqui se encontram também vão usar a palavra. Que não fique apenas nisso, que saia alguma coisa de concreto. O que vamos fazer a curto, a médio e a longo prazos? Como agrônomo, sou muito prático. Sou agricultor, e o agricultor também é prático, gosta de ver resultado. Temos de ter resultados.  

Guardei muito bem o que foi dito pelo Sérgio: falta um cadastro organizado que nos dê segurança jurídica e também impeçam que os Governos gastem dinheiro em programas que, às vezes, não chegam ao produtor, por falta desse diagnóstico, desse brainstorm que fizemos ainda há pouco, desse feedback da realidade. Vamos ter de ser humildes e perceber que erramos, ver o que está errado.  

Ainda há tempo para corrigir. Na democracia é assim. Por isso, esta é a Casa do contraditório. Deixo esta minha preocupação. Estou ansioso, Sr. Presidente, não para falar e ir embora, mas porque tenho outra reunião, que está sendo prejudicada com a minha presença aqui. Se for possível, ainda vou ouvir alguns Deputados e principalmente o Dr. Petrus, que está representando uma estrutura do porte do INCRA, de que nos orgulhamos.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Quero dizer ao nosso companheiro, Deputado Moacir Micheletto, que fizemos o requerimento de realização desta reunião, conversando com o Presidente da Comissão, Deputado Waldemir Moka, exclusivamente com o objetivo de dar ao meio rural brasileiro um pouco mais de tranqüilidade. Esta audiência pública é o início de um trabalho desta Casa. Insistimos na convocação do IBAMA. De forma feliz, hoje está representado pelo Dr. Sebastião Azevedo, que trabalhou no INCRA, tem muito conhecimento e cujas ponderações são também as do proprietário rural. A reserva legal, o meio ambiente e a demarcação são importantíssimos. Tivemos a participação da CONTAG e da CNA, muito relevante. Está gravada e as notas taquigráficas vão para a Assessoria Técnica. Tivemos o cuidado de, antes de fazer a convocação, Deputado Moacir Micheletto, conversar com a Direção da Casa. Nosso Presidente, Deputado João Paulo Cunha, está interessado também na resolução do problema fundiário, na área legislativa, não só nas medidas provisórias, para que tenha encaminhamento técnico e jurídico e seja feito o cadastro do País todo. V.Exa. solicitou várias vezes a participação do Dr. Petrus. Vou passar a palavra a S.Sa. para que faça suas considerações. Em seguida, a palavra ficará aberta a qualquer integrante da Mesa, pelo prazo de três a cinco minutos.  

O SR. PETRUS EMILE ABI-ABIB – Sr. Presidente, com satisfação ouvi o pronunciamento de V.Exa., suas conclusões e proposições finais. V.Exa. enfatiza a necessidade de um cadastro. Informo à Comissão que existe projeto nesse sentido, com o objetivo de fazer o cadastro nacional de imóveis rurais, já previsto por lei. Ele deverá entrar em prática a partir de meados do corrente ano e tem o objetivo de medir pontualmente lote por lote, em todo o território nacional.  

Estimamos encontrar de cinco milhões e meio a seis milhões de propriedades rurais. O prazo para realizar esse trabalho deverá ser de nove anos, a um custo total de 260 milhões de dólares. Na primeira fase, o projeto está contemplado com 130 milhões de dólares e terá a participação efetiva de todos os Estados. Deveremos começar este ano, ou no início do ano vindouro, a trabalhar com os Estados do Paraná, de Mato Grosso, do Maranhão, do Ceará, da Bahia e de São Paulo, que reúnem o maior número de propriedades rurais.  

O projeto dimensiona cerca de 2 milhões e 200 mil propriedades e será georreferenciado nos próximos quatro anos. Hoje, inclusive, está reunida para isso equipe do BID. Vai depender de financiamento externo. A segunda missão do Banco de Desenvolvimento Interamericano convidou o Presidente da IRIB para dar palestra a respeito da situação dos cartórios e do sistema de registro brasileiro. Deputado, posso lhe garantir que sua idéia já estava germinando nas entranhas não só do INCRA, mas de todos os órgãos de terra dos Estados. Esse projeto foi desenvolvido exatamente com a associação dos órgãos de terra estaduais. Inclusive está prevista a participação dos Estados com recursos, em termos de contrapartida. Espero que, com esse trabalho associado e adaptado à Lei nº 10.267, de 2001, que cria o Cadastro Nacional de Imóveis Rurais, a questão esteja bem encaminhada.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Tem a palavra o Sr. Hilário Gottselig, da CONTAG.  

O SR. HILÁRIO GOTTSELIG – Agradeço mais uma vez aos colegas da Mesa as intervenções.  

Já se enfatizou anteriormente a necessidade desse cadastro. Com o esforço de todos nós, inclusive da CONTAG, ele se concretizará. Cabe a esta Casa avançar mais. Quando se fala em pequeno, médio, grande e miniprodutor, o que significa?  

Temos de dividir melhor esse segmento, independentemente da relação de enquadramento sindical ou não. Essa é uma discussão forte que existe entre a CONTAG e a CNA. Talvez neste ano, com a mudança da legislação sindical, a divergência se acomode e cada um busque seu caminho. Essa questão tem de ser pensada em termos da estrutura dos agricultores. O cadastro teria de relatar o que é agricultura familiar, sua forma, se é pequeno ou médio produtor, e sua viabilidade, o que é agricultura e o que representa a agricultura patronal no País.  

O cadastro teria de entrar nessa diferenciação e representá-la, espelhando-a para o Brasil, porque há vários conceitos de agricultura familiar: em certas regiões, 2 hectares são considerados agricultura patronal; em outras, 150 hectares podem não ser. Sua definição precisa estar representada e ser mostrada à sociedade. A legislação precisa ser repensada e adequada a essa visão também. O que é agricultura familiar? E sua viabilidade? O que é agricultura patronal? O que é cumprimento da função social? O estudo do impacto ambiental também deve estar incluído na lei, assim como a relação de produtividade ou não. Se o cadastro mostrar essa realidade, já trará um mapa e um interesse bastante grandes. Agradeço à Casa a oportunidade. Estamos à disposição de todos.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Com a palavra o Dr.Sebastião Azevedo.  

O SR. SEBASTIÃO AZEVEDO – Obrigado pela oportunidade, Sr. Presidente. As considerações que vou tecer vão mais no sentido de minha militância na atividade jurídica, agrária e ambiental. Todos sabemos que, numa verificação da evolução histórica da propriedade territorial brasileira, defrontamo-nos com o caos na estrutura fundiária, sobretudo naquelas regiões mais inóspitas. Refiro-me não ao aspecto do cumprimento da função social da propriedade, questão que não está em cogitação — muito há que se avançar nesse sentido —, mas da dominialidade desses imóveis.  

Tem se detectado, sobretudo em regiões pioneiras, um conjunto de fraudes e falsificação de títulos. Várias iniciativas já foram adotadas ao longo desse período. A criação do instituto da discriminação, que constituiu avanço significativo, a ratificação das concessões e alienações da parte de fronteira dela decorrentes, as discussões com os Estados-membros a respeito de uma tentativa de harmonização dessa legislação, tudo isso teve o propósito de dar segurança jurídica aos proprietários rurais que de boa-fé adquiriram imóveis rurais neste País e com eles conseguiram a condição social almejada. Participamos da discussão e elaboração da Lei nº 1.267, assim como da elaboração da Lei de Fronteira. Era nosso objetivo termos presente a necessidade de proteger populações rurais que ficaram sem o amparo do Estado.  

Todos conhecemos a situação das comunidades indígenas, das comunidades remanescentes de quilombos e dos trabalhadores rurais em geral, as dificuldades que eles enfrentaram diante desse caos fundiário com que nos defrontamos. Nesse sentido, o grande objetivo que queremos alcançar é, primeiramente, separar desse conjunto de irregularidades que se detectou, que resultou inclusive no cancelamento de cadastro de áreas acima de 10 mil hectares e, posteriormente, no cadastramento de área até 5 mil hectares, aqueles títulos ostentados que pudéssemos considerar regulares, legítimos e adquiridos de acordo com a legislação — tanto estadual, como federal — vigente à época dos títulos objetos de fraudes e falsificações, que detectamos inclusive em CPIs bem conduzidas nesta Casa.  

Entendemos, em determinado momento, que não bastava adotar procedimentos de cancelamento de cadastro, era preciso criar neste País, em conjunto, obviamente, com os diversos órgãos e entidades da administração pública que participaram dessa discussão, inclusive o Ministério Público e entidades como IRIB e ANOREG, condições para que se pudesse garantir a segurança jurídica desses títulos de propriedade ostentados pelos legítimos proprietários e, de outro lado, proteger as populações rurais.  

É evidente que, diante do Regime Jurídico de Propriedade, que se inicia defeituoso, com todas as dificuldades que encontramos desde os tempos memoriais das Capitanias Hereditárias, por mais que a legislação pudesse atender a esses anseios, do ponto de vista operacional, teríamos dificuldades. Não seria nesse curto período que iríamos ter condições objetivas de tornar essa lei plenamente eficaz. Daí essas dificuldades operacionais com que nos defrontamos, ainda quando dirigentes e representantes judiciais do INCRA, e com que não só o INCRA, mas outras entidades governamentais, tais como a FUNAI, o IBAMA, a própria Receita Federal e os Estados-membros, poderão se defrontar. O apelo que faço é no sentido de darmos um voto de confiança a essas entidades, sobretudo ao INCRA.  

Temos certeza de que, sob a gestão do seu presidente, que conhecemos, e com o assessoramento competente do Dr. Petrus e de tantos outros que estão participando dessa nova gestão, eles terão condições objetivas de dar a resposta que todos queremos e tornar esta lei plenamente eficaz.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Com a palavra o Dr. Luiz Alfeu Moojen Ramos.  

O SR. LUIZ ALFEU MOOJEN RAMOS – Sr. Deputado, V.Exa. não assistiu à minha exposição. Iniciamos mostrando que o cadastro, como se pretende instituir, além de subsidiar a administração com uma eficaz e importante base de dados para a elaboração de políticas ligadas ao meio rural, também trará segurança, na medida em que resolverá problemas graves, transcendentais, como a superposição de títulos, a má e deficiente localização das terras.  

Obviamente, com essa segurança jurídica, haverá também maior facilidade para o investimento produtivo nas regiões, principalmente nas de ocupação mais recente. Essa insegurança dos títulos, essa dúvida que paira sobre a legitimidade e autenticidade dos títulos, funciona, nas regiões de ocupação mais recente, como fator inibidor de investimento, o que, conseqüentemente, é prejudicial ao desenvolvimento econômico e social.  

Começamos mostrando a importância desse cadastro e destacamos que as maiores dificuldades surgiriam na sua implementação e na operacionalização desse processo, conforme o representante do serviço registral enfatizou. Talvez, a maior contribuição que o Poder Legislativo possa dar, ouvindo a experiência do INCRA e de outros órgãos, seja justamente na operacionalização da aplicação desse cadastro de maneira que possa se realizar sem maiores percalços.  

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Tem a palavra o Sr. Sérgio Jacomino.  

O SR. SÉRGIO JACOMINO – Sr. Presidente, serei rápido. Fiquei bastante impressionado com as considerações do Deputado Moacir Micheletto. S. Exa. apontou realmente aquilo que verificamos. Fui registrador imobiliário de uma pequena comarca — Cardoso —, no norte do Estado de São Paulo. Sei muito bem quais são os problemas que o pequeno proprietário rural enfrenta, muitas vezes vencendo uma selva burocrática, inclusive dos cartórios, que dificultam enormemente sua vida. É muito legítimo o que S.Exa. expressou, veementemente, nesta Comissão. Lembrei-me, enquanto S.Exa. fazia seu pronunciamento, que uma das graves deficiências da lei — com liberdade excessiva, tentou-se corrigi-la no decreto — foi a desnecessidade da retificação judicial, quando se vai fazer o georreferenciamento.  

Lembro-me bem de que participei de uma reunião no INCRA — àquela altura, não era convidado oficial — e disse que naquele projeto havia um problema: a retificação. Quando fizéssemos qualquer alteração das divisas ou da área, incidiria a regra do art. 213, da Lei nº 6.015. Dito e feito, porque aquela regra é geral: apanha as hipóteses da descrição georreferenciada. Todos os imóveis rurais georreferenciados, ou praticamente 99%, importarão em alteração da descrição, porque teremos uma nova linguagem. Trata-se de um novo instrumental que é justamente o aporte tecnológico do georreferenciamento. Não vamos nos orientar mais por um modelo descritivo, mas através de pontos georreferenciados. O caput do art. 213 estabelece que esse poderá ser um erro a ser corrigido administrativamente pelo oficial do registro, desde que certificado pelo INCRA, desde que não haja superposição, desde que os confinantes concordem, num processo mitigado, de formalidade mitigada, de burocracia mitigada. Desde que nos cerquemos de todos esses cuidados, poderemos dar acesso aos memoriais georreferenciados para perfeita aplicação da lei. De outra forma, estimo que teremos um fenômeno de "esquizoregistro" — ou seja, duas descrições, que poderão ser contraditórias, povoando o registro público. Do ponto de vista metodológico, seria um absurdo. Em vez de reduzirmos o ruído decorrente da imperfeita descrição do imóvel, estaremos jogando gasolina nisso, porque teremos a descrição georreferenciada e a tradicional, que vem desde os tempos do Brasil Império.  

Quando falamos em registro de imóveis, não devemos esquecer que ele é anterior à Lei nº 601, de 1850. O Registro Hipotecário foi criado em 1846 e muitas das descrições que, à época, eram perfeitamente admitidas — havia um elemento social de reconhecimento da propriedade —, com o passar do tempo, foram perdendo completamente sua referencia social. De tal forma que hoje é incompreensível apresentar uma certidão dizendo que o imóvel confronta com os impossíveis da serra ou com o pasto da vaca mocha. Entre esse dado que consta do registro e o que será apresentado pela nova lei, haverá uma contradição que, se não for perfeitamente compreendida e superada por uma visão menos burocrática, produzirá um colapso. Se não houver o registro, acabaremos por remeter os proprietários rurais a uma retificação judicial custosa, porque eles já terão pago para fazer o levantamento. E muitas vezes, por não conseguirem dispor da sua propriedade imediatamente, ainda terão de pagar por uma retificação de registro.

O SR. PRESIDENTE (Deputado Nelson Marquezelli) – Tem a palavra o Sr.

Deputado Luis Carlos Heinze.

O SR. DEPUTADO LUIS CARLOS HEINZE – Sr. Presidente, desculpe-me, porque estava em outro compromisso, tratando de outro assunto também extremamente importante, mas não poderia deixar de lhe cumprimentar pela oportunidade do tema, do debate nesta Comissão, com pessoas ligadas ao ramo, sejam do INCRA, do IBAMA, da CONTAG ou da CNA.

O Dr. Sebastião falava sobre a função social da propriedade, o que considero extremamente importante. Gostaria de fazer uma reflexão.

Casualmente, um dos assuntos que estávamos tratando pela manhã era com um grupo de cooperativas de suinocultores do Rio Grande do Sul. Essas sete cooperativas têm 44 mil associados, entre os quais, 34 mil pequenos agricultores. Chamo a atenção não para o cadastro e o registro, mas para a análise, porque eles vivem anos de altos e baixos e um problema gravíssimo ao longo desses anos.

O Deputado Valdir Colatto conhece bem a situação, porque também é típica de Santa Catarina. Há três ou quatro anos, quando o preço do milho estava em baixa, os suinocultores e avicultores estavam bem — trata-se de pequenas propriedades integradas ou junto das cooperativas. Quando o preço subiu, eles passaram a viver um inferno. Quando se discute função social, é preciso lembrar que esse pessoal não tem condições de parar. Qualquer outro empresário pára a hora que quer. Uma empresa como a GM demite, pára, dá férias coletivas. O agricultor, a cooperativa não têm condições de fazê-lo, havendo ou não prejuízo. O que está ocorrendo hoje — cito esse fato para que os senhores, quando estiverem no INCRA ou no próprio IBAMA, se lembrem deles — nessas propriedades é que os prejuízos se acumulam sobre o próprio produtor, que tem de parar a atividade, ou sobre a própria cooperativa, que entra num colapso em cima de uma quebradeira.

Estamos buscando socorro junto ao Ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e ao próprio Banco do Brasil. Alerto para o fato de que isso acontece com qualquer tipo de agricultor, seja ele produtor de grão, de carne ou de leite.

Quando for feito esse cadastro, na análise da função social, deve-se levar em conta que esses agricultores têm de tocar para a frente, não podem parar no meio do caminho. Quando o negócio melhorar, quando a Rússia voltar a importar, o tempo já terá passado. Com todos os investimentos feitos nos últimos anos, o Brasil aumentou barbaramente as exportações de carnes de maneira geral, com frangos e suínos, em primeiro lugar; e agora esse pessoal amarga essa situação. Quando for feito um cadastro, lembrem-se dessas coisas que merecem atenção. Daqui a pouco esse pessoal estará desclassificado. Quando for feita uma análise, poderá ser dito que não cumprem a função social da terra. Não estou falando de grandes propriedades. São pessoas que possuem 5, 10, 15, 20 hectares no Rio Grande do Sul, em Santa Catarina e em outros Estados. Gostaria de cumprimentá-lo e de deixar este alerta em relação ao tema. O Sr. Sebastião falou sobre função social, o que isso representa e o que é a produção primária de alguém que vive a situação de mercado em que não se tem essa pol&a



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