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O poder familiar e os atos notariais e de registros - Marcelo Melo*


O instituto do pátrio poder ou poder familiar (expressão utilizada pelo Código Civil de 2002) nos últimos anos tem evoluído muito e por conseguinte sofrido algumas alterações, principalmente através da Constituição Federal e o Estatuto da Criança e do Adolescente. Ocorre, que muitas vezes essas alterações passam despercebidas pelo aplicador do Direito, quer em virtude da rapidez das mutações legislativas, quer pela falta de tempo para atualização. 

O poder familiar “é o complexo de direitos e deveres concernentes ao pai e à mãe, fundado no Direito Natural, confirmado pelo Direito Positivo e direcionado ao interesse da família e do filho menor não emancipado, que incide sobre a pessoa e o patrimônio deste filho e serve como meio para o manter, proteger e educar” (JOSÉ ANTONIO DE PAULA SANTOS NETO. Do Pátrio Poder. RT, 1994, pág.  55).

O artigo 380 do Código Civil de 1916 dispõe que “durante o casamento compete o pátrio poder aos pais, exercendo-o o marido com a colaboração da mulher. Na falta ou impedimento de um dos progenitores, passará o outro a exercê-lo com exclusividade”. (Redação dada pela Lei nº 4.121, de 27.8.1962).

Contudo, com o advento da Constituição Federal estabeleceu-se igualdade de direitos entre homens e mulheres de forma explícita (artigo 5º, inciso I e artigo 226, § 6º) o que caracteriza o fenômeno da não recepção pela Magna Carta do referido dispositivo.          

Com relação ao exercício do poder familiar, eram duas as alternativas possíveis para que não se desrespeitasse o preceito constitucional: estabelecer o exercício do poder familiar ao pai e a mãe conjuntamente; ou permitir que qualquer um deles o exercesse isoladamente, sem excluir o direito do outro. Optou o legislador, bem ou mal, pela primeira alternativa nos termos do artigo 21 do Estatuto da Criança e do Adolescente: “o pátrio poder será exercido, em igualdade de condições, pelo pai e pela mãe, na forma do que dispuser a legislação civil, assegurado a qualquer deles o direito de, em caso de discordância, recorrer à autoridade judiciária competente para a solução da divergência”.

Esclarece JOSÉ ANTONIO DE PAULA SANTOS NETO que “atualmente, a normatização da matéria foi retirada do Código Civil e chamada a si pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, que em boa hora escoimou o anacrônico vezo de relegar a mãe a um injustificável segundo plano e guindou-a ao mesmo nível do pai (Ob. cit., pág. 79). O Código Civil de 2002 seguiu a mesma orientação outorgando o exercício do poder familiar ou pátrio poder (art. 1.631) com redação semelhante à do Estatuto da Criança e do Adolescente.

As conseqüências da alteração da legislação são significativas, todos os preceitos normativos que de certa forma violarem a Constituição Federal e o ECA ou não foram recepcionados pela primeira ou foram tacitamente revogados pelo segundo, onde podemos citar os artigos 9º, § 1º, inciso I, do Código Civil de 1916 e item 116.1 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (Capítulo XVII), que autorizam a concessão da emancipação pelo pai ou pela mãe. 

Dessa forma, qualquer ato jurídico que envolva o exercício do poder familiar ou pátrio poder, deve conter a anuência do pai e da mãe, salvo na falta de um ou de outro ou suspensão ou destituição da pátria potestade. 

A emancipação, ato jurídico a ser formalizado por instrumento público de acordo o novo Código Civil de 2002 (art. 5º, inciso I), a partir da vigência do Estatuto da Criança e do Adolescente só poderia ser outorgada pelo pai e pela mãe do emancipado. O item 116.1 das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça (Capítulo XVII), que autoriza a emancipação “por outorga do pai ou da mãe” foi elaborado de acordo com o Código Civil de 1916 e Lei 2.375, de 21.12.54, ambos revogados pelo ECA e Constituição Federal, merecendo urgente revisão pela Egrégia Corregedoria Geral da Justiça.

Interessante que o artigo 89 da Lei 6.015, de 31.12.1973, já trazia em seu texto que “serão registrados, em livro especial, as sentenças de emancipação, bem como os atos dos pais que a concederem”, porém, por não ser lei de conteúdo material, foi fixado entendimento à época no sentido da não revogação do artigo 9º, § 1º, inciso I, do Código Civil de 1916.

A representação e a assistência do incapaz também merecem atenção      pois são manifestações do exercício do poder familiar. A matéria esta disciplinada no Código Civil de 1916 no artigo 384, inciso IV, incumbindo aos pais representar os filhos até os dezesseis anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade até a cessação da incapacidade. Os artigos 142 do ECA e 1.634, inciso V do Código Civil de 2002 também conferem aos pais a representação e a assistência. 

Assim sendo, os atos notariais que envolvam de qualquer forma a manifestação do exercício do poder familiar devem conter a anuência do pai e da mãe do representado ou assistido, e caso a pátria potestade seja exercida somente por um dos pais, deve conter o ato a razão do não comparecimento do outro, em razão da perda, destituição ou extinção do poder familiar em razão do falecimento. 

Essa é a opinião do eminente JETHER SOTTANO, em excelente artigo publicado no Boletim de Direito Imobiliário 192 (Maio/1993): “o pátrio poder deve ser exercido pelo pai e pela mãe, simultaneamente, essa representação que é da mais alta importância deverá, numa demonstração de irrefutável consenso, ser manifestada e exercida por ambos os cônjuges, e não só pelo pai, como consigna, impropriamente, esse artigo. Vejo, nesses dispositivos legais, uma evidente incoerência e mesmo discrepância; dir-se-ia que a nova legislação modificou um artigo sem atentar para as prescrições do outro, em assunto tão correlacionado”. 

A própria lei traz os mecanismos necessários no caso de discordância do exercício do poder familiar dos pais, devendo a autoridade judiciária competente solucionar a divergência (parte final do artigo 21 do ECA). No caso de uma alienação de imóveis, por exemplo, os pais devem não só requerer a autorização judicial para a alienação como também comparecer na escritura para representar ou assistir o menor. Na aquisição,  não obstante o patrimônio do menor estar aumentando, os pais têm, no exercício do poder familiar, o direito de decidir sobre a viabilidade da aquisição.

Questão interessante diz respeito à qualificação do Oficial Registrador de ato notariais que desrespeitem a não observância das regras discutidas no presente trabalho. Ora, trata-se de norma de direito público que não pode ser superada pela vontade das partes por ser cogente, devendo o título ou ato ser desqualificado para correção. 

Ressalta-se que "o ato registrário não é lavratura ratificadora do ato notarial, e a observação da regularidade do ato não está restrita ao notário, sendo também inerente ao registrador, nos termos dos arts. 198 e 289, ambos da lei nº 6.015/73, a obrigatoriedade de análise formal do título apresentado a registro e da documentação que o instrui, em razão de seu dever funcional" (Apelação Cível nº 77.726-0/1 - DOE - 25/09/2001 - Conselho Superior da Magistratura de São Paulo).

O Oficial Registrador não pode estar obrigado à prática de atos ilegais, que violem o ordenamento jurídico e principalmente a Constituição Federal. Em seu poder de qualificação, o Registrador pode e deve rejeitar a prática de tais atos pois não observam os novos princípios do Direito de Família.

* Marcelo Melo é Escrevente do 4º Registro de Imóveis de São Paulo e colaborador deste Boletim Eletrônico
 



O Boletim Cartorário e o Irib - publicações recomendadas - Antônio Albergaria Pereira*


A vaidade é um sentimento inerente ao homem. É ridícula, se descamba para fatuidade. Negar que me sinto vaidoso, ao ser elogiado pela criação e manutenção do BOLETIM CARTORÁRIO, seria hipocrisia, tão ridícula quanto a fatuidade. Sinto-me realmente vaidoso quando o BOLETIM CARTORÁRIO é valorizado e exaltado pela sua existência e pela sua utilidade junto à classe cartorária. Quando o elogio parte de certas pessoas, ele, para mim, tem força energizante, a dar alento e estímulo, para que continue com a luta que iniciei há mais de dez anos: levar o cartorário, seja ele notário ou registrador, a ESTUDAR.

Pede o Dr. Sérgio Jacomino que sejam divulgadas no "excelente BOLETIM CARTORÁRIO" as últimas publicações editadas pelo "INSTITUTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO" e que a mim foram remetidas. São elas:

1- REGISTRO DE IMÓVEIS – o Lado Humano, de autoria de Ulysses da Silva, já objeto de comento no Boletim Cartorário nº 6, do 3º decêndio de fevereiro de 2002, página 4; 

2- REGISTRO DE IMÓVEIS, enfeixando trabalhos de destacados juristas brasileiros, apreciados nos encontros de Oficiais de Registro de Imóveis, em São Paulo (1998) e em Recife (1999); 

3- REGISTRO DE IMÓVEIS, enfeixando trabalhos apresentados no encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis, realizado em Vitória, em 2000. 

4- A PREVIDÊNCIA SOCIAL E O REGISTRO DE IMÓVEIS, de autoria de Ulysses da Silva; 

5- DIREITO REGISTRAL IMOBILIÁRIO, de autoria do culto e admirável oficial registrador Dr. ADEMAR FIORANELLI, por quem sempre tive admiração e respeito. Admiração pela sua comprovada cultura profissional; respeito pela sua postura humana de mestre e de colega de todos os que trabalham em cartório. 

Não posso neste registro omitir o nome de LINCOLN BUENO ALVES, pela sua atuação dinâmica, quando esteve à frente do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil, realizando o que foi, ainda é e sempre será o motivo de minha luta: INTEGRAÇÃO ENTRE NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO BRASIL.

Tenho o Dr. SÉRGIO JACOMINO como expressão de valor junto à classe dos Registradores Imobiliários do Brasil, por dois motivos que admiro:

1. É estudioso e combativo na defesa de suas idéias. 2. É um idealista, cujo ideal se identifica com o que adoto, ou seja, elevar intelectualmente a classe cartorária brasileira, através do ESTUDO. O cartorário estudioso adquire duas grandes oportunidades que o estudo que lhe dá: confirmação ou reformulação do seu saber. Antes de reproduzir o teor da carta que dele recebi, na qual ele registra que "o aprimoramento técnico e profissional dos registradores e notários brasileiros se faz também com bons livros", eu repito o que afirmou, em sentido mais amplo MONTEIRO LOBATO: "Um país se faz com homens e livros". E um cartório também. Para conhecimento de meus eleitores, a carta que recebi do Dr. SÉRGIO JACOMINO é a seguir transcrita:

"Prezado Dr. Albergaria,

Felicito-o pelo excelente Boletim cartorário que a cada decêndio ilustra-nos com excelente doutrina jurisprudência.

Gostaria de fazer chegar às suas mãos as últimas publicações editadas pelo nosso Instituto. Peço a gentileza de divulgar em seu Boletim as nossas iniciativas editoriais, cônscios de que o aprimoramento técnico e profissional dos registradores e notários brasileiros se faz também com bons livros.

Quero registrar a grata surpresa de ver publicado em seu Boletim pequeno artigo de nossa autoria, apresentando a decisão do Dr. Venício A. de Paula Salles que permite a aquisição de bens imóveis por condomínios.

A decisão é inovadora e se justifica seja amplamente divulgada pelas páginas que coordena no BDI. Agradeço sua deferência.

Aceite minhas cordiais saudações,

Sérgio Jacomino

Presidente"

* Antônio Albergaria Pereira é notário aposentado e editor do Boletim Cartorário.
 



SPC e Serasa - Projeto de lei reprime abusos em cadastros


A Comissão de Defesa do Consumidor, Meio Ambiente e Minorias aprovou o Projeto de Lei 5220/01 – na forma do substitutivo do relator, Luiz Ribeiro (PSDB-RJ) –, que altera a sistemática de inclusão ou exclusão de nomes de consumidores inadimplentes em cadastros de serviços de proteção ao crédito, como o SPC e o Serasa. Para o relator, o consumidor tem sido “atormentado” pelos registros negativos indevidos, e a divulgação pela mídia dos casos comprova os “vexames e constrangimentos” que ocorrem nesses casos. De acordo com o texto, práticas abusivas que possibilitem o abalo do crédito ou da reputação do consumidor podem levar os responsáveis à reparação por danos morais e materiais, com indenizações entre R$ 10 mil e R$ 500 mil.

COMUNICAÇÃO PRÉVIA

O substitutivo considera como prática abusiva, por exemplo, a inserção indevida de nomes em cadastros de inadimplentes. À exceção dos casos em que a sentença condenatória já tenha transitado em julgado, o registro de consumidores suspeitos de inadimplência será obrigatoriamente precedido de comunicação por escrito ao acusado. Mesmo assim, no prazo de dez dias após o recebimento do comunicado, o consumidor poderá pedir impugnação do registro, desde que apresente justificativa fundamentada. Os registros também não poderão conter informações negativas por período superior a cinco anos e, uma vez comprovada a extinção da causa, a exclusão do nome do inadimplente deverá ser feita em 48 horas.

Outras modificações importantes contidas no projeto referem-se à natureza de instituições como Serasa e SPC, bem como à divulgação das informações nelas contidas. Os bancos de dados e os cadastros, assim como os serviços de proteção ao crédito e instituições semelhantes, passam a ser considerados entidades de caráter público, para fins de habeas data – acesso amplo e gratuito dos consumidores aos seus dados. 

Fica proibido o repasse de informações entre essas entidades, estejam elas na mesma localidade ou em regiões diferentes. De outro lado, os serviços de proteção ao crédito deverão disponibilizar aos órgãos do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNAC), sem qualquer ônus, a consulta às informações contidas em seus bancos de dados e cadastros. 

O projeto tramita em caráter conclusivo e foi originalmente elaborado pela senadora Maria do Carmo Alves (PFL-SE), cuja redação visava alterar o Código de Defesa do Consumidor e instituir a Certidão Negativa de Débito (CND), instrumento para corrigir registros irregulares de inadimplência.

FÉ PÚBLICA

Em sua justificação, o deputado esclarece que, por lei, as certidões negativas só podem ser expedidas por órgãos dotados de fé pública, onde não se enquadram as empresas privadas mantenedoras dos serviços de proteção ao crédito. “Que órgão do Poder Público controla essas empresas?” indaga Luiz Ribeiro, lembrando que os acionistas do Serasa são as maiores instituições financeiras do País e os SPC são mantidos pelas associações comerciais. “Não existe qualquer controle. As reclamações só crescem, e sempre em detrimento do consumidor”, avaliou.

O parlamentar fluminense acrescentou que, atualmente, basta uma simples informação do comerciante ou fabricante para sujar o nome do consumidor, uma vez que os bancos de dados daquelas instituições não exigem protesto de títulos ou documentos de dívidas para o registro negativo. “Fica a palavra do credor contra a do devedor. E leva-se bastante tempo para regularizar a situação de quem foi negativado, que ainda precisa gastar dinheiro para voltar a ficar limpo na praça”, argumentou. “Isso, quando o informante não faliu ou mudou de endereço”, completou. Segundo Ribeiro, muitas vezes o consumidor só vem a saber do registro negativo tempos depois, quando necessita fazer um empréstimo ou crediário.

(Christian Morais/AM - Agência Câmara - [email protected])
 



Posta restante


Prezado amigo e líder Jacomino,

Lendo teu texto do BE # 475, 27/4/2002 (e toda matéria do Boletim, como faço sempre), a respeito da necessidade de unificação e integração dos serviços notariais e de registro, formato de sua fiscalização, etc., reporto-me ao Encontro do Irib em Maceió, em 1991, quando apresentei um singelo trabalho intitulado Notários e registradores - uma visão integrada, em que propugnava, ardorosamente, pela integração de todos os profissionais da área, antes mesmo da conquista da Lei 8935/94, que chamei de Lei possível, naquele momento em que presidia o Colégio Notarial do Brasil, em âmbito federal.

Muitos anos antes, propunha no RS a criação de bancos de dados, por exemplo, de todos os protestos do RS. Logo depois em São Paulo criou-se a Central de Testamentos, há algum tempo também funcionando no RS. 

Quero te dizer que teu esforço jamais será suficiente, se lutares quase solito (como dizemos na fronteira gaúcha). 

Por isso, depois de um pouco afastado das atividades classistas, a partir deste ano estou retomando as reuniões do Colégio Notarial no RS, inclusive tendo realizado no sábado passado um Encontro Notarial em minha cidade profissional, Novo Hamburgo-RS, com todos os delegados de nossa entidade no Estado, e com integrantes da minha delegacia regional, sediada em NH. Tratamos sobre o tema "A Ata Notarial e as Novas Tecnologias". 

Finalmente, quero me colocar à tua disposição, como soldado de nossa causa, visando a integração profissional, moral, social, institucional e tecnológica de nossa classe de notários e registradores. 

Por oportuno, terei o privilégio de poder comparecer em Natal, agora em Junho, quando espero poder te abraçar e conversarmos sobre tudo isso.

Felicidades e sucesso.

J. Flávio B. Fischer

[email protected]

www.tabelionatofischer.not.br

Confira do colega J. Flávio Bueno Fischer:

Compra e Venda

Doação

Deontologia Notarial

Função Notarial Criadora de Direito

Função Notarial Preventiva de Litígio

Mandato

Notários e Registradores - Uma Visão Integrada

Sociedades Civis e Sociedades Comerciais - Aspectos Distintivos



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