BE3290
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TJRS. Imóvel rural. Identificação. Destinação. Localização. IPTU. ITR. Incidência.
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA
RJV
Nº 70019421650
2007/Cível
DIREITO TRIBUTÁRIO. ITR E IPTU. IMÓVEL LOCALIZADO EM ÁREA URBANA, COM DESTINAÇÃO RURAL: INCIDÊNCIA DO ITR, E NÃO DO IPTU. INCLUSÃO DO IMÓVEL NO CADASTRO MUNICIPAL, PARA FINS DE IPTU: DEVE SER PRECEDIDA DE COMUNICAÇÃO AO PROPRIETÁRIO, PARA FINS DE EVENTUAL IMPUGNAÇÃO.
1. Relevante, para a definição da incidência do ITR (Imposto Territorial Rural) e do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), é a destinação econômica do imóvel tributável, e não a sua localização (rural ou urbana). O art. 32 do CTN não mais prevalece à vista dos arts. 15 e 16, do DL nº 57/66, não revogado pela Lei nº 5.868/72, declarada inconstitucional pelo STF e suspensa sua vigência pela Resolução nº 313/83, do Senado Federal. Assim, pode o Município instituir o IPTU sobre os bens imóveis localizados em sua zona urbana, definida em lei municipal, qualquer que seja o seu uso e destinação, ressalvados, contudo, os utilizados em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agro-industrial, que se sujeitam unicamente ao ITR, da competência federal.
2. Ademais, cabe ao Município comunicar ao proprietário, ensejando a ampla possibilidade de impugnação de sua parte, – o que não ocorreu na hipótese dos autos –, que seu imóvel rural foi incluído no cadastro fiscal para efeitos do IPTU em razão de sua consideração como urbano, e não ao seu proprietário, no sentido de que este informe que o seu imóvel está sujeito ao ITR.
Decisão: recurso desprovido. Unânime.
APELAÇÃO CÍVEL Nº 70019421650
SEGUNDA CÂMARA CÍVEL
COMARCA DE SANTA MARIA
APELANTE: MUNICIPIO DE SANTA MARIA
APELADO: ALFREDO BERLEZE & IRMAOS
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des. Arno Werlang (Presidente) e Des. Adão Sérgio do Nascimento Cassiano.
Porto Alegre, 12 de março de 2008.
DES. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS,
Relator.
Relatório
DES. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS (RELATOR)
Trata-se de apelação cível interposta pelo MUNICÍPIO DE SANTA MARIA à sentença de fls. 66/70, datada de 12/04/2006, que julgou procedente (para o efeito de declarar a falta de competência do Município para a tributação, via IPTU, do imóvel rural da empresa apelada, com a área de 69,01 has., localizado no território municipal) o pedido deduzido pela empresa ALFREDO BERLEZE & IRMÃOS LTDA. nos embargos por ela opostos à execução fiscal (tendo por objeto IPTU relativo aos exercícios de 1996 a 2000) que lhe move aquele e, via de conseqüência, condenou o Município ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, fixados estes em R$ 800,00.
Aos embargos, ajuizados em 1º/04/2002, foi atribuído o valor de R$ 4.428,29.
Apela o Município sustentando ser da sua competência a instituição do IPTU sobre todos os imóveis localizados em sua zona urbana, como no caso dos autos, definida pela Lei municipal nº 3.731/93, em vigor à época, além de existirem, no local, postes de iluminação pública e uma escola nas imediações, além, ainda, de três dos sócios residirem na área. Entende, ademais, que, “o fato da executada apresentar pagamentos feitos a título de ITR durante os anos em execução (1996 a 2000) não a exime de suas responsabilidades”, não podendo o Município “ser prejudicado pelo não-recolhimento do tributo de IPTU em razão de um erro cometido pela própria sociedade contribuinte”, além do que se constata que “a destinação econômica da área tributável em questão apresenta natureza nitidamente industrial, dada a empresa existente e as atividades industriais desenvolvidas”. Pede, assim, o provimento do apelo.
Em contra-razões recursais, pede a empresa apelada a manutenção da sentença, além de reiterar seus argumentos expendidos na inicial, entre os quais o fato de que atuava ela no beneficiamento de arroz, atualmente com suas atividades completamente desativadas, e que a área, com 69,01 hectares, tem sua destinação na manutenção de campos e matos, além de estar cadastrada na Receita Federal há muitos anos, pagando ITR, que se encontra em dia.
O Ministério Público de primeiro grau é pela desnecessidade de sua intervenção, não havendo manifestação da Procuradoria de Justiça neste grau de jurisdição.
É o relatório, que submeto à douta revisão.
Votos
DES. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS (RELATOR)
A doutrina e os Tribunais já chegaram a um definitivo consenso relativamente ao critério a ser adotado para a tributação (se ITR, da competência federal, ou se IPTU, da competência municipal), quando o imóvel puder, em tese e pelas aparências, ser enquadrado ora na categoria “rural”, ora na categoria “urbana”: é o da sua destinação (uso), e não o da sua localização (urbana).
Partiram da idéia de que– se o campo não anda bem, a cidade vai mal –, porque, afinal, o citadino depende sempre da produção rural (primária), para a sua sobrevivência.
Elucidativa, nesse particular, a seguinte ementa, lançada em acórdão do 1º Grupo Cível do TJERS (Embargos Infringentes nº 70001213685, de 06/10/2000, TJERS, Rel. Des. ARNO WERLANG):
ITR e IPTU. Critério distintivo entre área urbana e área rural. Relevância da destinação econômica da área tributável. 1. Relevante para distinguir a incidência do tributo, ITR ou IPTU, não apenas a localização do imóvel, mas a destinação econômica da área tributável. O art. 32 do CTN deve ser interpretado com as alterações introduzidas nos arts. 15 e 16, do DL nº 57/66, não revogado pela Lei nº 5.868/72, porque declarada inconstitucional pelo STF e suspensa sua vigência pela Resolução nº 313/83, do Senado Federal. 2. Os Municípios podem arrecadar impostos de sua competência dos imóveis: a) situados em suas zonas urbanas, definidas em lei municipal, qualquer que seja a sua destinação, ressalvados os utilizados em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial; b) situados fora de zona urbana, qualquer que seja a sua área, desde que utilizados exclusivamente como sítios de recreio.”
Assim, não mais se aplica, à vista do art. 15 do Decreto-Lei nº 57/66 (“Estatuto da Terra”), que determina a destinação do imóvel para fins rurais como elemento definidor da incidência do ITR, o art. 32 do Código Tributário (Lei nº 5.172/66), que tem na localização do imóvel o elemento definidor. É que, antes mesmo de entrar em vigor o Código Tributário, em 1º/01/1967, foi editado o “Estatuto da Terra” (DL nº 57/66) que, em seu art. 15 assim estabeleceu (ver, a propósito, a Revista dos Tribunais nº 658/105):
o disposto no art. 32 da Lei nº 5.172, de 25/20/1966, não abrange o imóvel que, comprovadamente, seja utilizado em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuniária ou agroindustrial, incidindo assim, sobre o mesmo, o ITR e demais tributos com o mesmo cobrados”.
Como bem salientou o eminente Des. GENARO JOSÉ BARONI BORGES, do mesmo 1º Grupo, como Redator designado para a lavratura de acórdão em outro feito de matéria idêntica, do qual foi relatora a Eminente Desª. LISELENA SCHIFINO ROBLES RIBEIRO (Embargos Infringentes nº 598543130, 1º Grupo, TJERS):
Já em dezembro de 1972 foi editada a Lei nº 5.868, que pretendeu estabelecer critério para a caracterização do imóvel como urbano ou rural, ... O STF, no entanto, em composição plena, declarou a inconstitucionalidade do art. 6º e seu parágrafo único, da Lei 5868, porque, ‘não sendo lei complementar, não poderia ter estabelecido critério, para fins tributários, de caracterização de imóvel rural ou urbano, diverso do fixado nos arts. 29 e 32 do CTN’ (RE 93.850/MG)”.
Aliás, os precedentes nesse sentido são inúmeros: REsp 492.869/PR, STJ, Rel. Min. TEORI ALBINO ZAVASCKI, j. em 15/02/2005; AgAg no Ag 498.512/RS, STJ, Rel. Min. PEÇANHA MARTINS, j. em 22/03/2005; REsp 738.628/SP, STJ, Rel. Min. CASTRO MEIRA, j. em 12/05/2005; AC 70016983496, TJRS, Rel. Des. CARLOS ROBERTO LOFEGO CANÍBAL, j. em 14/03/2007; AC e RN 70016191520, TJRS, Rel. Des. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO, j. em 14/03/2007; e AC 70014223168, TJRS, Rel. Des. JOÃO ARMANDO BEZERRA CAMPOS, j. em 07/03/2007.
Conseqüentemente, a solução, aqui, não será diferente, até porque foi nesse sentido que a respeito já me manifestei no meu DIREITO TRIBUTÁRIO NACIONAL (Livraria do Advogado, 2002, 3ª edição, p. 161/162).
Aliás, em resposta à alegação do Município, de que, “o fato da executada apresentar pagamentos feitos a título de ITR durante os anos em execução (1996 a 2000) não a exime de suas responsabilidades”, não podendo o Município “ser prejudicado pelo não-recolhimento do tributo de IPTU em razão de um erro cometido pela própria sociedade contribuinte”, além do que se constata que “a destinação econômica da área tributável em questão apresenta natureza nitidamente industrial, dada a empresa existente e as atividades industriais desenvolvidas”, lembro que a omissão, na verdade, foi do próprio Município, que não comunicou à empresa apelada, quando do lançamento, a inclusão da sua área no cadastro municipal, para que tomasse ela desde logo as providências legais cabíveis, inclusive o seu insurgimento à pretensão municipal, tal como acenado nos seguintes acórdãos, de minha lavra, entre tantos outros:
DIREITO TRIBUTÁRIO. DECRETAÇÃO, DE OFÍCIO, DA PRESCRIÇÃO EM MATÉRIA TRIBUTÁRIA: POSSIBILIDADE. DESMEMBRAMENTO DE ÁREA EM TERRENOS VIRTUAIS, PARA EFEITOS DE IPTU E TAXAS CORRELATAS: IMPOSSIBILIDADE. CDA QUE OMITE REQUISITOS DO ART. 202 DO CTN: NULIDADE.
1. Diferentemente do que ocorre no direito privado, em que a prescrição, além de renunciável pela parte a quem aproveita, não pode ser decretada de ofício por extinguir apenas o direito à ação e não seu objeto, no direito tributário (que, por ser autônomo, possui regras próprias, cf. arts. 146, III, ‘a’ e ‘b’, da CF/88, combinadas com os arts. 109 e 110 do CTN) a decretação, de ofício, da prescrição, é perfeitamente possível porque, além de irrenunciável (porque imposta por lei), com sua consumação tanto ocorre a extinção do crédito tributário (art. 156, V) como a respectiva ação de cobrança (art. 174, “caput”), daí porque não pode o magistrado, constatando a inexistência de causa impeditiva, suspensiva ou interruptiva da sua contagem, de informação a cargo do Fisco, manter ativa uma ação sem objeto e sem interesse jurídico a resguardar, não lhe cabendo outra alternativa senão extingui-la (cf. art. 267, VI, e 269, IV, do CPC). Precedentes: AC nº 70005205117, 13/11/02, 1ª Câmara Cível, TJRS, e REsp nº 543913/RO, 09/12/03, 1ª Turma, STJ).
É nulo o lançamento de IPTU e de taxas correlatas sobre terrenos virtuais, artificialmente concebidos pelo Município dentro de uma área maior, porquanto a tributação somente alcança fatos reais, no caso, lotes existentes, individualizados, demarcados, com infra-estrutura própria, e devidamente assentados no Cartório de Registro de Imóveis, aberto ao público, inclusive ao Fisco Municipal, por se enquadrar o referido imposto na modalidade de lançamento ‘direto’, do qual o contribuinte não participa. Precedente: AC e RN nº 70001492479, 19/12/01, 1ª Câmara Cível, TJRS.
2. Exige-se, para a validade da cobrança, notificação pessoal do sujeito passivo respectivo, sempre que se tratar de lançamento ‘de ofício’, como na hipótese de inclusão no cadastro fiscal municipal, para efeitos de IPTU e taxas correlatas, de imóvel de origem rural, em razão de sua consideração como urbano pela lei municipal, porquanto não pode o sujeito passivo ser tomado de surpresa quanto ao lançamento e seus efeitos, devendo ser-lhe possibilitado o mais amplo direito de defesa administrativa em relação à inclusão e ao valor lançado. Precedente: AC nº 70002607448, 17/10/01, 1ª Câmara Cível, TJRS.
3. É nula de pleno direito (art. 203 do CTN) a CDA da qual não consta a indicação do livro e da folha da sua inscrição, requisito indispensável para a sua cobrança e defesa judicial, a teor do art. 202 do referido Código. Apelo provido. Unânime”.
(AC nº 70008902678, julg. em 11/08/2004, 2ª Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS).
DIREITO TRIBUTÁRIO. IPTU. LANÇAMENTO DE OFÍCIO: NECESSIDADE DE NOTIFICAÇÃO PESSOAL. Exige-se a notificação pessoal do sujeito passivo sempre que se tratar de lançamento ‘de ofício’, como o efetuado por força de inclusão do imóvel no cadastro fiscal em razão de sua consideração como urbano, já que, em casos tais, o sujeito passivo é sempre tomado de surpresa quanto à efetivação do lançamento, diferentemente do que ocorre quando se trata de lançamento ‘direto’, periódico e rotineiro, com data de pagamento legalmente prevista, caso em que, por estar o contribuinte já ciente de que seu imóvel se encontra cadastrado como urbano, sujeito, portanto, ao IPTU, a notificação pessoal se torna absolutamente desnecessária, constituindo, tanto ela como a eventual remessa de carnês de pagamento ou convocação geral pela imprensa (edital), mera cortesia e lembrete do sujeito ativo, no interesse da agilização e efetivação da arrecadação. Não havendo a notificação pessoal em casos tais, deve a execução ser extinta”. (AC nº 70002607448, julg. em 17/10/2001, 1ª Câmara Cível, TJRS, Rel. Des. ROQUE JOAQUIM VOLKWEISS).
Em suma: relevante, para a definição da incidência do ITR (Imposto Territorial Rural) e do IPTU (Imposto Predial e Territorial Urbano), é a destinação econômica do imóvel tributável, e não a sua localização (rural ou urbana). O art. 32 do CTN não mais prevalece à vista dos arts. 15 e 16, do DL nº 57/66, não revogado pela Lei nº 5.868/72, declarada inconstitucional pelo STF e suspensa sua vigência pela Resolução nº 313/83, do Senado Federal. Assim, pode o Município instituir o IPTU sobre os bens imóveis localizados em sua zona urbana, definida em lei municipal, qualquer que seja o seu uso e destinação, ressalvados, contudo, os utilizados em exploração extrativa vegetal, agrícola, pecuária ou agroindustrial, que se sujeitam unicamente ao ITR, da competência federal.
Ademais, cabe ao Município comunicar ao proprietário, ensejando a ampla possibilidade de impugnação de sua parte, – o que não ocorreu na hipótese dos autos –, que seu imóvel rural foi incluído no cadastro fiscal para efeitos do IPTU em razão de sua consideração como urbano, e não ao seu proprietário, no sentido de que este informe que o seu imóvel está sujeito ao ITR.
Por essas razões, nego provimento ao apelo.
É o voto.
DES. ADÃO SÉRGIO DO NASCIMENTO CASSIANO (REVISOR) - De acordo.
DES. ARNO WERLANG (PRESIDENTE) - De acordo.
DES. ARNO WERLANG - Presidente - Apelação Cível nº 70019421650, Comarca de Santa Maria: “NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO, NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. UNÂNIME.”
Julgador(a) de 1º Grau: DANIEL NEVES PEREIRA
(Fonte: Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul)
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