BE3225
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Dúvida – cabimento – título judicial. Ação de divisão. Disponibilidade. Especialidade. Continuidade.
Recurso em Mandado de Segurança. Registro de imóvel. Ação de Divisão. Suscitação de Dúvida. Cabimento.
I - Tendo em vista os princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade que norteiam os registros públicos, assegurando-lhes a confiabilidade dos mesmos, pode o Oficial do Registro suscitar dúvida, independentemente de ser título judicial ou extrajudicial.
II - Não preenchidos os requisitos exigidos para a pretendida transcrição no Registro de Imóveis, inexiste o alegado direito líquido e certo a ser amparado pelo mandamus.
III - Recurso em mandado de segurança desprovido.
RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA Nº 9.372 - SP (1998D0003044-1)
RELATOR: MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
RECORRENTE: HAJIME ANTÔNIO SATO E OUTROS
ADVOGADO: HEITOR GAYER E OUTRO
T. ORIGEM : TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
IMPETRADO: CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DE SÃO PAULO
EMENTA
Recurso em Mandado de Segurança. Registro de imóvel. Ação de Divisão. Suscitação de Dúvida. Cabimento.
I - Tendo em vista os princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade que norteiam os registros públicos, assegurando-lhes a confiabilidade dos mesmos, pode o Oficial do Registro suscitar dúvida, independentemente de ser título judicial ou extrajudicial.
II - Não preenchidos os requisitos exigidos para a pretendida transcrição no Registro de Imóveis, inexiste o alegado direito líquido e certo a ser amparado pelo mandamus.
III - Recurso em mandado de segurança desprovido.
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, negar provimento ao recurso ordinário. Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Nancy Andrighi e Castro Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Brasília, 19 de maio de 2005 (Data do Julgamento)
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro
Relator
RELATÓRIO
EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO: Trata-se de recurso em mandado de segurança interposto por Hajime Antonio Sato e outros contra acórdão unânime proferido pelo Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado:
"Mandado de segurança - Registro de imóveis- Apresentação de carta de sentença, extraída dos autos de ação de divisão, para registro - Dúvida suscitada e acolhida - Recurso interposto que foi desprovido pelo E. Colendo Conselho Superior da Magistratura - Pretensão que implica ofensa aos princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade - Necessidade, ainda, de submeter o título judicial á qualificação, de acordo com os princípios que regem o registro imobiliário - Inexistência de violação de direito líquido e certo, bem como, de desrespeito ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada - Segurança denegada." (fls. 85)
Alegaram os recorrentes que, embora entendam "que o registro da Carta de Sentença não afronta os princípios registrários da disponibilidade, especialidade e continuidade, ainda que tal ocorresse, jamais poderia constituir óbice ao registro da Carta de Sentença extraída dos autos da divisão judicial, processo contencioso que culminou com sentença de mérito transitada em julgado pondo termo à comunhão existente e atribuindo aos condôminos os seus quinhões." (fls. 93).
Afirmam que é admissível o acerto quanto à necessidade de se submeter o título judicial à qualificação, de acordo com os princípios que regem o registro imobiliário, mas isso não pode acontecer no caso de título judicial decorrente de sentença extraída em ação de Divisão, dado a especificidade desta ação e da sentença cujos limites objetivos ao abrigo da coisa julgada abrangem detido e aprofundado exame dos títulos de propriedade que servem de base ao título judicial que é levado a registro.
Afirmam os recorrentes, verbis:
"Pouco importa e é irrelevante na espécie, questionar o acerto ou desacerto das sentenças proferidas na divisão, assim como absolutamente irrelevantes a invocação do princípio de continuidade dos Registros Públicos, a alegação de que não coincidem as áreas e descrição constantes do registro público com as apuradas na divisão, ou de que houve desmembramento inferior ao módulo.
Face ao trânsito em julgado das sentenças proferidas na divisão, hão há mais que questioná-las, ainda que erradas, mas simplesmente cumpri-las, dada a imutabilidade da prestação jurisdicional do Estado, já definitivamente entregue aos Impetrantes, como decorrência da coisa julgada." (fls. 96D97).
Salientam, ainda, que a modificação da sentença ou sua desconstituição parcial, como sugerido pelo acórdão recorrido, não é possível, tendo em vista tratar-se de sentença de mérito com trânsito em julgado, não sendo mais possível a sua desconstituição através de rescisória, dado o decurso de 02 anos.
Além disso, aduzem, o referido imóvel já foi desapropriado pela Sabesp no curso de processo divisório, sendo inviável a reconstituição física do imóvel pois grande parte se encontra submersa sob as águas da represa da desaproprianda.
Nesta instância, manifestou-se a douta Subprocuradoria-Geral de República pelo desprovimento do apelo (fls. 111D113).
É o relatório.
VOTO
EXMO. SR. MINISTRO ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO: - Conforme se verifica dos autos, foi negada a transcrição do registro de imóvel de área contemplada na ação de divisão, cuja sentença já havia transitado em julgado. E isso porque a área contemplada era superior à do respectivo assentamento transcrito.
Ainda que compreenda a irresignação dos recorrentes, não há como prover o seu apelo.
O fato de a sentença na ação de divisão ter transitado em julgado não isenta a autora do ônus de satisfazer os requisitos da Lei de Registros Públicos.
Maria Helena Diniz afirma que "o procedimento registrário é de inteira responsabilidade do Cartório e do serventuário, que deverá examinar os títulos apresentados, extrair elementos para a matrícula e observar rigorosamente todas as exigências legais para que se possa fazer o assento do título que lhe foi exibido." (In Sistemas de Registros de Imóveis, pág. 243).
Avelino se Bona, em seu livro "Títulos Judiciais no Registro de Imóveis" também sustenta:
"Todas as providências euremáticas que, em razão do cargo, são exigidas do oficial visam contribuir para a segurança e eficácia jurídica dos atos ou negócios registrados. Por isso, quanto à função qualificadora, o ordenamento jurídico não faz distinção entre títulos públicos, judiciais e extrajudiciais, e títulos particulares.
No pertinente aos títulos originados em sede judicial, o registrador imobiliário não pode omitir-se de efetuar o devido exame e conseqüente qualificação.
Inconcusso que essa função qualificadora extensiva aos títulos jurisdicionais não pode ser considerada como concessão ao oficial de uma atividade revisora de atos judiciais a ele submetidos, mas ele a exerce em decorrência do encargo de guarda da segurança jurídica e da regularidade do Registro Público." (Ob. citada, pág. 71).
O acórdão recorrido denegou a segurança por não se verificar o direito líquido e certo dos impetrantes, como se pode ver do seguinte trecho do voto, verbis:
"Não há ofensa ao ato jurídico perfeito, ou á coisa julgada, pois o próprio Colendo Conselho Superior da Magistratura já se manifestou, de forma reiterada, no sentido de que também os títulos judiciais submetem-se à qualificação, particularmente para a verificação de sua conformidade com os postulados e princípios registrários (Apelações Cíveis nºs 15.909-0D3, 16.923-0D4, 18.162-0D0, 15.757-0D9, 15.808-0D2, 16.142-0D0, 17.627-0D1 e 18.768-0D0).
Aliás, a inobservância desta qualificação, imprescindível ao registro, tornaria este imprestável e um verdadeiro caos passaria a existir, como ocorria anteriormente á exigência desta qualificação.
Da mesma forma, a carta de sentença, porque constitui título judicial, não estava dispensada deste requisito, imprescindível á boa ordem dos serviços e ao atendimento de sua finalidade.
E não há que se argumentar com ato jurídico ou coisa julgada, porquanto a desqualificação verificada não vulnera o título mencionado. Ao contrário, foi examinado e mantido íntegro, apenas e tão-somente afastada a possibilidade de sua inscrição, por não observar os princípios registrários (Apelação Cível nº 14.583-0D7).
Demais disso, tem-se que o ingresso do título caracterizaria nítida ofensa aos princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade.
Com efeito, a carta de sentença contém área cuja extensão supera a força do respectivo assentamento imobiliário. Em outras palavras, não há coincidência entre o título apresentado e os dados do registro real, o que é de todo inadmissível.
Outrossim, há ainda, outro óbice impedindo o registro pretendido pelos impetrantes.
Efetivamente, verifica-se que os quinhões, decorrentes do auto de divisão, apresentam áreas inferiores ao módulo permitido para a região. Tratando-se de desmembramento de imóvel rural, com ofensa á fração mínima exigida para o parcelamento, imprescindível a autorização do INCRA." (fls. 86D87).
Os Tribunais de Justiça têm mantido o entendimento de que não há distinção entre os títulos judiciais e extrajudiciais para fins de suscitação de dúvida, tendo em vista os princípios registrários, como citados na já referida obra de Maria Helena Diniz. Transcrevo alguns deles, verbis:
"AC 993-0, Iguape, 11-5-1982 - Não há distinção na lei entre títulos judiciais e extrajudiciais para fins de exame pelo Oficial do Registro de Imóveis. Ambos podem ser objeto de dúvida.
AC 1.558-0, Palmital, 3-11-1982 - "Os títulos judiciais também são susceptíveis de suscitação de dúvida, na medida em que também podem não se ajustar aos princípios norteados do Registro de Imóveis."
AC 452-0, Guarujá, 11-11-1981 - Os mandados judiciais, como qualquer outro título, são suscetíveis de apreciação, pelo Oficial, à luz dos princípios normativos dos Registros Públicos. Também em relação a eles pode ser suscitada dúvida.
RT, 582:88 - A origem judicial do título não o alivia do ônus de satisfazer os requisitos de ingresso no Registro Imobiliário, mui especialmente cabendo ao oficial velar pela observância dos princípios normativos que são peculiares aos Registros Imobiliários, dentre eles, com destaque, o da continuidade dos registros.
RT, 585:85 - A origem judicial dos títulos não os alivia do exame pelo oficial, tendo em conta os princípios registrários, sendo certo que, se ao registrador não é dado objetar às partilhas julgadas, também não pode deixar de lado o controle que lhe cabe, indiscutivelmente, p.ex., sobre a obediência aos princípios da continuidade e da especialidade, RT, 551:101; 286.908 - RT, 539:103; 271.597 - RT, 517:121; 271.182; 269.827 - RT, 515:112; 980-0; 993-0)."(fls. 347D348).
Tendo em vista os princípios da disponibilidade, especialidade e continuidade que norteiam os registros imobiliários, assegurando-lhe a confiabilidade dos mesmos, não poderia ser procedido o registro como requerido pelos impetrantes, ora recorrentes. A recusa do registrador não configura ofensa à coisa julgada, estando os títulos judiciais também suscetíveis de apreciação dos requisitos exigidos.
Assim, não preenchendo os requisitos exigidos, tendo em vista ser a área contemplada superior à disponibilidade do respectivo assentamento transcrito, além de a parcela ser inferior ao módulo exigido, o direito líquido e certo dos impetrantes não se apresenta patente.
Ante o exposto, nego provimento ao recurso.
CERTIDÃO DE JULGAMENTO
TERCEIRA TURMA
Número Registro: 1998D0003044-1 RMS 9372 D SP
Números Origem: 224170 369640 36964096
PAUTA: 03D05D2005 JULGADO: 19D05D2005
Relator
Exmo. Sr. Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO
Presidenta da Sessão
Exma. Sra. Ministra NANCY ANDRIGHI
Subprocurador-Geral da República
Exmo. Sr. Dr. BENEDITO IZIDRO DA SILVA
Secretário
Bel. MARCELO FREITAS DIAS
AUTUAÇÃO
RECORRENTE: HAJIME ANTÔNIO SATO E OUTROS
ADVOGADO: HEITOR GAYER E OUTRO
T. ORIGEM: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
IMPETRADO: CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA DO ESTADO DE SÃO PAULO
ASSUNTO: Civil - Direito das Coisas - Posse - Divisória
CERTIDÃO
Certifico que a egrégia TERCEIRA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:
A Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso ordinário. Os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros, Nancy Andrighi e Castro Filho votaram com o Sr. Ministro Relator.
Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Carlos Alberto Menezes Direito.
Brasília, 19 de maio de 2005.
MARCELO FREITAS DIAS
Secretário
(D.J. de 13/6/2005)
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