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23º Encontro Regional dos Oficiais de Registro de Imóveis em Belém do Pará recebe cem participantes de 12 estados e 30 cidades


O evento contou com a participação de colegas do Pará, Roraima, Rio Grande do Norte, Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Goiás, Amapá, Distrito Federal, Espírito Santo, Rio de Janeiro e São Paulo foram os estados presentes. Além da capital, o Pará esteve representado por cidades de nomes tão sonoros como Ananindeua, Brasil Novo, Conceição do Araguaia, Cametá, Dom Eliseu, Itupiranga, Nova Ipixuna, Novo Progresso, Parauapebas, Ponta de Pedras, Salinópolis, São Geraldo do Araguaia, Soure e Uruará.

O 23º Encontro Regional dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, realizado em Belém, nos dias 12 e 13 de outubro, discutiu temas de interesse nacional e regional como certificação digital, fatores da irregularidade fundiária no Brasil, lei 11.441, grilagem de terras, qualificação registrária, retificação e georreferenciamento de registro.

A solenidade de abertura do encontro foi presidida pelo presidente do Irib  Helvécio Duia Castello e contou com a participação de Cleomar Moura, vice-presidente do Irib pelo estado do Pará; José Torquato Araújo de Alencar, juiz auxiliar da vice-presidência do TJPA; José Benevenuto Andrade Vieira, assessor da Companhia de Desenvolvimento da Área Metropolitana de Belém, Codem, representando o prefeito municipal de Belém, Duciomar Costa; desembargadorEliziário Bentes, presidente do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região; Wilton Nery dos Santos, promotor de Justiça, representando o procurador-geral de Justiça, doutor Geraldo de Mendonça Rocha; Regina Fernandes, defensora pública, representando a defensora pública geral do estado do Pará, Anelyse Santos de Freitas; e Ângela Sales, presidente da OAB-PA.

Cleomar Moura, anfitrião do encontro, apresentou os primeiros cumprimentos e agradecimentos e destacou o empenho dos registradores do Pará vindos de localidades distantes em busca de conhecimento. “O objetivo deste congresso é aproximar cada vez mais o Irib dos registradores, democratizar o conhecimento, promover debates e estimular a discussão, de forma a contribuir para o aperfeiçoamento e a capacitação profissional de registradores e notários. Nossa responsabilidade é responder à credibilidade outorgada pela sociedade e prestar serviços eficientes, seguros e rápidos, bem como excelente atendimento ao público.”

Segundo o registrador, a expressão popular “culpa no cartório” demonstra a credibilidade que o serviço goza junto à sociedade. “Não há sistema mais capaz de impulsionar a economia, dar segurança ao crédito e proporcionar a necessária segurança jurídica para a prática dos atos mais importantes na vida do cidadão. Os cartórios se modernizam, muitos estão totalmente informatizados e prestam serviços pela Internet, com mais rapidez e eficiência”.

Rapidez, eficiência, modernidade e segurança nos registros

Rapidez, eficiência, modernidade e segurança também foram as palavras de ordem utilizadas por Helvécio Castello na abertura dos trabalhos. “O sistema notarial e registral brasileiro é mais importante do que se imagina. Os imóveis são bens de extrema valia. São ativos financeiros que geram riqueza, progresso, empregos e renda, desde que estejam legalizados e registrados.”

Ele lembrou a necessidade e importância de se reduzir drasticamente a clandestinidade jurídica dos imóveis. “Um imóvel irregular não tem capacidade de gerar riquezas para seu proprietário, não proporciona segurança à família e à sociedade.”

Todos os registradores têm a responsabilidade de viabilizar a regularização fundiária e isso é uma das coisas mais importantes que o administrador público brasileiro pode fazer pelo país. O cidadão precisa ter sua propriedade regularizada para que possa exercer o seu direito de cidadania plena”.

Além das questões jurídicas da regularização fundiária, o presidente do Irib falou sobre a inevitabilidade de a prestação de serviços de notas e registros migrar do mundo físico para o mundo virtual. “A informática, pura e simplesmente, não resolve mais os problemas e nem atende às necessidades tanto do poder Judiciário quanto do sistema registral e notarial”.

E citou a exposição do secretário-executivo do Conselho Nacional de Justiça, Sérgio Tejada, no XXXIV Encontro dos Oficiais de Registro de Imóveis do Brasil, em Florianópolis, sobre a necessidade de integração do poder Judiciário brasileiro com os serviços notariais e registrais. “O Brasil tem 97 tribunais de diferentes naturezas. De acordo com o doutor Sérgio Tejada, ainda que alguns deles sejam ilhas de excelência no trato da documentação, são ilhas que não se comunicam entre si. Por isso, ao criar um mecanismo para possibilitar a intercomunicação entre os tribunais, o CNJ desempenha papel fundamental nesse processo. Na era digital não se aceita mais que um simples ofício de indisponibilidade decretado por uma autoridade do Banco Central leve mais de 60 dias para chegar a um cartório no interior do estado de São Paulo, o mais rico da Federação. O que dirá para chegar aos cartórios de outros estados?”

Essa preocupação levou o Irib a desenvolver um grande portal eletrônico em parceria com outras entidades nacionais representantes de notários e registradores: a Central Registral de Serviços Eletrônicos Compartilhados, CRSEC. “Ao falar em digitalização, desmaterialização de documentos, certificado digital e assinatura eletrônica, não estamos tratando do futuro, mas de algo que já está acontecendo”, afirmou Helvécio Castello. “No entanto, a utilização dessa nova tecnologia não deve ser motivo de preocupação ou insegurança para os registradores, o processo será tão simples quanto passar da caneta tinteiro para a esferográfica”.

O presidente do Irib informou, ainda, que a partir deste ano a Receita Federal do Brasil obrigará as pessoas jurídicas a entregar suas declarações de imposto de renda por meio do certificado digital. Para o próximo ano, está programada a obrigatoriedade de as pessoas jurídicas fazerem contrato com a Receita Federal utilizando o certificado digital. Quanto aos cartórios, será editada uma instrução normativa para que a declaração de operação imobiliária, DOI, seja encaminhada à Receita com o uso do certificado digital. Ainda em 2008, todos os registradores serão obrigados a possuir certificado digital para assinar eletronicamente o encaminhamento das declarações de operações imobiliárias para a Receita federal. “O poder Judiciário brasileiro é hoje o mais avançado em matéria de desmaterialização documental, certificação digital e informatização”.

Central Registral de Serviços Eletrônicos Compartilhados – o IRIB na era digital

Em sua palestra, Helvécio Castello fez uma retrospectiva do surgimento do documento eletrônico no Brasil, com a edição da medida provisória 2.200, de 27 de julho de 2001, que criou a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira, ICP-Brasil. “O modelo brasileiro é o mais avançado do mundo em matéria de tecnologia digital e documento eletrônico”, afirmou. “A estrutura de raiz única, isto é, uma autoridade certificadora raiz que define como serão as regras de utilização da documentação eletrônica em todo o país, só existe no Brasil. A Espanha e os Estados Unidos trabalham com sistemas autônomos, não há um padrão de linguagem obrigatória. Com a MP 2.200, o Brasil criou padrões de interoperabilidade de governo eletrônico, o e-ping, que define um conjunto de políticas e especificações técnicas que regulamentam a utilização da tecnologia de informação e comunicação, TIC, no governo federal, estabelecendo as condições de interação com os demais poderes e esferas de governo e com a sociedade em geral.”

Falou sobre as propriedades do documento eletrônico: autenticidade, integridade, não-repúdio e sigilo. E anunciou: “O Irib está desenvolvendo um programa que permitirá tanto assinar digitalmente quanto abrir um documento assinado digitalmente e que ficará disponível na Internet, para download gratuito por qualquer pessoa.”

Os fatores que contribuíram para o panorama de irregularidade no Brasil

A diretora do Irib, Patricia André de Camargo Ferraz, proferiu palestra sobre regularização fundiária, cujo tratamento não considera adequado no Brasil em razão de uma visão distorcida dos problemas que envolvem a irregularidade dos imóveis no mercado em geral. “A falta de conhecimento resulta em perda de tempo e energia, principalmente dos governos estaduais e municipais, e do próprio governo federal, uma vez que não conseguem, ao final dos processos de regularização, alcançar a meta que buscavam.”

Ela chamou a atenção para os fatores que contribuíram para o panorama de irregularidade no Brasil, principalmente dos imóveis urbanos. Um deles está contido na lei 6.766/79, os requisitos urbanísticos para regularização ou aprovação dos projetos de parcelamento do solo urbano. “Determinados requisitos urbanísticos e ambientais da lei 6.766, considerados muito rigorosos, acabaram por provocar a fuga dos proprietários de glebas aos processos de formalização dos parcelamentos do solo urbano”, explicou. Um desses requisitos, já retirado da lei 6.766, dizia que 35% de toda área a ser parcelada num processo de loteamento urbano deveriam ser destinados ao poder público para implantação de sistema viário, áreas verdes e equipamentos públicos.

Um outro dispositivo previsto na lei 6.766 era a vedação de parcelamento do solo urbano em áreas de intensa declividade e áreas ambientalmente protegidas.

A dificuldade procedimental também terminou por afastar muitos proprietários de glebas parceladas dos processos de formalização regular do solo urbano”, disse Patricia Ferraz. “Em alguns casos, a fixação de diretrizes pelo poder público para que o empreendedor possa desenvolver seu projeto de parcelamento do solo demora meses e até anos. E quando ele desenvolve seu projeto de parcelamento, o poder público demora outros tantos meses ou anos para aprová-lo. Finalmente, o empreendedor consegue levar toda essa documentação ao registro de imóveis e, muito freqüentemente, encontra problemas para o registro do parcelamento.”

Lei 11.441 – inventário, partilha, separação e divórcio consensuais por via administrativa

O professor de Direito e tabelião de notas, Zeno Veloso, proferiu palestra sobre a lei 11.441, de 4 de janeiro de 2007,que, segundo ele, traz algumas dúvidas e problemas para quem pretende analisá-la com boa-fé e neutralidade, ou mesmo para os intérpretes ainda presos ao passado e a uma burocracia de carimbos e homologações.

Surgem pelo país afora as mais diversas interpretações negativas, algumas merecem destaque por estarem na contramão da lei”.

A interpretação mais comum, de acordo com o tabelião, diz respeito à necessidade de homologação da partilha. “Ora, se há necessidade de homologação do instrumento, por que a lei foi criada? Outra dúvida refere-se à separação amigável, que não seria possível porque a Constituição federal somente faz referência às separações judiciais. Tudo o que a lei diz que pode, na verdade, não pode? Esse raciocínio é perigoso”.

Zeno Veloso relatou que já houve tentativas anteriores de aprovar essa lei. “Quando a lei estava praticamente aprovada na Comissão de Constituição e Justiça, um deputado de São Paulo aventou que a Constituição federal faz menção apenas à separação judicial. Hoje, com a lei foi aprovada, se esse problema persistir, certamente a legislação será dada como inconstitucional.”

O professor entende que a lei 11.441 veio para simplificar procedimentos, baratear custas e desburocratizar o processo para ganhar tempo. “Esses aspectos têm de ser considerados. A lei exige uma interpretação equivalente e compatível com essas finalidades”.

Grilagem de terras: ainda somos um país posseiro

Paraguassu Éleres, defensor público, agrimensor e mestre em Direito agrário abordou a grilagem de terras, que classificou de duas formas: particular e institucional.

Grilagem é a apropriação indevida da terra, como a tomada de terras do México pelos Estados Unidos. Aquilo foi de fato uma grilagem, uma parte da Califórnia os americanos compraram, mas o resto foi tomado”, comentou.

O palestrante explicou que o Brasil também é uma terra de grileiros. “Pelo tratado de Tordesilhas, o Brasil estaria limitado entre Belém e Laguna, uma vez que a linha vertical de pólo a pólo, a partir do meridiano de Cabo Verde, passava entre Belém e Laguna”.

Entre 1580 e 1640, segundo Éleres, os luso-brasileiros valeram-se do fato de que Espanha e Portugal tinham a mesma bandeira para adentrarem o território, que aumentou 268%. “Formamos um território de 8.511.965 km2, e ainda estamos tomando posse dessas terras. Ainda somos um país posseiro. Segundo Patricia Ferraz, apenas 2% dos imóveis são registrados”.

O palestrante deu como exemplo o quarteirão formado pela estação de ônibus de Belém. “Existem áreas que não estão no nome do governo do estado; não foram compradas e nem desapropriadas. Ou seja, o próprio governo não tem a propriedade da área que utiliza”.

Institucional é aquilo que é cometido pela União federal contra os estados-membros. Inaugurada a República, o artigo terceiro da Constituição federal reservou uma área de 14.400 km2 do Planalto Central para construir a capital federal. Mas o artigo 64 dispõe que pertencem aos estados todas as terras devolutas, ficando para a União apenas as áreas de fronteira de 10 léguas, 66 km. O decreto 1.164/39 aumentou essa área para 150 km. Eis aí a primeira grilagem”.

Paraguassu Éleres ressaltou a importância dos registradores na legalização das terras no Brasil.

Retificação georreferenciamento: autonomia do registrador garante a efetividade do registro imobiliário

O diretor de assuntos agrários do Irib, Eduardo Augusto, demonstrou que procedimentos aparentemente burocráticos contribuem para o crescimento econômico do país e a diminuição das desigualdades sociais. Ele abordou os fundamentos acadêmicos e doutrinários dos atos registrais.

Falou das regras jurídicas do Direito registral imobiliário, a começar por seus princípios basilares, e demonstrou que a legislação fornece elementos suficientes para lastrear a autonomia do registrador. “A função do registrador é jurídica, ele é um profissional do Direito que trabalha com segurança jurídica, qualificação registral, prudência. Ele deve ter autonomia, para garantir a efetividade do registro imobiliário, e estar subordinado apenas às leis.”

O registro imobiliário depende da segurança jurídica cujo pressuposto é a qualificação registral, ou seja, a atuação do registrador na verificação do título, se ele pode ou não ter acesso à tábua registral, se o título está ou não apto a constituir aquele direito com o registro. Ao verificar um título, o registrador utiliza o saber jurídico prudencial – prudência, decisão –, que requer o princípio da autonomia. Só assim, poderá decidir sobre o que deve ser retificado ou registrado”, comentou.

O palestrante ainda apresentou casos práticos em que os dados técnicos não correspondiam à realidade dos dados da matrícula e defendeu a autonomia do registrador para proceder a retificação nesses dados. Para ele, a exatidão das informações, descritas de forma simples, objetiva e clara, com os dados necessários, dão segurança jurídica e, conseqüentemente, atraem investidores, reduzindo o risco Brasil e as taxas de juros, o que movimenta a economia e gera emprego.

Qualificação registrária abrange todos os títulos, incluindo os judiciais

O desembargador Ricardo Henry Marques Dip, do Tribunal de Justiça de São Paulo, esteve em Belém para falar sobre a qualificação registral.  Do ponto de vista prático, informou o desembargador, qualificação registral é o exame do título que vai ser registrado. É um julgamento se deverá ou não ser registrado o título. “No entanto”, observou, “não podemos nos deixar trair pela aparente simplicidade de um conceito. Aristóteles define o homem apenas como animal racional, mas sabemos da complexidade desse conceito. Embora a qualificação registral seja o simples exame de um título para saber se deve ou não ser registrado, esse conceito apresenta um potencial relevantíssimo.”

O Brasil, explicou o desembargador, já possuía a instituição da qualificação registral desde o século XIX. Ao longo do tempo, esse assunto foi tratado por doutrinadores bem como foi objeto de práticas, mas no início da década de 1990 foi retomado em estudo apresentado no primeiro congresso dos registradores gaúchos, em Porto Alegre. “Nele, afirmávamos que o saber próprio do registrador era de caráter prudencial, o que o aproximava do saber típico do juiz. Claro que isso não impedia que o registrador tivesse o saber científico, mas no exercício da função o que se exigia do registrador era o exercício prudência, a decisão do caso.”

Esse tema foi objeto de vários estudos do desembargador Ricardo Dip que foram apresentados em Porto Alegre, em 1990; em Maceió, em 1991, quando a qualificação registral foi tratada de maneira específica e, em 1992, sob um aspecto mais subjetivo, referente à ética do registrador predial.

Em 1997, num curso que se fez numa cidade do interior de São Paulo em homenagem ao doutor Gilberto Valente da Silva, saudosa e grande autoridade do Direito registral brasileiro, pudemos ver os aprofundamentos dessa matéria sustentados pelo doutor Sérgio Jacomino, que efetivamente se especializou no assunto”.

A indagação que se deve fazer é a seguinte: Por que quase um assunto que já tem pelo menos 17 anos da sua reconstrução, e tão aprofundado por bons doutrinadores, volta a ser objeto de meditação?”

A resposta a essa indagação é a mesma que se dá na década de 1990, isto é, por que alguém trataria um tema do século XIX na década de 1990? Por que alguém, em 2007, tem de falar de um tema do século XIX que já foi tratado no início dos anos 1990? Porque continua sendo questionada a independência jurídica do registrador, continua sendo questionada a conveniência da qualificação registral, sobretudo com um entrechoque que se vê em relação aos títulos judiciais. Tanto em 1990 como em 2007, a questão é: o registrador pode recusar o registro de um título, seja ele emanado de um notário, expedido pela administração pública, ou emitido pelo poder judiciário?”

A pergunta gerou polêmica entre os presentes, que aproveitaram a oportunidade para debater o tema com o desembargador.

Os participantes do encontro puderam apreciar, em Belém, uma das mais famosas festas religiosas do Brasil, o Círio de Nazaré, que este ano coincidiu com a data do 23º Encontro Regional dos Oficiais de Registro de Imóveis.



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