Natureza Jurídica dos Órgãos Notarial e Registrador
Cristiano Graeff Jr.
SUMÁRIO
1.Prática. 2. Funcionário Público. 3. Sistemas de organização da função notarial. 4. Notariado latino. 5. Modificação profunda. 6. A nova natureza da função. 7. Caráter privado do exercício. 8. Representação do Estado. 9.Responsabilidade civil e criminal. 10. A delegação. 11. Extinção da delegação. 12. Nomeação. 13. Profissional do Direito. 14. Empresa privada. 15. Jurisprudência contrária à Constituição.
1. PRÁTICA
Na data da promulgação do Código Civil, os atos notariais eram praticados praxisticamente, com base no "regimento dos Tabeliães das notas" das Ordenações Filipinas, de 1603 (Título 78 do livro l), que não é mais do que reprodução do 1º regulamento traçado por D. Diniz, em Santarém, em 1343, ou 1305 da Era Cristã, como esclarece o Ministro José Carlos Moreira Alves (1).
O Professor de Direito Notarial da Universidade do Ceará, Cláudio Martins, esclarece: "As discussões doutrinárias en torno da natureza da função de que o Notário é órgão empresta-lhe pelo menos quatro colocações divergente: é funcionário público porque exerce a função estatal; é oficial público autônomo porque a função pública nada tem de estatal; é um particular, a cargo de uma função pública (estatal), ou é um profissional liberal, acepção inaceitável pelas limitações sofridas pela função, notadamente quanto à investidura e ao número determinado de ofícios." (2)
Antes, afirma: "O Brasil situa-se entre as exceções desarrazoadas, por isso que, como instituição, ainda não foi aqui implantado como um sistema notarial, condizente com nossas tradições democráticas. Talvez o fato se deva à origem portuguesa de nosso acanhado notariado, que jamais passou de herança profundamente depreciada das Ordenações do Reino. O notariado brasileiro continua definido em lei como auxiliar do juízo. E tal tem sido o entendimento do Poder Judiciário, em farta jurisprudência." (3)
O Tabelião escrevia ou simplesmente assinava a escritura, que tinha fé pública (Decreto nº 3.084/98, arts. 264/265). Então, a Lei 5.621/70 autorizava os Tribunais de Justiça do Estado a dispor em resolução sobre a divisão e organização judiciárias, "inclusive Tabelionatos e Oficios Públicos", pelo que a função notarial ficou jungida ao Judiciário, à guisa de serviço auxiliar do Juízo" (4). E o Estado do Rio Grande do Sul classificou os registros públicos como auxiliares da Justiça, mencionando expressamente a função notarial entre os servidores públicos (Lei 7.356/80, arts. 90/92).
2. FUNCIONÁRIO PÚBLICO
O Tabelião, como no velho Portugal, era considerado funcionário público. Assim, também, o reputou a EC nº 7, de 13-04-77, que estabeleceu: "Ficam oficializadas as serventias do foro judicial e extrajudicial, mediante remuneração de seus servidores exclusivamente pelos cofres públicos, ressalvada a situação dos atuais titulares, vitalícios ou nomeados em caráter efetivo", que o Congresso Nacional repetiu na EC de nº 22/82, acrescentando a expressão "ou que tenham sido revertidos a titulares", além de outras providências acauteladoras de direitos.
Destarte, o titular de serventia caracterizava o funcionário público, que seria aposentado:
"l. por invalidez; ll. compulsoriamente após trinta anos de serviço; e lll. voluntariamente, após 35 anos de serviço" (EC nº 1, de 1969, art. 101 e incisos); e, quando mgistrado, porque membro de um Poder da República, "a aposentadoria seria compulsória aos setenta anos de idade ou por invalidez comprovadas e facultativa após trinta anos de serviços público. " (§ 2º do art. 113)
3. SISTEMAS DE ORGANIZAÇÃO DA FUNÇÃO NOTARIAL
A função notarial apenas 194 anos teria sito considerada ocupada por funcionários públicos nos 1.369 anos aproximadamente em sua vida documentada no mundo (1997-194 = 1803). O segundo a atuação do Notário na vida da sociedade, cabe distinguir em dois sistemas de organização da função notarial, conforme expõe Pedro Ávila Alvarez: "1º. Notariado con intervención simplemente funcionarista, parcial y añadida. 2º Notariado con intervención técnico-funcionarista total e interna.
"NOTARIADO SAJÓN Y NOTARIADO LATINO
"A) Al segundo de los sistemas indicados corresponde el Notariado latino, que, con unas u otras variantes, es el que rige en la Europa latina, parte de Alemanha, Holanda, Luxemburgo, parte de Suiza, casi em toda Hispano-América, parte francesa de Canadá y Estado de Luiziana. El Notariado de estos países se reúne periódicamente en Congresos y el primeiro de ellos adoptó el seguiente concepto del Notario Latino, en el que se reflexan sus carácteres: Es el profesional del Derecho encargado de una función pública consistente em recibir, interpretar y dar forma legal a la voluntad de las partes, redactando los instrumentos adecuados a ese fin y conferiéndoles autenticidad; conservar los originales de éstos y expedir cópias que den fe de su contenido. En su función está compreendida la autenticación de hechos."
"B) Al primeiro de los sistemas dichos responde el Notariado sajón, a cuyo padrón corresponden las legislaciones de Inglaterra, Estados Unidos de América y Venezuela (5)."
4. NOTARIADO LATINO
A Constituição brasileira de 1988 explicitou que aderia ao sistema correspondente ao Notariado latino, pois,no art. 236 e seus parágrafos, inserto no Título IX das Disposições Constitucionais Gerais, dispôs: "Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público. § 1º - Lei regulará as atividades, disciplinará a responsabilidade civil e criminal dos Notários, dos Oficiais de Registro e de seus prepostos, definirá a fiscalização de seus atos pelo Poder Judiciário. § 2º - Lei Federal estabelecerá normas gerais para fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro. § 3º - O ingresso na atividade notarial e de registro depende de concurso público de provas e títulos, não se permitindo que qualquer serventia fique vaga, sem abertura de concurso de provimento ou de remoção, por mais de 6 meses."
Destarte, transformou o titular da serventia pública de funcionário público em particular, exercento, "em caráter privado, por delegação do Poder Público", função pública.
Pôs em prática o ensinamento de Eduardo J. Couture: "No debe extrañar la existencia de una función pública a cargo de un particular, porque el ordem jurídica está poblada de situaciones de esta índole. Función pública desempeñan el testigo, el perito, el sindico, el depositario, el interventor, el ciudadano que contituye la mesa receptora de voto en el dia de los comicios, etc. Y sin embargo, la ley no les otorga a condición de funcionarios públicos." (6)
Chega a essa conclusão depois de afirmar: "el problema de la condición del escribano público no es un problema de definición legal. Podrá el legislador, en sus definiciones, denominalo así, pero bien sabemos que no es misión del legislador das definiciones sino instituir normas, es decir proposiciones hipotéticas de una conduta futura. El escribano público será funcionario público si la ley le asigna en el conjunto de las interaciones humanas, la condición jurídica que corresponde a los demás funcionarios públicos: su estatuto jurídico. No será funcionario público, aunque la ley lo denomine así, si en cúmulo de us derechos y deberes no tiene condición de tal." (7)
A frase é considerada lapidar por Villalba Welsh, citado por Pedro Ávila Alvarez: "El hecho de que la ley califique a los escribanos de funcionarios públicos no es da necesariamente ese cáráter y tal aseveración no está suficientemente respaldada por las demás imposiciones legales. Tal calidad no puede adquirir-se por una mera declaración aunque emane de un texto legal. La calidad de funcionario público debe ser una cosa cierta, evidente, que encuentre su apoio en la ley misma y en el reconocimiento de la existencia de un vínculo real con el Estado".(8)
5. MODIFICAÇÃO PROFUNDA
É pacífico, conforme ensina o Min. Carlos Maximiliano, "quaisquer disposições legislativas ou regulamentares contrárias ao seu espírito ou à sua letra não mais se observam, ruem automaticamente. Não mais surgem, perduram ou se renovam os seus efeitos. O poder constituinte é absoluto." (9)
Assim, ter-se-á de verificar, para continuar classificando o Notário como funcionário público, se a Lei Federal nº 8.935, de 18-11-94, que regulamenta o art. 236 da CF, dispondo sobre serviços notariais e de registro, apóia o reconhecimento da existência de um vinculo real com o Estado.
O texto não contém uma mera declaração explícita como a da Espanha: "El notario es el funcionario público autorizado para dar fe, conforme las leys de los contratos y demás actos extrajudiciales" (10), pois não seguiu essa linha de conduta, como o fizeram as lei italianas, francesas e argentinas, contestadas pelos doutrinadores como Diaz de Guijarro, Aguiar, Halperin, Planiol, Mazeaud, Dona e Castan, que fazem numerosas citações em contrário. (11)
Logo, é preciso contatar "si la ley le asigna en el conjunto de las interaciones humanas, la condición jurídica que corresponde a los demás funcionarios públicos: su estatuto jurídico." (12)
6. A NOVA NATUREZA DA FUNÇÃO
Perante o sistema jurídico brasileiro, o Notário não reúne os requisitos exigidos dos demais funcionário públicos.
E, segundo FRANCISCO MARTINEZ SEGOVIA, Enrique Diaz de Guijarro: "Resume los carácteres de los funcionários públicos, conforme a las expresiones de Berthélemy, Kammerer, Mayer Y Bielsa asi: ‘1º vinculación constante con el Estado, en la gestión de la cosa pública; 2º remuneracion por el Estado; 3º representación del Estado; e 4º responsabilidad del Estado por los actos del escribano’ y no encuentra ninguna de esas caracteristicas, como pasa a demostrarlo en sucesivos títulos de este parágrafo.
"Falta vinculación constante con el Estado porque el nombramiento y remoción es un derivado del régimen vigente para el Notariado y no de la creación de tal vinculo constante, y porque el escribanop no obra seguiendo instrucciones o nomas especiales emanadas del Poder Ejecutivo. Falta remuneracion por el Estado porque ella se rige por el sistema de honorarios a cargo de los particulares. Falta representación del Estado, porque el ejercicio dela fe pública no lo hace en calidad de representante. El escribano ‘al dar fe de los actos pasados ante él, satisface estos objetivos de verdad y seguridad. Pero al proceder así? Absolutamente no, pues obra tutelando a los particulares que contratan, ya que deja impreso un selo de verdad sobre las estipulaciones en que han convenido. El derecho de los particulares queda fijo, inmutable, constituyendo una garantia reciproca entre elles, si contar con la que significa definir sus posiciones frente a la comunidad’ (p.261)." (13)
7. CARÁTER PRIVADO DO EXERCÍCIO
Da gestão de cousa pública, é manifesto que o Notário não interfere, como esclarece corretamente o referido Villalba Welsh, pois: "3) la intervención del notarios se da exclusivamente en benefício de particulares y para legítimas relaciones de naturaleza privada; 4) el notario no actua en visivel de cosas públicas.", conforme acentua Fernando Tavares de Carvalho (14).
Pelo dispositivo constitucional, "lei federal estabelecerá normas gerais para a fixação de emolumentos relativos aos atos praticados pelos serviços notariais e de registro", cabendo aos Notários e Registradores observarem, afixando "em local visível, de fácil leitura e acesso ao público, as tabelas de emolumentos em vigor (art. 29, incs. VII e VIII, da Lei nº 8.935).
A remuneração dos serviços prestados - exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público - corre inteiramente por conta dos particulares, seus únicos interessados, e são de natureza privada - exercidos em caráter privado -, como diz a Constituição de 1988, elucidando que a lei federal os regulamenta. Esta, copiando dispositivo de um dos melhores diplomas legais sobre a matéria, que dispõe: È livre às partes a escolha do Tabelião." (art. 8º da Lei nº 8.935; Código de Organização Judiciária do Estado do Rio Grande do Sul, Lei nº 7.256/80, art. 130)
É de essência do regime do funcionário público que ele seja remunerado pelo Estado, conforme exigem os autores (15).
PONDÉ, referindo a Escola de Bolonha, onde "las notas del diapsón cientifico notarial alcanzaron sua más agudos tonos, ni tampoco en los escritos de los posglosadores del siglo siguiente se encuentra - ni siquiera insinuada - la posibilidad de que la función notarial estuvera conectada con el que hacer del funcionario público" e os Estatutos de Piemontes asseveram: "en ninguno de ellos el notario aparece configurado como funcionario público. En cambio, si, todos ellos regulaban su retribuición por el sistema de honorários tipicos de las funciones liberales" (16)
Aliás, Juiz contrário ao texto constitucional, realça a particularidade, asserindo, "por caráter privado, termo utilizado no texto constitucional, se há de entender apenas que essa atividade é exercida às custas do titular do oficio, sob a sua responsabilidade" (17)
Afixação do preço dos serviços pelo Poder Público em atividade privada é tão curial que chegou a generalizar-se, mediante a resolução de fixar os preços de todas as mercadorias de produção nacional ou importadas para consumo interno. Espanta tomá-la como caracterizador do caráter público, quando se vê diariamente , em todos os lados, concessão de serviços públicos, com afixação de tarifas ou preços de serviço cobrado diretamente e pertencentes a concessionárias, que nenhum jurista ousou denominar servidor público.
O número de Tabelionatos ou cargos de notários é fixado em lei, que considera as necessidades da população usuária, como faria para instalar uma estação rodoviária ou ferroviária.
8. REPRESENTAÇÃO DO ESTADO
Falta, ademais, a representação do Estado, porque o exercício da fé pública não se realiza em seu nome, certo, como é sabido, que todo funcionário público não tem a fé do notário.Como explica BAUTISTA PONDÈ: 'La ‘fe notarial’ es fe que posee el notario, el solo, por eso es personal y - como dije - enfáticamente personalísima."(18) E arremata COUTURE: "Cuando se habla de fe pública para referirse a los documentos se alude a algo especificamente notarial.No se dice, por exemplo, que el juiz, ou el ministro, o el embajador sean ‘funcionarios de fe pública’.Se dice, en cambio, que son funcionarios de la fe pública es escribano o el secretario judicial.Este es un hecho, un simple hecho del lenguage.Pero en la determinación de los conceptos, los hechos de lenguage no puedem ser desestimados.Cuando en el sistema de la ley se utiliza el vocablo ‘ministro de fe pública’, o más sencillamente ‘funcionario de fe pública’, no se alude a las condiciones normales y genéricas de todos los funcionarios públicos.Con esas palabras se alude a lo que, a largo de toda historia, fué una misión especifica del notariado y mui especialmente de la secretaria judicial"(19).
9. RESPONSABILIDADE CIVIL E CRIMINAL
Responsabilidade civil e criminal dos Notários é "exclusiva do respectivo titular", fixada e regulada pela lei, que obedeceu escrupulosamente a ordem constitucional (arts. 21,22, e 24 da Lei nº 8.935).
Para os funcionários públicos em geral, incide o disposto no §6º, inc. XXI, do art. 37 da Constituição, sendo o Estado pessoa jurídica de direito público: "automaticamente, o Estado responde, isto é, fica estabelecido o seu dever de reparar" (20).É-lhe assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa (21).
Depois de editada a disposição constitucional, não se poderá seguir a lição de Pontes de Miranda, ministrada para o art. 194 da Constituição de 1946, alargando o conceito de Notário para conseiderá-lo como qualquer pessoa chamada a prestar serviço público (22).
A lei, anunciada pela Constituição, regulou exaustivamente a responsabilidade civil e criminal do Notário, Oficial de Registro e seus prepostos, dizendo que a civil independe da criminal.
Estabeleceu que "os Notários e Oficiais de Registro gozam de independência no exercício de suas atribuições, têm direito à percepção dos emolumentos integrais pelos atos praticados na serventia e só perderão a delegação nas hipóteses previstas em lei", e garante-lhes a percepção, ainda quando afastados do serviço (Lei nº 8.935, arts. 21,28 e 36, §§ 2º e 3º).
Independente no exercício de suas funções, gerindo sua empresa de serviços particulares e com responsabilidade civil e criminal fixadas na lei, os Notários e Oficiais de Registro responderão pelos danos que, pessoalmente ou por seus prepostos, causarem a terceiros, seja por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência.Estão sujeitos à teoria da responsabilidade civil, especialmente a responsabilidade civil contratual e extracontratual, decorrente de ato próprio, e, a indireta, a responsabilidade por fato ou ato de outrem.
10.A DELEGAÇÃO
A Delegação do Poder Público a particular com o título de bacharel do exercício de atividade notarial não equivale a delegar ao Notário fé pública, pois "La ‘fe pública’ no se delega, no se puede delegar. La ‘fe pública’ devine de la ley,y nadie puede delegar lo que es don y facultad exclusiva de la ley.Quando se habla de delegación de la ‘fe pública’ no hay tal delegación, sino que se trata del ejercicio de la ‘fe pública’ que hace un componente del Poder administrativo o del Poder judicial que tiene el cuerpo" (23).
Trata-se, aliás, de mera aplicação geral do disposto pelas Ordenações Filipinas: "E em cada Aldea, que tiver mais de vinte vizinhos, e estiver situada fora da Cidade, ou Villa huma legoa, haja huma pessoa apta para fazer os testamentos aos moradores da dita Aldea, que estiverem doentes em cama.E sendo feitos segundo fórma de nossas Ordenações, ser-lhes-ha dada a fé e auctoridade, como se foram feitos per tabellião das Notas."(Titulo LXXVIII,nº 20).
A delegação não transforma o delegado em servidor público.Apenas investe o particular nos poderes para a prática de ato considerado como função pública.Os serviços são exercidos em caráter privado, pelo titular da serventia ou seus empregados.É símile do profissional ou sindicato previsto no art. 166 da Emenda Constitucional de 1969, cujos diretores jamais alguém alçou à categoria de funcionário público. O Notário ou o Tabelião exerce suas funções públicas em caráter privado; tira a sua fé pública da delegação, e é essa que o habilita a lavrar instrumento público. O poder Público o investe nos poderes de exercer função pública, em seu lugar. Delegar é transmitir poderes, é investir na faculdade de obrar.Conservando a qualidade de servidor público, o delegado exerceria normalmente as suas funções públicas e não careceria da delegação, que seria manifestamente inútil, a despeito de disposição constitucional.
11. EXTINÇÃO DA DELEGAÇÃO
Diz a lei federal que: "Extinguir-se-á a delegação a Notário ou Oficial de Registro por: I - morte; II - aposentadoria facultativa; III - invalidez; IV - renúncia; e V - perda, nos termos do art. 35". Esta só ocorre nos casos enumerados, que exigem decisão administrativa ou judicial.
Urge ao intérprete verificar se enumeração da lei é taxativa ou exemplificativa.Sera´de uma ou outra natureza, segundo se considerar, ou não, o Notário e Oficial de Registro servidores públicos. Sendo servidor, será aposentado compulsoriamente, nos termos do art. 40, inc. II, da própria Constituição.A compulsória introduz-se, naturalmente, entre os casos de extinção, quebrando todo o sistema instituído pela Constituição nova.
Precisamente, para tirar-lhes a característica de servidor público, a lei omitiu a aposentadoria compulsória, só aplicável aos funcionários públicos.Se for considerado particular, exercendo "em caráter privado, por delegação do Poder Público", função pública, é claro que enumeração é taxativa.
A linguagem da lei não permite dúvida, a enumeração não pode ser acrescida por fato que independe da vontade do interessado, pois, para haver perda é necessário decisão humana, própria ou de terceiros.
A aposentadoria facultativa, isto é, quando intervém a vontade do interessado, somente pode ser a ocorrida voluntariamente, na expressão constitucional da emenda de 1969 (art. 101, III).
As únicas ocorrências fatais são a morte, a que todo ser humano está sujeito, e a invalidez, que a lei exigiu ocorra nos termos da legislação previdenciária federal, a que são vinculados os Notários e seus auxiliares (arts. 35, incisos e parágrafos; 36 e parágrafos; 39, incisos e parágrafos; 40 da Lei nº 8.935).
12.NOMEAÇÃO
No que se refere ao ingresso na atividade notarial e de registro, a lei exige certas qualidades do candidato (submeter-se a concurso público de habilitação, ser brasileiro, capaz, quitação com as obrigações eleitorais e militares; diploma de bacharel em Direito e conduta condigna para o exercício da profissão) e não esclarece qual o órgão que fará a nomeação.Todavia, menciona que "as vagas serão preenchidas alienadamente, duas terças partes por concurso público de provas e títulos e uma terça parte por concurso de remoção.Admite, pois, a nomeação pelo Estado, mais precisamente pelo Poder Judiciário de cada Estado, órgão encarregado de fiscalizar e fixar emolumentos (arts. 6º a 19; 37 e 38 da Lei nº 8.935).
Este é unicamente o vínculo que prende o Notário ao Estado.Entretanto, Martinez Segovia pondera: " La única vinculación, no fundamental, del Notariado con el Estado es la designación o nombramiento o la inscripción en la matricula o elenco profesional, según los distintos sistemas."Depois, afirma (24): "Los sistemas de ingreso o admisión no son de la esencia del notariado latino ni forman parte del concepto sobre la función.Eligir un sistema u otro es cuestión de política legislativa y, por tanto, el que la ley disponga aceptar un de los varios conocidos depende del método que el legislador siga para componer la ley".(25).Assinale-se a opinião de Diaz de Guijarro, já aludida: "el nombramiento y remoción es un derivado del régimen vigente para el notariado"(26). E o regime adotado pela Constituição brasileira de 1988 foi calcado na expressão "os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público" (art.237).
13. PROFISSIONAL DO DIREITO
O notário é um profissional do Direito, dotado de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial, sem qualquer subordinação hierárquica ao Poder Público (Lei nº 8.935, art. 3º).Não é admissível esquecer a advertência posta no breviário tantas vezes citado: "Debe distinguirse entre superintendencia disciplinaria y dependencia jerárquica.Ésta comporta, como se ya ha visto: obediencia a órdenes, sometimiento a la jerarquia y revisión de los actos funcionales.La disciplina, em cambio, es sólo un contralor represivo de moral notarial o la aplicación de penas disciplinares por otras infracciones no contractuales, ni resarcitorias" (27).
14. EMPRESA PRIVADA
Aprovado no concurso e investido na função, o Notário ou Tabelião passa a exercer de verdadeira empresa, que explora a seu proveito, como entender.Se a serventia já tem empregados, os conserva, se não tem, os contrata, na forma dos arts. 2º e 10 da Consolidação das Leis do Trabalho.Trata-se de autêntica empresa, nos termos da legislação federal em vigor: "Considera-se empresa toda organização de natureza civil ou mercantil destinada à exploração por pessoa física ou jurídica de qualquer atividade com fins lucraticos." (art. 6º da Lei nº 4.137).Tem o luxo de possuir estabelecimento, que o anteprojeto do Código Civil define como "todo o complexo de bens organizado pelo empresário ou sociedade empresária, para o exercício da empresa" (art. 1.318).É a sede da empresa, com o seu aparelhamento e empregados. Tem aviamento, que é a aptidão da empresa à realização do fim a que se destina o estabelecimento, é o seu indice de prosperidade, porque representa a expectativa de lucros.Pode ter até insígnia, que é o nome do Tabelionato, que o individualiza.É a inscrição colocada no frontispicio do estabelecimento para distingui-lo de outros, congêneres (arts. 21 e 43 da Lei nº 8.935).
15. JURISPRUDÊNCIA CONTRÁRIA À CONSTITUIÇÃO
Não obstante o pretório, que guarda a Constituição, entenda que ela mudou radicalmente, considerando as funções exercida em caráter privado e ensejando recurso extraordinário, ás decisões que contrariarem seus dispositivos (CF. art. 102, inc. III, letra a), nem todos os Notários poderão utilmente usar a faculdade. Ficarão presos à orientação de alguns tribunais que resistem em assimilar essa mudança fundamental, nos afazeres do Notário (28).Prendem-se à fé, que eles irradiam desde o ano 1305, quando a profissão foi regulamentada pelo Imperador Justiniano para o ocidente.Mas a fé pública independe da natureza jurídica do Notário, isto é, se ele é funcionário público ou um particular, exercendo "em caráter privado, por delegação do Poder Público", função pública(29)."Fueron las sucesivas leys que configuraron y consolidaron lo que más tipifica a la ‘fe notarial’ y que consiste en sua caráter personal, tan personal que se ha hecho popular darle un matiz enfático llamándola personalisima".(30)Falam em se lhes emprestar perpetuidade, olvidando que, justamente, nessa matéria, houve o escândalo da venda dos oficios notariais, que se perpetuavam(31) e que a morte a evita, sendo causa da extinção delegatória. Distiguem o exercício da atividade, poderando que a Constituição não disse que o Notário exerce atividade privada.Se não se tivessem lido os juristas especializados, e constatado que os atos jurídicos praticados pelos Notários constam em todos os países latinos no Código Civil (32), seria suficiente consultar um dicionário para verificar que atividade é exercício efetivo de funções.Juiz eminente para conservar a natureza jurídica de funcionário público lembra que "a natureza do cargo é nitidamente anfibológica".Ambigüidade, realmente, é considerar funcionário público estadual (face à nomeação) filiado à previdência social de âmbito federal.
NOTAS.
(1) - Artigo intitulado "Os Requisitos da Escritura Pública no Direito Brasileiro", publicado no vol. 20. pp.7/21.
(2) - "Teoria e Prática doa Atos Notariais", Ed. Forense, 1979, p.84.
(3) - Op. cit., pp. 12/13
(4) - CLÁUDIO MARTINS, op. cit., p. 69.
(5) - "Estudos de Derecho Notarial", Editora Montecorvo S. A., 1973, p. 28
(6) - "El concepto de Fe Pública", Montevideo, p. 34 da ed. de 1954.
(7) - Op. Cit. 34.
(8) - Op. Cit., p. 240, notas nºs 219/220, Alberto Villalba Weish, "El Derecho Notarial a la Luz...", p. 231.
(9) - "Comentários à Constituição Brasileira de 1946". Ed. Freitas Bastos, 1954.l/149.
(10) - PEDRO ÁVILA ALVAREZ, op. cit., p. 17
(11) - EDUARDO J. COUTURE, "El concepto de Fe Pública", Montevideo, 1954, p. 34.
(12) - Op. et loc. cits.
(13) - ‘FUNCION NOTARIAL" , Ediciones Juridicas Europa - América, Buenos Aires, pp. 84/85, citação tirada da obra: "Son funcionários públicos los escribanos?"
(14) - FRANCISCO MATINEZ SEGOVIA, op, cit., p. 98
(15) - FRANCISCO MARTINEZ SEGOVIA, op. cit., p. 165, nº 3; JOSÉ MARIA SANHUJA Y SOLER, ENRIQUE DIAZ DE GUIJARRO, FERNANDO TAVARES DE CARVALHO, citados por F. M. Segovia nas pp. 84, 88, nota a; 96; MOISES JORGE SAVRANSKY, com citação de Bielsa, "Función y Responsabilidad Notarial", Abeledo Perrot, p. 11
(16) - Op. cit., p. 237, grifos do expositor
(17) - "RJTJRGS", 180/175
(18) - Op. Cit., p.16.
(19) - EDUARDO J. COUTURE, op. cit., p.27, nº 20, grifos do expositor.
(20) - AGUIAR DIAS, "Da Responabilidade Civil", II/148, ED. Forense, 1944.
(21) - THEMISTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, "Constituição Federal de 1946", comentade, IV/187-188; CARLOS MAXIMILIANO, op. cit. III/256-262.
(22) - "Comentários à Constituição de 1946", pp. 370/371, nº 2.
(23) - EDUARDO BAUTISTA PONDÉ, op. cit., p.17.
(24) - Op. Cit., p. 167
(25) - Op. Cit., p. 237, grifos do expositor
(26) - In op. cit., p. 84
(27) - MARTINEZ SEGOVIA, "Breviario del Derecho", op. cit., p. 167
(28) - "TJRGS" E STJ, in "RJTJRGS", 173/192-197; 180/172/177
(29) - FERNANDO TAVARES DE CARVALHO, in Francisco Martinez Segovia, op. cit., p97; ou opinião própria, nota nº 5, p. 166.
(30) - EDUARDO BAUTISTA PONDÉ, op. cit., p. 16.
(31) - EDUARDO J. COUTURE, op. cit. p.53.
(32) - MARTINEZ SEGOVIA, "Breviario del Derecho", op. cit., p. 168.
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