BE2376
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Arresto de imóvel compromissado à venda
Sérgio Jacomino
A Dra. Tânia Ahuali, juíza da Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo, vem de decidir um caso muito interessante.
O Ofício Imobiliário sob minha responsabilidade recebeu expediente da Corregedoria-Geral da Justiça de São Paulo originário de ação civil pública cautelar em que era parte o Ministério Público do Estado de São Paulo cm determinação de registro de arresto dos imóveis registrados em nome do réu.
O conjunto foi prenotado no mesmo dia e procedidos aos registros perseguidos.
A determinação original visava colher informações nos registros prediais e, sendo positiva a consulta, que se procedesse ao arresto dos bens eventualmente registrados em nome dos arrolados. Vinha vazada nos seguintes termos: “que seja publicado aviso aos serviços de registro de imóveis do Estado de São Paulo, para que eles informem a este Juízo sobre a existência de bens imóveis nome dos réus referidos, estendendo-se, em caso positivo, o arresto determinado”.
Na forma como redigida a determinação – informação da existência de bensem nome dos réus, estendendo-se, em caso positivo, o arresto – nos autorizou a prática do ato cautelar de registro do arresto.
Esse registro foi impugnado pela compromissária-compradora. A sua irresignação levou-a a postular judicialmente o cancelamento do registro.
O arresto é medida acautelatória que, diferentemente do seqüestro, se dirige aos bens e direitos do devedor – tantos quantos forem necessários para a reparação dos danos.
Ora, os imóveis se achavam registrados em nome do devedor. Embora existisse o registro de um compromisso de compra e venda quitado, fato é que o domínio remanescia em mãos do réu. O artigo 1.245, § 2º, do código civil, é claro: “enquanto não se registrar o título translativo, o alienante continua a ser havido como dono do imóvel”. O título translativo, no caso, é a compra e venda, já que o registro do compromisso faz nascer tão-somente o direito real de aquisição, que difere, claramente, do domínio (art. 1.417 do código civil).
Poder-se-ia argumentar que o compromisso é quitado, além de pactuado a irretratabilidade e irrevogabilidade, o que poria a salvo da constrição o imóvel. Mas a circunstância de remanescer, desde 2002, os imóveis na titularidade do réu poderia indicar que eventualmente remanescessem créditos que pudessem perfeitamente ser arrestados. Fosse de outra forma, ter-se-ia celebrado e registrado a compra e venda definitiva.
Não se trata de mera nomenclatura do negócio jurídico. Não se permite ao registrador,sponte propria, penetrar na “substância” do negócio e nele divisar uma compra e venda definitiva quando as partes pretenderam, inequivocamente, um mero compromisso de compra e venda. E é tal situação jurídica que exsurgia do registro, com toda a nitidez.
Ora, o domínio estava nas mãos do titular do direito de propriedade. Tal situação jurídica representa um lastro de garantia das obrigações do compromisso pactuado. Trata-se de um direito que integra inegavelmente o acervo patrimonial do réu e pode, por conseguinte, ser arrestado. É um direito atual. Aventuro-me a dizer que poderia até ser penhorado - nesse caso, tratando-se de uma ordem judicial que se dirigisse a um bem e direito específicos e determinados, nessa hipótese seria necessária a especializaçãoobjetiva e dodireito no próprio título judicial.
Nas informações prestadas no processo administrativo que afinal foi decidido registrava que era “preciso estar atento à circunstância muito particular que guardou a expedição da tal ordem de arresto, feita para todo o Estado de São Paulo. Sem especificação dos bens ou direitos que poderiam eventualmente ser atingidos, a ordem haverá de colher todos os bens e direitos que se acharem na esfera patrimonial do devedor, apuradosprima facie pelo que o registro publica. Cabe aos interessados manejarem as provas cabíveis para desembaraçar os bens e direitos do gravame judicial. É preciso demonstrar, perante o Juízo competente, que o registro já não espelha a realidade jurídica e isso representa um ônus de quem alega; o registrador não pode chegar a tanto. Uma vez mais calha o artigo 1.245, § 2º, do código civil”.
Por fim, nunca é demais lembrar que os direitos da requerente não foram e nem serão atingidos com o arresto.Ad argumentandum, a inda que o arresto venha a se converter em penhora e que a execução se ultime com o praceamento dos bens e direitos, o que poderia ser objeto da arrematação? Exatamente o que o titular de domínio ostenta em seu patrimônio. Não sendo a aquisição decorrente de execução judicial forma originária de aquisição o arrematante, ou o adjudicante, estaria sub-rogado nos direitos e obrigações do proprietário. A relevar-se a afirmação dos requerentes, estaria obrigado tão-somente a lavrar a escritura definitiva cumprindo o compromisso de compra e venda registrado. Enfim,nemo plus juris ad alium transferre potest quam ipse habet.
Sopesadas todas essas circunstâncias, deferi o registro e o mantenho – até que ordem judicial o pudesse levantar.
A decisão confirmou a decisão do registrador. Leia abaixo.
Arresto – registro – compromisso de compra e venda.
Ementa não oficial: Embora o contrato de compromisso de compra e venda tenha se aperfeiçoado, com a realização do pagamento, antes do arresto determinado, restou evidente que tal negócio jurídico não teve o condão de transferir a propriedade à requerente, procedendo corretamente o registrador em inscrever no fólio real tais arrestos.
Processo nº: 583.00.2005.207909-5
Vistos.
Cuida-se de procedimento administrativo, promovido por V., que visa o cancelamento de arrestos inscritos.
Destacou que é compromissária compradora de vários imóveis, tendo integralizado o preço avençado antes da inscrição dos arrestos, determinados em Ação Civil Pública promovida em face de C. Pugnou pela procedência, juntando documentos.
Veio aos autos a manifestação do Oficial da 5ª Serventia Imobiliária (fls. 47/49).
O Ministério Público opinou contrariamente ao cancelamento pretendido (fls. 52/54).
É o relatório.
DECIDO:
A pretensão não poderá ser atendida na forma apresentada e postulada.
Muito embora o contrato de Compromisso de Venda e Compra tenha se aperfeiçoado, inclusive com a realização do pagamento, bem antes do arresto determinado, é certo que este negócio jurídico não teve o condão de transferir a propriedade à requerente.
Não resta qualquer dúvida que a propriedade só se transfere com o competente registro da escritura de venda e compra, salvo em casos excepcionais, previstos expressamente em lei, nos quais não se enquadra a requerente.
Procedeu corretamente o Registrador em registrar os arrestos, uma vez que continua figurando como titular de domínio dos imóveis atingidos a promitente vendedora.
A requerente descurou de seus direitos em não providenciar a regularização da situação dominial do imóvel no momento oportuno, ou seja, após cumprir a prestação prevista no contrato preliminar.
A providência, portanto, não comporta acolhimento.
Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido vestibular.
Cientifique-se a requerente.
P.R.I.C.
São Paulo, 16 de março de 2006.
Tânia Mara Ahualli
Juíza de Direito
(D.O.E. de 03.04.2006) -Decisão 1ª VRPSP - data: 16/3/2006 fonte: 583.00.2005.207909-5 localidade: São Paulo (5º sri) - Juíza: Tânia Mara Ahualli
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