BE1672
Compartilhe:
Bem de família: imóvel em que o executado não reside pessoalmente
Rodrigo Toscano de Brito *
Desde a Constituição de 1988, principalmente, temas tradicionais de direito privado passaram a sofrer uma maior influência do direito público. A rigor, não seria nem mesmo cabível fazer essa distinção de modo estanque, ainda hoje, ou seja, direito público e privado, justamente em face de um maior entrelaçamento que passou a haver.
A temática relacionada ao bem de família é uma dessas que sofreram grande influência do espírito social da Constituição de 1988. Um tema típico de direito privado influenciado por um perfil social da norma que pretende salvaguardar nas mãos do devedor, que esteja enfrentando processo executivo, pelo menos um imóvel que sirva de moradia para ele e para a sua família.
Ainda antes de enfrentar o enfoque principal, é preciso relevar que até mesmo o conceito de família tem sido ampliado, de forma a não se admitir apenas aquela idéia tradicional de homem e mulher casados e seus filhos, mas também uma série de outras espécies de famílias, como aquelas constituídas a partir da união estável ou mesmo entre tios e sobrinho, avós e netos entre outras.
No Brasil o bem de família pode ser classificado como voluntário ou legal. No primeiro caso, o Código Civil prevê, entre os artigos 1.711 a 1.722, que qualquer pessoa pode, através de escritura pública ou testamento, destinar parte do seu patrimônio para instituir bem de família, dentro dos limites ali impostos. Por outro lado, ainda que a pessoa não tenha instituído o bem de família na forma prevista pelo Código Civil, a Lei 8.009/90 cuida da proteção do único bem que o devedor, já enfrentando fase de execução, tenha para sua moradia própria ou da família.
Ponto de relevo aqui é o que diz respeito à interpretação do art. 1º da Lei 8.009/90. Ali se tem o seguinte:
“Art. 1º. O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta Lei”.
A discussão gira em torno da interpretação literal ou extensiva da parte final do dispositivo, quando faz menção aos proprietários que nele residam. É comum que o executado faça a locação de seu bem em uma cidade, por exemplo, para locar outro em lugar diferente; ou mesmo ceda o bem para outras pessoas da família, ou não. De acordo com a interpretação literal, em assim sendo, o bem não seria considerado de família, justamente porque o proprietário nele não reside.
De modo acertado e de conformidade com o aspecto social da Constituição de 1988, que também tutela a dignidade da pessoa humana, o Superior Tribunal de Justiça vem adotando uma interpretação extensiva do artigo decidindo que a impenhorabilidade prevista na lei especial se estende ao único imóvel do devedor, ainda que este se ache locado a terceiros, inclusive por gerar frutos que possibilitam à família constituir moradia em outro bem alugado. Ademais disso, o STJ também tem se pronunciado no sentido de que ainda que no único imóvel do executado residam outros parentes, ainda que colaterais, por exemplo, o bem é considerado protegido pela lei especial.
De conformidade com a interpretação do STJ, a norma não é destinada um número determinado de pessoas, mas sim à pessoa humana que tem direito de ver resguardado, pelo menos, um bem de seu patrimônio, ainda que não esteja o usando pessoalmente, que sirva como eventual moradia com sua ou de seu família.
* Rodrigo Toscano de Brito é advogado especialista em direito notarial e registral ([email protected])
Últimos boletins
-
BE 5981 - 16/12/2025
Confira nesta edição:
ARIBA 2025 Conexão, Cooperação e Justiça: três entidades do Registro Imobiliário brasileiro participaram do evento | IRIB divulga link para AGO 2025 | Portaria SGD/MGI n. 11.229, de 12 de dezembro de 2025 | Portaria SGD/MGI n. 11.230, de 12 de dezembro de 2025 | Bem de Família, Direito Real de Habitação, herança e obrigações do vendedor após posse de comprador foram alguns temas tratados pelo STJ em 2025 | Programa Regularizar permite mais de 100 mil registros de imóveis no Piauí | CMULHER aprova PL que impede que marido agressor requeira usucapião de imóvel quando mulher fugir de violência doméstica | IRIB Qualifica oferece cursos online em áreas como gestão e compliance | Em parceria com IRIB, ANOREG/BR, ENNOR e ENORE-RS, UNISC lança nova turma de Mestrado e Doutorado em Direito | Reforma tributária e o cadastro imobiliário brasileiro: Uma nova arquitetura fiscal – por Ricardo Soriano e Natália Bessoni | Jurisprudência do TRF4 | IRIB Responde.
-
BE 5980 - 15/12/2025
Confira nesta edição:
IRIB divulga link para AGO 2025 | SREI: ONR apresenta avanços da Fase 4 | Resultado definitivo do 2º ENAC é homologado pelo CNJ | CNB/CF elege novo Presidente para gestão nos próximos anos | Clipping | IRIB Qualifica oferece cursos online em áreas como gestão e compliance | Em parceria com IRIB, ANOREG/BR, ENNOR e ENORE-RS, UNISC lança nova turma de Mestrado e Doutorado em Direito | É possível regularizar a minha fração ideal? Quando a estremação urbana é uma opção – por Dayana Fernanda Machado | Jurisprudência do TJPR | IRIB Responde.
-
BE 5979 - 12/12/2025
Confira nesta edição:
Você conhece a parceria IRIB e YK Editora? | ANOREG/BR publica matéria sobre relevância dos Cartórios na Regularização Fundiária | RIB emite Notas Técnicas sobre REURB, refinanciamento rural e assinaturas eletrônicas | CGJES veda criação de “sistema registral paralelo” | Clipping | IRIB Qualifica oferece cursos online em áreas como gestão e compliance | Em parceria com IRIB, ANOREG/BR, ENNOR e ENORE-RS, UNISC lança nova turma de Mestrado e Doutorado em Direito | Workshop: Prevenção à Lavagem de Dinheiro e Financiamento do Terrorismo | A anticrese na reforma do Código Civil – por Eduardo Figueiredo Simões | Jurisprudência do TJSC | IRIB Responde.
Ver todas as edições
Notícias por categorias
- Georreferenciamento
- Regularização fundiária
- Registro eletrônico
- Alienação fiduciária
- Legislação e Provimento
- Artigos
- Imóveis rurais e urbanos
- Imóveis públicos
- Geral
- Eventos
- Concursos
- Condomínio e Loteamento
- Jurisprudência
- INCRA
- Usucapião Extrajudicial
- SIGEF
- Institucional
- IRIB Responde
- Biblioteca
- Cursos
- IRIB Memória
- Jurisprudência Comentada
- Jurisprudência Selecionada
- IRIB em Vídeo
- Teses e Dissertações
- Opinião
- FAQ - Tecnologia e Registro
Últimas Notícias
- Reforma tributária e o cadastro imobiliário brasileiro: Uma nova arquitetura fiscal
- Inventário extrajudicial. Proprietário tabular – nome – divergência. Qualificação pessoal. Retificação.
- Penhora. Bem indivisível. Vaga de garagem. Impenhorabilidade. Restrição condominial.
