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Hipoteca e desenvolvimento
Enrique Rajoy *


Mais de dois terços da riqueza imobiliária do planeta não são explorados, ou seja, o dono de um direito imobiliário real não pode materializá-lo em dinheiro para melhorar a produtividade de sua exploração, financiar a aquisição de outros bens ou iniciar uma atividade empresarial. O problema resulta relevante nos países em vias de desenvolvimento, já que a terra constitui seu principal ativo econômico.

Em todos os países desenvolvidos, a hipoteca é a instituição jurídica que permite ao titular de um direito real imobiliário obter dinheiro como empréstimo, sem privar-se da propriedade ou da posse do bem sobre o qual recai esse direito. O credor acredita que esse dinheiro aumentará a renda futura do solicitante do empréstimo e que, consequentemente, esse poderá reembolsá-lo com os devidos juros nos prazos e quotas combinadas, embora o credor precise garantir-se contra o possível risco de que essa devolução não aconteça. Para isso, o Estado tem de lhe garantir que, caso venha a ocorrer essa hipótese, o bem hipotecado será vendido e o valor da venda destinado ao pagamento do que lhe é devido, conforme a preferência de garantia. A comparação entre os volumes de saldo hipotecário vivo dos países nos mostra o nível de capitalização imobiliária e a magnitude econômica de cada um. Segundo os dados da FHE (Federação Hipotecária Européia), esse volume (expresso em euros) atinge a cifra de 1.119 trilhão na Inglaterra, 1.156 trilhão na Alemanha, 313 bilhões na Espanha, 385 bilhões na França, e 173 bilhões na Itália, ao passo que no Brasil, esse volume situa-se por volta dos 26 bilhões. A correta interpretação desses dados exige relacioná-los com a população dos países mencionados. Vários são os fatores que influenciam no desenvolvimento do crédito hipotecário: a estabilidade política e social, a solidez da economia, o emprego, a eficiência do sistema financeiro e a eficácia do sistema jurídico de garantias. O nível dessa eficácia depende, principalmente, do funcionamento do Registro da propriedade e, para os possíveis não pagadores, do Judiciário e dos meios extrajudiciais de execução previstos. Se compararmos alguns dados no âmbito da União Européia, poderemos avaliar a importância do Registro. Enquanto nos países que contam com uma fé pública – Alemanha, Inglaterra e Espanha -, o volume do crédito hipotecário aumenta 54,3%, 70,4% e 42,1% de seus respectivos PIB e os tipos médios de juros entre bancos no período 1999 a 2003 situaram-se na ordem de 1,99%, 1,35% e 1,40%, na Itália e França, onde os efeitos do Registro são mais fracos, as porcentagens mencionadas em primeiro lugar são de 13,30% e 24,70% e os segundos foram de 2,30% e 2,61%. Convém ressaltar que, se tomarmos como referência a Inglaterra, a diferença de 1% no tipo de juros supõe uma economia anual de 11,19 bilhões de euros para seus cidadãos. A influência do Registro atinge outros âmbitos: a regulamentação de terras, o desenvolvimento urbanístico, a construção de moradias, o meio ambiente e o nível de conflito judicial.

Estes temas serão debatidos no XV Congresso do Cinder (Centro Internacional de Direito Registral), marcado para novembro, em Fortaleza, com a participação de especialistas de diferentes setores – jurídico, econômico, social, ecológico e empresarial.

* Enrique Rajoy é secretário-geral do Cinder

(Artigo publicado no Jornal Diário de São Paulo, seção Caderno de Imóveis, de 27/2/2005). 

 



Desabamento. Contrato de CV – direito à rescisão.


Compradores de apartamento no Edifício Itália, integrante do Condomínio Edifício Portugal, Espanha e Itália, localizado em São José do Rio Preto, São Paulo, mantiveram no Superior Tribunal de Justiça (STJ) o direito a rescindir contrato de compra por existência de vício oculto no imóvel, que desabou em 16 de outubro de 1997. Em seguida, exames periciais constataram haver defeitos na estrutura do prédio. De acordo com o Código Civil de 1916, o prazo de seis meses para se ingressar com uma ação de rescisão contratual começa a correr no momento em que o bem é entregue, exceto em caso de vício oculto, quando esse prazo tem início ao se conhecer o problema.

A partir desse entendimento, a Segunda Seção do STJ restabeleceu o acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP), sendo mantido o direito dos compradores de anular o contrato firmado entre as partes, de acordo com o voto da relatora, ministra Nancy Andrighi.

Valéria Ceron Antônio e outro ajuizaram, em 15 de abril de 1998, ação de rescisão contratual contra Francisco Tavares de Matos e outros, objetivando anular o contrato de promessa de cessão de direitos e obrigações firmado pelas partes, por existir vício redibitório (que pode motivar a anulação de uma venda). Para tanto, utilizaram-se dos artigos 1.101 e 1.104 do Código Civil de 1916.

A sentença de primeiro grau concluiu não ter fundamento a ação. Em apelo dos compradores, o TJSP reformou essa sentença, por entender que o prazo decadencial para o ajuizamento da ação só teve início no momento em que o defeito foi revelado. Por fim, os desembargadores do tribunal estadual julgaram em favor dos recorrentes, pela rescisão do contrato celebrado entre as partes, condenando Francisco de Matos (e outros) a devolver o valor recebido, bem como as despesas do contrato, tudo devidamente atualizado.

Desse entendimento, os réus recorreram ao STJ, onde a Quarta Turma assim decidiu: "Começa a correr da tradição [entrega] do bem imóvel o prazo de prescrição da ação redibitória", prosseguindo: "O cedente dos direitos sobre o apartamento construído por outrem não pode ficar perpetuamente responsável pelos vícios ocultos." Por último, os compradores do imóvel novamente recorreram, dessa vez ao próprio STJ. O caso foi levado à Segunda Seção (formada pela Terceira e pela Quarta Turma), onde, por maioria, foi restabelecido o acórdão do TJSP. Ana Cristina Vilela (61) 319-8591. Processo: Eresp 431353 (Notícias do STJ, 3/3/2005: Compradores de apartamento em prédio que desabou têm direito à rescisão contratual ). 



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