BE1354
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Alienação Fiduciária de bem imóvel objeto de compromisso de CV registrado
No BE # 749, de 18/7/2003, inauguramos a presente AP com o fim de discutir a viabilidade do registro de cessão de crédito imobiliário e alienação fiduciária de bem imóvel objeto de compromisso de compra e venda registrado.
O tema empolgou os participantes nas várias sessões e rodadas de discussões. As várias facetas do negócio fiduciário foram abordados – desde a estrutura do sistema criado pela Lei 9.514/97, até aspectos processuais. O novo Código Civil permeou a discussão sobre a cessão de crédito e cessão de direitos. Enfim, os debates acabaram envolvendo os maiores nomes da doutrina pátria.
Mas fez-se um “consenso na divergência”. Embora, no entendimento da maioria, o registro nesses casos poderia ser feito sem significativos embaraços, o tema não foi pacificado no âmbito desta AP III. Os argumentos – excelentes, por sinal – estão todos sumarizados aqui nesta ata que abaixo reproduzo. Além disso, indicamos em seguida à ata a sucessão de artigos e extratos de reuniões que foram sendo publicados pelo Irib no transcurso desta audiência. Os interessados encontrarão aqui os melhores subsídios para uma tomada de decisão.
Enfim, serão ou não registrados esses contratos?
A resposta absoluta a essa pergunta é simplesmente impossível. Ainda que se tenha identificado uma clara tendência afirmativa, o fato é que, como bem observou Maria Helena Leonel Gandolfo, será na fronteira do enfrentamento dos problemas concretos, a partir da apresentação concreta dos títulos formalizados, que todos os detalhes dessa importante discussão ganharão vida e perfeita significação.
Até lá, os registradores (e outros profissionais do Direito) têm aqui, em primeira mão, uma importante referência, urdida no transcurso de um qualificado debate, cuja importância e profundidade os leitores terão a chance de constatar.
O encaminhamento proposto e aprovado foi o envio de e-mail para todos os participantes da AP III, para sugestões de aperfeiçoamento do relatório, depois de consolidada e revisada a ata. É o que faremos em seguida: todos os participantes receberão um dossiê com todos os documentos relacionados com esta AP.
Dando por encerrada a Audiência Pública III, agradeço a todos os participantes e a todos os que indiretamente contribuíram para a construção dessa importante discussão de registradores.
Sérgio Jacomino
Presidente.
CESSÃO DE CRÉDITO IMOBILIÁRIO E ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE BEM IMÓVEL OBJETO DE COMPROMISSO DE COMPRA E VENDA REGISTRADO
Transcrição dos trabalhos da reunião realizada no dia 15 de dezembro de 2003, às 10:00 horas, nas dependências do hotel nh della volpe, em são paulo - sp, para posição final acerca dos temas tratados na audiência pública iii (cessão de crédito imobiliário e alienação fiduciária de bem imóvel objeto de compromisso de compra e venda registrado).
Data, local e presentes.
Aos quinze dias do mês de dezembro de dois mil e três, às dez horas, nas dependências do Hotel NH Della Volpe, situado na Rua Frei Caneca, nº 1199, Cidade de São Paulo, Estado de São Paulo, reuniram-se sob a presidência do Dr. Sérgio Jacomino (Presidente do IRIB), os Senhores Doutores Maria Helena Leonel Gandolfo (Conselheira Jurídica do IRIB), Alexandre Assolini Mota (Gerente Jurídico da Cibrasec – Cia Brasileira de Securitização), Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner (Advogado do Motta, Fernandes Rocha – Advogados), Ademar Fioranelli (Registrador e membro do Conselho de Ética do IRIB), Flauzilino Araújo dos Santos (Registrador e Diretor de Publicidade e Divulgação do IRIB), Pedro Klumb (Presidente da SFI - Serviços Financeiros Imobiliários), Neusa Oliveira dos Passos Hernandes (Advogada do SFI – Serviços Financeiros Imobiliários), Durval dos Santos (Tabelião), Des. José de Mello Junqueira (Conselheiro Jurídico do IRIB), Michael Altit (Advogado do Motta, Fernandes Rocha – Advogados) e Eduardo Messias Altemani (Estagiário do Motta, Fernandes Rocha - Advogados).
Relatório da AP III
O Senhor Presidente declarou abertos os trabalhos, às 10:20, relatando sobre a data de instauração da Audiência Pública III, 7 de julho de 2003, a qual foi proposta pelo Dr. Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner, do escritório Motta, Fernandes Rocha - Advogados. Em seguida, foram apresentados os documentos que instruem a referida audiência pública, iniciada com a petição enviada pelo escritório Motta, Fernandes Rocha - Advogados, datada de 7 de julho de 2003, subscrita pelos doutores Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner, Michael Altit e Eduardo Messias Altemani. Posteriormente veio cópia de um procedimento instaurado na Vara de Registros Públicos, a pedido do Dr. Marcelo Terra. Este pedido também foi encaminhado pela Brazilian Securites Cia de Securitização, seguindo-se cópia da decisão do Dr. Venício Antônio de Paula Salles, de 27 de janeiro de 2003. Houve nova manifestação sobre os temas, produzida pelos advogados citados de Motta Fernandes Rocha, de 11 de agosto de 2003. Em reunião do dia 1º de setembro de 2003, foram discutidas as manifestações apresentadas pelo Dr. Ricardo Nahat, colega do 14º Cartório de Registro de Imóveis da Capital, a manifestação da Dra. Maria Helena Leonel Gandolfo, Conselheira jurídica do Irib. Depois, analisamos um texto publicado no Boletim Eletrônico do Dr. Melhim Namen Chalhub, “Cessão de Crédito Imobiliário e Alienação Fiduciária de Imóvel Objeto de Compra e Venda Registrado”. Encaminhou-se a decisão da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de São Paulo, o parecer do Dr. João Omar Marçura, de julho de 2003, aprovado pelo senhor Corregedor Geral, o pronunciamento do Dr. Alexandre Assolini Mota, a carta do Dr. Elvino Silva Filho, em que ele pede escusas por não estar participando por motivos de saúde. Voltou-se a um texto do Dr. Marcelo Terra, “Variações a Respeito da Alienação Fiduciária em Garantia e a Securitização de Recebíveis Imobiliários”, publicado no Boletim Eletrônico Irib-Anoreg/SP nº 899. Posteriormente, foi publicada no Boletim Eletrônico Irib-Anoreg/SP nº 904 a consulta formulada pelo Dr. Marcelo Terra e as decisões já referidas. Retornando aos temas debatidos em 20 de outubro, chegou o parecer da Dra. Maria Helena Leonel Gandolfo e a manifestação do Dr. Junqueira, bem como o pronunciamento de 30 de outubro do SFI, assinado pelo Dr. Pedro Klumb, também publicado no Boletim Eletrônico, e a ata da reunião de 1º de setembro de 2003, perfazendo um total de 17 (dezessete) páginas a transcrição de toda a discussão.
Auto-regulação da atividade registral e normas de boas práticas no registro
Logo após, o Sr. Presidente relatou aos presentes que o IRIB iria tomar uma posição a respeito do assunto tratado na Audiência Pública III. A reunião tinha o objetivo de fechar a discussão, já que o debate havia prosperado e novas questões haviam sido levantadas. Ele ressaltou também que a matéria sob debate é muito importante, especialmente quando se tem em vista dois aspectos: primeiro, o fato de que a Corregedoria Geral da Justiça não se pronunciou a respeito deste assunto, ou quando foi provocada a manifestar chegou à conclusão de que não deveria dar uma resposta em tese para o caso, mas somente responder a questões concretas; segundo, o IRIB está paulatinamente assumindo um espaço muito importante no cenário jurídico brasileiro, servindo de sinalizador de normas técnicas, assim como instituição competente a proferir recomendações de boas práticas de registro imobiliário. O presidente ressaltou também que a atividade registrária caminha celeremente para a auto-regulação, especialmente quando se tem em vista que o novo perfil institucional do IRIB e o novo perfil institucional do registrador imobiliário ainda estão para ser construídos. A partir da Constituição de 1988, houve decisivamente uma radicalização na profissionalização da atividade e, hoje, observa-se a caça de um eixo que possa orientar a prática de atos registrais em todo o território nacional, de maneira harmônica, objetivando, especialmente, o caráter nacional dos casos que são apresentados, como, por exemplo, a cédula de crédito imobiliário, utilizada em todo o território nacional. As questões de tratamento do crédito imobiliário, que também têm uma feição nacional, não podem estar sujeitas às particularidades locais, não podem estar limitadas às situações concretas de cada comarca. Ele destacou também que hoje é nítida a visão de que, mais do que nunca, as demandas que chegam aos registros imobiliários têm um caráter muito mais abrangente do que as de antigamente. Não se tolera mais que um cartório possa registrar um determinado título e o cartório do outro lado da esquina não registre por motivos completamente diferentes ou, o que é pior, muitas vezes fundados em orientações normativas que são divergentes. Isto, num plano administrativo, é intolerável, não se admite este tipo de assimetria, e se persistir essa tendência o mercado haverá de criar mecanismos alternativos para que a segurança dos negócios seja garantida. Por fim, concluiu que em virtude de todos esses fatos o IRIB abraçou esta Audiência Pública e convidou a elite intelectual jurídica do direito imobiliário, pois considera o tema relevante.
Venda condicional – uma alternativa?
Em seguida, passou a palavra a Dra. Maria Helena Leonel Gandolfo, a qual mencionou que o Dr. Melhim Chalub havia proposto uma alternativa à consulta do escritório Motta, Fernandes Rocha - Advogados, enfatizando: "Então, não sabemos se vamos pensar um pouco sobre a hipótese de venda condicional ou se vamos nos restringir a examinar a questão apresentada pelo escritório consulente, o que nos parece que foi quase solucionada, tendo emperrado na questão do desdobramento da posse. Vamos pensar sobre a venda condicional, ou vamos partir da consulta do escritório?".
A seguir, o Dr. Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner, representando o escritório consulente, explanou: "Sugeriríamos aos presentes que continuássemos a discussão de onde paramos na Audiência anterior, tendo em vista que avançamos bastante na discussão. Não existe novidade quanto ao tema, parece-nos necessário um aprofundamento da questão proposta sobre a possibilidade de alienação fiduciária da propriedade residual posterior ao compromisso de compra e venda. Obviamente, nessa discussão, teremos que abordar a alternativa da venda condicional, porque não estamos em uma situação em que se trata de um ou outro. Na realidade, para o tipo de operação que está sendo almejada pelo mercado e por pessoas que já nos fizeram consultas, a alienação fiduciária é a solução para o problema, a venda condicional não. O que não quer dizer que a venda condicional não seja possível de ser implementada”.
Cessão dos direitos de promissário-vendedor e o NCC
“Gostaríamos de enfatizar três pontos que parecem principais a respeito da matéria discutida nesta Audiência Pública, sendo que dois já estão resolvidos e um é o que ainda resta a ser debatido e, quem sabe, solucionado. O primeiro diz respeito à possibilidade da cessão de direito do que restar ao promitente vendedor depois de celebrado o compromisso de compra e venda. Temos uma jurisprudência pacífica anterior ao NCC de que era inviável essa cessão. Hoje, temos o novo artigo 1418 que estabeleceu, de maneira muito clara, a possibilidade de se fazer essa cessão ao dizer que o promitente comprador, titular de direito real, pode exigir do promitente vendedor, ou de terceiros , a quem os direitos desses forem cedidos, a outorga da escritura definitiva. Desse modo, parece-nos que a referida cessão é possível. Depois de celebrar esse compromisso, o promitente vendedor cede ao terceiro seus direitos, o qual se tornará o responsável pela outorga da escritura definitiva. Superado esse primeiro ponto, passo ao segundo que é o da cessão do crédito deste promitente vendedor. Também nos parece que foi unânime o entendimento dos presentes, em todos os momentos desta Audiência Pública, no sentido de que a cédula de crédito imobiliário veio para ficar, está funcionando e é um instrumento hábil à transferência desse crédito. E se antes já não existia muita dúvida a respeito dessa possibilidade, hoje parece que se transformou em uma realidade incontestável. Vem agora o nosso terceiro ponto, que é a possibilidade de não se ceder definitivamente esse direito do promitente vendedor, mas cedê-lo de outra forma, qual seja, por meio de uma alienação fiduciária que servirá, simplesmente, para garantir a cessão do crédito”.
Cessão de crédito por alienação fiduciária e a questão do desdobramento da posse
“Esse foi um dos objetos da nossa consulta e recebeu respeitável oposição de alguns dos participantes desta Audiência, no sentido de que não era possível realizar a alienação fiduciária, porque a própria lei estabeleceria que, neste tipo de operação, teria que ter um desdobramento da posse sobre o bem dado em garantia, ficando a posse direta com o promitente vendedor e a indireta com o credor fiduciário. Ora, a partir do momento que se tem a celebração de um compromisso de compra e venda, a posse já é do promissário comprador. Foi manifestado o entendimento de que o promitente vendedor não teria mais a posse direta deste bem, portanto, não seria passível de uma alienação fiduciária. Salvo engano, esse parece que foi o ponto em que nós paramos no último encontro. Gostaríamos de fazer uma colocação que nos pareceu muito interessante a respeito desse conceito de posse direta e indireta. Já na Audiência anterior, levantamos alguns exemplos em que o desdobramento de posse direta e indireta não aconteceria, como no caso, por exemplo, da alienação fiduciária de um imóvel dado em usufruto, ou no caso de um imóvel locado, ou, ainda, de um bem de terceiro dado em alienação fiduciária. Na verdade, não tivemos uma resposta objetiva, mas apenas obtivemos uma opinião de que, se fosse desse jeito, não seria possível a alienação fiduciária de imóvel locado, ou de imóvel objeto de usufruto, ou ainda bem móvel e imóvel de um terceiro. Não concordamos com isso. Contudo, surgiu-nos o seguinte conceito de posse e convidamos os colegas a analisarem-no. As posses direta e indireta são conceitos que precisam ser analisados em relação a um referencial. Por exemplo, se um bem for dado em usufruto, o nu proprietário terá a posse indireta e o usufrutuário a posse direta do bem. Se esse usufrutuário locar o imóvel, o locatário terá em relação ao usufrutuário a posse direta, e este a posse indireta. No entanto, a relação possessória entre o nu proprietário e o usufrutuário não se alterará, este continuará tendo a posse direta aquele a posse indireta. Assim, o usufrutuário terá posse direta em relação ao nu proprietário e posse indireta em relação ao locatário. Esse é o mesmo conceito que transferiríamos para a alienação fiduciária da propriedade que resta ao promitente vendedor. Na relação entre o promitente vendedor e o promissário comprador, não há duvida de que o promissário comprador tem a posse direta e o promitente vendedor a posse indireta. Contudo, a relação que se estabelecerá entre o promitente vendedor e o credor fiduciário será a mesma. O credor fiduciário ficará com a posse indireta do bem e o promitente vendedor com posse direta. Essa operação não desnatura a alienação fiduciária, todos os elementos fundamentais deste tipo de contrato são respeitados. A relação possessória entre o promitente vendedor e o promissário comprador é indiferente para o credor fiduciário. Importante ressaltar que o desdobramento da posse em direta e indireta não é elemento essencial para a caracterização da alienação fiduciária, pois parece mais razoável o conceito de alienação fiduciária que a considera um negócio jurídico pelo qual o devedor ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência da propriedade resolúvel de coisa imóvel ao credor ou fiduciário. A nós parece suficiente a cessão da propriedade de um bem, mas a cessão de uma propriedade resolúvel, porque ela volta para o fiduciante no momento em que implementada uma certa condição. Achamos que isso parece suficiente para caracterizar a alienação fiduciária, sendo irrelevante a questão possessória para a configuração do negócio em questão. O que a lei não permite é que o credor fiduciário fique com o bem, pois caso contrário não se terá a fidúcia, a confiança. Não ficando o credor fiduciário com a posse direta do imóvel, é possível a realização de uma alienação fiduciária, independentemente do fiduciante ficar com a posse direta ou não do bem, podendo alugá-lo, ou emprestá-lo, etc.. Gostaríamos de colocar aos colegas nosso entendimento de que não existe óbice à celebração dessa alienação fiduciária, lembrando sempre que a cessão, pura e simples, já está assegurada pelo Código Civil. Nesse sentido, achamos que transferir a propriedade do imóvel de uma forma resolúvel, por meio de alienação fiduciária, não encontra óbice em nossa legislação, independente da questão da venda condicional, que nos parece ser um negócio possível nessa situação, mas que não atende a um interesse de segurança que o mercado exige, a hipótese de falência do promitente vendedor. Em uma venda condicional, conforme nosso entendimento, se ocorrer a falência do promitente vendedor, não tendo sido ainda implementada a condição, parece-nos que a venda não poderia ser finalizada. Situação diversa ocorre na alienação fiduciária, uma vez que nesta se tem efetivamente a retirada daquele bem do patrimônio do promitente vendedor, na medida em que ele é transferido ao credor fiduciário. Nesse caso, se houver falência do promitente vendedor, o bem alienado fiduciariamente fica fora da massa falida. Assim, a despeito da possibilidade de realização tanto da venda condicional, quanto da alienação fiduciária, parece-nos que esta pode ser implementada no caso em questão sem problema algum. Convidamos os colegas a refletirem sobre isso".
A cessão é direito pessoal
Fazendo uso da palavra, o Dr.Alexandre Assolini discorreu: "Em relação à transferência da nua propriedade residual que o promitente vendedor tem, achamos que a discussão já foi superada, até pelos termos do novo Código Civil, sendo possível passarmos a um próximo tópico. A possibilidade de cessão do crédito da promessa de compra e venda já era regulada no Código Civil anterior e continua sendo regulada pelo novo. A única observação que deixaríamos é que essa cessão de crédito decorrente de uma promessa de compra e venda é uma cessão pessoal. Entendemos que a Medida Provisória 2223 recepcionou a possibilidade de assentamento desse ato nos Registros de Imóveis, de acordo com a Lei de Registros Públicos, mas continua sendo uma cessão de direito pessoal. Inicialmente, entendíamos que o desdobramento da posse era uma coisa essencial para a realização da alienação fiduciária. Mudamos o nosso entendimento, mas mesmo assim, mesmo achando que o desdobramento da posse não é essencial, acreditamos que algumas coisas deveriam ser observadas nesse negócio jurídico. Concordamos com o Carlos Eduardo no sentido de que a lei buscou preservar o direito do fiduciante de a posse direta do imóvel não ficar com o fiduciário. Uma das interpretações possíveis do parágrafo único, do artigo 23 era de que realmente a posse direta não ficasse com o credor. Mas, também, tiramos outra conclusão daquele parágrafo, a qual seria de que a posse indireta obrigatoriamente deve ficar com o fiduciante. Achamos que essa seja uma questão essencial do negócio, isto é, não há que se falar, necessariamente, do desdobramento naquele momento, mas que haja possibilidade de que o fiduciário seja investido na posse indireta e de que ele também não permaneça com a posse direta do imóvel. Em nossa modesta opinião, não pode ser outro o entendimento, porque não seria facultada ao fiduciário ação possessória. Viemos discutindo muito a questão do desdobramento da posse, mas não foram analisadas as repercussões que o desdobramento, ou que os conceitos e necessidades do contrato de alienação fiduciária geram no direito possessório das partes. Não nos parece razoável que o fiduciário tenha qualquer tipo de ação possessória em relação ao promitente comprador. Em contrapartida, nos parece extremamente razoável, num exemplo análogo ao que foi citado, que o nu proprietário tenha ação possessória em relação ao locatário, caso o usufrutuário não exerça seus direitos possessórios, até para evitar questões de usucapião e valores relativos. A diferença entre o exemplo citado por eles e a questão concreta seria uma questão de continuidade, ou seja, primeiro nasce à relação de usufruto e depois a de locação. Não estamos querendo dizer nessa hipótese em concreto que primeiro nasce a locação, ou então a transferência da posse direta, para depois nascer a alienação fiduciária. Parece-nos que não se fecha essa continuidade e até mesmo por isso é que não vemos a possibilidade de o fiduciário ter qualquer tipo de ação possessória em relação ao comprador da unidade. Essas seriam as primeiras manifestações no debate. Achamos que é importante debater não só a ficção jurídica do desdobramento da posse, mas também a questão das ações possessórias em relação a cada uma das partes envolvidas no negócio".
A questão da ação possessória
Prosseguindo, o Dr. José de Mello Junqueira indagou: "Jamais um novo fiduciário poderá arcar com a ação possessória, porque a relação dele com o adquirente, o compromissário comprador, é apenas uma relação de compromisso de compra e venda. Ele só substituiu a figura do vendedor, do alienante com o compromisso de compra e venda, mais nada. Vamos supor que o compromissário comprador não pague, qual o direito que advém ao fiduciário? Apenas o de entrar com uma ação de rescisão contratual de um compromisso de compra e venda. Contudo, isto nunca poderia acontecer, porque ele não figurou no contrato de alienação fiduciária. Nossa posição é a seguinte: o fiduciário não tem a possessória, apenas substitui, no pagamento do crédito, o promitente vendedor em sua posição. Esta é a nossa primeira posição e gostaríamos de resposta".
Prosseguindo, o Dr.Alexandre Assolini enfatizou: "Também concordamos com a sua posição. Jamais o fiduciante vai ter direito possessório contra o comprador. O art. 30 da Lei 9.514/97 assegura ao fiduciário ação possessória contra o fiduciante. Se a lei assegura esse direito, é porque a possibilidade do fiduciário ter ação possessória é uma coisa que deve existir. Se não existe é porque o nosso contrato não preenche todas as condições necessárias à sua formalização. Quanto à tese de se ter o promitente comprador como fiduciante, também não acreditamos nela. Para não haver mais delongas, poderíamos debater quanto à possibilidade do contrato de alienação fiduciária. Caso esse contrato venha a ser possível, o fiduciante irá assumir a posição do incorporador e terá que cobrar o promitente comprador, nos termos do Código de Processo Civil. Acreditamos que isso gere milhões de repercussões, como, por exemplo, o valor que os imóveis serão levados à leilão, pois para esse imóvel existem algumas repercussões e restrições, que é a própria promessa de venda e compra existente. Sobre a facilidade de se realizar esse leilão operacional, também temos dúvidas, o que num próximo ponto podemos abordar. O que gostaríamos de deixar claro é que, realmente, entendemos que o fiduciário, nesse caso, não terá ação possessória. Não tendo ação possessória estaremos contrariando o art. 30 que assegura ao fiduciário tal ação. Da forma como estamos planejando fazer esse tipo de operação nem todos requisitos legais são preenchidos, por conseguinte nosso entendimento por sua impossibilidade”.
A preocupação subjacente: decretação da falência
Em seguida, o Dr. José de Mello Junqueira salientou que: “A questão se volta para os efeitos dessa negociação, se os efeitos práticos seriam atingidos ou não. Parece-nos que não haverá a segurança que dá a alienação fiduciária ao fiduciário e também ao incorporador. Parece-nos que essa segurança não vai acontecer”. A seguir, o Dr. Sérgio Jacomino indagou: "A esta altura da discussão já podemos distinguir se o negócio em si poderia ser feito. Se o fato de ficar desfalcado de uma ação impediria que o negócio fosse realizado. Parece-me que sim, porque se a ação deve assegurar um direito e se esta ação está prevista na lei, isto significa que se ela não pode ser exercitada nesse caso não há que se falar na possibilidade de tal negócio. Essa é a questão que colocamos em discussão”. Intercedendo o Dr. Alexandre Assolini explanou: "Esse contrato nunca vai se equiparar ao contrato de compra e venda com alienação fiduciária, mesmo que venha a ser possível. Aquela facilidade que se provou com a alienação fiduciária talvez não seja alcançada. Percebemos que a preocupação está na hipótese de falência do incorporador, hipótese em que aquela propriedade do imóvel seria carregada à massa. No caso da possibilidade dessa alienação fiduciária, não. Essa é a principal viabilidade. De qualquer forma, mesmo que ela se realize, sempre vamos nos sujeitar às regras do Código de Processo Civil para cobrar o promitente comprador e para fazer a retomada do imóvel. Achamos que a tese defendida pelo Marcelo Terra não é a dos demais presentes, até porque percebemos que não poderíamos transformar uma promessa de compra e venda em uma venda e compra com alienação fiduciária mediante a realização desse instrumento, inclusive, sem anuência do comprador. Fica uma situação muito difícil de se sustentar. Vemos que essa possibilidade de se tirar de uma massa falida o imóvel daquele comprador pode ser uma coisa interessante, mas nos parece que é possível utilizar para isso a alienação fiduciária. Se não pensarmos em uma situação de liquidez para esse tipo de direito de crédito, talvez não tenhamos possibilidades de fazer novos estoques, pois nunca vamos dar a primeira pedalada na bicicleta, mas essa é uma questão mais negocial do que jurídica”.
A estrutura essencial do compromisso será integralmente preservada
A seguir, o Dr.Pedro Klumb informou: “Ficou muito clara a posição de que ninguém pretende alterar unilateralmente contratos. O que se está buscando com essa operação é emprestar do regime legal da alienação fiduciária uma forma de garantir um negócio baseado em compromisso de compra e venda, o que obrigatoriamente terá que respeitar a estrutura contratual original do compromisso. Mesmo que se adote a garantia da alienação fiduciária, de acordo com a Lei 9514 e a medida provisória 2223, há que se respeitar o compromisso anteriormente contratado, não há como uma substituir a outra. Vale a pena ressaltar as duas situações em que se utilizaria essa garantia. A primeira delas é a hipótese de falência ou concordata do promitente vendedor. Essa é a principal defesa que se busca para essa situação. A segunda situação que pode acontecer é a inadimplência do promitente comprador. Esta vai ter que se tratada mediante o contrato de compromisso de compra e venda celebrado com o promitente vendedor. Desse modo, o fiduciário, porque comprou os direitos creditórios, terá que ficar assistindo ao momento de entrada na operação. Porém, há uma situação em que a inadimplência do promitente comprador poderá gerar alguma ação por parte do fiduciário, em nosso modo de ver. Trata-se da situação em que haja o distrato do compromisso de compra e venda. Com esta operação o que se pretende é a proteção do fiduciário no caso de falência do promitente vendedor, pois nesse caso o comprador dos créditos ficará sem estes e sem garantia alguma ao mesmo tempo, situação esta que tentamos evitar. É só na hipótese de falência do promitente comprador e distrato do compromisso que o fiduciário poderia fazer a reintegração da posse, uma vez que aquela condição do compromisso de compra e venda deixaria de existir, sendo possível aplicar com toda a eficácia a garantia de alienação fiduciária. Enquanto isso não acontecer haverá que se respeitar o direito contratado anteriormente entre o promitente comprador e o vendedor, ficando só nesse caso o credor fiduciário protegido da situação de falência. O imóvel dado em garantia fica aguardando o fiel cumprimento da obrigação contratada, fluindo os recursos provenientes das prestações pagas até a quitação do negócio ou, em hipótese contrária, pode o promitente comprador ficar inadimplente e o promitente vendedor em situação de insolvência. Nesse caso, a garantia contratada será utilizada. A questão é como fazer conviver essas duas estruturas contratuais simultaneamente, uma condicionada a outra e desde que ambos os direitos respeitados nas suas devidas proporções”.
Ainda o desdobramento da posse
Prosseguindo o Dr. Carlos Eduardo Fleury indagou: "Gostaríamos de voltar um pouco à questão do desdobramento da posse, pois, a nosso ver, ela ainda não está superada. Entendemos que o referido desdobramento é requisito essencial para a configuração da alienação fiduciária. Antes de debater esse tema, gostaríamos de levantar algumas questões importantes, uma vez que a Abecip e nós tivemos a honra de participar do anteprojeto que foi convertido na lei 9.514. Há uma preocupação muito grande de que não só alienação fiduciária, mas todo o processo que envolve a lei 9.514, todo o sistema de securitização ali previsto, o qual tem por fim o desenvolvimento de todo um sistema voltado a criação de novos negócios imobiliários, tendo-se em vista que o SFH está quase numa UTI. Em primeiro lugar, entendemos que a interpretação deve ser a mais restritiva possível, até para que não aconteça a perda de instrumentos como esses da alienação fiduciária, a exemplo da própria securitização. Da mesma maneira, em relação à alienação fiduciária, vemos que não é um instrumento específico para a securitização, mas um elemento essencial para dar maior segurança a uma operação de securitização, ou seja, também deve ter uma interpretação bastante restrita. Por essa razão, um outro exemplo acontecido com o fundo imobiliário: o fundo de investimento imobiliário é de 1993. Na época, procurou dar um revestimento ao instrumento de forma que não fosse prejudicado, ou contaminado com interpretações distintas para evitar a perda desse instrumento. O fundo imobiliário hoje é um condomínio fechado e não um condomínio aberto, que seria o mais lógico e razoável para um mercado de valores mobiliários. Vemos que nós devemos ter esse elemento em conta. Em relação à alienação fiduciária, mais um exemplo que daremos em termos de preocupação com o mercado, preocupação de que esse instrumento perdure justamente para permitir um desenvolvimento do mercado imobiliário. A alienação fiduciária de bem imóvel está sendo discutida hoje no âmbito do Conselho Curador do FGTS, que tem a competência para estabelecer as normas e condições para a utilização do fundo de garantia por tempo de serviço. A lei 8.036 define que a única garantia a ser aceita é a hipoteca. Depois, temos outra medida provisória que abriu o leque de garantias a ser utilizado no fundo de garantia. Está se discutindo: devemos ou não abrir a possibilidade de utilização de alienação fiduciária de bem imóvel para a camada de mais baixa renda? Sabemos que a alienação fiduciária é uma garantia eficaz, uma garantia que veio, efetivamente, tornar o crédito mais estável, permitir o retorno. Será que seria interessante admitir a alienação fiduciária para a camada de baixa renda, que seria bom, do ponto de vista de recuperação de crédito? E amanhã, se discutida em juízo a possível inconstitucionalidade da alienação, tendo em vista a dureza? Em razão de tudo isso, preferíamos ficar com a interpretação bastante restritiva. Entendemos, do ponto de vista técnico, que é elemento essencial da alienação fiduciária o desdobramento da posse, ficando o credor ou fiduciário com a posse indireta e o fiduciante com a posse direta. As questões, como o usufruto e a locação, podem ser tratados em separado, pode ser feita posteriormente a constituição da alienação fiduciária e não anteriormente. Outro aspecto que gostaríamos de levantar, polêmico em relação à própria CCI, refere-se ao direcionamento do negócio para uma securitização nos moldes da lei 9.514, ou mais ainda, dentro do SFI. A lei 9.514, em seu artigo 1º, define que o Sistema Financeiro Imobiliário tem por objetivo aumentar ou preservar o financiamento imobiliário em geral. Em razão disso, vemos que se a securitização for exclusiva ou for destinada ao SFI, teremos que ter em mente o artigo 1º da lei; caso contrário, poderemos estar fugindo do objeto. Voltando à questão da posse, entendemos que ela é elemento essencial. A lei deixou muito claro que se tal ponto não fosse elemento essencial, não haveria necessidade de constar do próprio dispositivo, tendo em vista que se aplicaria analogamente o próprio Decreto-lei 911/69, de onde foi buscada a inspiração da lei 9.514. Antes de avançar nas discussões, gostaríamos de ver se essa questão está realmente superada”.
Afetação do patrimônio do promitente vendedor
Dando prosseguimento, o Dr. Michael Altit informou: “Gostaríamos de reiterar algumas coisas que o Pedro Klumb colocou no seguinte sentido: hoje o mercado busca uma alternativa jurídica e econômica que permita efetivamente a desintermediação e a desova do estoque do compromissos de compra e venda. O mercado já tem trabalhado com as estruturas de cessão de crédito de compromisso de compra e venda. Nossa operação pretende fornecer ao mecanismo de securitização uma garantia adicional, que dê conforto para que as operações possam ser estruturadas com margens de garantias mais compatíveis. Assim, o parecer do IRIB a respeito da possibilidade de tal negócio irá contribuir para que as operações desse tipo sejam efetivamente mais eficientes, impedindo que tais transações sejam barradas. O objetivo do negócio aqui é uma afetação do patrimônio do promitente vendedor, o que é importante para a classificação de risco da operação, havendo a preocupação, nesse momento, com o risco de falência do promitente vendedor, enquanto que, com referência ao risco do promitente comprador, a própria estrutura do negócio, com diversificação da carteira, torna-se menor. Com relação aos critérios de pulverização dentro da carteira dos fundos ou das próprias securitizadoras, será possível a circulação desse tipo de crédito com média de garantia bastante razoáveis. Nesse caso, quando da constituição da alienação fiduciária o fundo ou o titular desse crédito específico, ficará vestido das garantias e prerrogativas que um promitente vendedor naturalmente tem. Não se quer acrescer e nem se retirar nada, o processo se atinge em toda a sua plenitude no objetivo que se busca alcançar com a constituição da garantia da alienação fiduciária. A relação de crédito entre o promitente comprador e o promitente vendedor, que será transferida para o cessionário do crédito mantém-se perfeita. O mercado já está preparado para a realização de tal operação. As agências de classificação de risco já suportam esse risco, sendo que infelizmente elas só não conseguem viver com o risco de falência do incorporador. Este é o único problema que se vê nas operações em que são solicitadas margens de garantia de 50% numa operação, ou seja, para cada real de crédito que se cede é necessário ceder 0,50 de crédito como um sobrecrédito, sobregarantia. O que se discute é a possibilidade de que não seja necessário ceder 50% de crédito como margem de garantia e sim, uma margem mais razoável, visto que a alienação fiduciária fará com que o investidor corra o risco de solvência do promitente comprador, ou possa, de uma certa forma, analisar o risco de falência do incorporador nesse caso. Uma outra coisa muito importante é que se entende que isso poderia gerar uma redução da margem de garantia, da ordem de 20 a 35%. Obviamente, os créditos de natureza imobiliária também podem ser vertidos para os fundos de recebíveis. Nesse caso, com o implemento da alienação fiduciária nesse tipo de transação, atingir-se-á exatamente os objetivos que se buscam alcançar”.
A incidência tributária do ITBI
Intervindo o Dr.Alexandre Assolini indagou: "Ninguém está se opondo à securitização desse tipo de crédito, ou a sua utilização via cessão. Estamos num foro que, não dissociado da questão econômica, está analisando aspectos jurídicos. Do ponto de vista econômico, temos o maior interesse de que operações com cessão de recebíveis de promessa se consolidem no mercado, tanto é que de 2001 para cá, já realizamos 32 (trinta e duas) operações de aquisição de recebíveis nesse mesmo modelo. A questão que gostaríamos de enfrentar é jurídica. Que o risco do incorporador é uma coisa sem medida e ser mitigada é interesse de todos. O que vale dizer é que uma das conclusões desse grupo é que o incorporador pode ceder seus direitos e o Código Civil é expresso nesse sentido. E podemos verificar da questão de ele transferir seus direitos no momento da cessão e não por alienação fiduciária. A única questão que temos sobre esse ponto refere-se à incidência tributária do ITBI, mas isso é uma questão de se verificar se os 30% ou 50% de crédito a mais que temos que apresentar como garantia são maior ou menor que a incidência do ITBI. Gostaríamos de deixar claro que ninguém está ignorando o aspecto econômico da operação, mas o que se está analisando aqui é a viabilidade jurídica do negócio”.
Os efeitos da alienação fiduciária no direito subjetivo do promissário-comprador
A seguir, o Dr. Carlos Eduardo da Costa Pires Steiner salientou que gostaria de abordar sobre a questão do desdobramento da posse e aproveitar para pegar um gancho no final da última exposição, no seguinte sentido: "Não vamos esquecer que a operação de alienação fiduciária é exclusiva entre promitente vendedor e o credor fiduciário e o que é objeto da alienação fiduciária já é aquela propriedade residual do promitente vendedor. A execução dessa garantia acontece simplesmente para que o credor fiduciário possa incorporar a propriedade residual, aquela propriedade já afetada por um compromisso de compra e venda no patrimônio dele. O promissário comprador, em nenhum momento, vai sofrer qualquer efeito da alienação fiduciária, não vamos levar o imóvel dele a leilão na forma da lei de alienação fiduciária, ele não terá nenhum direito desobedecido pelo novo proprietário. Podemos ceder a propriedade residual, sendo que o que pretendemos fazer é justamente ceder fiduciariamente aquela propriedade residual. Vejam, o promitente vendedor não pode ceder a propriedade plena, pode ceder apenas aquilo que ele tem, o que é uma propriedade que está limitada a um implemento de uma condição, que é o pagamento de todas as prestações. Se o promissário comprador pagou suas parcelas, ele já tem um direito real de obtenção da escritura definitiva. Temos que tomar cuidado com isso: o objeto de alienação fiduciária não é aquele imóvel cheio, completo, o que é objeto de alienação fiduciária é a propriedade residual, aquela que resta ao promitente vendedor depois de celebrar um compromisso de compra e venda. E as regras de alienação fiduciária vão se aplicar exclusivamente sobre essa propriedade residual. O credor fiduciário notifica o antigo promitente vendedor, para tornar-se titular definitivo da propriedade residual do imóvel. O promissário comprador do mesmo imóvel tem direito de receber a escritura definitiva do imóvel, continua a existir o compromisso de compra e venda. A partir desse momento, aquele credor fiduciário vai atuar como qualquer promitente vendedor, podendo cobrar o seu crédito na forma da lei, não na forma da lei de alienação fiduciária. Com relação ao art. 30 da Lei 9514, é certo que não estamos violando a ação prevista neste dispositivo, pois estamos supondo existir a possibilidade do fiduciário utilizá-la contra o promitente vendedor, no caso de ele criar um obstáculo para a transferência da propriedade plena para aquele. O promissário comprador em nada é afetado pela alienação fiduciária. Acreditamos que o credor fiduciário tem toda a garantia de que precisa, nos termos da operação sob análise. No caso de inadimplência do promissário comprador, o fiduciário terá como obter a propriedade definitiva daquele imóvel, imóvel que tem uma característica peculiar: a limitação da propriedade pela existência de compromisso de compra e venda. Assim, o fiduciário vai ter que obedecer aquele direito real de aquisição do imóvel, vai ter que cobrar, ou até mesmo rescindir o contrato de compra e venda, se for o caso, na forma prevista no nosso Código Processo Civil. Essa era a questão que gostaríamos de colocar para poder limitar bem o objeto da discussão jurídica da alienação fiduciária".
Qual a utilidade prática dessa operação?
A seguir, o Dr. José de Mello Junqueira concordando informou que: “Nada impede que o promitente vendedor aliene fiduciariamente a sua propriedade residual. No entanto, o que ainda não foi discutida é a utilidade dessa alienação fiduciária na prática. Ela vai se tornar inócua, porque não vão se obter os efeitos que a lei quis dar à alienação fiduciária. O fiduciário, no máximo, irá substituir o promitente vendedor em sua posição. Se o promitente comprador não pagar as suas prestações, a propriedade residual do imóvel consolidar-se-á nas mãos do fiduciário. Portanto, não vejo impedimentos para a realização da alienação fiduciária".
Intercedendo, o Dr.Pedro Klumb indagou: "Qual alternativa existe para se proteger de uma situação de insolvência do promitente vendedor quando se compra recebíveis oriundos de compromisso de compra e venda? Uma das hipóteses é transferir a propriedade do promitente vendedor para a securitizadora ou para um outro veículo, como, por exemplo, uma SPE, para a qual são transferidos os imóveis, com incidência de imposto. No caso da garantia, vamos evitar a incidência do imposto, exceto no momento em que se consolidar a propriedade, se for o caso”.
Intervindo, o Dr.Sérgio Jacomino complementou: “Na verdade não é só o imposto, é a administração do próprio bem e os custos daí decorrentes”. A seguir, o Dr. Alexandre Assolini informou que: “A diferença entre uma alternativa e outra é o deferimento do imposto, e não o pagamento do imposto. Tanto uma alternativa como outra devem ser verificadas. O promitente vendedor que, na maioria dos casos é o incorporador, não remanesce só com o direito, tem obrigações em relação ao promitente comprador no sentido da segurança, solidez da obra, etc. Também precisa ser verificado se a possibilidade de se tirar o imóvel do risco de falência do promitente vendedor não gera outros riscos, como, por exemplo, ser demandado judicialmente para reparar danos, vícios na construção ou alguma outra coisa que altere a solidez da obra. As responsabilidades do incorporador, nesse caso, seriam assumidas pelo fiduciário”.
Objetivo prático: não intermediação financeira
Prosseguindo, o Dr. Pedro Klumb relatou que: “Quando está se estruturando uma operação de securitização, um dos primeiros exercícios que se faz é identificar e listar os riscos, tais como os de construção, falência do incorporador, crédito do promitente comprador, desapropriação do imóvel, enfim, todos os possíveis. Para cada um desses riscos identificados, vamos encontrar um fator de proteção desse risco. Se os compromissos de compra e venda objeto dos negócios recaírem sobre imóveis ainda em fase de construção, também o risco de construção terá que ser protegido. Se o imóvel já estiver pronto e entregue não será preciso tratar desse risco especificamente. Eventualmente, em uma operação, estará sendo exigido um seguro performance, para garantir que os imóveis serão entregues. Para cada risco, vai existir um remédio ou um preço. O problema é que, em uma operação de securitização, pressupõem-se margens menores, senão far-se-ia uma operação bancária tradicional. Está-se tratando aqui de uma operação de desintermediação financeira, onde se reduz, teoricamente, os custos com a redução da possibilidade de percepção de riscos por parte dos investidores. Portanto, um mecanismo como esse dá a possibilidade de se proteger de um dos riscos envolvidos numa operação de securitização de forma mais barata que as outras alternativas, isto é um enorme estímulo para a atual fase do merc
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