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LEI No 10.931, DE 02 DE AGOSTO DE 2004 - em discussão - Retificação consensual - Capital de SP regulamenta procedimento


Primeira Vara de Registros Públicos de São Paulo baixa decisão normativa, de lavra do juiz-titular, Dr. Venício Antonio de Paula Salles, disciplinando a retificação de registro na Capital do Estado de São Paulo

Processo n°  000.04.077916-5

Vistos, etc...

A Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP, expõe longo rol de proposições, apresentadas como sugestões para a confecção de um padrão único, necessário para nortear todas as Serventias Imobiliárias da Capital, acerca da aplicação prática das mudanças introduzidas pela Lei 10.931/2004, tendo como meta, a conquista de uma melhor orientação aos Usuários do serviço público registral.

Sobre este redesenho do procedimento de retificação de registro imobiliário introduzido pela Lei 10.931, necessário a fixação de rumos precisos ajustados ao espírito e aos propósitos da norma, que veio alterar sensivelmente o procedimento, visando lhe imprimir maior celeridade e eficiência.

A tônica da nova Lei, portanto, se mostra muito clara e visível, tendo como foco a quebra do anacrônico e moroso procedimento retificatório até então desenvolvido pela via da jurisdição graciosa ou administrativa.

O novo diploma, em que pese o espírito inovador que o impregna, manteve a estrutura básica procedimental superada, tendo apenas deslocado, parcialmente, o seu campo de tramitação, ao incumbir ao Oficial do Registro de Imóveis a tarefa primeira no aprimoramento dos dados registrais.

A primeira análise e a primeira reflexão do texto legal revelam que o legislador ordinário, em algumas passagens, não logrou atingir os objetivos pretendidos, por eventual falha redacional ou falta de melhor informação, circunstâncias que podem ser debeladas por uma melhor exegese que considere o “sistema” produzido e as finalidades da norma.

Assim, na conquista de um padrão orientador e único para a Capital, adotaremos as propostas apresentadas, amoldadas a teleologia normativa.

Relatado.

decido:

A Lei 10.931/2004 prevê três formas básicas de retificação de registro imobiliário. Em primeiro lugar a “retificação de ofício ou a requerimento da parte”, muito próxima do que anteriormente era conhecido como “retificação por erro evidente”, e além desta, a “retificação consensual” e a “retificação judicial”.

retificação de ofício e a requerimento do interessado - art. 213, item I;

Preliminarmente, há que se proceder a uma diferenciação, que não é feita pela Lei, para apartarmos a modalidade “retificação de ofício”, da “retificação a requerimento do interessado”, conquanto aquela (de ofício), em face dos efeitos vinculantes do princípio da instância (que seria mais bem entendida como princípio da inércia), consagrado no inciso II, do art. 13 da Lei de Registros Públicos, possui restrições ínsitas, o que em muitos casos, torna o requerimento do interessado insuperável.

Desta forma, em atenção e respeito ao princípio da instância, a retificação de ofício, a exemplo do que ocorria nos casos tipificados como erro evidente, não pode ser deflagrada quando a retificação venha a se revelar dependente da produção de novas provas. A retificação de ofício se limita à superação de imperfeições viabilizadas pela utilização de documentos pré-existentes, pois deve ter o exato sentido de correção de erro material.

Ademais, a retificação de ofício não pode ser empregada para alterar o núcleo do desenho tabular, assim considerado, a localização e conformação imobiliária (local, perimetria, área e confrontantes). Pode, entretanto, incidir sobre pontos periféricos da descrição imobiliária desde que não alterem a sua substância ínsita.

Neste contexto e com tal limitação, é de se admitir a retificação de ofício para efeito de ser complementada a informação tabular, a partir de uma certa base documental, com a migração de informações extraídas do título causal, de outros documentos oficiais, ou de dados ou informações tabulares existentes ou anteriormente retificadas.

 A retificação de ofício, sem provocação do interessado, somente pode ser admitida, nos casos de imprecisão tabular provada por documentos pré-existentes, sem a necessidade de produção de novas provas. Em atenção ao rol que compõe os subitens, do inciso I, do art. 213, podemos destacar que a Retificação de Ofício pode ser implementada nas seguintes hipóteses:

RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO

Omissão ou erro cometido na transposição de dados do título causal. (observação: não apenas transposições dos títulos causais como também dos registros antecessores); alteração da denominação do logradouro como base em documento oficial. (obs: o documento será o Municipal para a informação urbana e do departamento estadual competente no caso de estradas, Lei ou Decreto); retificação que vise a indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georreferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais; (obs: todas as medidas perimetrais devem ser mantidas, assim com a área, sendo acrescentado apenas as deflexões e ângulos, de forma que ausente qualquer destes elementos descritivos, a retificação somente pode ser feita pela via consensual ou judicial); inserção de área decorrente de mero cálculo, quando a descrição tabular possua todas as demais informações. (obs: somente quando o imóvel forme figuras geométricas que permitam o cálculo. Nos demais casos, que exija novas provas, somente mediante requerimento do interessado); inserção de dados da qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais.

As demais hipóteses dependem de requerimento do interessado. A retificação de ofício ou a requerimento dos interessados prescindem da anuência dos confrontantes.

RETIFICAÇÃO CONSENSUAL – com anuência dos confrontantes

A retificação consensual materializa a grande inovação introduzida pela Lei 10.931/2004, pois propicia a correção tabular sem a necessidade de procedimento judicial, tramitando diretamente junto ao Oficial do Registro Imobiliário, se viabilizando para todas as hipóteses de retificação de medidas perimetrais, quer seja para mera inserção de medidas omitidas, quer seja para alteração das existentes no registro, resultando ou não em modificação da área de superfície.

O pedido de retificação consensual deve ser recebido pelo Oficial do Registro de Imóveis, instruído com planta e memorial descritivo subscrito pelo requerente, pelo engenheiro ou por profissional credenciado, acompanhado da anuência dos confrontantes. O técnico preferencialmente deve também ter conhecimentos para proceder ao exame registral filiatório.

Alguns detalhes devem ser observados. Como a Lei 10.931 prevê a responsabilidade solidária entre o técnico e o requerente sobre a idoneidade das informações reveladas pela planta, recomendável se mostra a inserção, na planta, do texto do § 14°, do art. 213 abaixo das respectivas subscrições.

A anuência dos confrontantes proprietários deve ser dada diretamente na planta, com a reserva de espaço adequado para tanto, contendo a exata qualificação do subscritor e a indicação de seu imóvel, com a localização e o número da matrícula ou transcrição. Necessária a anuência do casal (salvo se casados com regime da separação integral de bens, com pacto antenupcial projetado para os bens futuros).

Também os ocupantes devem conferir anuência na planta ou em Carta de Anuência em separado.

Caso o oficial não tenha condições de atestar que o ocupante anuente é realmente confrontante, poderá fazer constatação no local, diretamente ou por preposto (art. 213, § 12°).

Todas as anuências devem ter suas firmas reconhecidas.

RETIFICAÇÃO CONSENSUAL – com notificação

Esta modalidade de retificação é concebida para duas formas distintas de correção dos assentos registrais. A retificação destinada à mera inserção de medidas, ou a retificação voltada para alteração dos dados tabulares.

Engloba a hipótese em que parte dos confrontantes tenha dado anuência e parte se submeta à notificação.

1 – INSERÇÃO

No caso de mera inserção, sem alteração das medidas tabulares existentes no fólio real, a “planta” deve se limitar à descrição do imóvel retificando, indicando apenas sua localização e confrontações, respeitando as prescrições do art. 225, da Lei de Registros Públicos. Poderá o Oficial exigir a apresentação adicional, de planta reproduzida de foto aérea da Emplasa ou empresa credenciada, para confirmar o formato geométrico (impropriamente tratado como geodésico) do imóvel e sua real situação.

Neste caso não há necessidade de maior investigação sobre os imóveis confrontantes, conquanto esta forma retificatória não envolve risco ou potencialidade de dano a terceiros confrontantes.

2 – ALTERAÇÃO

Entretanto, se a retificação tiver como propósito ou meta a correção das metragens tabulares, com alteração de medidas e/ou de área do imóvel, a planta e o memorial devem apresentar mais elementos.

A forma mais completa ocorre quando a planta venha a contemplar além da topografia do próprio imóvel retificando, também a descrição dos imóveis confrontantes, mormente dos confrontantes potencialmente afetados.

Evidentemente que frente à finalidade da nova disposição normativa, o levantamento físico topográfico das áreas confinantes somente se justifica em havendo interesse jurídico certo e palpável, ou seja, somente em relação aos imóveis situados no sentido em que venha a ocorrer eventual expansão das medidas retificandas. Por exemplo, em se verificando que as medidas encontradas são maiores que as tabulares, provocando uma aparente expansão lateral, somente os imóveis dos confrontantes laterais é que devem ser objeto de levantamento topográfico. Inversamente, caso a expansão de medidas ocorra apenas na profundidade do imóvel, o levantamento topográfico deve contemplar o confrontante dos fundos, bem como a medida da “via ou logradouro público” frontal, sendo que neste caso a municipalidade deve ser notificada.

Também deve ser feito o levantamento topográfico relativamente ao confrontante que tenha divisa instável com o imóvel retificando, assim considerada a divisa não demarcada por edificação ou muro consolidado e respeitado (edificação de ambos os lados).

Esta maior amplitude do levantamento topográfico se torna necessário, para conferir maior clareza para o confrontante notificado (não havendo igual exigência para o confrontante anuente). Tal providência sempre foi exigida nos processos de retificação que tinha curso pelo procedimento superado.

O “memorial” deve respeitar e manter todas as informações tabulares não envolvidas na retificação, procedendo a uma descrição objetiva e direta do imóvel. Destarte, o “memorial” deve em primeiro lugar fornecer a localização, depois a perimetria, considerando o ponto “1” como o ponto mais próximo do ponto de “referência” e o ponto “2”, com o segundo ponto da face frontal do imóvel. Todos os ângulos internos devem ser apresentados, assim, como a área de superfície. O confrontante tabular deve ser indicado por seu nome, número do assento registral e número de contribuinte.

A retificação é dirigida em face dos confrontantes, que nos termos do § 10º, do art. 213, que engloba o proprietário (confrontante tabular) e o ocupante (confrontante físico), e para se cumprir os desígnios legais devem ser notificados uns e outros. Assim, devem ser chamados os ocupantes diretos, desde que não estejam na posse por autorização, permissão, detenção ou em razão de contrato firmado como o titular do domínio, casos em que tal cientificação se mostra dispensável.

Também o Poder Público, titular do imóvel público que serve de acesso ao imóvel, pode ser notificado, quando tenha interesse jurídico envolvido com o pedido de retificação (vide fls. 09, segundo parágrafo).

A notificação pode ser feita diretamente pela serventia imobiliário; pelo Oficial de Registro de Títulos e Documentos; ou mediante postagem com aviso de recebimento, devendo o interessado promover o depósito da diligência ou responder por seu valor no correspondente RTD.

A notificação dos confrontantes proprietários (confrontante tabular) deve ser feita pessoalmente, podendo ser tentada em todos os endereços disponíveis na serventia ou apresentados pelo interessado. É recomendável, à mingua de maiores informações, a realização de diligências ordinárias na tentativa de localização do confrontante tabular não localizado, antes da notificação ficta.

Não sendo encontrado o confrontante tabular, a sua notificação deve ser feita por edital, com prazo de 15 dias, mediante publicação por duas vezes em jornal de grande circulação.

Caso o pedido de retificação tenha sido requerido por “interessado” não titular do domínio, este também deve ser notificado.

Os ocupantes devem ser notificados pela via postal. Comprovado o recebimento do “aviso de recebimento” no endereço postado, a notificação se torna apta a produzir todos seus efeitos jurídicos, independentemente de quem tenha recebido o aviso. Portanto, a notificação do ocupante cumpre seus propósitos quando recebida no endereço correspondente.

Não sendo apresentado impugnação por qualquer dos notificados, o Oficial pode proferir decisão homologatória que ateste a regularidade do processo de notificação.

Procedimento RETIFICATÓRIO junto ao Registro de Imóveis

Os procedimentos retificatórios, inclusive a retificação de ofício, deve deflagrar a instauração de procedimento administrativo, que deverá seguir o padrão judicial. O processo deve ser autuado e numerado, sendo identificado com o número da prenotação.

A peça inicial será materializada pelo requerimento, quando feito pelo interessado ou pelo ato do Oficial quando envolver retificação de ofício.

Os efeitos da prenotação nos procedimentos retificatórios devem seguir o modelo dos demais procedimentos administrativos, como o procedimento de “dúvida registral” (art. 198, da LRP), que provoca a prorrogação de seus efeitos durante toda a tramitação procedimental, mesmo quando iniciado junto ao Registro Imobiliário e convertido (por decisão motivada), em retificação judicial.

As informações da serventia devem ser juntadas ao processo. Assim, as Notas Devolutivas, que podem ser denominadas como Notas de Exigência, devem ser juntadas aos autos, sempre que a serventia entender que o pedido não se revele completo ou suficientemente instruído.

Os prazos devem seguir o padrão processual, ou seja, o prazo comum é de 5 (cinco) dias, salvo quando previsto prazo mais dilatado. Nos casos de acordo, o prazo pode respeitar o quanto pedido pelos interessados.

Será competente para processar o pedido de retificação a serventia que mantenha a transcrição ou matrícula que deva ser retificada. O deslocamento para a Serventia competente atualmente não pode ocorrer, posto que o Oficial do Registro de Imóveis não dispõe de prerrogativas para expedir mandado para a correção em outra circunscrição.

Feita a correção, o Registro de Imóveis competente, lastreado na certidão expedida pela Serventia que processou a retificação, poderá descerrar nova matrícula em atenção às informações retificadas ou apenas transportar a informação, por averbação, à matricula existente.

Os documentos que devem instruir o pedido de retificação devem ser apresentados no original ou cópias autenticadas, quando possível. As plantas e memoriais devem ser apresentados em número suficiente para a notificação de todos os envolvidos.

O prazo para impugnação é de 15 dias, salvo para o Poder Público que dispõe de prazo quádruplo, na forma como prescreve o art. 188 do CPC, aplicável analogicamente à espécie.

Findo o prazo sem impugnação o Oficial dará decisão homologatória, atestando a higidez formal do procedimento.

Caso o interessado postule a remessa para a via judicial o Oficial de Registro não deverá promover o encaminhamento no prazo de 5 (cinco) dias.

Procedimento RETIFICATÓRIO impugnado

Havendo impugnação fundamentada o Oficial intimará o requerente e o técnico, para que em cinco dias se manifestem. Conquanto a lei tenha aludido a impugnação fundamentada, qualquer tipo de insurgência deve ser acatada como tal e gera os mesmos efeitos.

O Oficial não julga conflitos, de forma que não sendo apresentado termo de acordo entre o requerente e o impugnante, os autos devem ser encaminhados à Corregedoria-Permanente, que julgará de plano ou mediante instrução sumária.

Quando a peça de resistência do confrontante versar sobre questões de “divisa”, o procedimento mantém o seu sentido administrativo junto à Corregedoria-Permanente, contudo, havendo a impugnação afirmando a existência de “sobreposição”, o litígio passa a envolver não uma correção de medidas, mas uma disputa de “propriedade”, de forma que deve ser encaminhado para as “vias ordinárias”.

Em São Paulo, todas as questões registrais administrativas ou litigiosas são resolvidas frente a 1ª Vara de Registros Públicos (art. 38, do Decreto-lei Complementar 03/69), salvo se o foco primeiro da discussão deixar de ser registral.

RETIFICAÇÃO CONSENSUAL por Escritura

Os interessados poderão fixar suas divisas exatas ou retificá-las, corrigindo a informação tabular, mediante a apresentação de escritura pública, na forma do § 9°, do art. 213.

Em sendo mantidas as divisas físicas, que reflitam a implantação do imóvel no solo, a retificação independe do pagamento do imposto de transmissão, e deve ser feita sem novas exigências. Contudo ocorrendo alteração das divisas, além do recolhimento tributário, deve ser exigida a anuência Municipal, no caso de imóveis edificados, para atestar que os recuos exigidos nas posturas continuam atendidos.

ENCERRAMENTO

O presente procedimento deverá receber todas as sugestões, e ponderações para os oficiais, necessários para a revisão e aperfeiçoamento do presente padrão regulamentar, que deverá se ajustar às normas e determinações da E. Corregedoria-Geral da Justiça.

Ante ao exposto, determino a publicação desta decisão que passa a ostentar efeitos normativos. Comunique-se à E. Corregedoria Geral da Justiça.

Int.

Dr. Venício Antonio de Paula Salles,
Juiz de Direito titular



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