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LEI No 10.931, DE 02 DE AGOSTO DE 2004 - em discussão - Retificação de registro - Venicio Antonio de Paula Salles [i]*

 


O procedimento de retificação dos registros públicos, com a edição da Lei nº 10.931/2004, que entrou em vigor na data de sua publicação no Diário Oficial, ocorrida no último dia 3 de agosto de 2004, experimentou sensível alteração em seu trâmite buscando a lei lhe imprimir maior celeridade e eficiência. A tônica da nova Lei, portanto, se mostra muito clara e visível, tendo como foco a quebra nos anacrônicos e morosos procedimentos retificatórios que até então eram desenvolvidos pela via da jurisdição graciosa ou administrativa.

O novo diploma, em que pese o espírito inovador que o impregna, manteve a estrutura básica procedimental superada, tendo apenas deslocado, parcialmente, o seu campo de tramitação ao incumbir ao Oficial do Registro de Imóveis a tarefa primeira no aprimoramento dos dados registrais.

Para melhor entender seus termos e determinações, torna-se necessária uma análise de certo ponto comparativa com os procedimentos existentes antes do advento da nova lei, que eram desenvolvidos sob a forma de retificação decorrente de “erro evidente”, a “retificação de área” e a “retificação de registro”.  Cada modalidade era marcada por um rito próprio e por uma estrutura peculiar.

RETIFICAÇÃO decorrente de ERRO EVIDENTE

A retificação decorrente de erro evidente que podia ser realizada de ofício ou a requerimento do interessado, era reservada à superação de erros ou omissões de fácil ou direta visualização, imperfeições capazes de ser detectadas prima facie, frente a uma simples e imediata análise documental.

A expressão “erro evidente” foi muito debatida e suficientemente tratada pela doutrina e jurisprudência. Mesmo encerrando conceito de conteúdo genérico e não detalhado na legislação, o termo “erro evidente” não gerou grandes contendas ou controvérsias, havendo um certo consenso interpretativo sobre a sua extensão e conteúdo.

De certa maneira o “erro evidente” sempre foi concebido ou entendido como uma forma de “erro material”, que permite fácil identificação, mediante análise e consideração “documental”. Este consenso ou esta convergência interpretativa não obstou que na prática ocorressem tratamentos diferenciados, dispensados pelas diversas Serventias Imobiliárias, que ora tratavam a questão com excessivo rigor, ora contemporizando e flexibilizando a aplicação. A orientação do Oficial Registrador conferia o viés da serventia, de forma que sendo conservador e precavido, acabava gerando uma profusão de postulações judiciais e sendo diligente e empreendedor corria o risco de  experimentar o dissabor de uma demanda indenizatória.

Tais riscos, em parte, decorriam da ausência de uma melhor delimitação legal sobre o tema.

RETIFICAÇÃO DE ÁREA

O procedimento de retificação de área, submetida a procedimento de jurisdição voluntária, era reservado à superação de imperfeições descritivas constantes do ato de registro, capazes de determinar alterações nas medidas perimetrais do imóvel. Em verdade, além dos casos de alteração das medidas perimetrais, esta forma retificatória também era utilizada nos casos de deslocamento parcial da base física do imóvel, bem como para algumas hipóteses de modificação da área da superfície imobiliária.

Assim, envolvendo “potencialidade de dano” ou risco para terceiros confrontantes, o procedimento de “retificação de área” exigia a “citação” de todos os confinantes, bem como do antigo titular do domínio, somente sendo dispensada esta última citação caso a transação tivesse ocorrido há mais de vinte anos (ou de quinze, em se fazendo uma adaptação em face do novo Estatuto Civil).

Este procedimento tinha tramitação lenta, não em razão da instrução documental ou técnica, mas em função da necessidade do chamamento dos interessados e possíveis afetados.

Mormente nas grandes metrópoles como São Paulo, a desatualização dos endereços dos titulares tabulares, principalmente em relação aos imóveis situados nas áreas periféricas, onde mais se concentram os pedidos desta natureza, gerou grandes dificuldades na concretização das citações.

RETIFICAÇÃO DE REGISTRO

Por fim, a retificação de registro era estruturada como processo administrativo de cunho unilateral, dotado de rito ágil e rápido, justamente pela ausência de citação dos confrontantes e confinantes. Contudo, o entendimento jurisprudencial sempre convergiu no sentido de restringir e estreitar o âmbito de atuação deste caminho administrativo unilateral, reservando-o apenas para os singelos casos de inserção de medidas perimetrais e de área, desde que despidas de potencialidade de dano a terceiros confrontantes.

Ambos os procedimentos, impropriamente tidos como “judiciais”, tramitavam com a intervenção do Ministério Público, que atuava na condição de custos legis. Desta forma, além dos atores processuais normais, que são os interessados e o juízo, a legislação contemplava mais esta participação credenciada, que determinava e influía decisivamente na condução, no curso e no tempo do processamento.

Este panorama deve ser considerado na análise dos novos procedimentos, justamente porque a tônica da Lei 10.931/2004 foi a de reduzir e agilizar a tramitação de tais procedimentos.

Lei 10.931/2004

O novo art. 212, transcrito abaixo, concebe três requisitos básicos para a deflagração da retificação do ato de registro, que são a omissão e imprecisão do ato de registro ou para os casos em que o ato não exprima a verdade. O texto legal é bem elucidativo:

Art. 212. Se o registro ou a averbação for omissa, imprecisa ou não exprimir a verdade, a retificação será feita pelo Oficial do Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, por meio de procedimentos administrativo previsto no art. 213, facultado ao interessado requerer a retificação por meio de procedimento judicial.

Parágrafo único: A opção pelo procedimento administrativo previsto no art. 213 não exclui a prestação jurisdicional, a requerimento da parte prejudicada.

A “retificação”, destinada a cuidar da superação de imperfeições da especialidade objetiva ou subjetiva dos dados registrais, pode, nos termos da lei, decorrer de simples omissão (como no caso da ausência da menção de medida perimetral ou da área de superfície), imprecisão, (que pode ocorrer quando as medidas perimetrais aparecem invertidas ou em virtude de indicação errada de confrontante), ou nos casos em que o desenho do imóvel não venha a exprimir a verdade (que sintetiza a ausência de simetria entre a implantação real e a descrição tabular).

Os termos “omissão” e “imprecisão” empregados na delimitação da “ação retificatória”, têm conteúdo de sentido abstrato, contemplando o aperfeiçoamento registral a partir da migração ou utilização de informações coletadas junto a bases documentais, ao passo que a adequação da descrição imobiliária destinada a ajustá-la à realidade concreta, tem bases exclusivamente físicas ou fáticas.

Três foram os caminhos processuais concebidos pela nova lei para a obtenção da retificação do registro imobiliário: (1) a retificação de ofício ou mediante requerimento”; (2) retificação consensual, e por fim, a (3) retificação judicial. A nova previsão também indicou situações que independem de retificação.

O discrímen primeiro entre estas formas procedimentais considera não mais a direta “potencialidade de dano”, mas a existência de interesse dos envolvidos ou a contenciosidade da situação.

RETIFICAÇÃO DE OFÍCIO ou mediante REQUERIMENTO DO INTERESSADO

A retificação de registro nas hipóteses enumeradas no art. 213, inciso I, da LRP (art. 59 da Lei 10.931/2004), foi franqueada ao Oficial do Registro Imobiliário, podendo ser realizada por sua direta iniciativa ou em atenção a requerimento do interessado. Suas hipóteses foram expressamente indicadas:

Art. 213. O oficial retificará o registro ou a averbação:

I - de ofício ou a requerimento do interessado nos casos de:

a) omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título;

b) indicação ou atualização de confrontação;

c) alteração de denominação de logradouro público, comprovada por documento oficial;

d) retificação que vise a indicação de rumos, ângulos de deflexão ou inserção de coordenadas georreferenciadas, em que não haja alteração das medidas perimetrais;

e) alteração ou inserção que resulte de mero cálculo matemático feito a partir das medidas perimetrais constantes do registro;

f) reprodução de descrição de linha divisória de imóvel confrontante que já tenha sido objeto de retificação;

g) inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas;

A retificação de ofício ou a requerimento da parte, que anteriormente era reservada à superação de imperfeições decorrentes de erro evidente, passou a ser tratada no inciso I, do atual art. 213, que cuida de “erros de transposição de elementos do título”, “erros na indicação de confrontação”, “alteração de denominação de logradouro público, comprovada por documento oficial” e “retificação para inserção de deflexões, rumos ou ângulos, com a manutenção das perimetrais”, “alterações ou inserção decorrente de mero calculo a partir das medidas perimetrais”, “reprodução de descrição de linha divisória de imóvel confrontante retificado”, e “inserção ou modificação de qualificação pessoal das partes”.

Há que se proceder a uma diferenciação, que não é feita pela disposição em comento, entre retificação de ofício e retificação a requerimento do interessado, conquanto aquela (de ofício), em face dos efeitos vinculantes do princípio da instância (que seria melhor entendida como princípio da inércia), consagrado no inciso II, do art. 13 da Lei de Registros Públicos, possui restrições ínsitas, o que em muitos casos torna o requerimento do interessado insuperável.

Relembre-se que o princípio da instância assegura, ao titular do domínio, o direito à manutenção da descrição tabular. Desta forma, qualquer correção na informação tabular depende de provocação do interessado, inibindo a retificação de ofício.

Este princípio, evidentemente, não tem aplicação absoluta para todos os casos e hipóteses de correção de registro, sendo admitida a providência direta do Oficial Registrador, sem provocação do interessado, em certas hipóteses, como no caso em que a retificação venha a ter sentido de mera superação de erro material constante no registro.

Na condição de “ato administrativo”, o ato de registro deve espelhar a realidade, não podendo, por imperativo de coerência, rivalizar com outras informações constantes ou presentes em outros documentos oficiais. Portanto, o ajuste do ato de registro, nestes casos, comporta providência de ofício, não representando desrespeito ao direito outorgado ao interessado.

Além de tal hipótese, também pode ser admitida retificação direta e sem provocação, quando o erro registral não estiver situado no “núcleo” tipificador da especialidade objetiva, que é a própria e direta descrição tabular do imóvel intrinsecamente considerado. Este núcleo atinge, basicamente, as medidas perimetrais, a área e os ângulos ou rumos, de forma que toda e qualquer correção que escapar a este substrato, pode ser feita independentemente de requerimento.

Assim, em atenção e respeito ao princípio da instância, a retificação de ofício, a exemplo do que ocorria nos casos tipificados como erro evidente, não pode ser deflagrada quando a retificação se mostrar dependente da produção de novas provas. A retificação de ofício se limita à superação de imperfeições viabilizadas pela utilização de documentos pré-existentes.

Assim, a correção de ofício para não agredir o princípio da instância deve ter o exato sentido de correção de erro material incidindo sobre pontos periféricos da descrição tabular.

Neste contexto, e com tal limitação, é de se admitir a retificação de ofício para efeito de ser complementada a informação tabular, a partir de uma certa base documental, como a migração de informações extraídas do título causal, de outros documentos oficiais, ou de dados ou informações tabulares existentes ou anteriormente retificadas.

Portanto, a retificação de ofício se encontra LIMITADA às correções tabulares feitas a partir de bases documentais, como nos casos de: (a) transposição de dados do título causal; (b) atualização do nome do confrontante ou da confrontação, em atenção a documento oficial; (c) alteração da denominação do logradouro como base em documento oficial; (e) inserção de área decorrente de mero cálculo, quando a descrição tabular possua todas as demais informações, com a indicação das perimetrais e os ângulos e rumos, ou quando tais informações constem de documentos oficiais; (f) a inserção de rumos e ângulos desde que presentes em documentos oficiais; (g) inserção de dados da qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais.

As demais hipóteses dependem de requerimento do interessado. Assim se mostra dependente de requerimento do interessado: (a) a retificação tendente a inserir ângulos e rumos do imóvel, desde que não haja alteração das medidas perimetrais; (b) a inserção de área em decorrência de mero cálculo, quando da descrição tabular não conste os ângulos ou rumos.

Em todos os casos de RETIFICAÇÃO DE OFICIO ou a REQUERIMENTO, o Oficial do Registro de Imóveis deverá instaurar procedimento específico, iniciado através do ato inaugural de retificação ou a partir do requerimento do interessado, juntando os documentos e as provas eventualmente apresentadas. Havendo dúvida relevante na análise das provas ou documentos, o procedimento pode se converter em RETIFICAÇÃO JUDICIAL, com a remessa dos autos à Corregedoria Permanente, com o detalhamento das conclusões.

Caso o interessado postule a remessa para a via judicial o Oficial de Registro não deverá reter o procedimento.

RETIFICAÇÃO CONSENSUAL

A retificação consensual foi a grande inovação introduzida pela Lei 10.931/2004, propiciando a correção das informações tabulares, sem a necessidade de procedimento judicial, realizada diretamente ao Oficial do Registro Imobiliário. Esta modalidade retificatória foi aberta para todas formas de “correção de medidas perimetrais”, quer sejam para mera INSERÇÃO, quer sejam para ALTERAÇÃO destas medidas, resultando ou não em modificação da área de superfície.

O texto modificativo do art. 213, é bastante elucidativo:

Art. 213. O oficial retificará o registro ou a averbação:

I - ...:

II - a requerimento do interessado, no caso de inserção ou alteração de medida perimetral de que resulte, ou não, alteração de área, instruído com planta e memorial descritivo assinado por profissional legalmente habilitado, com prova de anotação de responsabilidade técnica no competente Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura - CREA, bem assim pelos confrontantes.

§ 1o Uma vez atendidos os requisitos de que trata o caput do art. 225, o oficial averbará a retificação.

...

§ 10. Entendem-se como confrontantes não só os proprietários dos imóveis contíguos, mas, também, seus eventuais ocupantes; o condomínio geral, de que tratam os arts. 1.314 e seguintes do Código Civil, será representado por qualquer dos condôminos e o condomínio edilício, de que tratam os arts. 1.331 e seguintes do Código Civil, será representado, conforme o caso, pelo síndico ou pela Comissão de Representantes.

O pedido de retificação consensual deve ser recebido pelo Oficial do Registro de Imóveis, instruído com planta e memorial descritivo subscrito por profissional credenciado, acompanhado da anuência dos confrontantes. O profissional deve estar habilitado pelo CREA, sendo de muita utilidade que possua conhecimentos na área registral, para saber lidar com o estudo filiatório.

A nova redação não mais exige o chamamento do antigo titular do domínio, independentemente do tempo decorrido da alienação. Em que pese o art. 500 do Código Civil ainda preservar o direito de ajuste de valor entre comprador e vendedor quando for constata alteração de medidas do imóvel alienado, esta forma compensatória não mais impregna o serviço de retificação registral.

A retificação consensual envolve duas formas básicas. A retificação destinada a mera inserção e a retificação que gera alteração.

No primeiro caso, ou seja, para mera inserção, sem alteração das medidas existentes, os documentos que irão instruir a postulação não precisarão fazer incursões sobre os imóveis confrontantes, de forma que a planta pode se limitar à descrição do imóvel retificando, indicando apenas sua localização e confrontações, respeitando as exigências do art. 225, da Lei de Registros Públicos. A apresentação de planta extraída de foto aérea (Emplasa), se mostra útil para debelar incertezas, confirmando o formato geodésico do imóvel.

Entretanto, em se tratando de correção de divisas com alteração das medidas perimetrais ou da área, a planta pode contemplar além da topografia do próprio imóvel retificando, também a descrição dos imóveis confrontantes.

Evidentemente em face da finalidade desburocratizante da nova regra, o levantamento físico das áreas vizinhas somente se justifica quando existir instabilidade nas divisas demarcatórias. Também, poder-se-á exigir o levantamento dos confrontantes quando o imóvel retificando acusar medida maior do que no a constante do fólio real, de forma que, em havendo certo aumento de medidas, por exemplo, da testada e dos fundos, somente os imóveis laterais é que comportam medição, e se porventura houver expansão de área das medidas laterais, os confrontes laterais devem ser levantados.

Para tal propósito é de se conjugar esta exigência como o art. 500 do Estatuto Civil, que admite como razoável e dentro das diferenças normais e aceitáveis de uma medição, uma variação de até 5% (cinco por cento), de forma que, se a expansão de medidas não ultrapassar este percentual, a necessidade de levantamento dos confrontantes não se mostra necessária.

Neste contexto, a dimensão (largura) da via pública que serve o imóvel também pode ser levantada e apresentada na planta.

Evidentemente que tal exigência de apuração da medida dos confrontantes somente se justifica em circunstâncias excepcionais, não se aplicando, por razões óbvias, aos imóveis rurais. Mas nos casos de divisas instáveis ou que registrem expansão superior a 5% (cinco por cento), tal exigência se justifica, posto que a questão de retificação atua sobre a titularidade patrimonial, de forma que a ciência ou anuência dos confrontantes deve vir cercada dos melhores esclarecimentos possíveis.

A planta topográfica, portanto, deve indicar em todos os casos: (a) a localização do imóvel; (b) as medidas do imóvel retificando, reais e tabulares; (c) seus ângulos internos, mormente no caso de imóveis urbanos, e; (d) sua distância do ponto de referência mais próximo (ex: ponto de intersecção de cruzamento de vias); (e) medidas tabulares e reais dos confrontantes, quando necessário.

O “memorial descritivo” deve respeitar e manter todas as informações tabulares não envolvidas na retificação, procedendo a uma descrição objetiva e direta do imóvel. Destarte, o “memorial” deve em primeiro lugar fornecer a localização, depois a perimetria, considerando o ponto “1” como o ponto mais próximo do ponto de “referência” e o ponto “2”, com o segundo ponto da face frontal do imóvel. Todos os ângulos internos devem ser apresentados, assim, como a área de superfície.

A anuência dos confrontantes deve ser dada diretamente na PLANTA, com a reserva de espaço adequado para tanto, contendo a exata qualificação do subscritor e a localização e assento registral de seu imóvel.

Nos termos do § 10°, deve ser entendido como confrontante, além dos proprietários, também os “ocupantes”. Assim, para se cumprir os desígnios legais, devem concordar com o pedido de retificação, além dos proprietários, também os ocupantes diretos, desde que não estejam na posse por mera detenção, ou escudados em autorização, permissão ou em razão de contrato firmado como o titular do domínio. Nestes casos a anuência é dispensável.

É de se ter sempre presente que a retificação afeta o direito de propriedade de forma que apenas os atores envolvidos com este direito é que devem ser chamados ou consultados.

Também o Poder Público, titular do imóvel público que serve de acesso ao imóvel, pode subscrever a Planta, na medida em que também ostenta a condição de confrontante. Entretanto, para que tal medida não represente um pré-processo no âmbito da Prefeitura local, o interessado pode optar pela Notificação da Municipalidade.

TRAMITAÇÃO DA RETIFICAÇÃO CONSENSUAL

Não vindo o pedido de retificação consensual acompanhado da concordância de todos os confrontantes, poderá o interessado, nos termos das disposições transcritas, requerer ao Oficial de Registro que proceda à notificação destes, diretamente ou pelo correio, ou ainda, mediante a utilização dos serviços de Registro de Títulos e Documentos. Esta questão é tratada nos seguintes parágrafos:

§ 2o Se a planta não contiver a assinatura de algum confrontante, este será notificado pelo Oficial de Registro de Imóveis competente, a requerimento do interessado, para se manifestar em quinze dias, promovendo-se a notificação pessoalmente ou pelo correio, com aviso de recebimento, ou, ainda, por solicitação do Oficial de Registro de Imóveis, pelo Oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la.

§ 3o A notificação será dirigida ao endereço do confrontante constante do Registro de Imóveis, podendo ser dirigida ao próprio imóvel contíguo ou àquele fornecido pelo requerente; não sendo encontrado o confrontante ou estando em lugar incerto e não sabido, tal fato será certificado pelo oficial encarregado da diligência, promovendo-se a notificação do confrontante mediante edital, com o mesmo prazo fixado no § 2o, publicado por duas vezes em jornal local de grande circulação.

§ 4o Presumir-se-á a anuência do confrontante que deixar de apresentar impugnação no prazo da notificação.

O endereço para a postagem ou para o cumprimento da Notificação é o endereço constante do registro imobiliário ou no endereço do próprio imóvel.

Também o interessado poderá fornecer endereço para a notificação, sendo que em qualquer caso o confrontante deve ser cientificado pessoalmente.

Sendo declarado pelo oficial encarregado da diligência que o confrontante proprietário, se encontra em lugar incerto e não sabido, a notificação deve ser feita por edital, que deve ser publicado por duas vezes em jornal local de grande circulação.

O “ocupante” não precisa ser citado por edital, pois a postagem de notificação para o seu endereço, independentemente de quem venha a subscrever o aviso de recebimento, cumpre a exigência legal.

Em todos os casos, será conferido o prazo de 15 dias para a impugnação do confrontante, sendo conferida à Municipalidade o prazo em quádruplo aplicando-se analogicamente o art. 188 do Código de Processo Civil.

A ausência de impugnação ou a impugnação despida de fundamentação gera presunção de anuência com o pedido e permite a conclusão da retificação.

§ 5o Findo o prazo sem impugnação, o oficial averbará a retificação requerida; se houver impugnação fundamentada por parte de algum confrontante, o oficial intimará o requerente e o profissional que houver assinado a planta e o memorial a fim de que, no prazo de cinco dias, se manifestem sobre a impugnação.

Existindo impugnação de um ou de alguns confrontantes o interessado será intimado para em 5 (cinco) dias se manifestar. Também o profissional que subscrever a planta deve apresentar explicações ou esclarecimentos.

Ocorrendo impugnação, o processo somente pode ser solucionado junto ao Registro Imobiliário se houver acordo com a desistência da impugnação ou aditamento do pedido vestibular.

§ 6o Havendo impugnação e se as partes não tiverem formalizado transação amigável para solucioná-la, o oficial remeterá o processo ao juiz competente, que decidirá de plano ou após instrução sumária, salvo se a controvérsia versar sobre o direito de propriedade de alguma das partes, hipótese em que remeterá o interessado para as vias ordinárias.

Não se materializando o acordo ou consenso entre as partes, o processo deve ser remetido ao “juiz competente”, que no caso é o corregedor-permanente, que processará o pedido como retificação judicial.

Formado o litígio em relação a uma das divisas do imóvel, este procedimento, mesmo de cunho contencioso, se desenrolará como procedimento administrativo, de forma que não implica na necessidade do patrocínio por advogado ou o cumprimento das formas do processo civil.

Não se pode perder de vista que procedimento administrativo é aquele voltado a resolver questões ligadas a um ato administrativo, que no caso é o ato de registro, e a existência de interesses conflitantes não inibe ou obsta tal processamento, pois estará à disposição das partes o questionamento judicial da decisão prolatada, pois entre nós vige o princípio da supremacia da jurisdição.

A decisão administrativa não se revestirá de definitividade, mas será apta a resolver o conflito de interesses. A decisão administrativa, peculiarmente, se pauta pela “melhor aparência” ao passo que a decisão judicial, dado o seu caráter perene, somente pode trilhar por critérios de “certeza”.

A segurança jurídica que o sistema normativo deve cumprir, não pode ser entendida como algo que pereniza e torna imutáveis os direitos. Tal qual um prédio de edifício, a construção jurídica deve admitir oscilações, para que não venha a ruir ao primeiro vento.

Como sublinhado, os procedimentos administrativos têm como foco primeiro o exame de um ato administrativo, não sendo exigida como condição insuperável a unilateralidade do procedimento, mormente quando o ato em questão, venha a envolver mais de um interessado. Da forma como dispõe o art. 204 da Lei de Registros Públicos, a “retificação judicial” não inibe o aforamento de demanda judicial propriamente dita.

Contudo, não propiciará a remessa para o juiz censor correspondente quando a discussão levantada na impugnação venha a versar sobre o direito de propriedade.

É certo que toda a discussão travada nas demandas retificatórias envolvem direito de propriedade, ou a extensão territorial deste direito. Nesta conformidade, quando a parte final do § 6° remete a discussão para as vias ordinárias, e o faz por exceção, está considerando os casos em que a discussão não se restringe a uma disputa de divisas, mas que envolvam a idéia de sobreposição. Portanto o discrímen neste caso é de natureza quantitativo.

APURAÇÃO DE REMANESCENTE

Atendendo aos mesmos pressupostos e a mesma forma da retificação consensual, pode o interessado proceder a “apuração de remanescente”. Cuida-se de procedimento necessário para a exata determinação tabular de imóvel remanescente de matrícula ou transcrição desfalcada por alienações. Nestes casos a planta deve considerar todos os imóveis destacados da área maior, ou apresentar a localização do imóvel em apuração, destacado em planta aerofotogramétrica.

RETIFICAÇÃO JUDICIAL

 A retificação judicial pode ser facultativa, quando deflagrada a requerimento do interessado, e pode ser postulada a qualquer momento do processamento da retificação de ofício ou da iniciada a requerimento, assim como durante a tramitação da retificação consensual. Portanto, basta o requerimento do interessado.

A retificação judicial será obrigatória nos casos em que ocorrer impugnação fundamentada, que não envolva direito de propriedade (sobreposição).

Em todos os casos o processamento deve ser célere, com o julgamento de plano após a remessa, ou mediante instrução sumária. O Ministério Público, em que pese o teor do art. 296 da Lei de Registros Públicos, não mais participa desta ação, salvo quando o seu deslinde envolver direitos difusos, coletivos ou individuais indisponíveis.

Da decisão administrativa proferida na ação de retificação judicial pode ser atacada por recurso de apelação, dotado de duplo efeito, dirigido à Corregedoria-Geral da Justiça. Durante o processamento não há a possibilidade de interposição de agravo de instrumento, reservado unicamente para a discussão nulidade de registro (art. 214).



[i]* Venicio Antonio de Paula Salles é juiz de direito da Primeira Vara de Registros Públicos da Capital de São Paulo



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