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Ponto crítico 3/5 - SFI – novas (e velhas) questões - Alexandre Assolini Mota [i]*, Daniela Ferreira Sugano Maximiano [ii]**, Paulo Sérgio de Moura [iii]***


Ementa: Sistema de Financiamento Imobiliário; Entidades Autorizadas a Operar no SFI; Securitização de Créditos Imobiliários; Definição de “Crédito Imobiliário”; Originadores de Créditos Imobiliários; Cedentes de crédito imobiliário; Alienação Fiduciária de Imóveis em Construção.

A Assessoria Legal da CIBRASEC - Companhia Brasileira de Securitização é consultada sobre diversas questões envolvendo o Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), a Securitização de Créditos Imobiliários, a existência de vedação a participação de determinados agentes nas operações de securitização, notadamente em relação à figura do cedente de créditos imobiliários.

Ressaltamos que não abordaremos questões relativas a co-obrigação dos cedentes de crédito, haja vista que a operação estruturada originária deste parecer, não contempla esta modalidade de garantia.

Evidentemente a Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997 (Lei do SFI), trouxe inúmeras inovações ao nosso ordenamento jurídico, em destaque: a criação de um novo sistema de financiamento; uma nova forma de captação de recursos, e; uma nova modalidade de garantia, já consagrada no financiamento de bens móveis, pela sua eficiência na preservação de interesses dos respectivos credores.

Contudo, as inovações não pararam nestes institutos.

É o que veremos a seguir.

ENTIDADES E ORIGINADORES

O Art. 2º[[iv]1] da Lei do SFI realmente delimita quais as entidades autorizadas a operar no sistema, ficando o Conselho Monetário Nacional encarregado da autorização para ingresso de outras entidades.

Infelizmente, o comando legal em questão não é, por todos, interpretado de forma correta e concisa com outros dispositivos da própria lei.

Deste pressuposto, partimos da primeira questão objeto deste Parecer: definir qual a abrangência da autorização de operação no SFI.

Ressalta-se, como forma de contextualização, que um dos princípios do novel sistema encontra-se no Art. 1º[[v]2] da Lei, que define que o financiamento imobiliário em geral será promovido segundo condições compatíveis com a formação de seus fundos.

Frise-se também que a expressão “operar” não é sinônimo de “originar”, de sorte que operação comporta uma série de atividades, como captação e aplicação de recursos, ao passo que originar representa a constituição do crédito, seja mediante aplicação de recursos captados, seja mediante venda a prazo de ativos próprios.

Assim, a autorização para operar no SFI possibilita àquelas, e somente àquelas entidades, a concessão ordinária e habitual de financiamentos, segundo as diretrizes fixadas pela própria lei, como, v.g., reposição integral do valor emprestado, remuneração do capital às taxas convencionadas no contrato, capitalização de juros e existência de cobertura securitária[[vi]3].

Outra não poderia ser a conclusão, pois a concessão habitual de financiamentos a terceiros, com recursos provenientes de captação, no mercado financeiro e de valores mobiliários[[vii]4], é operação (operar) típica das instituições financeiras, que são autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil[[viii]5] [[ix]6].

Neste ponto, parece-nos que a questão é pacífica, dado que, efetivamente, todas as entidades autorizadas a operar no SFI são instituições financeiras e, por conseguinte, autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil.

No mesmo sentido, destaque-se que as Companhias Securitizadoras, criadas pela própria Lei do SFI, não estão autorizadas a operar no sistema.

É que lei define como objetivo destas companhias, a aquisição de créditos imobiliários (já constituídos) e a posterior vinculação destes a títulos que serão posteriormente negociados no mercado.

O termo “Crédito Imobiliário”, ainda passará, neste parecer, por uma análise detalhada, contudo, temos, desde já, como precipitada a concepção de que os créditos imobiliários objeto de aquisição pelas Companhias Securitizadoras, devam se referir, exclusivamente, a financiamentos concedidos por entidades operadoras do SFI.

Até mesmo porque somente em junho de 2002 foi realizada a primeira operação envolvendo créditos imobiliários originados por instituição autorizada a operar no SFI, representando aproximadamente 10% das emissões de Certificados de Recebíveis Imobiliários – CRI realizadas desde 1999.

Acreditar neste conceito restritivo é desconsiderar todo o trabalho conceituado da Comissão de Valores Mobiliários[[x]7], realizado neste mercado, dado que 90% das emissões analisadas e registradas são lastreadas em créditos originados fora do SFI.

Ademais, é evidente que esse não foi o objetivo do legislador: primeiramente por definir que a Companhia Securitizadora adquirirá créditos, sem nenhuma preocupação em definir um conceito do que venha a ser o “crédito imobiliário”; segundo, por não fazer qualquer distinção em qual sistema estes créditos deveriam ser originados para que pudessem ser objeto de securitização.

Por certo, desta afirmação podemos concluir que as Companhias Securitizadoras poderão adquirir créditos, razoavelmente considerados como imobiliários, decorrentes, dentre outros: a) do SFI; b) do Sistema Financeiro da Habitação (SFH); c) da Carteira Hipotecária, e; d) de Financiamento Direto.

Há que se ressaltar que a própria Lei do SFI expressamente refere-se a operações realizadas fora de seu âmbito.

Destacamos, a título de exemplo, o Financiamento Direto. Observe-se:

“Art. 5º

(...)

§2º As operações de comercialização de imóveis, com pagamento parcelado, de arrendamento mercantil e de financiamento imobiliário em geral, poderão ser pactuadas nas mesmas condições permitidas para as entidades autorizadas a operar no SFI.” (grifos nosso)

Com este dispositivo, a Lei do SFI buscou agregar mais uma força motriz ao sistema, de forma que os proprietários de imóveis e as sociedades de arrendamento mercantil pudessem utilizar as mesmas condições daquelas entidades.[[xi]8]

Com efeito, poderão ser originadores de créditos imobiliários, nas mesmas condições estabelecidas no SFI, além das sociedades de arrendamento mercantil, pessoas físicas e jurídicas, como, v.g., incorporadoras, loteadores e até mesmo Companhias de Saneamento, obedecendo a um único requisito: O financiamento deverá ser feito para negociação de seus próprios imóveis.

Assim, o que diferencia o Financiamento Direto do Financiamento no SFI é o objeto do originador: enquanto no Financiamento Direito o originador busca facilitar a negociação de seus próprios imóveis, no financiamento propriamente dito o originador realiza o financiamento de imóveis de terceiros.

Neste sentido, merece destaque a intenção evidente do legislador brasileiro com o instituto do Financiamento Direito, qual seja, possibilitar uma forma alternativa de originação de créditos imobiliários passíveis de securitização.

Qual seria o motivo de tamanha equiparação, não fosse o incremento da oferta no mercado secundário de créditos imobiliários, onde a demanda, espera-se, seja integralmente realizada pelas Companhias Securitizadoras.

Este também é o entendimento de Melhim Namem Chalhub[[xii]9], vejamos:

“Com efeito, não poderia ser de outra forma, pois o funcionamento de um mercado secundário de créditos imobiliários se faz, necessariamente, mediante uma dinâmica pela qual créditos imobiliários, em geral, gerados por qualquer pessoa física ou jurídica, que produza ou comercialize imóveis, possam circular no mercado.” (grifamos)

E complementa:

“Visa a lei, assim, que o mercado ajuste suas linhas de operação, de forma a viabilizar a constituição de créditos homogêneos, e por isso suscetíveis de circular com mais facilidade, sem obstáculos no mercado, ensejando a captação de recursos em larga escala para esse setor da produção.” [[xiii]10]

Ainda que se ressaltar que o Financiamento Direto está em total sintonia com os objetivos do SFI, pois se trata de peça fundamental para o fortalecimento de um círculo virtuoso de concessão de novos financiamentos, alcançando os três objetivos fundamentais da Lei do SFI: “geração de renda e empregos, ampliação do acesso da população à moradia e promoção do crescimento sustentado da economia” [[xiv]11].

Mas não é só.

Evidente que estes originadores não estão autorizados a operar no SFI, mas evidente também, por conseqüência, que nenhuma vedação há à originação e cessão de seus créditos imobiliários a Companhias Securitizadoras.

É por esta razão, ou seja, por nada em contrário dispor a Lei do SFI, que a cessão de crédito imobiliário, rege-se, como cediço, pela Legislação Civil[[xv]12].

Caso o entendimento não fosse o acima exposto, nosso legislador teria reservado a emissão de Cédulas de Crédito Imobiliário - CCIs, criadas pela Medida Provisória nº 2.223, de 04 de setembro de 2001, às entidades autorizadas a operar no SFI, dado que se trata de instrumento célere de cessão de créditos imobiliários, especialmente criado para incremento das operações de securitização.

Como bem se depreende do § 1º do Art. 7º[[xvi]13], as CCIs serão emitidas pelo credor do crédito imobiliário, sem qualquer restrição naquele sentido.

E que nem se fale, que as CCIs, em conseqüência, não poderiam ser objeto de securitização pois o Art. 12[[xvii]14] da Medida Provisória 2223/01 é expresso neste sentido.

Em face de tais considerações, forçoso concluir que a originação de créditos imobiliários passíveis de securitização não é reservada às entidades autorizadas a operar no SFI.

Cumpre agora discorrer sobre definição de “Crédito Imobiliário”.

É o que se passa a fazer:

CRÉDITO IMOBILIÁRIO

A Lei do SFI estabelece que o CRI será lastreado em créditos imobiliários[[xviii]15] e que  “a securitização de créditos imobiliários é a operação pela qual tais créditos são expressamente vinculados à emissão de uma série de títulos” [[xix]16].

A partir deste dispositivo, verifica-se que o legislador brasileiro optou por utilizar o gênero “crédito imobiliário”, termo que comporta diversas espécies.

Obviamente não houve interesse numa definição numerus clausus das espécies, basicamente: a) pela experiência do SFH, que encontrava, na inflexibilidade da regulamentação, obstáculos para o satisfatório atendimento das necessidades de financiamento da população, e; b) pela possibilidade de exclusão de uma ou outra espécie apropriada ao instituto da securitização, o que certamente em nada contribuiria para consolidação do mercado.

Se, por um lado, conceituação expressa não houve; por outro, pode-se inferir, com precisão, do próprio texto da Lei do SFI, sem prejuízo de outras, as seguintes espécies de crédito imobiliário, aqueles decorrentes de:

a) financiamento imobiliário em geral[[xx]17];

b) comercialização de imóveis[[xxi]18] [[xxii]19] [[xxiii]20] [[xxiv]21];

c) arrendamento mercantil de imóveis[[xxv]22] [[xxvi]23] [[xxvii]24];

d) mútuo com garantia real imobiliária[[xxviii]25];

Neste mesmo sentido, há que se citar também o Art. 15 da Medida Provisória nº 2223/01 que ao definir questões relativas a indexação de contratos e títulos, define, também de forma clara, as seguintes espécies de crédito imobiliário:

“Art. 15. Nos contratos de comercialização de imóveis, de financiamento imobiliário em geral e nos de arrendamento mercantil de imóveis, bem como nos títulos e valores mobiliários por eles originados, com prazo mínimo de trinta e seis meses, é admitida estipulação de cláusula de reajuste, com periodicidade mensal, por índices de preços setoriais ou gerais ou pelo índice de remuneração básica dos depósitos de poupança.” (grifamos e destacamos)

Como se viu, é transparente que, a partir de setembro de 2001, os CRIs emitidos pelas Companhias Securitizadoras poderão, em razão das disposições do supracitado artigo, ser indexados por índices de preços setoriais e gerais, desde que emitidos com prazo superior a 36 (trinta e seis) meses.

Ressalte-se que a indexação era uma das mais importantes questões envolvendo o incremento das operações de securitização de créditos imobiliários, dado que os índices de preço compõem as metas atuariais das entidades de previdência complementar, consideradas como principais investidoras de CRIs.

Desta forma, dada a inexistência de definição legal, outras espécies poderão ser definidas, observados somente determinados critérios de razoabilidade.

Feitas estas ponderações acerca da definição de crédito imobiliário, resta-nos apenas apreciar, então, a possibilidade de alienação fiduciária de imóveis em construção.

É do que se passa a cuidar.

ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE IMÓVEIS EM CONSTRUÇÃO

De antemão, ressalva-se que mesmo integrantes de uma mesma Lei, SFI e Alienação Fiduciária são institutos autônomos e independentes, sendo tratados inclusive em capítulos distintos.

Com isto, tem-se que as motivações legislativas para uma ou outra questão também deve ser extraídas de forma autônoma e independente.

Pois bem.

Originariamente, tal como publicada, a Lei 9.514/97, assim dispunha em seu artigo 22:

“Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Parágrafo único.  A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, podendo ter como objeto imóvel concluído ou em construção, não sendo privativa das entidades que operam no SFI.” (Grifamos)

E, de fato, a nova redação dada à Lei pela Medida Provisória nº 2.223, de 4 de setembro de 2001, revogou o referido parágrafo único, ao acrescentar ao Artigo 22 dois novos parágrafos, quais sejam:

“§ 1o A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI.(NR)

§ 2o A alienação fiduciária poderá ter como objeto bens enfitêuticos, sendo também exigível o pagamento do laudêmio se houver a consolidação do domínio útil no fiduciário.(NR)”

Mas que nem se diga que a intenção do legislador deve agora ser interpretada de forma restritiva, de forma a excluir os imóveis em construção da possibilidade de que sejam objeto de alienação fiduciária!

É evidente que não foi esta a intenção do legislador quando revogou o parágrafo único do artigo 22.

Muito pelo contrário.

É que quis o legislador federal, ao revogar o parágrafo único - conseqüentemente suprimindo do texto da Lei a expressão “imóvel concluído ou em construção” -, evitar exatamente tal interpretação errônea, qual seja, a interpretação restritiva.

No mesmo sentido se posicionava a doutrina antes da revogação do parágrafo único do Art. 22, verbis

“Estando definido no caput que o objeto da alienação é a propriedade resolúvel de coisa imóvel, não há qualquer dúvida de que está a lei se referindo a terreno e acessões, por que bem imóvel é constituído pelo solo e por tudo aquilo que nele se incorporar permanentemente, sendo tecnicamente incorreta a particularização contida no parágrafo único. Assim, a particularização contida no parágrafo único do Art.22 seria perfeitamente dispensável.”[[xxix]26] (grifamos)

Verdade que, tal como se apresentava aquela redação, forçoso admitir que possível seria a interpretação de que imóveis não construídos, como terrenos urbanos, por exemplo, não pudessem ser objeto de alienação fiduciária.

Neste sentido, Mario Pazutti Mezzari [[xxx]27] destaca:

“A redação do parágrafo único do art. 22 (...) estabelece verdadeiro impasse ao intérprete da lei.

(...)

Já ouvi dizer que, literalmente interpretada a lei, imóvel que não tenha cessões, prontas ou em construção, não poderá ser objeto de alienação fiduciária em garantia”

E complementa:

“Ora rasgue-se toda a argumentação daqueles que querem ver nesta nova lei um farol apontando para a diminuição do déficit de prédios, habitacionais ou não, que assola nossa país. Se não se pode financiar a construção neste novo sistema, pelo simples fato de que a garantia não pode recair sobre terreno inedificado, rústico ou urbano, então a nova legislação perde largamente sua utilidade e seu longínquo mas saudado cunho social, que é o de combater o déficit de edificações no Brasil.” [[xxxi]28]

Mas verdade também que foi justamente para que o instituto da alienação fiduciária pudesse ser empregado de forma mais abrangente, atingindo desta forma os fins a que se propunha, como nova modalidade de garantia que é, que tal parágrafo único foi revogado. Ou em outras palavras: o antigo parágrafo único foi revogado exatamente para que não houvesse possibilidade de que o instituto da alienação fiduciária fosse interpretado de forma restritiva.

Mas não é só.

Verdade ainda que qualquer interpretação restritiva quanto ao instituto da alienação fiduciária, em razão da supressão do antigo parágrafo único, revela-se não só inadequada como completamente errônea.

É que, uma vez admitida a interpretação restritiva, tal raciocínio tosco levar-nos-ia, por analogia, a aceitar ainda que não é possível a alienação fiduciária de imóvel concluído uma vez que também a expressão “imóvel concluído” foi revogada pelo advento da Medida Provisória nº 2.223, de 4 de setembro de 2001!

É evidente que tal não ocorreu.

Desta forma, face ao que se expôs, é raciocínio errôneo a interpretação restritiva do instituto, uma vez que, como bem se demonstrou, foi exatamente para que não se dessem margens a interpretações restritivas do instituto que o Legislador Federal revogou o parágrafo único do art. 22 da Lei 9.514/97.

CONCLUSÃO

Face ao que se procurou demonstrar, algumas conclusões podem ser inferidas:

Os Créditos destinados à Securitização não são restritos àqueles originados por entidades autorizadas a operar no SFI

Verdade, portanto, que estão autorizadas a operar no SFI somente as pessoas de que trata o artigo 2º da Lei do SFI.

Entretanto, não há que se identificar a autorização do Originador para operar no SFI como requisito para que os créditos por ele originados sejam passíveis de cessão às companhias securitizadoras porque não há nenhuma previsão legal contrária à securitização de créditos originados fora do âmbito do SFI.

Ademais, a construção legislativa nos leva a esta interpretação.

Desta forma, em se tratando de créditos imobiliários, são passíveis de securitização, os créditos decorrentes, dentre outros: a) do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI); b) do Sistema Financeiro da Habitação (SFH); c) da Carteira Hipotecária, e; d) de Financiamento Direto.

“Crédito Imobiliário”, por ausência de definição legal, deve ser interpretado de forma extensiva

Como se evidenciou, o legislador da Lei do SFI utilizou-se de expressão que é gênero e como tal, pode abranger diversas espécies de créditos e o fez, intencionalmente, exatamente porque interesse não havia numa definição taxativa das espécies de crédito que poderiam ser objeto de securitização.

Ao agir de tal forma, quis o legislador evitar que obstáculos fossem criados ao SFI, então criado, e à alavancagem do respectivo Mercado.

É desta forma que se verifica, do próprio texto da lei, diversas alusões à securitização de créditos imobiliários originada fora do âmbito do SFI, como os decorrentes de financiamento imobiliário em geral, comercialização de imóveis, arrendamento mercantil de imóveis, mútuo com garantia real imobiliária, dentre outros.

Face ao que se expôs, deve a expressão “crédito imobiliário” ser interpretada de forma extensiva, observado evidentemente o princípio da razoabilidade.

Imóveis não construídos e imóveis em construção podem ser objeto de Alienação Fiduciária

Como se demonstrou, a revogação da expressão “imóvel concluído ou em construção” do antigo parágrafo único do artigo 22 deu-se exatamente porque quis o legislador federal evitar que o instituto da alienação fiduciária fosse interpretado de forma restritiva.

Tal interpretação restritiva, defendida por alguns autores antes da modificação, é inadequada e incompatível com as finalidades a que se propôs o legislador com a instituição da nova modalidade de garantia sobre bem imóvel.

Sendo assim, é certo que a alienação fiduciária pode incidir sobre imóveis construídos ou não, mas também pode a garantia recair sobre terreno não edificado, rústico ou urbano, e isto por que nos termos o Código Civil caracteriza como bens imóveis o solo e tudo que nele se incorporar permanentemente (terreno e acessões).

Essa é a nossa opinião.

São Paulo, 03 de setembro de 2002



[i]* Alexandre Assolini Mota, advogado e Gerente Jurídico da CIBRASEC, membro efetivo do Conselho Científico do Irib.

[ii]** Daniela Ferreira Sugano Maximiano, Advogada

[iii]*** Paulo Sérgio de Moura, Assistente Jurídico

[iv][1] "Art. 2º Poderão operar no SFI as caixas econômicas, os bancos comerciais, os bancos de investimento, os bancos com carteira de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimo, as companhias hipotecárias e, a critério do Conselho Monetário Nacional - CMN, outras entidades."

[v][2] "Art. 1º O Sistema de Financiamento Imobiliário - SFI tem por finalidade promover o financiamento imobiliário em geral, segundo condições compatíveis com as da formação dos fundos respectivos." (grifamos)

[vi][3]  "Art. 5º As operações de financiamento imobiliário em geral, no âmbito do SFI, serão livremente pactuadas pelas partes, observadas as seguintes condições essenciais:
I - reposição integral do valor emprestado e respectivo reajuste;
II - remuneração do capital emprestado às taxas convencionadas no contrato;
III - capitalização dos juros;
IV - contratação, pelos tomadores de financiamento, de seguros contra os riscos de morte e invalidez permanente."

[vii][4] "Art. 4º (...) Parágrafo único. Nas operações de que trata este artigo, poderão ser empregados recursos provenientes da captação nos mercados financeiro e de valores mobiliários, de acordo com a legislação pertinente."

[viii][5] Lei nº 4595, de 31 dezembro de 1964 - "Art. 17 Consideram-se instituições financeiras, para efeitos da legislação em vigor, as pessoas jurídicas públicas ou privadas, que tenham como atividade principal ou acessória a coleta, intermediação ou aplicação de recursos financeiros próprios ou de terceiros, em moeda nacional ou estrangeira, e a custodia de valor de propriedade de terceiros." (grifamos)

[ix][6] Lei nº 4595, de 31 dezembro de 1964 - "Art.18 As instituições financeira somente poderão funcionar no País mediante prévia autorização do Banco Central do Brasil ou decreto do Poder Executivo, quando forem estrangeiras."

[x][7] A Comissão de Valores Mobiliários foi, pela Medida Provisória nº 8, de 31 de outubro de 2001, alçada a categoria de entidade autárquica em regime especial (Agência Reguladora do Mercado de Capitais).

[xi][8] A Emenda nº 25, do Deputado Luiz Roberto Ponte, que foi acolhida pelo autor do Substitutivo que deu origem à lei, Deputado José Chaves, contava com a seguinte justificativa para inclusão do § 2º no Art. 5º da Lei: "A emenda vem suprir importante lacuna no projeto. Com efeito, para que o mercado imobiliário possa gerar créditos passíveis de serem adquiridos pelas instituições financeiras autorizadas a operar no SFI, é essencial que as condições dessas operações sejam aquelas aplicáveis a mencionadas instituições, pois caso contrário, esses créditos não seriam transferíveis para elas e não seriam assimiláveis pelo mercado secundário, por via da securitização.(....)"

[xii][9] In Negócio Fiduciário - Editora Renovar - Rio de Janeiro - 1998, pág. 203.

[xiii][10] Idem. Ibidem. Pág. 203

[xiv][11] Exposição de Motivos da Lei da SFI.

[xv][12] Código Civil Brasileiro "Art.1.065 - O credor pode ceder o seu crédito, se a isso não se opuser a natureza da obrigação, a lei, ou a convenção com o devedor. 
Art.1.066 - Salvo disposição em contrário, na cessão de um crédito se abrangem todos os seus acessórios.
Art.1.067 - Não vale, em relação a terceiros, a transmissão de um crédito, se se não celebrar mediante instrumento público, ou instrumento particular revestido das solenidades do art. 135 (art. 1.068).
Parágrafo único - O cessionário de crédito hipotecário tem, como o sub- rogado, o direito de fazer inscrever a seção à margem da inscrição principal.
Art.1.068 - A disposição do artigo antecedente, parte primeira, não se aplica à transferência de créditos, operada por lei ou sentença.
Art.1.069 - A cessão de crédito não vale em relação ao devedor, senão quando a este notificada; mas por notificado se tem o devedor que, em escrito público ou particular, se declarou ciente da cessão feita.
Art.1.070 - Ocorrendo várias cessões do mesmo crédito, prevalece a que se completar com a tradição do título do crédito cedido.
Art.1.071 - Fica desobrigado o devedor que, antes de ter conhecimento da cessão, paga ao credor primitivo, ou que, no caso de mais de uma cessão notificada, paga ao cessionário, que lhe apresenta, com o título da cessão, o da obrigação cedida.
Art.1.072 - O devedor pode opor tanto ao cessionário como ao cedente as exceções que lhe competirem no momento em que tiver conhecimento da cessão; mas, não pode opor ao cessionário de boa-fé a simulação do cedente.
Art.1.073 - Na cessão por título oneroso, o cedente, ainda que se não responsabilize, fica responsável ao cessionário pela existência do crédito ao tempo em que lho cedeu. A mesma responsabilidade lhe cabe nas cessões por título gratuito, se tiver procedido de má-fé.
Art.1.074 - Salvo estipulação em contrário, o cedente não responde pela solvência do devedor.
Art.1.075 - O cedente, responsável ao cessionário pela solvência do devedor, não responde por mais do que daquele recebeu, com os respectivos juros; mas tem de ressarcir-lhe as despesas da cessão e as que o cessionário houver feito com a cobrança.
Art.1.076 - Quando a transferência do crédito se opera por força de lei, o credor originário não responde pela realidade da dívida, nem pela solvência do devedor.
Art.1.077 - O crédito, uma vez penhorado, não pode mais ser transferido pelo credor que tiver conhecimento da penhora; mas o devedor que o pagar, não tendo notificação dela, fica exonerado, subsistindo somente contra o credor os direitos de terceiro.
Art.1.078 - As disposições deste título aplicam-se à cessão de outros direitos para os quais não haja modo especial de transferência."

[xvi][13] "Art. 7º (...)  § 1o A CCI será emitida pelo credor do crédito imobiliário e poderá ser integral, quando representar a totalidade do crédito, ou fracionária, quando representar parte dele, não podendo a soma das CCI fracionárias emitidas em relação a cada crédito exceder o valor total do crédito que elas representam." (grifamos)

[xvii][14] "Art. 12. A CCI, objeto de securitização nos termos da Lei no 9.514, de 20 de novembro de 1997, será identificada no respectivo Termo de Securitização de Créditos, mediante indicação do seu valor, número, série e instituição custodiante, dispensada a enunciação das informações já constantes da Cédula ou do seu registro na instituição custodiante. 
Parágrafo único. O regime fiduciário de que trata a Seção VI da Lei no 9.514, de 1997, no caso de emissão de Certificados de Recebíveis Imobiliários lastreados em créditos representados por CCI, será registrado na instituição custodiante, mencionando o patrimônio separado a que estão afetadas, não se aplicando o disposto no parágrafo único do art. 10 da mencionada Lei." (grifamos)

[xviii][15] "Art. 6º O Certificado de Recebíveis Imobiliários - CRI é título de crédito nominativo, de livre negociação, lastreado em créditos imobiliários e constitui promessa de pagamento em dinheiro." (grifamos)

[xix][16] Art. 8º da Lei do SFI.

[xx][17] Idem nota 2.

[xxi][18] Art. 5º (...) "§2º As operações de comercialização de imóveis, com pagamento parcelado, de arrendamento mercantil e de financiamento imobiliário em geral, poderão ser pactuadas nas mesmas condições permitidas para as entidades autorizadas a operar no SFI."

[xxii][19] Art. 8º (...) "Parágrafo único. Será permitida a securitização de créditos oriundos da alienação de unidades em edificação sob regime de incorporação nos moldes da Lei nº 4.591, de 16 de dezembro de 1964."

[xxiii][20] "Art. 36. Nos contratos de venda de imóveis a prazo, inclusive alienação fiduciária, de arrendamento mercantil de imóveis, de financiamento imobiliário em geral e nos títulos de que tratam os arts. 6º, 7º e 8º, admitir-se-á, respeitada a legislação pertinente, a estipulação de cláusula de reajuste e das condições e critérios de sua aplicação."

[xxiv][21]  "Art. 38. Os contratos de compra e venda com financiamento e alienação fiduciária, de mútuo com alienação fiduciária, de arrendamento mercantil, de cessão de crédito com garantia real e, bem assim, quaisquer outros atos e contratos resultantes da aplicação desta Lei, mesmo aqueles constitutivos ou translativos de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por instrumento particular, a eles se atribuindo o caráter de escritura pública, para todos os fins de direito, não se lhes aplicando a norma do art. 134, II, do Código Civil."

[xxv][22] Idem nota 18.

[xxvi][23] Idem nota 20.

[xxvii][24] Idem nota 21.

[xxviii][25] Idem nota 21.

[xxix][26] Ob. Cit. Pág. 206.

[xxx][27] in Alienação Fiduciária da Lei n. 9.514, de 20-11-1997, Pág.29

[xxxi][28] Idem, Ibidem. Pág 29.



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