BE1169
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Alguns comentários sobre o sistema registral brasileiro. (Baseados no trabalho do colega e amigo Sergio Jacomino) Elias Mohor Albornoz[i]*
Como introdução, devo afirmar que visualizo diversas congruências conceituais e práticas entre os Sistemas Registrais Brasileiro e Chileno, especialmente dentro de uma perspectiva do regime e estrutura institucional.
Assim, por exemplo, temos características similares conformes em nossos sistemas, tais como autogestão, independência econômica e estabilidade de funcionalismo público, elementos que constituem a base da estabilidade de nossos cargos, independentemente dos mandatos de governo e dos vaivens políticos, que tanta descontinuidade representam a estes cargos.
Estas particularidades são as que fazem com que um Sistema possa oferecer clareza e transparência em suas atuações, com uma aplicação adequada na prática das linhas doutrinárias fundamentais, que são os Princípios do Direito Registral, que marcam o âmbito de ação dos agentes depositários de fé pública do Registro.
Não obstante o seu interessante trabalho, que me permitiu comentar, encontro, por um lado, sérias preocupações, por uma série de incongruências que afetam a integridade do Sistema e, por outro, modificações e ingerências no desenvolvimento da função registral, que atentam contra a sua eficácia e segurança, que lhe devem ser consubstanciais.
Com efeito, e tal como eu lhe comentava por ocasião do Encontro Ibero-Americano da Colômbia, tenho a sensação de que existe um notório grau de não uniformidade em seu Sistema, como você o afirmou em seu ótimo trabalho, quando realiza uma análise do que denomina “Idiossincrasias do registro predial brasileiro”, onde você expressa que, apesar do conjunto legal e normativo que disciplina ou regula a atividade registral brasileira, é possível visualizar um estado de desarticulação do sistema, que termina por prejudicar o pleno exercício da atividade, pondo obstáculos à certeza jurídica, à garantia e à tutela de interesses privados, por um processo de desmontagem sistemática de instituições jurídico-sociais, como ocorre com as atividades notariais e registrais, agravado com uma campanha pública no sentido de simplesmente extinguir tais atividades.
Você deixa, além disso, claramente demonstrado que se faz necessário que os serviços registrais possam, e eu creio que devem, se harmonizar de acordo com a adoção de um padrão de procedimento que seja adequado para todo o território nacional. É indubitável que isso conduz, inequivocamente, a que possamos contar com uma estrutura integrada que permitirá a implementação de todas as modernizações que sejam necessárias para uma adequação do sistema às exigências da globalização crescente e sua incidência em um tráfico imobiliário ágil.
Negar isso implica sérios riscos de coexistência de procedimentos registrais dispersos e não harmônicos, gerando uma perigosa anarquia sistemática, que produz insegurança e falta de estabilidade, assim como custos desnecessários.
De acordo com o que você menciona, e com o acréscimo da circunstância de que cada juiz, em cada comarca de seu país, pode expedir normas para o funcionamento do registro de imóveis, terminará agravando a funcionalidade das mencionadas instituições, atentando contra a sua imprescindível harmonia. Uma disciplina normativa eficiente e adequada, concordo com você, a qual deve estar a cargo de uma fonte estável e permanente, sem prejuízo de independência necessária e autonomia decisória que devem ser garantidas tanto para o registrador como para o notário, para um eficiente desempenho de suas funções.
Também em meu país se tentou, em diferentes épocas, ensaios similares, movidos por solicitações de simplificação de trâmites e celeridade mal entendida das gestões imobiliárias, com absoluto desconhecimento dos sólidos fundamentos, sustentadores da atividade registral, que possui elementos doutrinários que comprovaram devidamente sua vigência ao longo do tempo, em um marco institucional sério, certeiro, e que produz a segurança jurídica que se deve esperar de um Sistema Registral, fator determinante do desenvolvimento econômico e social de um país.
Afortunadamente, estas aventuras não prosperaram, devido, fundamentalmente, à clara convicção de que o Sistema é adequado e que as suas características básicas de independência, autogestão e estabilidade constituem a garantia mais relevante de eficiência e segurança para o resguardo dos direitos de todos os interessados.
Entretanto, se faz necessário implementar as novas tecnologias de crescente aplicação, como o documento e a assinatura eletrônica, a interconexão dos diferentes cartórios e a capacitação e aperfeiçoamento profissional dos agentes depositários da fé pública, encarregados de tarefas tão delicadas.
Neste sentido, temos grandes desafios a serem necessariamente abordados no prazo mais breve possível, visto o avanço e o crescimento do mercado imobiliário e a necessidade de acelerar a entrega da informação precisa aos negócios jurídicos que, cada dia, apresentam maiores exigências.
Estou convencido de que todas as imperfeições que podem ser detectadas na atualidade e que afetam nossos sistemas são plenamente passíveis de correção, mas é fundamental manter a sua integridade institucional que, no caso de nossos países, goza de destacadas características e de uma excelente concepção doutrinária, como já foi expressado, motivo pelo qual não devemos poupar esforços para empreender os desafios que nos são apresentados, cuidando de velar pela manutenção de sua estrutura básica, evitando uma desnecessária dispersão normativa que atente contra ela.
Nota do editor.
O trabalho a que se refere o autor pode ser consultado aqui. A relevância do diálogo transnacional é enfatizado pelo autor: tanto no Brasil, quanto no Chile (a exemplo do que ocorre em outros países da Europa, como a Espanha) o registro é uma atividade pública delegada ao exercício privado. Nesse sentido, os benefícios que os sistemas apresentam podem ser considerados como fator relevante no desenvolvimento do crédito imobiliário e das garantias e segurança no tráfico jurídico-imobiliário, o que não passa desapercebido pelos estudiosos do tema – especialmente os economistas e juristas com enfoque multidisciplinar.
[i]* Elías Mohor Albornoz é registrador (Conservador de Bienes Raíces) de Buin, Chile. Advogado (Universidad de Chile), graduado em directo notarial e registral, Vice-presidente da Corporación Chilena de Estudios de Derecho Registral. Diretor de relações internacionais dos Registradores do Chile. Diretor da Associação dos Notários e Registradores do Chile.
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