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O Direito de Empresa e o NCC - Graciano Pinheiro de Siqueira


“Atiçar dúvidas. Enquanto as temos, o espírito estará aberto para novas verdades”.
“Todo assunto possui argumentos contrários”.

Sociedade e empresa

Antes de entrar no assunto propriamente dito, que é, como se tem comentado, “a matéria da moda”, parece-me oportuno fazer algumas considerações preliminares sobre SOCIEDADE e EMPRESA, valendo-me, para tanto, dos ensinamentos do Prof. Darcy Arruda Miranda Jr., extraídos do seu Curso de Direito Comercial.

Aparentemente elas têm entre si uma intimidade, se assim podemos dizer, que pode levar um observador mais apressado a equipará-las. Na realidade, em ambas, a característica mais saliente é a atividade econômica. Levando-se em conta que muitos autores consideram a sociedade como uma forma de exercício coletivo da empresa, é de suma relevância estabelecer-se, desde logo, a existência ou não de possíveis diferenças entre elas.

Não há a menor dúvida de que a sociedade e a empresa normalmente coexistem, embora se deva admitir a possibilidade, mais teórica do que prática, de uma sociedade sem empresa, - uma sociedade constituída para a realização de um só ato, por exemplo – como pode acontecer nas chamadas sociedades acidentais (parágrafo único do art. 981 do Novo Código Civil - NCC), pois, ressalte-se, às sociedades constituídas para um único negócio não se pode atribuir a qualidade de empresária, dado que inexiste, no caso, uma empresa (Remo Franceschelli, Imprese e Imprenditori, 3a. edição, 1.964, Editora A. Giuffrè, Milão). Não se deve esquecer também do caso da sociedade que, constituída, permanece inerte, sem desenvolver objeto social.

É inquestionável que existem entre sociedade e empresa conexões muito próximas, a ponto de ser difícil conceber uma sociedade sem empresa. Entretanto, não se pode deixar de reconhecer que entre as mesmas haja diferenças nítidas.

Para o Prof. Darcy Arruda Miranda Jr., seguindo o entendimento de Franceschelli, a empresa não é sujeito nem objeto de direito. A sociedade, contudo, quando regularmente constituída e arquivada no registro peculiar, dá nascimento a uma pessoa jurídica.

Já para Fran Martins, a empresa é objeto de direito e não sujeito de direito.

Deve-se considerar, também, que a extinção da empresa não importa, pelo menos do ponto de vista legal, na liquidação da sociedade, dado que, enquanto não se pode falar em empresa destituída de atividade, é possível dizer-se tal relativamente à sociedade.

A sociedade é constituída para o exercício de uma atividade, contrariamente à empresa que é, justamente, o exercício de uma atividade.

Deve-se assinalar, outrossim, que as obrigações assumidas pelos sócios relativamente a terceiros, em decorrência do contrato social, prevalecem, ainda que a empresa não tenha sido constituída ou jamais venha a sê-lo, em conseqüência do não início das atividades sociais, ou, em outras palavras, os efeitos jurídicos decorrentes da constituição da sociedade não estão condicionados à criação ou não da empresa (Lorenzo Mossa, Trattato Del Nuovo Diritto Commerciale, 1.951, Editora Antonio Milani, Padova).

O certo é que, segundo o Prof. Nelson Abrão, “nos últimos anos surgiu no direito comercial a noção de empresa, a qual foi consagrada pelo Código Comercial Italiano de 1942. De alguns tempos para cá, se passou a encarar o aspecto objetivo da atividade empresarial, passando a perder importância o aspecto subjetivo, razão pela qual não só os doutrinadores, como os legisladores, entendem que muito mais que o aspecto contratual, o que se precisava salvaguardar era a organização empresarial, que é muito mais complexa, que transcende a figura de seu titular, porque compreende o complexo de interesses, de pessoas, dependentes, assalariados, o próprio fisco, fornecedores, clientes, compradores, etc.

A empresa é pois uma instituição complexa, mas no momento em que aquele que a criou, o empresário, a coloca em movimento, a sua figura fica relegada a um plano secundário”.

Daí a afirmação de Egberto Lacerda Teixeira, ao tratar da sobrevivência da sociedade com um único sócio, de que a empresa vive de uma vida a tal ponto autônoma e independente da dos indivíduos que a compõem.

Entre nós, sob o aspecto legislativo, a figura da empresa não é desconhecida, pois dispõe o artigo 2º da CLT que “considera-se empregador a EMPRESA, individual ou coletiva, que, assumindo os riscos da atividade econômica, admite, assalaria e dirige a prestação pessoal de serviços. Parágrafo primeiro: equipara-se ao empregador, para os efeitos exclusivos da relação de emprego, os profissionais liberais, as instituições de beneficência, as associações recreativas ou outras instituições sem fins lucrativos, que admitirem trabalhadores como empregados. Parágrafo segundo: sempre que uma ou mais EMPRESAS, tendo, embora, cada uma delas, personalidade jurídica própria, estiverem sob a direção, controle ou administração de outra, constituindo grupo industrial, comercial ou de qualquer outra atividade econômica, serão, para os efeitos da relação de emprego, solidariamente responsáveis a empresa principal e cada uma das subordinadas”.

Observe-se que o legislador trabalhista comete engano ao fazer a indicação de empresa individual ou coletiva, eis que o que existe, na realidade, é empresário individual ou coletivo (sociedade). Além do mais, a empresa , em si, não tem personalidade jurídica.

Mesmo assim, é importante tal referência, já que fica demonstrado que é o empresário (empregador) quem articula (organiza) os fatores de produção, dentre os quais o trabalho de outrem.

Concluindo, SOCIEDADE e EMPRESA não são expressões sinônimas, embora utilizadas , como tal, constantemente, na prática.

Sociedades simples e sociedade empresária

Pois bem. Feitas essas colocações, passemos, então, ao estudo do Direito de Empresa em face da nova legislação civil pátria.

Trata-se de um projeto, identificado como Projeto nº 634-B/75, que tramitou no Congresso Nacional por mais de 25 anos, resultando na Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Daí algumas críticas de que a mesma já tenha nascido velha, o que não é bem verdade, pois, se há nela pontos negativos, há, também, pontos positivos.

O NCC possui 2.046 artigos, dos quais 229 são dedicados ao Direito de Empresa.

No entanto, no entender do Ministro Francisco César Asfor Rocha, do STJ, em recente palestra proferida no IV Congresso de Notários e Registradores, realizado em Fortaleza/CE, no mês de novembro próximo passado, do qual participei, em que pese alguns elogios que fez ao novo texto legal e a necessidade de certas modificações em razão do tempo em que o Código Civil vigente foi elaborado (1916), talvez esteja sendo precipitada a entrada em vigor do NCC já neste mês de janeiro de 2003, eis que determinadas matérias foram tratadas com evidente retrocesso, sendo outras bastante polêmicas, como no caso do Livro II, que trata do Direito de Empresa. Haja vista o grande número de emendas propostas no curso do prazo da vacatio legis, especialmente no tocante ao direito societário, mais precisamente em relação à sociedade por quotas de responsabilidade limitada, onde as controvérsias que poderiam, eventualmente, existir sobre a matéria, já se acham devidamente pacificadas, conforme concluiu o eminente Ministro.

É importante destacar que, mesmo antes da entrada em vigor do NCC, várias são as propostas legislativas de reformá-lo encaminhadas ao Congresso Nacional, dentre as quais o PL nº 6.960/2002 (Fiuza 1), o PL nº 7.160/2002 (Fiuza 2), esta de autoria do CESA (Centro de Estudos das Sociedades de Advogados), e o PL nº 7.312/2002 (Fiuza 3), todas encaminhadas pelo deputado Ricardo Fiuza. Estas propostas visam elidir os aspectos controversos da nova legislação e diminuir sua complexidade.

Dentre as divergências surgidas em face da nova legislação, a primeira delas está , justamente, na data inicial de sua vigência: 10, 11 ou 12 de janeiro de 2.003.

A mim me parece que 11 de janeiro seja a data correta, conforme demonstrado no texto do Dr. Vladimir Aras, Promotor de Justiça do MP da Bahia, publicado no “site” Consultor Jurídico e no Boletim nº 10, ano I, do CDT-Centro de Estudos e Distribuição de Títulos e Documentos de São Paulo, fundamentado na Lei Complementar nº 95/98, art. 8º, parágrafos 1º e 2º, com a redação dada pela Lei Complementar nº 107/01.

Outra questão polêmica é a distinção entre sociedade simples e sociedade empresária, da qual tratarei na seqüência. Creio mesmo que, antes de nos preocuparmos com as inovações observadas nas sociedades por quotas de responsabilidade limitada, deveríamos procurar chegar, primeiramente, a esta diferenciação.

Mas, enquanto as emendas não forem aprovadas, temos que, com o NCC há, por assim dizer, uma unificação do Direito Privado (Civil e Comercial) em matéria de direito societário, eis que, ao tratar, no Livro II, do Direito de Empresa, o legislador decidiu por fazer com que o novo diploma civil reunisse a legislação completa aplicável a todos os tipos de sociedades, exceto para aquelas regidas por leis especiais, como é o caso das sociedades anônimas.

Com a teoria da empresa adotada pelo artigo 966 do NCC, busca-se tutelar o exercício de uma atividade econômica organizada, independentemente de sua qualidade comercial ou civil. Justifica-se a igualdade de tratamento, pela submissão a praticamente aos mesmos riscos e vicissitudes da vida empresarial

A teoria da empresa não se preocupa com o gênero da atividade econômica; o que importa para ela é o desenvolvimento da atividade econômica mediante a organização de capital, trabalho, tecnologia e matéria-prima, que resulta na criação e na circulação de riquezas.

Tenho dúvidas, entretanto, se o legislador pátrio entendeu o verdadeiro conteúdo da teoria da empresa, advinda do direito italiano. Falo isso depois de ter acompanhado, atentamente, ao longo dos anos, as emendas que foram inseridas no texto primitivo do Projeto nº 634-B/75. Este sim incorporava, com mais fidelidade, aquela teoria, tal como era o desejo do Prof. Silvio Marcondes, autor do texto original do citado Livro II do NCC. Tais emendas, da forma como foram introduzidas, levam à afirmação de muitos de que o que houve, na realidade, foi, apenas, a título de modernização, uma mudança de nomenclatura, ou seja, o que é sociedade civil passará a ser sociedade simples; o que é sociedade comercial, passará a ser sociedade empresária.

O próprio deputado Ricardo Fiuza, Relator Geral do NCC, ao comentar os vários artigos relativos ao Direito de Empresa no Novo Código Civil Comentado da Editora Saraiva, do qual foi o coordenador, parece conduzir-se para essa linha de raciocínio. Quando trata do artigo 982, p. ex., diz o parlamentar: “A norma deste art. 982 vem a instituir uma nova divisão entre as formas societárias até então definidas pelo direito privado brasileiro. Se adotarmos um paralelismo simétrico, a antiga sociedade comercial passou a ser denominada sociedade empresária, enquanto a sociedade civil, regulada pelo Código de 1.916, passou a ser definida como sociedade simples”.

Reforçam essa idéia, inclusive, o disposto nos artigos 5º, V, 983 e 2.037 do NCC, bem como nas várias regras que fazem referência ao órgão de registro público do empresário e da sociedade empresária (Registro Público de Empresas MERCANTIS), dentre as quais o artigo 1.150.

Até mesmo a discutível manutenção de tipos societários de rara utilização, como a sociedade em nome coletivo, a sociedade em comandita simples e a sociedade comandita por ações, serve como argumento de que, pelo menos aparentemente, nada mudou.

Observe-se que a sociedade de capital indústria foi abolida pela nova legislação, sendo certo que ela, ao lado da sociedade em conta de participação, esta ainda mantida, vinham sendo utilizadas, na prática, quase que exclusivamente, para provocar, respectivamente, fraudes a direitos trabalhistas e fraudes contra a economia popular. Vide, neste aspecto, a edição do Jornal “O Estado de São Paulo” do dia 18 de maio de 2002, caderno “Economia”, onde estão relacionadas 69 (sessenta e nove) sociedades em conta de participação que estão sendo processadas pelo Ministério Público, por envolvimento em fraudes na negociação de imóveis.

Estudando melhor o assunto, parece-me muito tímido falar que houve apenas uma mudança de nomenclatura, até porque o legislador teria perdido muito tempo por tão pouco. Na verdade, o que ocorreu, efetivamente, foi uma mudança conceitual.

Mas, ainda que se possa chegar à conclusão de que a mudança tenha sido meramente estético-legislativa, o certo é que o NCC, ao adotar a teoria da empresa, rompeu, definitivamente, com a antiga distinção entre sociedades civis e mercantis, que tinha por alicerce o critério material da prática de atos de comércio, onde o objeto social, em regra, era o fator decisivo para distingui-las.

Se assim é, parece estranho a manutenção do adjetivo MERCANTIS na denominação do órgão encarregado do registro do empresário e da sociedade empresária, retro referido, a cargo das Juntas COMERCIAIS, nomenclatura também estranhamente mantida.

A propósito, até mesmo o nome Registro Público de Empresas Mercantis é impróprio, já que não se registram as empresas, como entes independentes; registram-se os atos relativos aos empresários e às sociedades empresárias, das quais as empresas são a expressão econômica.

Com o NCC passam a coexistir duas naturezas de sociedades – a empresária e a simples, as quais terão seu campo de incidência, em tese, não mais vinculado à atividade econômica que ambas venham a praticar. Qualquer que seja ela, mais importante mesmo que o objeto social, será a estrutura ORGANIZADA de sua atividade econômica fator relevante para distinguir uma da outra.

ORGANIZADA, pois, é a palavra chave.

Além disso, é característica marcante na sociedade simples a atuação pessoal (individual) dos sócios, sobrepondo-se à organização dos fatores de produção.

Mas, ainda que paire dúvidas quanto ao limite que separa a sociedade simples da empresária, caberá, quiçá, à doutrina e à jurisprudência estabelecer outros critérios para diferenciar uma da outra, dentre os quais, v.g., o porte do capital social (teoria da relevância do capital social, divulgada por Romano Cristiano), a quantidade de sócios, de empregados, de gerentes, o tamanho do estabelecimento, etc...

Frise-se que tanto a sociedade empresária quanto a sociedade simples exercem atividade econômica, sendo ambas espécies do gênero SOCIEDADE.

Afirmar que a sociedade simples não pratica atividade econômica, e, conseqüentemente, que não visa lucro, seria contradizer as disposições dos artigos 981 e 982 do NCC, sendo certo que o legislador definiu, no art. 53, a ASSOCIAÇÃO como sendo a entidade que não tem fins econômicos. Lembre-se que o conceito de associação era, meramente, doutrinário.

A dificuldade maior está em que as décadas de discussões a respeito da separação entre sociedade civil e sociedade mercantil são substituídas por uma regra que trará novas perplexidades, a qual, de sua vez, reabrirá novo período de meditação para que as novas divergências sejam superadas.

E, já que o momento é de reflexão, será que a sociedade simples pura ou sociedade simples propriamente dita ou, ainda, sociedade simples “simples”, prevista nos artigos 997 a 1.038 do NCC, a quem o escritório Demarest & Almeida Advogados prefere chamar de sociedade simples tipo, não é a mesma (e raramente usada) sociedade civil pura, prevista no art. 1.363 e seguintes do atual Código Civil, revestida agora de uma nova roupagem?

É importante destacar, no entanto, que a sociedade simples não está restrita meramente ao campo das atividades ligadas à profissão intelectual, literária ou artística (parágrafo único do art. 966). Ao contrário, estende-se a qualquer ramo de atividade, desde que não se enquadre no contexto empresarial. Sua estrutura e sua organização passam, contudo, por estágios de complexidade cada vez maior, atingindo, a partir de certo ponto, o patamar em que predomina a empresarialidade, oportunidade em que deverá transformar sua natureza, de sociedade simples em sociedade empresária. Supera-se, ultrapassa-se, dessa forma, a sociedade simples, situada em estágio mais singelo e passa-se a acolher a figura da sociedade empresária, não porque pratique o comércio, nos moldes tradicionalmente aceitos, mas porque pratica a atividade empresarial, de contornos muito mais amplos. Deixa, assim, de ter relevo o objeto da sociedade; qualquer que seja ele, se a estrutura criada para o exercício das atividades que lhe sejam próprias assumir características empresariais, a instância administrativa de registro será o Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial). Caso contrário, mesmo que ela pratique o que, até então, se denomina ato de comércio, por não ter atingido o degrau da empresarialidade, será simples, registrando seus atos perante o Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Nessa evolução, podemos distinguir três etapas:

a) a do profissional autônomo, atuando isoladamente;

b) a do mesmo profissional, associado a outro ou outros profissionais em sociedade simples (registrável perante o Registro Civil das Pessoas Jurídicas), que não se organizem em caráter empresarial e que se limitem a reunir esforços para que possam melhor atender diretamente à clientela, sem que entre eles e os clientes se interponha a empresa, e sem que a sociedade, em si mesma, tenha, necessariamente, fim lucrativo, bastando-lhe remunerar o trabalho prestado, individualmente, pelos sócios. Portanto, a sociedade que desenvolver uma atividade pelos próprios sócios, de forma pessoal, praticando eles mesmos atos do objeto social e executando o núcleo de sua atuação, não será considerada empresária. Neste caso, tem-se a configuração de uma sociedade simples;

c) e, por último, a organização empresarial, cuja estrutura conduz ao registro no Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial).

Pelo exposto, temos que uma sociedade não será empresária, mas simples, quando a atuação pessoal dos sócios suplantar a organização dos fatores de produção. Na sociedade simples, o critério reside, em princípio, na predominância da atividade pessoal dos sócios. O exercício DIRETAMENTE pelos sócios dos atos singulares inseridos no âmbito da atividade econômica em razão da qual a pessoa jurídica foi constituída lhe imprime o caráter de sociedade simples. É o caso de dois médicos que se unem para clinicar. Enquanto desenvolvem sua profissão em consultório, mesmo com o auxílio de uma secretária, não se encontram abrangidos pelo conceito de empresário.

A sociedade simples é, em síntese, a sociedade não empresária, ou seja, aquela sociedade que explora atividade econômica de produção e circulação de bens e serviços SEM ALGUM DOS FATORES DE PRODUÇÃO (capital, mão de obra, insumos e tecnologia).

São as sociedades de fins econômicos em que a ESTRUTURA E MÉTODOS DE TRABALHO não prevalecem sobre a atuação pessoal dos sócios, segundo o ensinamentos de Fábio Ulhoa Coelho.

Já aquelas sociedades que se cercarem de uma estrutura organizacional, como médicos reunidos na direção de seu próprio hospital, contando com pronto-socorro, laboratório, radiologia e empregando outros médicos, enfermeiras, atendentes, etc., sua profissão constituirá fundo ou elemento de empresa, qualificando-se como sociedade empresária.

Ambos os exemplos nos são fornecidos pelo Prof. Fábio Ulhoa Coelho em seu Manual de Direito Comercial.

Ressalte-se que caberá aos interessados a opção por qualquer das duas formas associativas (sociedade simples ou sociedade empresária), não havendo razão para o Poder Público, representado pelas instituições incumbidas do registro público de uma ou de outra (Registro Civil das Pessoas Jurídicas ou Junta Comercial), criar qualquer obstáculo, discutindo o motivo ou os fundamentos de ordem econômica dessa opção. E a razão disso é óbvia: somente os interessados é que poderão avaliar se a atividade a ser desenvolvida pela sociedade da qual eles farão parte é suficientemente estruturada (organizada) para ser considerada empresária ou não.

E é de suma relevância saber se a sociedade é empresária ou simples, porque daí resultará a obrigatoriedade de inscrição de seus atos constitutivos no Registro Público de Empresas Mercantis (Junta Comercial) ou no Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

O equívoco quanto ao órgão registrário competente pode acarretar graves conseqüências, porquanto a aquisição da personalidade jurídica, com o efeito de operar a separação patrimonial e jurídica da sociedade e dos sócios, somente se perfaz com o devido registro pertinente. O princípio de que a sociedade se distingue dos seus membros (societas distat a singulis) exige o registro como elemento constitutivo de sua operatividade.

Mantém o NCC, assim, a sistemática de condicionar a aquisição da personalidade jurídica dos entes abstratos à inscrição de seus atos constitutivos, mencionado, em vez de registro no órgão peculiar (atual Código Civil, art. 18), o registro respectivo e registro próprio (NCC, arts. 45 e 985).

É possível divisar que a entrada em vigor do NCC provoque interpretações equivocadas e uma irrefletida corrida às Juntas Comerciais para o registro de qualquer sociedade de fins econômicos, sem atentar para o seu caráter empresarial ou não.

Em relação às sociedades anônimas não subsiste qualquer dúvida, porque, levando em conta apenas a sua forma de constituição, a nova legislação civil, a exemplo do que já faz a atualmente vigente, as considera empresárias. Todavia, quanto as demais sociedades, é preciso identificar se possuem feição empresarial, segundo os parâmetros apontados, a partir da moderna Teoria da Empresa.

Se a sociedade for uniprofissional, com a execução das atividades pelos próprios sócios, de forma pessoal e com responsabilidade profissional, como sociedade de médicos, contadores, engenheiros, arquitetos e todas as específicas de profissões liberais será, em princípio, considerada sociedade simples, sujeita à inscrição de seus atos no Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

Ainda que não se trate de sociedades uniprofissionais, são também sociedades simples aquelas cuja atuação individualizada dos sócios, para a realização de seu objeto social, supere a organização dos fatores de produção. A pessoa jurídica, nesta hipótese, é mero aspecto formal de compartilhamento de meios, recursos e bens para uso comum de cada sócio. Não se tem, genuinamente, uma sociedade empresária. Tal sucede, por exemplo, na constituição de uma sociedade de cabeleireiros para rateio de um espaço comum e divisão das despesas.

As sociedades de participação, as chamadas holdings puras, por não se caracterizarem pelo exercício de uma atividade econômica organizada para a criação ou circulação de bens ou serviços, na definição de empresário contida no art. 966 do NCC, são consideradas sociedades simples, sujeitas ao Registro Civil das Pessoas Jurídicas.

No entender de Ronald A. Sharp Júnior, Professor de Direito Civil e Comercial no Rio de Janeiro, seria necessário, dir-se-ia mesmo indispensável, para evitar incertezas na aplicação do direito, que do arcabouço legislativo constasse que se considera sociedade simples, para os efeitos do art. 982 e seu parágrafo único do NCC, a sociedade cuja atuação pessoal dos sócios seja predominante na prática dos atos de realização do objeto social, devendo assim também ser consideradas as que não se distinguirem pelo exercício de uma atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou de serviços, partindo do balizamento traçado pelo art. 966 do novo texto legal.

A propósito, de tudo o que ouvi em palestras das quais participei e também li sobre o assunto, é do ilustre professor carioca a melhor abordagem do tema, razão pela qual transcrevi, com a devida permissão, vários trechos de um parecer elaborado pelo mesmo sobre o então projeto que resultou na Lei nº 10.404/2.002, o qual adaptei ao texto final do NCC. Assim procedi porque suas idéias sobre a matéria se harmonizam com aquilo que penso a respeito.

Merece destaque também um Parecer do qual tive acesso (Parecer nº 13/97-PSS), elaborado em 1.997 pelo Procurador Adjunto da JUCERJA, Paulo de Salvo Souza, o qual, embora tratasse da Lei nº 8.934/96, já trazia em seu bojo, com bastante clareza, aspectos da teoria da empresa.

Uma vez escolhida, pelo interessado, a natureza de sua sociedade (simples ou empresária), estará fixada a competência do órgão público de registro (Registro Civil das Pessoas Jurídicas ou Junta Comercial), a qual deve prevalecer quanto aos atos subseqüentes, não mais podendo aquela, uma vez delimitada, ficar a mercê da vontade das partes.

É importante que se diga que a competência das Junta Comercial ou do Registro Civil das Pessoas Jurídicas que, conforme o caso, haja deferido o arquivamento dos atos constitutivos, não pode ser contestada pelas autoridades que fiscalizam o exercício de suas atividades ou se incumbem de efetuar o seu cadastramento ou sua inscrição fiscal.

Desta forma, muitas sociedades, que a doutrina atual reputa civis poderão inserir-se no regime das sociedades empresárias, sendo a recíproca também verdadeira, ou seja, muitas sociedades consideradas comerciais poderão revestir-se da natureza de sociedades simples, podendo estas adotar, inclusive, um dos tipos de sociedade empresária regulados no art. 1.039 e segs. do NCC. Não o fazendo, subordinar-se-ão às normas que lhe são próprias (art. 983). Repetiu-se, assim, a regra do Código Civil vigente no sentido de permitir que a sociedade civil se revista das mesmas formas das sociedades comerciais (art. 1.364).

Frise-se que, mesmo que a sociedade simples adote uma das formas da sociedade empresária, ainda assim sua natureza será de sociedade simples. Neste sentido o Enunciado nº 57 do Centro de Estudos do Conselho de Justiça Federal. Contudo, esta afirmação contraria os comentários feitos, por Ricardo Fiuza, às páginas 890 e 1.028 do já citado Novo Código Civil Comentado. Inconformado com tais comentários, enviei e-mail ao ilustre parlamentar, que, em resposta, reconheceu o equívoco, alegando que o engano será corrigido na 2a. Edição da referida obra.

Dizer, entretanto, que, compulsoriamente, as atuais sociedades civis devem passar a ser empresárias não parece ser, s.m.j., o entendimento mais correto.

É importante que se diga que a afirmação de que a regra será a sociedade empresária e a exceção a simples deve ser vista com bastante cautela, eis que, na prática, tomando-se por base as sociedades existentes sob a égide da legislação vigente, o que se observa é justamente o contrário, pois poucas são aquelas que nascem (a menos que se constituam, por exemplo, sob a forma de S/A) ou adquirem, ao longo de sua existência, estrutura organizada que lhes permita atingir o almejado patamar da empresarialidade.

Para o órgão de registro público, seja ele a Junta Comercial ou o Registro Civil das Pessoas Jurídicas, a grande modificação reside no fato de que, a partir do novo Código, não se examina mais apenas o aspecto formal do documento, devendo ser analisados também o seu conteúdo e o ato jurídico em si, sem que, com isso, passe aquele a exercer função julgadora.

O tempo se encarregará de dizer se o aqui exposto tem ou não procedência.

Questões societárias relevantes em face do NCC

O Novo Código Civil é essencialmente registrário, prestigiando, desta forma, a atividade do REGISTRADOR.

De acordo com o novo diploma civil pátrio, as sociedades terão a seguinte estrutura:

a) Sociedades não personificadas, aquelas em que a pessoa dos sócios ainda não é diferenciada da personalidade da sociedade por não terem ainda os atos constitutivos devidamente registrados no órgão competente (Registro Público de Empresas Mercantis ou Registro Civil das Pessoas Jurídicas), subdivididas em sociedade em comum (abrangendo as chamadas sociedades irregulares e as sociedades de fato) e sociedade em conta de participação; e,

b) Sociedades personificadas, subdivididas em sociedades simples (incluindo as cooperativas) e sociedades empresárias (abrangendo a sociedade limitada, a sociedade em nome coletivo, a sociedade em comandita simples, a sociedade em comandita por ações e a sociedade anônima).

Segundo o art. 2.031 do NCC, as associações, sociedades e fundações, constituídas na forma das leis anteriores, terão o prazo de um ano para se adaptarem às disposições do mesmo. Porém, de acordo com o art. 2.033 do referido diploma ,as deliberações que modifiquem os atos constitutivos das pessoas jurídicas acima mencionadas, bem como os atos de transformação, incorporação, cisão ou fusão, reger-se-ão, a partir de 11.01.03, pelo NCC.

O artigo 2.044 do NCC indica o prazo de 1 (um) ano de vacatio legis, tendo existido propostas para ampliação desse prazo para mais 1 (um) ano, dentre as quais a formulada pelo Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal. A propósito, este Conselho tem vários Enunciados relativos ao NCC, frutos da Jornada de Direito Civil, ocorrida em fins do mês de setembro de 2002. Também o deputado Luiz Antonio Fleury apresentou Projeto Legislativo (PL nº 7.347/2002), visando adiar em um ano a entrada em vigor do novo Código Civil. Mas, logo o retirou de cena.

Em face do NCC, o Decreto nº 3.708/1919, embora não expressamente, será revogado (suas regras confrontam-se com norma mais nova e mais completa – o NCC) e a 1a. parte do Código Comercial foi expressamente derrogada. O Código Comercial passa a ser aplicável apenas em relação ao comércio marítimo.

A denominada sociedade por quotas de responsabilidade limitada do Decreto nº 3.708/19 foi, aliás, substituída, no novo Código Civil, por uma denominação tão imprópria quanto aquela: sociedade limitada. Ora, sabemos todos, que a responsabilidade de ambas é ilimitada, respondendo com todos os seus bens, pelas dívidas da sociedade. Limitada é apenas a responsabilidade de seus sócios. Além do mais, como também temos conhecimento, a S/A e as sociedades em comandita têm sócios com responsabilidade limitada.

As sociedades por quotas de responsabilidade limitada, tipo societário mais utilizado no País, representando 98% (noventa e oito por cento) dos registros efetuados, quer nas Juntas Comerciais, quer nos Registros Civis das Pessoas Jurídicas, com a entrada em vigor do NCC, perderão, segundo alguns, muito de sua flexibilidade, especialmente em face da criação de novas estruturas sociais, como Diretoria, Conselho Fiscal, Reuniões e Assembléias Gerais. Todavia, como bem alerta o Prof. Miguel Reale, em matéria publicada no Jornal “O Estado de São Paulo”, edição de 23 de novembro de 2002, elas somente deverão ser observadas “nos casos considerados obrigatórios, prevalecendo o livremente disposto no contrato social.

Desse modo se evitou a estruturação rígida das sociedades limitadas, dada a multiplicidade de suas formas, quer segundo o modelo da sociedade anônima, quer de conformidade com o da sociedade simples, optando-se por uma solução plural, facultando aos seus fundadores optar, por exemplo, pela regência supletiva de uma ou de outra legislação para solução dos casos omissos.

A distinção básica é a de sociedades com mais de dez quotistas, para a qual se exige administração mais complexa, enquanto que nas demais hipóteses pode ela, consoante o artigo 1.060, ser exercida “por uma ou mais pessoas designadas no contrato ou em separado”, o que demonstra a sem-razão dos críticos que dizem que o novo código vem “complicar a vida das limitadas”, estendendo-lhes requisitos próprios das sociedades anônimas.

Para provar que a matéria foi disciplinada com mais amplo critério bastará salientar que, segundo o artigo 1.066, “pode (note-se) o contrato social instituir Conselho Fiscal composto de três ou mais membros e respectivos suplentes, sócios ou não, residentes no País”, eleitos pela assembléia-geral.

Outra distinção essencial é entre as deliberações que devem ser tomadas em reunião (sic) de sócios, ou, então, em assembléia, “conforme previsto no contrato”, sendo obrigatória a assembléia, como já disse, se o número dos quotistas for superior a dez (artigo 1.072 e seus parágrafos).

Dir-se-á que a nova lei prevê formalidades especiais para convocação das assembléias, mas não é menos certo que elas são dispensáveis “quando todos os sócios comparecerem ou declararem por escrito, cientes do local, data e ordem do dia”.

Além disso, de acordo com o parágrafo 3º, do artigo 1.072, “a reunião ou assembléia tornam-se dispensáveis quando todos os sócios decidirem, por escrito, sobre a matéria que seria objeto dela”.

Entra pelos olhos que tais dispensas têm como destinatárias as empresas limitadas de pequeno ou médio porte, o que não impede que haja disposições cautelares para as sociedades por quotas de maior vulto”.

Quanto ao nome empresarial, o NCC indica a necessidade da designação, na denominação de uma sociedade limitada, do seu objeto social. Essa imposição, que já havia caído em desuso, poderá ser inconveniente para algumas sociedades que tenham objetos sociais amplos. A esse respeito, o Decreto nº 3.708/19 já continha previsão mais flexível ao admitir que a denominação social deveria, quando (a doutrina entendia como quanto) possível, dar a conhecer o objeto da sociedade. Lembre-se que a sociedade limitada poderá adotar, ao invés de denominação, uma firma.

O bom senso indica que, quando a sociedade limitada usar denominação, esta leve a entender, pelo menos, a atividade preponderante. Aquelas sociedades que não tenham em sua denominação algo que leve a entender o objeto social, a meu ver, ao contrário do que se possa pensar, não terão que se adaptar ao novo texto legal por se tratar de um direito inerente a sua personalidade. Neste sentido o Enunciado nº 73 do Centro de Estudos Judiciários do Conselho de Justiça Federal.

Quanto aos demais tipos societários, o NCC traz regras para a composição do nome empresarial (denominação ou firma). Já em relação à sociedade simples, o legislador silenciou. O que deixou claro, apenas, foi que a sociedade simples deve ter denominação.

A sociedade limitada será regida, supletivamente, pelas regras da sociedade simples, a menos que o contrato social faça previsão expressa de que a norma a ser seguida é a da sociedade anônima. Aliás, as regras da sociedade simples também se aplicam, supletivamente, às sociedades não personificadas e à cooperativa.

Atente-se para a nova e interessante disposição contida no parágrafo único do art. 44 do NCC, segundo a qual “as disposições concernentes às associações aplicam-se, subsidiariamente, às sociedades que são objeto do Livro II da Parte Especial deste Código”. Trata-se de um regime de integração entre as associações e as sociedades.

Quanto ao capital social este, na sociedade limitada, poderá ser dividido em quotas iguais ou desiguais. Esta igualdade ou desigualdade, a meu ver, pela redação ao artigo 1.055 e seus respectivos parágrafos, diz respeito à quantidade de quotas. Nada impede, porém, que a sociedade limitada estabeleça quotas com direitos especiais (quotas preferenciais).

A contribuição para formação do capital social, na sociedade limitada, pode se dar em dinheiro, bens ou créditos. Vedou-se, expressamente, a contribuição em serviço (trabalho), permitida, apenas, na sociedade simples, passando todos os sócios a responder, solidariamente, pela exata estimação de bens conferidos ao capital social, até o prazo de 5 (cinco) anos da data do REGISTRO da sociedade. Por isso, é recomendável solicitar um laudo de avaliação ao sócio que estiver integralizando a sua participação no capital social com um determinado bem, para certificar-se de seu real valor. Não há fundamento legal, entretanto, para que o registrador exija tal laudo no momento do registro.

Para os aumentos de capital social, o NCC indica a necessidade de que o capital social esteja totalmente integralizado. Lembre-se que a Lei das S/As exige, nestes casos, que o capital social esteja realizado em, pelo menos, ¾ (três quartos) do seu valor. É, portanto, um dispositivo mais rígido.

A modificação do contrato social para fins de aumento do capital social, na sociedade limitada, exige a aprovação de sócios representando, ao menos, ¾ (três quartos) do capital social.

Haverá direito de preferência para os demais sócios, na proporção das quotas de que sejam titulares, a ser exercido em até 30 (trinta) dias após a deliberação de aumento do capital social. Caberá ao registrador verificar se o direito de preferência foi observado.

Salvo disposição em contrário, prevista no contrato social, o direito de preferência poderá ser cedido se não houver oposição de titulares de mais de ¼ (um quarto) do capital social.

A redução de capital social poderá ocorrer, através de alteração contratual, em duas situações:

a) depois de integralizado o capital social, se houver perdas irreparáveis (prejuízos acumulados, em analogia ao disposto na Lei das S/As); e,

b) se o capital social for excessivo em relação ao objeto social. Nesta hipótese, o credor quirografário terá 90 (noventa) dias, a contar da data da publicação da ata da assembléia que aprovou a redução, para opor-se a tal deliberação.

A redução somente se tornará eficaz se não for impugnada durante os 90 (noventa) dias, ou se provado o pagamento da dívida ou o depósito judicial do respectivo valor. Satisfeitas estas condições, proceder-se-á ao registro da alteração contratual no órgão competente.

Na omissão do contrato, o sócio poderá ceder suas quotas, total ou parcialmente, a quem seja sócio, independentemente da anuência dos demais, ou a terceiro (estranho), se não houver oposição de sócios representando mais de ¼ (um quarto) do capital social.

Quando da cessão de quotas, o cedente permanecerá solidariamente responsável com o cessionário, pelo prazo de 2 (dois) anos, a contar da AVERBAÇÃO, no órgão competente, da modificação do contrato, pelas suas obrigações como sócio (parágrafo único do art. 1.057, combinado com o art. 1.003). O mesmo ocorre na sociedade simples (artigo 1.032).

O NCC estabeleceu quorum específico para a aprovação de certas matérias (deliberações) na sociedade limitada, sendo certo que cabe aos sócios fixarem, no contrato social, o funcionamento das Reuniões ou Assembléias. Não o fazendo, seguir-se-ão as determinações do NCC relativas às Assembléias.

Uma das alterações mais polêmicas em termos de quorum previsto na nova legislação é aquela que estabelece a exigência de, pelo menos ¾ (três quartos) do capital social, para aprovar modificações do contrato social, nas sociedades limitadas. Em se tratando de sociedade simples, a regra é ainda mais rígida, já que o artigo 999 do NCC estabelece que “as modificações do contrato social que tenham por objeto matéria indicada no art. 997, dependem do consentimento de todos os sócios; as demais podem ser decididas por maioria absoluta de votos, se o contrato não determinar a necessidade de deliberação unânime.”.

As deliberações serão tomadas em Reuniões ou Assembléias, previamente convocadas pelos administradores, nos casos previstos em lei ou no contrato social, podendo, excepcionalmente, ser convocadas pelos sócios ou pelos conselheiros fiscais, se estes existirem, devendo a convocação ser devidamente publicada, nos termos do artigo 1.152 e respectivos parágrafos.

Há situações em que tanto a convocação, como as Reuniões ou Assembléias ficam dispensadas, como visto alhures.

Haverá, necessariamente, para as sociedades limitadas, uma Assembléia Geral Anual, nos 4 (quatro) primeiros meses seguintes ao término do exercício social, para aprovação de contas, designação de administradores, quando for o caso, e para tratar de outros assuntos de interesse da sociedade.

O direito de retirada (recesso), a ser exercido nos 30 (trinta) dias subseqüentes à Reunião que aprova a matéria da qual se é dissidente, foi mantido pelo NCC, conforme disposto no art. 1.077, que é, diga-se de passagem, uma regra muito abrangente.

Esse direito foi introduzido também para os casos de incorporação ou fusão, expressamente. Na hipótese de cisão, embora não prevista, entende-se que também cabe o direito de recesso.

Há a possibilidade de sócios estrangeiros no quadro de sócios da sociedade limitada.

Não há mais necessidade de se colocar, expressamente, na cláusula do capital social, que a responsabilidade dos sócios é limitada à totalidade do capital social, conforme determinava o art. 2º, “in fine”, do Decreto nº 3.708/1919.

A sociedade limitada poderá ser administrada por sócio ou não sócio (o mesmo ocorrendo na sociedade simples), não existindo mais as figuras do sócio-gerente e do gerente-delegado. Deverá haver, na sociedade limitada, a indicação de quem são os administradores. Na sociedade simples, na omissão, entender-se-á que todos os sócios são administradores.

O quorum para nomeação ou destituição do administrador varia em razão da condição de sócio ou não sócio, bem como do instrumento (contrato ou ato separado) de sua designação.

A administração atribuída no contrato social a todos os sócios não se estende, automaticamente, aos que posteriormente ingressarem na sociedade.

Uma dúvida que pode surgir é se a sociedade limitada pode ou não ser administrada por uma pessoa jurídica?

Como o texto do art. 1.060 do NCC fala em uma ou mais pessoas, parece-me que não há nenhuma restrição, especialmente se a sociedade não adotar, supletivamente, as regras da sociedade simples, pois esta, consoante o disposto no art. 997, exige que a administração seja feita, obrigatoriamente, por pessoas naturais (físicas).

A responsabilidade dos administradores está prevista somente em relação às sociedades simples, cujas regras se aplicam, subsidiariamente, às limitadas, exceto se o contrato social fizer referência expressa que, supletivamente, serão seguidas as regras das S/As, diga-se de passagem mais rígidas (v. art. 1.070 do NCC).

O Conselho Fiscal, órgão facultativo dentro da sociedade limitada, exerce funções fiscalizadora e opinativa. Seus integrantes têm dever de denúncia, sob pena de responder com seus bens pessoais.

As deliberações do Conselho Fiscal são colegiadas e também individuais.

Os requisitos e impedimentos relativos aos membros do Conselho Fiscal estão previstos no NCC. Especialmente quanto aos impedimentos, deve o registrador observá-los, através de declaração a ser juntada para REGISTRO.

Tanto administradores como conselheiros fiscais (ainda que não sócios), podem responder com seu patrimônio social, mediante a desconsideração da personalidade jurídica, se ocorrer abuso de forma, caracterizado pelo desvio de finalidade ou confusão patrimonial (art. 50).

São os seguintes os livros obrigatórios da sociedade limitada:

a) Livro de Atas de Assembléia de Sócios;

b) Livro de Atas da Administração; e,

c) Livro de Atas e Pareceres do Conselho Fiscal.

Não há necessidade de publicação das Demonstrações Financeiras. Basta que sejam colocadas à disposição dos sócios 30 (trinta) dias antes da realização da Assembléia Geral Anual.

O NCC também tratou, expressamente, dos institutos da transformação, incorporação e fusão, cujas normas aplicar-se-ão a todas as sociedades, exceção feita à sociedade anônima, que já se rege por norma especial, permanecendo vigentes os artigos 223 a 234 da Lei das S/As.

Antes da promulgação do NCC, as operações societárias de transformação, incorporação, fusão e cisão eram disciplinadas pela lei do anonimato, que se aplicava às sociedades de tipos iguais ou diferentes. A partir da entrada em vigor do NCC, verificaremos as seguintes situações: a) quando essas operações envolverem somente sociedades anônimas, aplica-se o disposto na lei das S/As; b) quando essas operações envolverem os demais tipos societários, aplica-se o disposto no NCC; e, c) quando essas operações envolverem sociedade anônima e sociedade de outro tipo, aplica-se, para as obrigações das sociedades anônimas, o disposto na lei das S/As, e, para a outra sociedade, o disposto no NCC.

Destaca-se que o NCC não exige a elaboração de protocolo e da justificação para os atos de incorporação, fusão e cisão. Tais atos, no entanto, deverão ser publicados.

O estabelecimento (art. 1.142 a 1.149 do NCC), chamado, até então, fundo de comércio e conhecido na Itália por azienda, corresponde ao conjunto de bens corpóreos e incorpóreos organizados pelo empresário para a exploração da atividade econômica. Juntamente com o empresário e a empresa, o estabelecimento corresponde a um dos elementos da empresarialidade destacados por Waldirio Bulgarelli, na sua obra Tratado de Direito Empresarial (BULGARELLI, 1.997, p.109).

O NCC perdeu uma excelente oportunidade de introduzir no País a limitação da responsabilidade do empresário individual, a qual existe, por exemplo, na França, Itália, Alemanha e Portugal, como forma de incentivo à exploração da atividade econômica de menor vulto mediante a limitação dos riscos do negócio. A limitação da responsabilidade do empresário individual poderia ter sido adotada pelo novo diploma ci



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