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Áreas de Preservação Permanente e Áreas de Reserva Legal - Dr. Francisco José Rezende dos Santos*
Introdução
Limitações Administrativas
As Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal são duas figuras jurídicas distintas, criadas pelo Direito Ambiental, ambas limitadoras da exploração plena da propriedade rural, em sua atividade extrativa ou agropastoril. São figuras jurídicas que incidem na propriedade rural como encargos particular e individual, embora revertam em benefício social e coletivo gratuito. Por isso, antes de iniciarmos o estudo especificamente do tema do nosso trabalho - Áreas de Preservação Permanente e Áreas de Reserva Legal nos Imóveis Rurais - é necessário que façamos um breve exame do que sejam as limitações administrativas impostas pelo Estado ao particular e ao direito de propriedade, visto que ambos os constrangimentos se enquadram nesse campo do Direito Administrativo, o que dará uma melhor visão do assunto ora em debate e, ainda, maior entendimento e consciência das questões levantadas.
A limitação administrativa é uma das maneiras pelas quais o Estado, como organismo político administrativo, no uso de sua autoridade, intervém na propriedade e nas ações dos particulares. É a limitação administrativa um estado de sujeição ou de restrição, que o Poder Público impõe ao particular diretamente ou aos bens destes, de obediência a determinadas normas, fazendo-o no exercício da sua soberania, dentro dos princípios constitucionais que lhe são próprios, limitando o pleno direito de propriedade e intervindo em suas ações particulares.
Segundo Hely Lopes Meirelles “as limitações administrativas representam modalidades de expressão de supremacia geral que o Estado exerce sobre pessoas e coisas existentes no seu território, decorrendo do condicionamento da propriedade privada e nas atividades individuais ao bem estar da comunidade. Como limitações de ordem pública, são regidas pelo Direito Administrativo, diversamente das restrições civis, que permanecem reguladas pelo Direito Privado (CC, art.554 e ss.).”
A limitação administrativa tem características próprias. É uma imposição geral, gratuita, unilateral por parte da Administração, e de ordem pública. Tem como finalidade atender às exigências do interesse público e do bem-estar social. Pode ser encontrada na modalidade de fazer (positiva), em que o particular fica obrigado à imposição da Administração, de não fazer (negativa), em que o particular fica impedido de fazer algo, ou deixar de fazer (permissiva), em que o particular deve permitir que a Administração faça a atividade a que se propõe.
As limitações administrativas, por serem preceitos de ordem pública, devem se arrimar nos limites impostos pela Constituição Federal e pelas leis, sob pena de se perderem por despóticas. Observa ainda Hely Lopes Meirelles que “só são legítimas quando representam razoáveis medidas de condicionamento do uso da propriedade, em benefício do bem estar social, e não impedem a utilização da coisa segundo sua destinação natural.”
Em seu livro Direito Administrativo, Maria Sylvia Zanella di Pietro nos diz quanto às limitações administrativas: “O Poder Legislativo, no exercício do poder de polícia que incumbe ao Estado, cria, por lei, as chamadas limitações administrativas ao exercício das liberdades públicas.” E continua: “Sendo medidas impostas pelo poder de polícia do Estado, com fundamento no princípio da supremacia do interesse público, não cabe ao particular qualquer medida, administrativa ou judicial, visando impedir a incidência da limitação sobre o imóvel de sua propriedade; o Estado age imperativamente, na qualidade de poder público, e somente poderá sofrer obstáculos, quando a Administração aja com abuso de poder, extravasando os limites legais. Neste caso, cabe ao particular, além de opor-se à limitação estatal, pleitear a indenização por prejuízos dela decorrentes.”
É muito importante este aspecto da razoabilidade da constrição, pois se ultrapassadas as regras da moderação, hão de ser arbitrárias, portanto facilmente aniquiláveis pelos mais diversos remédios jurídicos, especialmente o mandado de segurança, podendo chegar até a decretação da ilegalidade ou da inconstitucionalidade.
Uma outra característica das limitações administrativas é que estas não geram indenização ao particular que as sofre. Se forem excessivas as limitações, podem ser consideradas servidões administrativas ou até desapropriação, ensejando, em ambos os casos, justa reposição pecuniária ao ofendido.
A limitação administrativa é uma condicionante ao uso indiscriminado e sem limites da propriedade e deve expressar-se em forma de normas genéricas de conduta. Só as leis podem criar limitações administrativas. Em seu livro Curso de Direito Administrativo Positivo, Edmur Ferreira de Faria nos diz: “A limitação administrativa, por ser geral, obrigatória e gratuita, só pode ser imposta por lei geral emanada do Poder Legislativo. Diferentemente dos outros meios administrativos de restrição que, embora previstos em lei, materializam-se por meio de ato administrativo.”
O critério da autoridade competente na limitação administrativa é fundamental e vital. A limitação administrativa nunca pode ser imposta por qualquer autoridade, há de se observar sempre o critério da autoridade competente, que será sempre uma autoridade administrativa. Não podem ser impostas através de pareceres ou resoluções do Ministério Público ou ainda atos judiciais (sentenças, despachos etc...), pois as limitações são atos próprios da Administração, e como atos administrativos, só cabe à Administração Pública o poder de implantá-las.
As limitações administrativas não se confundem com os direitos de vizinhança, apesar de ambos incidirem sobre o mesmo objeto, a propriedade privada, mas os direitos de vizinhança são estabelecidos pelas leis civis no sentido de proteger especificamente a propriedade particular, seu conforto, a subsistência, a saúde e o lazer, resguardados pelo Código Civil, e só atingem vizinhos nos seus interesses particulares, e não toda uma coletividade, genericamente.
Também não se confundem com as servidões, pois constituem estas direitos reais sobre a coisa alheia e gravam um imóvel em benefício de outro, mediante contrato, se servidões prediais; ou se servidões administrativas, mediante indenização do Poder Público, para favorecer o cumprimento de serviços públicos necessários.
Se distinguem as limitações administrativas da desapropriação, pois nesta se retira do particular a propriedade da coisa, ressarcindo-o com a justa indenização pecuniária pela perda do bem.
Às limitações administrativas se subordina também o Poder Público, igualando-se ao particular, e às normas impostas pelo município ao ordenamento urbano, se subordinam os Estados e a União, pois em tais matérias prevalece a competência constitucional dada ao município.
É muito importante destacar, para um estudo mais acurado das limitações administrativas, o princípio da não-retroatividade da lei ou da norma legal, seja ela decreto, regulamento ou outra, criadora ou reguladora da limitação administrativa. É princípio que toda lei em vigor tem efeito imediato e geral, respeitados o ato jurídico perfeito, o direito adquirido e a coisa julgada, princípio esculpido no art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal, bem como no art. 6º do Decreto-Lei n. 4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução ao Código Civil). Nenhum dispositivo ou ato, nem de ordem pública, pode atentar contra essa disposição constitucional. Assim, não podem as limitações administrativas atingir atos que, à época em que foram praticados, se tornaram eficazes e devidamente consumados, sob o abrigo de norma legal vigente à época do evento, confirmando-se estes em atos jurídicos perfeitos.
Assim, se um particular que construiu um prédio de 10 (dez) andares em determinado bairro, que posteriormente foi submetido a restrição urbanística, só sendo permitido atualmente, que se construa até 3 (três) andares, não pode ser ele impelido a derrubar o prédio, ou os andares excedentes, pois, no momento em que fora construído, a lei vigente o autorizava a tal obra, sendo, por isso mesmo, direito adquirido. Às novas construções naquele bairro a norma se impõe, mas àquela já construída anteriormente não.
Segundo Hely Lopes Meirelles “limitações administrativas são, p.ex., o recuo de alguns metros das construções em terrenos urbanos e a proibição de desmatamento de parte da área florestada em cada propriedade rural. Mas se o impedimento de construção ou do desmatamento atingir a maior parte da propriedade ou sua totalidade, deixará de ser limitação para ser interdição de uso da propriedade e, neste caso, o Poder Público ficará obrigado a indenizar a restrição que aniquilou o direito dominial e suprimiu o valor econômico do bem. Pois ninguém adquire terreno urbano em que seja vedada a construção, como também nenhum particular adquire terras ou matas que não possam ser utilizadas economicamente, segundo sua destinação normal. Se o Poder Público retira do bem particular seu valor econômico, há de indenizar o prejuízo causado ao proprietário. Essa regra, que deflui do princípio da solidariedade social, segundo o qual só é legítimo o ônus suportado por todos em favor de todos, não tem exceção no Direito pátrio, nem nas legislações estrangeiras.” (grifos nossos)
Diz ainda o festejado mestre: “A preservação dos recursos naturais faz-se por dois modos: pelas limitações administrativas de uso, gerais e gratuitas, sem impedir a normal utilização econômica do bem, nem retirar a propriedade do particular, ou pela desapropriação individual e remunerada de determinado bem, transferindo-o para o domínio público e impedindo a sua destruição ou degradação.”
As limitações administrativas não são levadas aos Registros Imobiliários para a averbação junto às matrículas dos imóveis. É desnecessário. A lei lhes dá a publicidade e a eficácia necessárias para o seu cumprimento por todos. Assim, ninguém nunca viu uma limitação administrativa, por exemplo, de recuo, afastamento ou natureza de edificações, averbada em matrículas de imóveis. Também nunca se viu averbada, em uma matrícula de um lote, a imposição de determinado zoneamento ao imóvel, se tal área é comercial, residencial ou industrial, ou ainda averbados regulamentos de higiene e normas sanitárias, ou qualquer norma referente à altura de prédios que possam ser construídos no lote objeto de determinada matrícula. Tal averbação é desnecessária, repetimos. O que lhe dá vida e eficácia no mundo do Direito é a lei. O Poder Público fiscaliza o cumprimento da limitação administrativa, em decorrência do Poder de Polícia que lhe garantem os Direitos Administrativo e Constitucional, e não pela averbação de uma limitação administrativa nos Ofícios de Registro Imobiliário.
Às mesmas regras e fundamentos das limitações administrativas se submetem as Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal, impostas aos proprietários rurais pelas leis ambientais, pois estas são limitações administrativas. Sabemos todos, e muito bem, o quanto é necessária a preservação dos recursos naturais, e disso não temos dúvida, mas existem meios e princípios que devem ser obedecidos e que norteiam a ação do administrador. Os excessos, advindos da Administração, ou de órgãos externos, ainda que fiscalizadores, como o Ministério Público, devem ser repelidos, pois o afã de tutelar o meio ambiente não pode justificar arbitrariedades e abuso de poder. Tudo tem limite. Os princípios gerais do Direito, e especialmente a lei, devem ser respeitados, caso contrário estaremos desacatando e aniquilando tudo que existe de sólido e basilar no Estado de Direito.
Áreas de Preservação Permanente
As Áreas de Preservação Permanente, figuras jurídicas criadas pelo Direito Ambiental e materializadas em nosso Direito Positivo, pela Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965, o Código Florestal, são uma limitação radical da exploração e uso de determinadas áreas da propriedade rural para qualquer uma das suas atividades fins, sejam elas extrativas, agrícolas ou pecuárias.
Como figura do Direito Administrativo, são as Áreas de Preservação Permanente limitações administrativas, pois preenchendo todos os requisitos próprios daquele instituto do Direito Administrativo, são gratuitas, impostas pelo Poder Público, gerais, e têm como finalidade atender às exigências do interesse público e do bem-estar social. São impostas na modalidade de limitação administrativa negativa, de não fazer, em que o particular fica impedido pela lei de fazer algo, no caso em espécie a exploração ou supressão de matas e vegetação em áreas predeterminadas da sua propriedade rural. São elas, restrições que incidem sobre o uso pleno da propriedade, e ainda consideradas encargos particular e individual, embora revertam em benefício social e coletivo gratuito.
As Áreas de Preservação Permanente, o próprio nome já diz, são áreas reconhecidas como de utilidade pública, de interesse comum a todos e localizadas, em geral, dentro do imóvel rural, público ou particular, em que a lei restringe qualquer tipo de ação, no sentido de supressão total ou parcial da vegetação existente, para que se preservem com as plantas em geral, nativas e próprias, que cobrem a região. São as áreas localizadas especialmente nas imediações das nascentes e cursos d’água, as lagoas, lagos ou reservatórios d’água naturais ou artificiais, os topos de montanhas e serras, as encostas com aclive acentuado, as restingas na faixa litorânea, as vegetações localizadas em altitudes superiores a 1.800 metros e as vegetações localizadas em determinadas áreas urbanas, assim definidas por lei específica.
As Áreas de Preservação Permanente, localizadas em propriedades particulares e públicas, são as citadas no art. 2º da Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código Florestal), e suas alterações, assim discriminadas:
“Art. 2° - Consideram-se de preservação permanente, pelo só efeito desta Lei, as florestas e demais formas de vegetação natural situadas:
a) ao longo dos rios ou de qualquer curso d'água desde o seu nível mais alto em faixa marginal cuja largura mínima será:
1 - de 30 (trinta) metros para os cursos d'água de menos de 10 (dez) metros de largura;
2 - de 50 (cinqüenta) metros para os cursos d'água que tenham de 10 (dez) a 50 (cinqüenta) metros de largura;
3 - de 100 (cem) metros para os cursos d'água que tenham de 50 (cinqüenta) a 200 (duzentos) metros de largura;
4 - de 200 (duzentos) metros para os cursos d'água que tenham de 200 (duzentos) a 600 (seiscentos) metros de largura;
5 - de 500 (quinhentos) metros para os cursos d'água que tenham largura superior a 600 (seiscentos) metros;
b) ao redor das lagoas, lagos ou reservatórios d'água naturais ou artificiais;
c) nas nascentes, ainda que intermitentes e nos chamados "olhos d'água”, qualquer que seja a sua situação topográfica, num raio mínimo de 50 (cinqüenta) metros de largura;
d) no topo de morros, montes, montanhas e serras;
e) nas encostas ou partes destas, com declividade superior a 45°, equivalente a 100% na linha de maior declive;
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou estabilizadoras de mangues;
g) nas bordas dos tabuleiros ou chapadas, a partir da linha de ruptura do relevo, em faixa nunca inferior a 100 (cem) metros em projeções horizontais;
h) em altitude superior a 1.800 (mil e oitocentos) metros, qualquer que seja a vegetação.
Parágrafo único - No caso de áreas urbanas, assim entendidas as compreendidas nos perímetros urbanos definidos por lei municipal, e nas regiões metropolitanas e aglomerações urbanas, em todo o território abrangido, observar-se-á o disposto nos respectivos planos diretores e leis de uso do solo, respeitados os princípios e limites a que se refere este artigo.”
O Código Florestal, em seu artigo 3º, equipara outras áreas, que devem ser declaradas por ato do Poder Público, às Áreas de Preservação Permanente, assim fixando:
“Art. 3º - Consideram-se, ainda, de preservação permanente, quando assim declaradas por ato do Poder Público, as florestas e demais formas de vegetação natural destinadas:
a) a atenuar a erosão das terras;
b) a fixar as dunas;
c) a formar faixas de proteção ao longo de rodovias e ferrovias;
d) a auxiliar a defesa do território nacional a critério das autoridades militares;
e) a proteger sítios de excepcional beleza ou de valor científico ou histórico;
f) a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçados de extinção;
g) a manter o ambiente necessário à vida das populações silvícolas;
h) a assegurar condições de bem-estar público.
§ 1° - A supressão total ou parcial de florestas de preservação permanente só será admitida com prévia autorização do Poder Executivo Federal, quando for necessária à execução de obras, planos, atividades ou projetos de utilidade pública ou interesse social.
§ 2º - As florestas que integram o Patrimônio Indígena ficam sujeitas ao regime de preservação permanente (letra g) pelo só efeito desta Lei.”
As Áreas de Preservação Permanente são tão importantes, que o próprio Código Florestal dedica o seu artigo 18 à possibilidade de o Poder Público interferir na propriedade privada, onde exista necessidade de se recuperar a área de preservação permanente e promover o florestamento ou o reflorestamento da área, fazendo-o sem a necessidade de desapropriação e encarregando o particular e proprietário da mesma à sua conservação e manutenção. É de se observar que se a área estiver ocupada com cultura, o proprietário poderá ser indenizado, é lógico, sendo necessário que a cultura tenha sido ali implantada há muitos anos, antes da existência das leis ambientais. Assim diz o artigo 18:
“Art. 18 - Nas terras de propriedade privada, onde seja necessário o florestamento ou o reflorestamento de preservação permanente, o Poder Público Federal poderá fazê-lo sem desapropriá-las, se não o fizer o proprietário.
§ 1° - Se tais áreas estiverem sendo utilizadas com culturas, de seu valor deverá ser indenizado o proprietário.
§ 2º - As áreas assim utilizadas pelo Poder Público Federal ficam isentas de tributação.”
O Desembargador Narciso Orlandi Neto, do Tribunal de Justiça de São Paulo, em seu artigo Reservas Florestais (publicado na Revista do Instituto de Registro Imobiliário do Brasil – n. 42), ao abordar o assunto das áreas de preservação permanente como limitações administrativas, diz: “Essas limitações não atingem alguns imóveis, mas todos situados em determinadas regiões, ou dotados de cobertura especialmente protegida. Não se confundem com servidões. Não há prédio dominante e prédio serviente. O proprietário não é obrigado a ‘suportar que se faça´. Trata-se de restrições legais, limitações administrativas ou limitações legais. Independem de registro no Registro de Imóveis. Decorrem da lei. Independem da vontade do proprietário. São perpétuas, inalteráveis e indivisíveis. Sua imposição pela lei tem por causa a necessidade de preservação do meio ambiente, de que a cobertura florestal é instrumento.”
A lei não determina que a restrição administrativa incidente sobre as Áreas de Preservação Permanente seja levada a registro ou averbação na matrícula do imóvel junto aos Cartórios de Registros de Imóveis. Existe um motivo para isso. É que limitações administrativas não são levadas aos Registros Imobiliários para a averbação junto às matrículas dos imóveis, como já vimos acima, no item que estudamos as limitações administrativas. É desnecessário o seu registro ou averbação. A lei lhes dá a publicidade e a eficácia necessárias para o cumprimento por todos. As Áreas de Preservação Permanente existem independentemente do seu registro ou averbação no Registro de Imóveis, e o proprietário do imóvel deve respeitá-las, na forma e nos limites que a lei estabelecer.
Reserva Legal
A figura jurídica da Reserva Legal, tal como está colocada na lei, só existe no Brasil. Por seu alcance é, sem sombra de dúvida, a mais importante e controvertida, estudada e discutida figura de limitação administrativa criada pelo Direito Ambiental, no Brasil. É motivo de grande polêmica no meio rural, pois os proprietários, além de terem uma grande parte, no mínimo 20%, da sua propriedade rural limitada quanto à sua destinação natural, seja agrícola, pecuária ou extrativista, praticamente nada recebem como compensação ou incentivo pela conservação ambiental dessas áreas, como é feito nos países que são nossos principais concorrentes no mercado agrícola internacional.
A Reserva Legal não existia, originariamente, no Código Florestal – Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965. Foi nele incluída pela Lei n. 7.803, de 18 de julho de 1989. Depois, diversas medidas provisórias deram extensão à Reserva Legal, por exemplo, determinando que sua averbação fosse gratuita para a pequena propriedade rural.
As Áreas de Reserva Legal não se confundem com as Áreas de Preservação Permanente, que são as citadas no artigo 2º da Lei n. 4.771, de 15 de setembro de 1965 (Código Florestal), e suas alterações, e que já foram objeto deste nosso estudo.
“Reserva legal é a área localizada no interior de uma propriedade ou posse rural, excetuada a de preservação permanente, necessária ao uso sustentável dos recursos naturais, à conservação e reabilitação dos processos ecológicos, à conservação da biodiversidade e ao abrigo e proteção da fauna e flora nativas”, é como nos é definida a Reserva Legal pelo artigo 1º, § 2º, inciso III, da Medida Provisória n. 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que altera dispositivos do Código Florestal.
O Desembargador Narciso Orlandi Neto, do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim define a Reserva Legal: “Reserva legal é limitação que atinge todos os imóveis situados em regiões especialmente protegidas, restringe o uso de parte certa e localizada de cada imóvel, em caráter definitivo e imutável, e pode ser especializada no Registro de Imóveis, a requerimento do proprietário. Por lei, destina-se à preservação de florestas particulares e torna-se efetiva com a proibição do corte raso.”
O ilustre doutrinador diz que a Reserva Legal pode ser especializada no Registro de Imóveis. Especializar é um princípio do Direito Registral Imobiliário que se consubstancia, no dizer de Nicolau Balbino Filho, em seu livro Direito Imobiliário Registral, na “individualização que se lança no registro, inerente ao bem objeto do direito real sobre o qual recai o negócio jurídico” ou ainda, no dizer de Afrânio de Carvalho, em seu livro Registro de Imóveis, “O princípio de especialidade significa que toda inscrição deve recair sobre um objeto precisamente individuado.”
Geraldo Cezar Torres Carpes, Tabelião e Oficial do Registro de Imóveis de Ponta Porã, no Mato Grosso do Sul, considera a Reserva Legal como: “Limitação administrativa ao direito de propriedade, estabelecida pelo Código Florestal, incidente sobre cada propriedade rural, sob forma percentual, em cuja área não é permitido o corte raso, ou destinada à reposição florestal.”
Podemos apontar algumas características próprias da Reserva Legal: da mesma forma que as Áreas de Preservação Permanente, a Reserva Legal é uma limitação administrativa ao direito de propriedade, amoldando-se em todos os requisitos daquele instituto do Direito Administrativo, são gratuitas e gerais, impostas pelo Poder Público, e têm por fim acatar os reclames do interesse público. Também, como as Áreas de Preservação Permanente, são impostas na modalidade de limitação administrativa negativa, de não fazer, em que o particular fica impedido pela lei de fazer algo, no caso a supressão de um percentual de, no mínimo, 20% de florestas ou de vegetação nativa existentes, originariamente, na sua propriedade rural. São também as Áreas de Reserva Legal, como limitações administrativas, restrições que incidem sobre o uso pleno de toda a propriedade rural, pois limitam a utilização de toda a propriedade e ainda são consideradas encargos particular e individual do proprietário do imóvel, pois obrigam à conservação da vegetação na área demarcada da Reserva Legal.
As Áreas de Reserva Legal só podem ser localizadas em imóvel rural, público ou particular. A lei restringe qualquer tipo de supressão total ou parcial da vegetação nativa existente nestas áreas, para que sejam conservados e reabilitados os processos ecológicos, para que sirvam de abrigo e proteção da fauna e flora nativas e se preserve a biodiversidade existente. É imposta em caráter definitivo e em princípio imutável, a não ser por determinação expressa da autoridade competente. Torna proibido o corte raso da madeira e de toda a vegetação existente, e só deve ser especializada no Registro Imobiliário na matrícula do imóvel rural, quando o proprietário pretenda explorar o imóvel, suprimindo vegetação nativa ou florestas já existentes.
A Reserva Legal é demarcada na lei pelo artigo 16, seus incisos e parágrafos da Medida Provisória n. 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que modifica o Código Florestal, que assim diz:
"Art. 16 - As florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica, são suscetíveis de supressão, desde que sejam mantidas, a título de reserva legal, no mínimo:
I - oitenta por cento, na propriedade rural situada em área de floresta localizada na Amazônia Legal;
II - trinta e cinco por cento, na propriedade rural situada em área de cerrado localizada na Amazônia Legal, sendo no mínimo vinte por cento na propriedade e quinze por cento na forma de compensação em outra área, desde que esteja localizada na mesma microbacia, e seja averbada nos termos do § 7º deste artigo;
III - vinte por cento, na propriedade rural situada em área de floresta ou outras formas de vegetação nativa localizada nas demais regiões do País; e
IV - vinte por cento, na propriedade rural em área de campos gerais localizada em qualquer região do País.
§ 1º - O percentual de reserva legal na propriedade situada em área de floresta e cerrado será definido considerando separadamente os índices contidos nos incisos I e II deste artigo.
§ 2º - A vegetação da reserva legal não pode ser suprimida, podendo apenas ser utilizada sob regime de manejo florestal sustentável, de acordo com princípios e critérios técnicos e científicos estabelecidos no regulamento, ressalvadas as hipóteses previstas no § 3º deste artigo, sem prejuízo das demais legislações específicas.
§ 3º - Para cumprimento da manutenção ou compensação da área de reserva legal em pequena propriedade ou posse rural familiar, podem ser computados os plantios de árvores frutíferas ornamentais ou industriais, compostos por espécies exóticas, cultivadas em sistema intercalar ou em consórcio com espécies nativas.
§ 4º - A localização da reserva legal deve ser aprovada pelo órgão ambiental estadual competente ou, mediante convênio, pelo órgão ambiental municipal ou outra instituição devidamente habilitada, devendo ser considerados, no processo de aprovação, a função social da propriedade, e os seguintes critérios e instrumentos, quando houver:
I - o plano de bacia hidrográfica;
II - o plano diretor municipal;
III - o zoneamento ecológico-econômico;
IV - outras categorias de zoneamento ambiental; e
V - a proximidade com outra Reserva Legal, Área de Preservação Permanente, unidade de conservação ou outra área legalmente protegida.
§ 5º - O Poder Executivo, se for indicado pelo Zoneamento Ecológico Econômico - ZEE e pelo Zoneamento Agrícola, ouvidos o CONAMA, o Ministério do Meio Ambiente e o Ministério da Agricultura e do Abastecimento poderá:
I - reduzir, para fins de recomposição, a reserva legal, na Amazônia Legal, para até cinqüenta por cento da propriedade, excluídas, em qualquer caso, as Áreas de Preservação Permanente, os ecótonos, os sítios e ecossistemas especialmente protegidos, os locais de expressiva biodiversidade e os corredores ecológicos; e
II - ampliar as áreas de reserva legal, em até cinqüenta por cento dos índices previstos neste Código, em todo o território nacional.
§ 6º - Será admitido, pelo órgão ambiental competente, o cômputo das áreas relativas à vegetação nativa existente em área de preservação permanente no cálculo do percentual de reserva legal, desde que não implique em conversão de novas áreas para o uso alternativo do solo, e quando a soma da vegetação nativa em área de preservação permanente e reserva legal exceder a:
I - oitenta por cento da propriedade rural localizada na Amazônia Legal;
II - cinqüenta por cento da propriedade rural localizada nas demais regiões do País; e
III - vinte e cinco por cento da pequena propriedade definida pelas alíneas ‘b’ e ‘c’ do inciso I do § 2º do art. 1º.
§ 7º - O regime de uso da área de preservação permanente não se altera na hipótese prevista no § 6º.
§ 8º - A área de reserva legal deve ser averbada à margem da inscrição de matrícula do imóvel, no registro de imóveis competente, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, de desmembramento ou de retificação da área, com as exceções previstas neste Código.
§ 9º - A averbação da reserva legal da pequena propriedade ou posse rural familiar é gratuita, devendo o Poder Público prestar apoio técnico e jurídico, quando necessário.
§ 10 - Na posse, a reserva legal é assegurada por Termo de Ajustamento de Conduta, firmado pelo possuidor com o órgão ambiental estadual ou federal competente, com força de título executivo e contendo, no mínimo, a localização da reserva legal, as suas características ecológicas básicas e a proibição de supressão de sua vegetação, aplicando-se, no que couber, as mesmas disposições previstas neste Código para a propriedade rural.
§ 11 - Poderá ser instituída reserva legal em regime de condomínio entre mais de uma propriedade, respeitado o percentual legal em relação a cada imóvel, mediante a aprovação do órgão ambiental estadual competente e as devidas averbações referentes a todos os imóveis envolvidos.” (grifos nossos)
Reserva Legal, portanto, como nos diz o caput do artigo, é uma área a ser mantida com floresta ou vegetação nativa na propriedade rural, onde é proibido o corte raso da vegetação e é exigida quando o proprietário for suprimir essa vegetação, para a exploração do imóvel com a atividade agropecuária ou extrativista. A manutenção desta área é obrigatória em cada propriedade rural, correspondendo a um percentual que varia, dependendo de cada região. Em Minas Gerais, o percentual mínimo é de 20% da propriedade.
O verbo manter, em destaque, nos dá a entender que já exista no local uma floresta ou vegetação nativa, e o verbo suprimir, também em destaque, nós dá a entender que vai ser cortada ou eliminada uma parte dessa floresta ou vegetação nativa.
A floresta ou vegetação nativa correspondente à Reserva Legal não é criada, mas sim mantida, e a averbação da Reserva Legal é exigida quando for ser suprimida a floresta ou vegetação nativa existentes no imóvel.
O caput do artigo nos fala ainda de “florestas e outras formas de vegetação nativa, ressalvadas as situadas em área de preservação permanente, assim como aquelas não sujeitas ao regime de utilização limitada ou objeto de legislação específica.” As Áreas de Preservação Permanente já foram por nós estudadas. Já as florestas sujeitas ao regime de utilização limitada, são as matas situadas em áreas de inclinação entre 25 e 45 graus, só sendo nelas tolerada a extração de toros, quando em regime de utilização racional. Florestas, objeto de legislação específica, são as áreas também de preservação, delimitadas pelos Parques Nacionais, Estaduais ou Municipais, as de Reservas Biológicas, Reservas Ecológicas, Estações Ecológicas, Florestas Nacionais, Estaduais e Municipais, Áreas de Proteção Ambiental, Áreas de Relevante Interesse Ecológico e Reservas Extrativistas, assim definidas por lei. Existem ainda as Reservas Particulares do Patrimônio Natural, que são florestas particulares gravadas com perpetuidade pelos seus proprietários, desde que verificada a existência de interesse público pela autoridade florestal.
Observe-se que o caput do artigo 16, acima transcrito, trata do caso de restrição imposta ao proprietário do terreno rural que pretenda suprimir floresta ou vegetação nativa existentes no imóvel. Analisando minuciosamente o artigo 16, vemos que a intenção do legislador, com o texto, é atingir somente aquele proprietário que pretenda explorar economicamente o imóvel rural que ainda possui no estado in natura, e para que tal intenção se concretize, necessita ele suprimir as florestas ou outras formas de vegetação nativas ali existentes, para que possa dar ao imóvel rural a sua destinação natural, ou seja, tirando partido da sua propriedade com atividades de agricultura, pecuária, extrativista ou outras ligadas ao meio rural. O que se pretende é impor limitação administrativa ao uso dessas áreas ainda in natura, não podendo o titular da propriedade simplesmente extingui-las na sua totalidade, mas podendo os mesmos, nessas áreas, fazer a supressão, cortando uma parte e conservando outra, no mínimo 20% de toda a propriedade.
E qual é o momento da exigibilidade da Reserva Legal? É o que analisaremos a seguir.
A Reserva Legal é condição para a atividade de supressão da floresta ou de vegetação nativa existentes no imóvel. Não havendo supressão da floresta ou de vegetação nativa existentes no imóvel, não se pretendendo desmatar, não há que se exigir a delimitação da Reserva Legal, até porque, como corolário, toda a propriedade estará automaticamente intacta. Isso é muito importante. Se não vai haver supressão, estará tudo preservado. Toda a floresta ou a vegetação nativa estará preservada, pois, para haver supressão, é necessária a autorização do órgão florestal, e, aí sim, neste momento, promove-se a delimitação da Reserva Legal.
Para fazer a delimitação da Reserva Legal, quando o interessado desejar fazer supressão de floresta ou vegetação nativa existentes, deverá ele se dirigir à autoridade florestal, no caso de Minas Gerais, ao Instituto Estadual de Florestas - IEF, munido com planta ou croquis da sua propriedade rural, e formar um processo de aprovação. O órgão ambiental, analisando com os critérios e instrumentos definidos em lei, depois de feita a vistoria na área a ser desmatada, localiza e define a Área da Reserva Legal na propriedade, emitindo um documento, chamado Termo de Preservação de Florestas. Nesse momento, o interessado ainda não pode fazer a supressão da mata. Com o Termo de Preservação de Florestas em mãos, o interessado se dirige ao Ofício de Registro Imobiliário da circunscrição do imóvel e solicita a sua averbação na respectiva matrícula. Só depois de feita a averbação, o interessado poderá promover a supressão da floresta ou outra forma de vegetação nativa existentes no imóvel e objeto da autorização.
Aí vemos que a autorização do órgão florestal não é suficiente para que o interessado promova o desmatamento da área. O interessado só poderá promover o desmatamento da área depois de averbado no Registro de Imóveis o Termo de Preservação de Florestas, é o que diz a lei no artigo 16, § 8º, da Medida Provisória n. 2.166-67, de 24 de agosto de 2001, que modifica o Código Florestal.
A emissão do Termo de Preservação de Florestas, pelo órgão florestal, não dá eficácia à Reserva Legal. Só a averbação no Registro de Imóveis lhe dá a eficácia legal. Só depois da averbação, é autorizada a supressão da mata. A averbação da Reserva Legal tem como única finalidade autorizar o interessado a desmatar o imóvel, e não é empecilho para o exercício de outros direitos sobre a propriedade imobiliária. Diz a lei (art. 16, § 8º citado) que, depois de averbada a Reserva Legal, não é permitida a sua alteração nos casos de transmissão a qualquer título, de desmembramento ou de retificação de área.
Desvirtuando o entendimento do texto legal, o § 8º do artigo 16, do Código Florestal, tem sido analisado separadamente do caput do artigo e aplicado como obstáculo nos registros de documentos, especialmente de transmissões, nos Cartórios de Registros de Imóveis.
O § 8º do artigo 16 não pode ser analisado separadamente no mundo jurídico. Ele complementa e explica a restrição, a limitação administrativa estabelecida no caput do artigo. A sua análise passa sistematicamente pela análise do caput do artigo, que trata, no caso, de supressão da mata. Seria um absurdo analisar somente o parágrafo e lhe dar aplicação literal. É inconcebível, sob a ótica da técnica de elaboração das leis, interpretar um parágrafo sem se ater ao objetivo do caput do artigo.
Não pode ser outro o entendimento claro e preciso do texto legal. É um simples exercício de hermenêutica jurídica. Depois de processado o pedido de desmatamento, pelo órgão florestal, é emitido o Termo de Preservação de Florestas que, depois de averbado no Registro de Imóveis, passa a dar existência à Reserva Legal, sendo que esta não pode ter a destinação alterada nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, nem modificada nos casos de desmembramento ou de retificação de área do imóvel matriculado, que acaba de receber a constrição da Reserva Legal.
A Reserva Legal não pode ser alterada nos casos de transmissão do imóvel a qualquer título, seja compra e venda, doação, incorporação ou outra transmissão qualquer, sejam as transmissões inter vivos ou causa mortis como herança ou legado. Também não pode ser alterada a Reserva Legal nos casos de desmembramento, em que é destacada uma parte do imóvel, ou de retificação de área, casos em que se corrige a metragem da área do imóvel na sua matrícula imobiliária, se esta não coincide com a área real.
Nota-se, com clareza, a essência da limitação administrativa. A limitação, nesse caso, consubstancia-se na restrição de só desmatar uma parte da propriedade. Se não existisse a limitação administrativa, poderia o interessado desmatar toda a propriedade rural. Como existe a limitação, só pode desmatar uma parte dela e preservar pelo menos 20%. A limitação administrativa da Reserva Legal só restringe o desmatamento e a alteração da destinação da parte gravada com a Reserva. Só deverá existir para desmatar e não para outros atos do proprietário no imóvel. Poderá ele utilizar o imóvel, arrendar, dar em garantia hipotecária, em usufruto, constituir bem de família, vender, doar e praticar quaisquer outros atos, próprios de quem tem o direito de propriedade, sem ser molestado por ninguém.
Uma questão poderia vir a ser chamada. Se as limitações administrativas não são registradas ou averbadas, por que então a lei determina a averbação da Reserva Legal na matrícula do imóvel?
Responde-se: Com o fim único de dar publicidade à Reserva, para que futuros adquirentes do imóvel rural saibam exatamente onde está localizada a Reserva Legal dentro do mesmo. Para que saibam os seus limites e confrontações, já que, em tese, a Reserva Legal poderia ser demarcada em qualquer lugar na propriedade. E a lei determina que, uma vez demarcada, fica vedada a alteração de sua destinação, inclusive nos casos de transmissão, a qualquer título, nos casos de desmembramento ou de retificação de área. Já na área de preservação permanente não é necessário o registro, pois a lei define claramente onde se localizam tais áreas, nas nascentes, margens de rios etc., como já vimos.
A lei não tem meias palavras ou palavras desperdiçadas. Quando quer exigir uma obrigação, o faz claramente. Vejamos o exemplo do próprio Código Florestal em exame, quando o seu artigo 37 diz o seguinte:
“Art. 37 - Não serão transcritos ou averbados no Registro Geral de Imóveis os atos de transmissão ‘inter vivos’ ou ‘causa mortis’, bem como a constituição de ônus reais, sobre imóveis da zona rural, sem a apresentação de certidão negativa de dívidas referentes a multas previstas nesta Lei ou nas leis estaduais supletivas, por decisão transitada em julgado.” (grifos nossos)
É claro o texto e, nesse caso, sim, de exigência de certidões negativas, existe a proibição de registro ou averbação dos atos de transmissão e oneração que cita.
Conclusão
Existem doutrinadores que entendem que as alterações trazidas ao Código Florestal, pela Lei n. 7.803, de 18 de julho de 1989 (que instituiu a Reserva Legal), estão eivadas de nulidade e de inconstitucionalidade. Entre eles se coloca o Professor Miguel Reale, em opinião consubstanciada em parecer oferecido à Sociedade Rural Brasileira, em 17 de abril de l998, e publicado, resumidamente, no Jornal O Estado de S. Paulo, de 15 de maio de 1999. Chega ele a concluir que: “Os proprietários devem se recusar a cumprir determinações do Ministério Público ou de autoridades administrativas baseados no § 2º (hoje § 8º) do art. 16 do Código Florestal, conforme acrescentado pela citada Lei 7.803/89, recorrendo ao Judiciário pelos meios adequados a cada caso, se e quando necessário.” Outros entendem que a Reserva Legal é praticamente um confisco, em parte, da propriedade particular, pois indisponibiliza a área e não lhe permite retorno econômico. Outros ainda defendem o zoneamento ecológico, o que, sem dúvida, iria dar maior caráter de racionalidade à política ambiental brasileira.
São posições que traduzem muito bem o quanto é controvertido o exame do tema sobre Reserva Legal. Não resta dúvida de que principalmente a Reserva Legal esvazia, em parte, o direito à plena propriedade. Mas essa é uma tendência moderna e, no Brasil, mais acentuada a partir da Constituição Federal de 1988.
Mas essa tendência não pode justificar inomináveis atentados à lei, que possam ser cometidos. Os limites da lei devem ser respeitados.
Assim, entendemos, em conclusão, s.m.j., que a averbação da
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