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IRIB representa o Brasil em encontro internacional sobre terras indígenas e meio ambiente
Leia as recomendações do VIII Seminário de Direito Registral realizado pelo Centro de Formação da AECIDem Santa Cruz de La Sierra, Bolívia.
Marcelo Augusto Santana de Melo, registrador imobiliário em Araçatuba, São Paulo, e diretor de meio ambiente do Irib, representou o instituto e o Brasil no VIII Seminário de Direito Registral sobre formas de propriedade e seu registro: terras indígenas e recursos naturais.
O evento, realizado de 24 a 26 de junho de 2008 no Centro de Formação da AECID – Agência Espanhola de Cooperação Internacional e Desenvolvimento, em Santa Cruz de La Sierra, na Bolívia, foi organizado pelo Colégio de Registradores da Espanha, sob a coordenação do registrador espanhol Francisco de Asis Palacios Criado.
No dia 24 de junho, o diretor do Irib apresentou seu trabalho em espanhol, que será publicado na próxima edição deste BE. A experiência brasileira foi destacada no evento, uma vez que o país possui delimitadas ou em estudo, cerca de 105.673.003 hectares de terras indígenas – quase duas vezes o tamanho da Espanha –, ou 12,41% do total do território brasileiro, o que configura uma área imensa e impressionante.
O registrador aproveitou a oportunidade para abordar também a experiência brasileira sobre a titulação de terras de comunidades quilombolas e, em ambos os casos, defendeu a publicidade registral.
O direito às terras dos povos indígenas e comunidades quilombolas está previsto na Constituição Federal do Brasil, contudo, muito pouco se escreveu sobre o tema, mormente sobre sua efetiva concretização. Embora as terras indígenas sejam consideradas bens públicos da União que possuem proteção legal – imprescritibilidade e inalienabilidade –, o legislador pátrio elegeu o Registro de Imóveis para conferir publicidade de ditas áreas, encerrando o procedimento administrativo. Com as comunidades quilombolas ocorreu o mesmo, com a diferença de que o poder público adquire as respectivas áreas para transferi-las para associações com fins específicos.
O BE IRIB já publicou trabalhos de Marcelo Augusto Santana de Melo sobre os temas apresentados no seminário. Confira:
- O Registro de Imóveis e as Terras tradicionalmente ocupadas pelos Índios
- As Comunidades Quilombolas e o Registro de Imóveis
Carta de recomendações
Leia a carta de recomendações do VIII Seminário de Direito Registral de Santa Cruz de La Sierra. O documento pode ser acessado no portal do CADRI e constitui uma referência importante para reflexão e debate, uma vez respeitada a legislação interna de cada país bem como as tradições, culturas e instituições indígenas. Subscreveram a carta os representantes da Bolívia, Brasil, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Chile, Honduras, México, Nicarágua, Panamá, Peru, República Dominicana e Espanha. (Tradução: Carlos Raul Vargas)
CARTA DE RECOMENDAÇÕES DO VIII SEMINÁRIO DE DIREITO REGISTRAL
Primeira seção: formas de propriedade e seu registro
1) Todo processo de urbanização e industrialização do território requer um marco jurídico adequado às exigências do desenvolvimento sustentável que inclua entre suas prioridades oferecer ao usuário uma informação registral veraz, eficiente, completa das atuações sobre o mesmo facilitando à Administração do país, no exercício de suas políticas públicas, controlar a ordem do território, sua legalidade assim como dotar de mais transparência a tendência da terra qualquer que seja a titularidade e as limitações administrativas, urbanísticas, jurídicas, meio ambientais que afetem tanto ao aproveitamento dos recursos naturais renováveis como não renováveis localizados no solo e no subsolo.
Para que a proteção dos direitos de propriedade sobre a terra seja mais eficiente, eles devem estar publicados e claramente determinados, independentemente de poderem ser ou não comercializados.
2) A necessidade de informação mais completa no tráfego jurídico imobiliário deriva da existência, por um lado, de mais diversificação de regimes jurídicos da propriedade com seus riscos mais peculiares e ostensíveis e o incremento, por outro lado, dos limites à extensão e exercício do direito de propriedade assim como das responsabilidades e obrigações meio ambientais que sua função social e ecológica (socioambiental) impõe ao titular.
Malgrado uma boa gestão territorial e o fortalecimento dos direitos de posse sobre a terra aconselham reforçar as instituições que têm por finalidade sua proteção, dotando-as dos recursos humanos, tecnológicos e regulação necessária para levar a cabo a mesma dando atenção especial à necessidade do georreferenciamento (bases gráficas) progressivo dos imóveis (prédio) registrais.
O uso das bases gráficas é indispensável para uma perfeita identificação das propriedades rurais, bem como para a proteção dos espaços públicos, sendo as bases registrais uma ferramenta idônea para as políticas públicas em matéria de meio ambiente.
Mediante o georreferenciamento, além de identificar de maneira objetiva os imóveis rurais, é possível associar a eles qualquer informação que incida na configuração do direito de propriedade: comunidades indígenas, meio ambiente, agricultura, vias pecuárias, costas, carreteiras, ferrovias, gasodutos, morros, etc.
Considera-se que são os registros jurídicos da propriedade imobiliária (de instrumentos públicos) devidamente modernizados e coordenados com outros órgãos da Administração a instituição idônea para oferecer essa informação ao usuário, aumentar realmente a segurança da propriedade da terra, garantir os direitos de propriedade e fazê-los cumprir, evitando com isso a expedição de títulos por instituições irregulares preexistentes (ou paralelas), o que perturba gravemente a segurança jurídica no tráfego imobiliário registral.
3) Entre outras finalidades, a modernização do Registro terá de pôr à disposição de quem tenha interesse legítimo no assunto não somente a situação jurídica do prédio, mas uma informação clara, precisa, atualizada que indique a titularidade do direito, a extensão dele sobre o solo, se for o caso, no subsolo, com as limitações que o afetem.
4) Para poder oferecer esse tipo de informação conforme o estabelecido nos itens anteriores é preciso que as limitações que recaiam sobre o prédio constem no fólio registral que lhe corresponda mediante notas marginais, anotações preventivas, inscrições segundo o grau de eficácia de que se queira dotá-las, o que dependerá sempre do indicado no documento público apresentado que será qualificado pelo registrador sob sua responsabilidade.
Igualmente aconselha-se que na inscrição bem como nas notas informativas, certidões expedidas pelos registradores imobiliários reservem um item às limitações ambientais para indicar sua existência ou não e, no caso de existir, informar qual o documento público que comunica a limitação, sua data, órgão, autoridade, duração, natureza da limitação, extensão territorial que abrange e os deveres e/ou que implica para o titular.
No entanto, os Registros imobiliários também poderão oferecer informação ambiental de caráter geral. Esses dados terão um valor informativo.
Segunda seção: terras indígenas e seu registro
A) Os direitos sobre as terras indígenas, por sua origem, destino, tipo, natureza jurídica, reconhecimento legislativo, características, índice elevado de conflituosidade, devem ser protegidos mediante a adoção de medidas que tenham por finalidade:
- A identificação dos territórios indígenas.
- Garantir a proteção efetiva de seus direitos de propriedade e posse.
- Salvaguardar os direitos indígenas para participar do manejo dos recursos e de sua conservação.
- Consultar as comunidades indígenas nas questões relativas ao desenvolvimento sustentável dos recursos naturais.
- Realizar estatísticas periódicas sobre a extensão de seus direitos territoriais e do grau de participação no desenvolvimento de energia elétrica, extração de madeira e outras gestões de recursos, entre eles a gestão de parques naturais e áreas protegidas.
- A identificação das comunidades indígenas.
- Prever o uso não autorizado das terras indígenas.
- Maior participação e capacitação dos membros das comunidades indígenas na delimitação física e jurídica das terras.
- Maior unidade legislativa nessa matéria.
B) Para o melhor cumprimento dos objetivos anteriormente expostos recomenda-se a inscrição dessas terras num Registro jurídico que tenha as seguintes características:
1) Sistema de organização
À vista das experiências comparadas propõe-se para sua organização um dos seguintes modelos:
A. Sistema de inscrição das terras indígenas no Registro da Propriedade.
B. Sistemas de Registro nacional de terras indígenas coordenado com o Registro da Propriedade.
2) Circunstâncias da inscrição
Na inscrição deverão ser expressas as seguintes circunstâncias:
1) Titulo de aquisição das terras indígenas.
2) Inscrição do título constitutivo e os estatutos da comunidade no Registro de Comunidades Indígenas aos efeitos de que lhes outorgue personalidade jurídica. Na inscrição se expressará: objeto, órgão de representação e administração.
3) Uma vez obtida a personalidade jurídica mediante inscrição no Registro, se poderá proceder à inscrição das terras no nome da comunidade indígena no Registro correspondente da propriedade.
4) A inscrição, portanto, seria praticada em favor do sujeito de direito territorial que é a unidade local, comunidade nativa, indicando seu nome, grupo étnico, família lingüística dos seus membros, região, província e destino, resolução setorial de sua titulação, número de título e ano de outorga, título que respalda legalmente seus direitos territoriais, área titulada, área cedida em uso e área total (soma das anteriores).
5) A propriedade comunitária inscreve-se em favor da comunidade indígena com o caráter de não-alienável, não transmissível, imprescritível, nem suscetível de gravames ou embargos de acordo com a legislação de terras indígenas vigentes. Nos respectivos títulos se fará constar a proibição de sua alienação.
6) O destino agropecuário, florestal, mineral, industrial ou artesanal segundo as normas previstas para cada comunidade.
7) Que as terras estejam situadas no lugar onde habita a comunidade, ou caso necessário nas zonas próximas mais aptas para seu desenvolvimento. Acreditar-se-á por certificação cadastral gráfica e descritiva onde apareça a extensão territorial devidamente georreferenciada e supervisada pelo organismo oficial indígena competente.
8) O uso individual das terras por cada um dos membros integrantes de acordo com o indicado nos estatutos.
9) Cânon ou beneficio econômico que tem que receber a comunidade indígena pela exploração dos recursos naturais, os quais ficarão afeitos à realização de obras comunais ou qualquer ação que implique um benefício coletivo e meio ambiental.
10) As inscrições praticadas sobre esse tipo de terras estarão isentas do pagamento de contribuições, honorários e taxas.
11) Nos casos excepcionais em que a legislação de cada país o tenha previsto, quando se autorizem atos de venda, doações, adjudicações, hipotecas ou qualquer outro ato que implique um deslocamento patrimonial far-se-á constar quando o indique a norma: a participação e consulta à comunidade indígena inscrita e a autorização em termos previstos por ela.
12) O previsto no item anterior será igualmente aplicável para a inscrição no Registro de Imóveis de concessões administrativas de minas, águas, etc., localizadas no solo ou subsolo de terras indígenas na qual deverá constar:
a) Os estudos de impacto ambiental.
b) Participação da organização indígena nos benefícios.
c) A salvaguarda dos direitos preferenciais da comunidade indígena.
d) As permissões e autorizações expedidas.
13) Com o objetivo de colaborar com a Administração do país, os registradores imobiliários, em caso de dúvida fundada sobre a adjudicação de terras em áreas cuja titularidade corresponda a comunidades indígenas, parques, reservas naturais, áreas protegidas, terrenos com conflito armado, áreas destinadas ao culto religioso, formação espontânea de núcleo de população, levarão a situação ao conhecimento do organismo legalmente previsto e representante da comunidade indígenas implicada. Ambos os organismos num prazo razoável comunicarão ao registrador, de comum acordo, a certificação da resolução aprobatória do acordo alcançado admitindo ou não à inscrição.
Terceira seção: proteção registral dos recursos naturais
A titularidade sobre concessões (minas, águas…) são direitos reais administrativos cuja finalidade é o aproveitamento dos recursos naturais no solo e subsolo.
O caráter limitado, não inesgotável dos recursos e a racionalização de seu aproveitamento aconselham a adoção de medidas de prevenção que tenham por objeto sua proteção mediante a publicidade de seus diferentes usos, aproveitamento, limitações a seu gozo e disposição, faculdade de excluir, necessidades quantitativas, supostos de contaminação, o que contribui para estabelecer um sistema transparente de atribuição do recurso e, portanto, a um uso mais racional do mesmo.
Para isso é necessário admitir a inscrição como imóvel especial das concessões administrativas no Registro de Imóveis competente previa inscrição no registro administrativo.
Procurar-se-á que na inscrição dessas concessões se expressem as circunstâncias gerais que lhes sejam aplicáveis, as especiais contidas no próprio titulo da concessão, a lei especial da concessão ou disposição administrativa que a outorgue, as obras executadas para o aproveitamento das mesmas, os encargos de condições gerais, particulares, facultativas, natureza, classe e denominação da concessão, condições da reversão, plano que determine sua localização física:longitude, largura e termos municipais que atravessa, declaração de impacto ambiental, permissões ou autorizações que tenham-se expedido. Praticar-se-á a inscrição principal no registro em que se localize sua maior extensão, realizando-se inscrições de referência no local ou locais que a atravessem.
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