Em 10/11/2016

Cédula de Crédito Bancário. Hipoteca. Penhora


Questão esclarece dúvida acerca de averbação de penhora em imóvel gravado com hipoteca cedular


Nesta edição do Boletim Eletrônico esclarecemos dúvida acerca de averbação de penhora em imóvel gravado com hipoteca cedular. Veja nosso posicionamento sobre o assunto:

Pergunta: Estando o imóvel gravado com hipoteca decorrente de Cédula de Crédito Bancário, é possível a averbação de penhora em favor de credor diverso?

Resposta: É polêmica a possibilidade de penhora sobre imóvel dado em hipoteca em Cédula de Crédito Bancário, sem a anuência do respectivo credor.

Trata-se de hipoteca comum, regida especialmente pela Lei n. 10.931/2004 (art. 26 e seguintes). Esse regramento não restringe, explicitamente, a incidência da penhora, ao contrário do que o fazem as normas aplicáveis às Cédulas de Crédito Rural, Industrial, Comercial, à Exportação, e afins (cf. arts. 59 do Decreto-lei nº 167/1967 e 51 do Decreto-lei nº 413/1969).

Justificamos a falta de harmonia no entendimento a ser dado a questão, pelo que temos no art. 30, da Lei n. 10.931/2004, que tem a seguinte redação: "A constituição de garantia da obrigação representada pela Cédula de Crédito Bancário é disciplinada por esta Lei, sendo aplicáveis as disposições da legislação comum ou especial que não forem com ela conflitantes". Surge aí a interpretação de que as restrições previstas naquela legislação das cédulas especiais também se aplicaria à CCB.

Em que pese posições diversas quanto a interpretação do citado art. 30, salvo melhor juízo, a nossa é de que não tem ela a força de descaracterizar a hipoteca da Lei 10.931, da forma comum para a especial, até mesmo pelo fato de que a CCB pode ser utilizada em qualquer modalidade de crédito (sendo ampla e comum, portanto). Entendemos, com isso, que uma restrição dessa ordem deve requerer previsão expressa e específica na legislação, o que parece-nos não ocorrer no caso.

Dentre as doutrinas contrárias ao entendimento aqui esposado, temos o de Tiago Machado Burtet, em obra publicada pelo IRIB intitulada “Coleção Cadernos IRIB – Cédulas de Crédito no Registro de Imóveis” – 1º edição, IRIB, São Paulo, 2016, p. 29-30, da qual destacamos o seguinte:

“18. Anuência do credor para alienação ou oneração de bem gravado por cédula

Ao aplicar legislações especiais, verifica-se que a venda dos bens vinculados às Cédulas de Crédito Rural e Industrial depende de prévia anuência do credor, por escrito (arts. 59 do Decreto-lei nº 167/1967 e 51 do Decreto-lei nº 413/1969).

Neste sentido foi o julgamento da Apelação Cível número 000.267.476-0/00, da 8ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, contendo a ementa com o seguinte teor:

‘SUSCITAÇÃO DÚVIDA - IMÓVEL GRAVADO COM HIPOTECA - CÉDULA DE CRÉDITO RURAL - DEC-LEI N.º 167/67 - ALIENAÇÃO - PRÉVIA ANUÊNCIA DO CREDOR. Consoante regra do art. 59, do Decreto-lei 167 de 14.02.1967, a venda dos bens apenhados ou hipotecados pela cédula de crédito rural depende de prévia anuência do credor, por escrito.’

E da Apelação Cível nº 114-6/2, do Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, órgão judiciário do qual se tem conhecimento que mais aprecia matérias registrais no Brasil, negando o acesso de uma penhora ao Álbum Imobiliário, por nele já constarem registradas Cédulas de Crédito Comercial e Industrial:

‘REGISTRO DE IMÓVEIS – Dúvida – Registro de penhora – Impossibilidade, diante de prévios registros de hipotecas constituídas por cédulas de crédito comercial e cédulas de crédito industrial – Inteligência do artigo 5º da Lei nº 6.840/80 e do artigo 57 do Decreto-lei nº 413/69.’

Como se vê, tais regras se aplicam às Cédulas de Crédito à Exportação, Comercial e Bancário (art. 3º da Lei nº 6.313/1975, art. 5º da Lei nº 6.840/1980, e arts. 30 e 34, §2º, da Lei nº 10.931/2004).

É de se ponderar que, no tocante à Cédula de Crédito Bancário, não há regra precisa sobre a anuência do credor. Todavia, por uma interpretação sistemática, penso como acima informado, porque, se a anuência é obrigatória para alterar, retirar, deslocar ou destruir, ou alterar a destinação do bem gravado (art. 34, §2º, da Lei nº 10.931/2004), com igual razão é de se exigir a anuência para a alienação. Se a anuência é necessária para ato de importância menor, com maior ênfase ela deverá ser exigida para um ato de superior envergadura, como uma alienação. O legislador não exigiria a anuência do credor para situações de menor importância e autorizaria a alienação do bem gravado. Se para o menor [alterar (inclusive a destinação), retirar, deslocar ou destruir o bem] exige-se a anuência, para o maior ela também parece ser imprescindível. Ademais, o art. 30 da Lei nº 10.931/2004, aplicável às CCBs, remete para a aplicação das normas especiais relativas às cédulas e aos gravames, nas quais se verifica a necessidade de se alcançar a autorização do credor que consta da matrícula, para que seja possível registrar novo gravame a favor de terceiro. Fundamento minha posição com respaldo na simetria de tratamento a estes títulos: por qual razão exige-se a anuência do credor em todas as cédulas, salvo na CCB? O espírito é o mesmo, oportunizar maior proteção aos credores que se utilizam destes instrumentos de concessão de crédito.

O entendimento em sentido contrário vislumbra a remessa à aplicação da legislação comum (o mesmo art. 30 da Lei nº 10.931/2004), para a qual está dispensada tal anuência. O entendimento que irá prevalecer só a jurisprudência dirá.”

Para maior aprofundamento na questão, sugerimos a leitura da obra indicada, cuja íntegra poderá ser acessada diretamente da página eletrônica do IRIB por meio do link http://www.irib.org.br/publicacoes/CadernoIrib9/pdf.pdf. (acesso em 1º/11/2016).

Em se aproveitando os ensinamentos de Tiago Machado, como aqui exposto, que nos dirige pela impossibilidade de ingresso da penhora sobre bens hipotecados em CCB, com base aí na legislação que temos a cuidar de outras Cédulas de Crédito, como aqui já reportadas, temos ainda a observar quatro exceções para que tal penhora possa ser recepcionada pelo Registrador Imobiliário, ou sejam:

a)      – quando decorrentes de procedimento que cobra dívida trabalhista - decursiva de feitos trabalhistas, com previsão expressa no art. 186, do Código Tributário Nacional, que da sustentação a preferência desse crédito sobre qualquer outro. Ver também REsp 55196RJ e REsp 236553SP.

b)      – quando a penhora advir de autos de dívida fiscal - como textualmente prevê o art. 184, do Código Tributário Nacional, que inclui entre os bens sujeitos à penhora para garantia de dívidas dessa natureza os bens gravados por ônus real ou com a cláusula de inalienabilidade ou impenhorabilidade. Ver também RExt 103169SP,  REsp 471899SP,  REsp 563033SP,  REsp 318883SP,  REsp 268641SP,  REsp 309853SP,  REsp 575590RS e  REsp 672029RS.

c)      – quando a penhora tiver origem em autos que se reportam a dívida condominial – cuida-se de outra exceção para a penhora ora em trato, sustentada em decisão proferida pelo Conselho Superior da Magistratura do Estado de São Paulo, nos autos de Ap. Cível 223-6/0, exarada em procedimento de Dúvida originária do 10o. Oficial de Registro de Imóveis da Capital, objeto de publicação no Diário Oficial da Justiça de 7 de dezembro de 2004, a qual, além de outros argumentos, assim se fez por justificar: “A dívida condominial é despesa feita por terceiro (o condomínio) para a conservação e manutenção da própria coisa e a ela se incorpora como dívida “propter rem”, gozando de privilégio especial de preferência frente ao crédito hipotecário”; e

d)      – quando tivermos como já vencida a cédula onde foi negociada a hipoteca do bem - de acordo com o decidido pela egrégia Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo, no procedimento de número 2009/139095, em data de 18 de março de 2010, e publicação feita no Diário Oficial da Justiça de 9 de abril do referido ano, que teve como envolvido o Registro de Imóveis da comarca de Garça, quando tivermos cédula de crédito já vencida, podemos dar regular ingresso de uma penhora no sistema registral, mesmo que originária de procedimento judicial que cuida de dívidas comuns, que não as anteriormente excepcionadas, com a observação de que, neste caso, não podemos admitir nos assentos registrários, eventual Carta de Arrematação ou de Adjudicação, ou título que venha a indicar a Alienação em trato no art. 880, do atual CPC (685-C, do CPC de 1973), enquanto não efetivamente cancelada a hipoteca em questão, o que, diga-se de passagem, é admitido para as demais exceções aqui já reportadas. 

Com o até aqui exposto, caberá ao registrador decidir a respeito, considerando sua independência jurídica.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Seleção: Consultoria do IRIB

Fonte: Base de dados do IRIB Responde

Comnetários: Equipe de revisores técnicos



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