Em 13/09/2018

Clipping – Jornal do Brasil - Acabou-se o que era verde na Gávea (RJ)


Moradores descobrem que área vizinha a prédio tem dono e terá 37 árvores abatidas para construção de mansão


 
Um imbróglio ambiental mobiliza moradores de um prédio da bucólica Rua Major Rubens Vaz, na Gávea, Zona Sul. No endereço escolhido como morada pela atriz Cissa Guimarães — primeira a chegar —, pelo músico Dado Villa-Lobos, do antológico Legião Urbana; pelo pianista Toca de Lamare; e pela atriz Glaucia Rodrigues, ambiência escolhida a dedo pelo antigo proprietário, todos sempre desfrutaram de um lote contíguo ao prédio, que consideravam uma área verde para chamar de sua. Ali, pontificam um abacateiro de mais de 15m, uma frondosa mangueira, a palmeira imperial sob a qual Cissa depositou as cinzas de seu filho, Rafael, falecido há oito anos, e um frondoso bambuzal que contribui para conter a encosta íngreme. Eles acabam de descobrir que o terreno tem dono, e que já mandou marcar o abate de 37 árvores para construir no local.
 
A situação se complica pela própria história do imóvel. Na realidade, existem ali dois prédios contíguos dos anos 50, estilo Corbusier, que pertenciam a dois irmãos já falecidos, Manoel Antunes, que nunca morou lá, e Margarida Xavier, que controlava tudo com amorosa mão de ferro. Quando ficou viúva, há cerca de três anos, ela repassou o controle dos alugueis dos dez apartamentos de um dos edifícios aos filhos, Fernando e Maria Helena, que se casou com Ricardo Salim, e Maria Anita, casada com Fernando Guimarães. Os dois genros de Dona Margarida estariam no centro de toda essa celeuma.
 
Na realidade, os dois imóveis são administrados por um mesmo condomínio, que partilha a segurança, entre outros itens. Existem ainda outros três lotes na frente dos prédios: uma servidão e dois terrenos de área verde, totalizando 1.100 m². A aquisição mais recente dos condôminos foi o mobiliário de um parquinho para os lotes em questão. Sempre houve uma relação cordial entre a vizinhança, que cuidava da área verde providenciando podas, removendo abelhas e usufruindo da população de tucanos, macacos e uma infinidade de passarinhos, até que Luiz Antônio Vieira, defensor público, marido da atriz Gláucia Rodrigues, descobriu que o IPTU que sempre pagou não incluía o terreno em questão.
 
Os moradores investigaram e revelaram, então, que Salim e Guimarães pagaram o IPTU por todos esses anos, sem compartilhar essa informação com os demais condôminos, e entraram com um processo de usucapião que cita Patrícia, filha do falecido Manoel Antunes, um dos irmãos antigos proprietários dos imóveis. “Oferecemos ressarci-los por estes valores, porém, o que nos foi oferecido foi a compra do terreno”, relata Vieira.
 
Os moradores obtiveram informações desencontradas. Um dos boatos é de que haveria um projeto de construção de um espigão com 20 andares no local. Ricardo Salim confirma o plano de se construir um imóvel no local, mas nega que seja um prédio. “O lote não é área de condomínio, ninguém ali pagou IPTU, o que venho fazendo há 50 anos. É uma propriedade particular da minha mulher, fica na Gávea, não se trata de uma reserva biológica na Patagônia. Vai ser construída uma casa no terreno”, disse Salim ao JORNAL DO BRASIL, sem entrar em detalhes sobre o futuro imóvel. Sobre a oferta dos moradores de ressarcir o IPTU pago pelo lote, Salim reagiu: “Eles que contratem um perito para fazer a conta”.
 
Embora os vizinhos, amigos de Cissa Guimarães, informem que ela está em viagem de férias, em Portugal, e já teria alugado um apartamento em São Conrado para não ter o desgosto de acompanhar o desmatamento, a atriz não confirmou a informação. Ela disse ao JB que volta ao Brasil amanhã e prefere não se aprofundar no assunto, antes de saber melhor em que pé está a situação. “Eles têm direito de entrar com o usucapião, tanto quanto nós. Não estão errados. Todo mundo luta pelo que quer. Quero entender melhor para não me posicionar de maneira leviana”, disse a atriz.
 
Leite derramado
A essas alturas, porém, a reação dos moradores, motivada pela mudança de atitude em relação à antiga cordialidade de Dona Margarida, parece ser leite derramado. A secretaria municipal de Urbanismo informa que já foi licenciada a construção de uma casa unifamiliar com subsolo, térreo e dois pavimentos no lote 90 da Rua das Acácias, endereço onde se localiza a área verde. Já a subsecretaria de Meio Ambiente, vinculada à Secretaria de Conservação e Meio Ambiente, confirma que foi emitida em maio autorização para a remoção de 37 árvores, “a maioria exótica”, como o abacateiro de mais de 15m, “porém, haverá medida compensatória de plantio de 362 mudas de espécies de mata atlântica, em locais próximos ou bairros adjacentes”.
 
Fonte: Jornal do Brasil
 


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