COAF – Notários e Registradores no combate ao crime – Aspectos práticos, problemas mais comuns – repensando estratégias
Confira abaixo entrevista concedida por Madalena Teixeira* ao Boletim do IRIB.
O curso “COAF – Notários e Registradores no combate ao crime – Aspectos práticos, problemas mais comuns – repensando estratégias”, promovido em parceria entre a Corregedoria Nacional de Justiça do Conselho Nacional de Justiça e a Escola Paulista da Magistratura (EPM), será realizado virtualmente nos dias 26 a 28/04/2021, a partir das 9h30.
Nesta edição, o Boletim do IRIB entrevistou Madalena Teixeira, que apresentará palestra intitulada “A experiência internacional do combate à lavagem de dinheiro”, no dia 26/04/2021, às 11h30. Confira a íntegra da entrevista:
Boletim do IRIB (BE): Qual a importância do tema para os registradores portugueses?
Madalena Teixeira (MT): O combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo é um desígnio que a todos convoca, porquanto está em causa a salvaguarda de bens jurídicos coletivos de primeira grandeza, como são a paz pública e um desenvolvimento económico “saudável” e devidamente ajustado aos preceitos do Estado de Direito.
Sabendo-se que as transações imobiliárias são comumente consideradas como setor de risco, pela frequência com que os esquemas contratuais inerentes são utilizados para efeitos de branqueamento de capitais, é manifesto o valor que as instituições registais podem acrescentar, quer no plano preventivo do branqueamento de capitais, quer no plano repressivo da privação económica, com o registo da apreensão e da perda de bens a favor do Estado.
Para os registradores portugueses, a relevância do tema coloca-se, pois, numa dimensão ético-jurídica, dado que nos encontramos ao serviço exclusivo da comunidade e dos cidadãos, mas também numa perspetiva de dever funcional, dado que a lei nos atribui expressamente a qualidade de entidades auxiliares na prevenção e combate ao branqueamento de capitais e ao financiamento do terrorismo (CBCFT) e nos outorga um conjunto de deveres, de cujo rigoroso cumprimento dependerá alguma parcela de eficácia nesta matéria.
Relativamente aos deveres atribuídos aos registradores pela Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo, vale ainda a pena assinalar que, a despeito de toda a assessoria que vendo sendo prestada pelo Instituto dos Registos e do Notariado (IRN), não está legalmente prevista qualquer intermediação ou análise preliminar a cargo da entidade de tutela, pelo que é ao registrador que compete aferir, desde logo, dos indicadores de suspeita de prática do crime de branqueamento de capitais e assumir os deveres e a iniciativa em matéria de CBCFT.
BE: Há protocolos de colaboração entre os registradores da UE a respeito do tema da lavagem de dinheiro e combate ao terrorismo?
MT: Naturalmente, a consecução dos objetivos legais em matéria de CBCFT depende, em muito, de uma operacionalização em rede e de uma articulação de esforços entre as várias entidades nacionais, europeias e internacionais.
No plano da cooperação internacional, a articulação cabe, antes de mais, à Unidade de Informação Financeira (UIF), que é a entidade com competências de centralização, organização e difusão da informação e que, igualmente, assegura a cooperação com as suas congéneres internacionais, seguindo, para o efeito as regras definidas na Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo e nos instrumentos da União Europeia em matéria de partilha da informação, bem como os princípios e o padrão de conduta definidos no âmbito do Grupo de Egmont (do qual o COAF também faz parte).
No âmbito da atuação pertinente aos serviços de registo, a cooperação com entidades congéneres pertencerá ao IRN, a quem está legalmente atribuída a competência para a celebração de protocolos, acordos ou outros instrumentos jurídicos de colaboração, pelo que, em princípio, os registradores não poderão celebrar protocolos de colaboração direta com outros registradores da UE.
Não obstante, na Lei de Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo, encontra-se definido um bloco de deveres gerais e especiais de cooperação, ao qual o IRN, enquanto entidade equiparada a entidade sectorial e na parte pertinente ao seu raio de missão, estará também vinculado, que permite desenvolver um intercâmbio de informação favorável à prossecução dos objetivos europeus e internacionais em matéria de CBCFT.
Quanto aos pedidos de colaboração de autoridade de registo estrangeira em matéria de CBCFT, diretamente enviados aos serviços de registo, é também exigida uma coordenação prévia da resposta por parte do IRN, atentas as funções que desempenha enquanto membro da Comissão de Coordenação das Políticas de Prevenção e Combate ao Branqueamento de Capitais e ao Financiamento do Terrorismo e o interesse numa concertação acerca dos termos e do alcance da cooperação requisitada.
BE: Os registradores portugueses desenvolveram alguma ferramenta tecnológica de apoio às atividades?
MT: Neste plano de atividade, ainda não foi implementada uma infraestrutura tecnológica que incorpore todo o iter operacional e procedimental relativo ao trabalho desenvolvido pelas várias entidades no âmbito da prevenção e do CBCFT, contudo, nas comunicações entre estas entidades, bem como no processamento e tratamento da informação, não deixa de se privilegiar o recurso aos meios tecnológicos disponíveis, estando, aliás, previsto que todas as comunicações a cargo dos registradores sejam obrigatoriamente feitas por via eletrónica.
BE: Algum comentário que julgar pertinente e interessante.
MT: Na estratégia de combate ao BCFT, merece especial destaque a criação do Registo Central do Beneficiário Efetivo (RCBE), que tem por escopo o reforço da transparência e o bloqueio da utilização abusiva de determinados instrumentos jurídicos para ocultamento da identidade de agentes de atividades ilícitas especialmente danosas, como são o branqueamento de capitais e o financiamento do terrorismo.
Na mesma linha estratégica, cabe também referir o sistema de interconexão dos registos dos beneficiários efetivos (BORIS), que visa interligar os registos centrais nacionais dos beneficiários efetivos e o Portal Europeu da Justiça, e que, através de uma plataforma central europeia (que serve de serviço central de pesquisa), disponibiliza todas as informações relacionadas com os beneficiários efetivos, tendo em vista degradar os expedientes de dissimulação de identidade de pessoas singulares e robustecer a integridade do sistema financeiro.
Na esteira argumentativa do direito da União Europeia, a prevenção do branqueamento de capitais e do financiamento do terrorismo só poderá ser eficaz, se os esforços para combater estas atividades ilícitas forem envidados à escala mundial e se todo o sistema for hostil aos criminosos que procuram proteger as suas finanças através de estruturas não transparentes.
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* MADALENA TEIXEIRA é Conselheira do Instituto dos Registos e do Notariado (IRN) em Portugal.
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