Em 18/12/2015
Incra recebe posse de imóveis para primeira titulação de território quilombola no Ceará
A comunidade na região do Cariri é a primeira remanescente de quilombos no estado a receber a posse de suas terras
A Superintendência Regional do Incra no Ceará recebeu a posse de dois imóveis rurais que serão destinados à criação do território quilombola de Sítio Arruda, no município cearense de Araripe – localizado no extremo Sul do estado e distante cerca 530 km da capital Fortaleza -. A comunidade na região do Cariri é a primeira remanescente de quilombos no estado a receber a posse de suas terras. O ato de transmissão de domínio das áreas ao Incra foi realizado na comunidade, no dia 15/12.
A comunidade lotou uma das seis salas da escola padrão do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), em construção no local, para presenciar o oficial de justiça entregar formalmente a posse da área ao Incra/CE, concluindo processos de desapropriação em benefício de 34 famílias quilombolas, futuras detentoras de 334 hectares do município.
O fato histórico de ser a primeira comunidade a receber suas terras foi destacada pelo jovem José Lourenço, escolhido orador de Sítio Arruda. “A comunidade se orgulha por ter recebido esse título, de ser a primeira comunidade beneficiada com a posse de suas terras no Ceará”, disse, ressaltando ainda o trabalho da autarquia. “Desde 2010 que o Incra luta para realizar nosso sonho e hoje ele está realizado”.
Representantes das famílias assinaram como testemunhas o Auto de Imissão de Posse, documento que formaliza a destinação das áreas para a autarquia. Segundo o superintendente do Incra/CE, Roberto Gomes, o ato pode contribuir para fortalecer a regularização de territórios quilombolas no Ceará, a partir da percepção de outras comunidades acerca do momento histórico vivido em Sítio Arruda. “Esse momento tem uma força concreta inimaginável e, com certeza, outras comunidades vão olhar para Sítio Arruda e dizer ‘é possível`, nosso povo negro pode conquistar terra”, disse.
Responsável pelo estudo antropológico que reconheceu as famílias como remanescentes de quilombos, José da Guia Marques, relembrou as origens de Sítio Arruda. Segundo ele, a comunidade é formada a partir de três famílias negras, originadas de escravos vindos do município de Cabrobó, em Pernambuco, e da Chapada do Araripe e região dos Inhamuns – estas últimas no Ceará mesmo.
Após Abolição da Escravatura – por meio da Lei Imperial n.º 3.353, mais conhecida como Lei Áurea, sancionada em 13 de maio de 1888 -, as famílias fixaram morada em uma localidade no município de Araripe , onde trabalhavam em uma propriedade rural vizinha sob condição de semi-escravidão. Com a venda da propriedade e das terras onde vivia, a comunidade migrou para Sítio Arruda, pequena área adquirida pela comunidade na década de 80. “Com os dois imóveis desapropriados, onde as famílias costumavam trabalhar, a comunidade agora tem uma área maior para se reproduzir, morar e produzir”, disse.
O orgulho da comunidade no resgate de sua história esteve exposta na mesa de autoridades. O Certificado de Autorreconhecimento emitido pela Fundação Palmares, preservado em uma moldura, dividia espaço na mesa com o Relatório de Identificação e Delimitação do Território (RTID), produzido pelo Incra/CE para identificar a comunidade quilombola e o tamanho de seu território, além de trabalho fotográfico produzido com apoio da Prefeitura Municipal local com imagens da comunidade e biografias das matriarcas e patriarcas de Sítio Arruda.
O futuro
Em um primeiro momento, as famílias vão receber um Contrato de Concessão de Direito Real de Uso (CCDRU), que autoriza a comunidade a fazer uso das suas terras. O passo seguinte é a entrega do título de propriedade coletivo do território. O Incra/CE pretende orientar as famílias no estágio inicial de instalação no território, além de discutir com parceiros projetos para desenvolvimento social e econômico dos quilombolas. “Vamos fazer uma oficina de gestão e planejamento com vocês”, disse Gomes.
A cerimônia de imissão de posse na comunidade contou com a presença das principais autoridades do município, representantes do governo estadual, da igreja, de organizações não governamentais, trabalhadores rurais e comunidades quilombolas da região.
Participaram do evento o prefeito eleito Giovani Guedes, o vereador João de Vilma, representando o prefeito interino, a ex-ouvidora agrária do Incra/CE e representante do Governo do Estado, Íris Tavares, da coordenadoria de política de promoção racial do Governo do Estado, Raimundo Silva (Sula), o presidente da Câmara Municipal de Araripe, Roberto Guedes, Verônica Neuma, do Grupo de Valorização Negra do Cariri (Grunec), além de Manoel Leandro do Nascimento, da Cáritas Diocesano, Alda Ferreira, da Associação Cristã de Base, e o presidente do Sindicato Rural de Araripe, Pedro Rocha.
Portaria de Reconhecimento
Durante o evento o Incra/CE entregou ao representante da comunidade quilombola de Serra das Chagas, João Damião do Nascimento, uma cópia da Portaria de Reconhecimento da comunidade, publicado pelo Incra no Diário Oficial da União do último dia 30 de novembro. A Portaria beneficia 32 famílias de Salitre, município vizinho a Araripe.
Além do Reconhecimento de Serra das Chagas, áreas dos territórios quilombolas de Três Irmãos e Brutos, localizadas nos municípios de Croatá e Tamboril, foram decretadas pela presidente Dilma Roussef como passíveis de desapropriação no último dia 20 de novembro, Dia da Consciência Negra. “Estivemos nas comunidades de Brutos e Três Irmãos para entregar os decretos, com ampla participação do poder público e de organizações civis dos municípios”, destacou Gomes.
Fonte: Incra
Em 17.12.2015
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