MPF/MG: bloqueados bens de empresa responsável por obras no parque da Serra da Canastra
Obras causaram danos ambientais tão graves, que a visitação ao local deve ser proibida
O Ministério Público Federal em Minas Gerais (MPF/MG) obteve ordem judicial que determinou o bloqueio de bens da empresa GPO-Gestão em Projetos e Obras Ltda, assim como os de seus administradores José Bonifácio Pinto Júnior e Sávio Rubens Souza Andrade, para assegurar a recuperação de gravíssimos danos ambientais no Parque Nacional da Serra da Canastra.
A GPO foi contratada pela Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), empresa vinculada ao Ministério da Integração Nacional, para a execução de obras e serviços de recuperação e reforma de estradas e acessos no Parque da Canastra. As obras, orçadas em mais de R$ 51 milhões, tiveram início em maio de 2013 e foram suspensas poucos meses depois, no último bimestre daquele ano, deixando para trás o assoreamento de cursos dágua que alimentam a bacia do São Francisco, a poluição de águas que abastecem populações locais e a queda de barreiras e erosão do solo, entre outros danos ambientais.
“A interrupção, que, na verdade, constituiu verdadeiro abandono das obras, expôs de maneira drástica os inúmeros vícios construtivos: erros grosseiros, perceptíveis até mesmo para leigos, sobretudo nas dragagens e aterros, com descumprimento do projeto e de normas técnicas, além de intervenções visivelmente temerárias”, afirma o procurador da República Gustavo Henrique Oliveira, autor da ação cautelar [ação cautelar tem caráter preventivo e preparatório, para embasar futura ação civil pública] proposta no último dia 24 de março.
Na ação , o MPF pediu que a Justiça Federal expedisse mandado de busca e apreensão no canteiro de obras e no escritório da empresa, sediado no município de São Roque de Minas, para impedir o extravio de documentos e viabilizar tecnicamente a recuperação emergencial das obras por terceiros.
O juízo federal de Passos/MG concordou com o pedido e determinou a busca e apreensão de todos os documentos, mídias, equipamentos, computadores, discos rígidos e registros, especialmente o Diário de Obras, relacionados ao projeto de reforma da estrada. Ele explicou que a medida fez-se necessária, diante “da evidente recalcitrância da empresa GPO em franquear acesso aos mesmos, bem como os sólidos indícios de que, com o encerramento unilateral do contrato, urde-se uma blindagem dos arquivos que constituirão eventualmente o eixo das aferições de responsabilidade técnica, financeira e ambiental”.
Foi expedida também ordem judicial de bloqueio de bens da empresa e de seus administradores, com a suspensão de qualquer repasse de verbas federais à GPO. O depósito de eventuais créditos a que a empresa tenha direito em razão de contratos celebrados com o Poder Público federal deverá ser feito em juízo.
Segundo a decisão, “a indisponibilidade preventiva dos bens emerge como única garantia que tem a sociedade de que os prejuízos financeiros decorrentes de inexecução de contrato de tão elevada monta (cerca de cinqüenta milhões de reais), bem como as reparações dos danos ambientais, poderão ser levados a efeito a modo e prazo necessários – notadamente diante das diversas notícias de que a empresa já acumula débitos elevados com diversas empresas da região”.
Desídia - O histórico do caso demonstra o comportamento negligente da empresa na execução de um contrato milionário com recursos públicos.
O MPF relata que, menos de dois meses após o início das obras, a Codevasf já emitia relatório técnico apontando erros de execução do projeto, como taludes de corte e aterro sem os devidos direcionamento e apoio da equipe topográfica. Em reunião realizada em agosto de 2013, a empresa pública também se queixou do descumprimento, pela GPO, de obrigações contratuais, como a construção de um canteiro de obras aparelhado e de pátios para manutenção de máquinas, além de inúmeros outros problemas, como insuficiência da resistência do concreto utilizado pela empresa, insuficiência do grau de compactação dos aterros, má execução dos bueiros e desqualificação da equipe de técnicos em campo.
Após receber, no mês seguinte (setembro de 2013), notificação extrajudicial para correção das irregularidades, ao invés de acolhê-la, a GPO tentou emplacar aditivos contratuais, um deles de custo superior a 5,9 milhões de reais, que, se aceito, teria impacto multiplicador sobre todo o empreendimento.
Para o MPF, os aditivos tinham o objetivo apenas de dissimular os erros cometidos na execução das obras. A Codevasf indeferiu os aditivos, mas acabou acatando o pedido da empresa de suspensão das obras por 120 dias, com retorno previsto para março de 2014.
“O que se viu nos meses finais de 2013 e ao longo de todo o ano de 2014 foi a evidente desídia da GPO, que não tomou qualquer cuidado para evitar os danos ambientais na principal estrada do parque. Mesmo após autuação dos órgãos ambientais e por mais de 15 meses após a paralisação da obra, a empreiteira quedou-se inerte, deixando não só os danos se agravarem, como descumprindo seguidos compromissos de efetuar as devidas reparações. Nesse período, a despeito das insistentes tratativas, reuniões, prorrogações de prazos e concessões, a GPO não tomou nenhuma medida para contenção dos danos”, relata o procurador da República. “Esse comportamento contrasta com a notória capacidade econômica da empresa, evidenciada por suas vultosas doações eleitorais na campanha do ano passado”.
Parque fechado - Na ação, o MPF transcreve trecho de uma segunda notificação extrajudicial enviada pela Codevasf, na qual, além de apontar “falhas e vícios construtivos, inclusive na administração da obra”, informa que tais defeitos “culminaram na inviabilização do acesso ao Parque Nacional da Serra da Canastra, causando transtornos e prejuízos diretamente nos serviços de manutenção, monitoramento, proteção, visitação pública [.] impedindo o trânsito daqueles que dependem das entradas do Parque como acesso”.
A resposta da GPO à notificação extrajudicial foi a de que os serviços foram executados “dentro do mais alto padrão de qualidade”.
Mas não foi o que encontrou o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), que, em novembro de 2013, autuou e notificou a empresa a realizar reparos na estrada em virtude de determinados pontos críticos, entre eles, pontos de drenagem inacabados (a terra mal compactada estava sendo carreada para cursos dágua); aterros com compactação insuficiente (permitindo a erosão e risco à segurança das pessoas); alta declividade dos taludes e fragilidade do solo (causando quedas de barreiras) e grande quantidade de material causando assoreamento do rio do Peixe e do Córrego Estiva, responsável pelo abastecimento hídrico na cidade de São Roque de Minas. Os intensivos processos erosivos impactaram inclusive as populações de pato mergulhão, espécie de ave em extinção que somente se alimenta em ambiente de águas cristalinas.
Apesar disso, a empreiteira continuou afirmando que “sequer restou caracterizado a ocorrência de dano à unidade de conservação”, para, finalmente, em julho de 2014, um preposto da GPO reconhecer que sua equipe de campo “não estava correspondendo aos anseios da empresa referente ao padrão de qualidade que ela desenvolve em suas obras”.
O que parecia ser um sinal de que, finalmente, a empresa iria recuperar os danos ambientais, acabou frustrado. Passados oito meses daquela declaração, o ICMBio informou ao MPF que as obras continuavam abandonadas pela GPO e ainda alertou que o estado da via estava impedindo inclusive o combate a incêndios pelas viaturas de brigadistas, com graves avarias às viaturas utilizadas pelos técnicos do órgão de fiscalização ambiental.
A situação acabou levando, em janeiro de 2014, ao fechamento da visitação ao Parque Nacional da Serra da Canastra, gerando prejuízos também à economia local, que tem no ecoturismo sua principal fonte de renda. A prefeitura de São Roque de Minas, por exemplo, informou ao MPF que os hotéis e pousadas tiveram queda de 80% na ocupação de leitos.
No último dia 18 de março, a Codevasf resolveu rescindir unilateralmente o contrato com a GPO, o que motivou o MPF a ingressar com a ação cautelar para assegurar o resguardo de documentos que possam embasar futuro processo judicial.
Outro pedido feito pelo Ministério Público Federal e atendido pela Justiça Federal foi o de obrigar a Codevasf a adotar medidas emergenciais, para recuperar a trafegabilidade mínima da estrada principal do parque, de modo a estancar os danos ambientais que se agravam há quase dois anos. As obras deverão ser iniciadas no prazo de cinco dias e deverão observar as diretrizes técnicas indicadas pelo ICMBio.
A decisão judicial também autorizou a prefeitura de São Roque de Minas a recuperar, de maneira emergencial e segura, os acessos ao Parque Nacional, com possibilidade de futuro ressarcimento do que o município gastar com as obras.
(Ação Cautelar nº 995-57.2015.4.01.3804)
Fonte: MPF
Em 9.4.2015
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