Regularização Fundiária na Amazônia
Confira artigo do vice-presidente do IRIB para o Estado do Amazonas, Marcelo Lima Filho, publicado no blog Diário do Amazonas
Não deve faltar muito para que as manifestações recentemente havidas nos principais centros urbanos brasileiros desperte também o ímpeto dos que habitam os rincões da Amazônia. Contudo, no lugar de redução da tarifa de transporte público, segurança, saúde e educação, a pauta central ali há de ser a regularização fundiária. Melhor dizendo, a falta dela.
Oportuno relembrar a recente passagem do filósofo Roberto Mangabeira Unger pelo governo Lula, quando ocupou a Secretaria de Assuntos Estratégicos, cuja missão era elaborar um plano de desenvolvimento de longo prazo para o Brasil. Pensador dos mais respeitados no universo acadêmico americano, o ex-ministro se deu o trabalho de peregrinar por todos os estados da região mais cobiçada do planeta buscando entender a dinâmica econômica, os povos da floresta, as políticas públicas formuladas em Brasília que distam da realidade prática dos amazônidas bem como as inúmeras e em geral pouco frutíferas políticas públicas desenvolvidas pelos governos locais para valorizar a relação entre o homem, a natureza e a terra. Na sua percepção, era inimaginável pensar o futuro do Brasil sem considerar a Amazônia e a exploração racional da sua biodiversidade.
Fruto daquelas reflexões, foi gestado o plano Amazônia Sustentável, delimitando um conjunto de propostas prioritárias de longo prazo contemplando mineração, recursos hídricos, infraestrutura, política indigenista, desenvolvimento sustentável e a regularização fundiária, eixo principal deste escrito. É fato que o documento gerou rebuliço nos meios político e científico que fizeram questão de não tentar compreendê-lo e ainda desqualificá-lo. Mas afinal, desde a democratização do Brasil, a expressão longo prazo se resume ao interstício de quatro anos que separa uma eleição de outra.
Na sequência dos fatos, a então ministra do meio-ambiente Marina Silva, alegando dentre outras razões, não ter sido consultada sobre estratégia desenvolvimentista formulada por Unger, seu desafeto, deixou o governo. O desconforto com as repercussões sensacionalistas e maldosas sobre os eixos do plano esvaziaram o entusiasmo do ministro e não muito tempo depois foi a vez dele próprio apear do governo. E assim a Amazônia foi deixando de ser prioridade na agenda do governo federal.
O programa Terra Legal, que tem como articuladores o Incra e o Ministério do Desenvolvimento Agrário, é um programa voltado a promover a regularização fundiária, concebido no calor daquelas discussões acerca do desenvolvimento da Amazônia. Massificar a titulação de terras nesta região, atribuindo aos donos de fato, direitos e obrigações decorrentes da propriedade passa necessariamente pela simplificação de processos, identificação espacial das terras, cadastramento dos posseiros e sobretudo pela vontade política de priorizar esta agenda. A despeito de marcos legais bem definidos, a regularização de terras por aqui ainda é uma tarefa extremamente burocrática, cara e em hipótese nenhuma deveria ser vista sob a ótica eleitoral.
No Amazonas, o programa apresenta até aqui números frustrantes (apenas algumas centenas de títulos entregues) em função da pouca integração entre os atores e da deficiente estrutura operacional. Há relatos de que o cenário está em vias de melhora. Afinal, áreas críticas como a fronteira sul do Amazonas, correm o risco de transformarem-se em terra sem lei, caso a questão fundiária não seja equacionada.
Lembremos, esta não é uma ação de curto prazo, mas também não precisa demorar uma eternidade pra sair do papel. Deve ser feita a partir de uma frente interinstitucional ampla, com critério, segurança jurídica e planejamento, até porque como já diz um velho ditado registral imobiliário “a pressa é inimiga da averbação”.
Perfil do autor: Mestre em Direito Público (UFSC); especialista em Direito Mobiliário (USP), Direito Internacional (ESA-SP) e Direito da Economia e da Empresa pela FGV/RJ. Foi secretário de Planejamento e Desenvolvimento Econômico do Estado do Amazonas, tendo sido secretário executivo naquela Pasta, no período de 2007 a 2009. É professor universitário e atua como notário e registrador no Amazonas. Coordenou o projeto de preparação de Manaus como cidade-sede da Copa 2014, em que merece destaque o sistema de mobilidade urbana – Monotrilho, e Arena da Amazônia, a cargo do Governo do Estado.
Fonte: Blog Diário do Amazonas
Em 28.7.2013
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