Senado: Índios rejeitam mudança na demarcação de terras
Propostas que transferem do Executivo para o Congresso responsabilidade pela demarcação criam mais obstáculos devido à bancada ruralista, afirmam indígenas
Propostas de emenda à Constituição (PECs) que transferem a responsabilidade da demarcação de terras indígenas do Executivo para o Congresso foram duramente criticadas ontem em debate no Senado. Índios e representantes de comunidades indígenas acusaram a bancada ruralista de ser a principal patrocinadora dessas iniciativas.
Na audiência pública da Comissão de Direitos Humanos (CDH), o secretário executivo do Conselho Indigenista Missionário (Cimi), Cleber Buzatto, disse que as propostas criam ainda mais obstáculos ao reconhecimento e à demarcação de terras indígenas, haja vista o grande poder da bancada ruralista. Ele acrescentou que a lentidão na demarcação contribui para a violência no campo e argumentou que as PECs são inconstitucionais porque prejudicariam o equilíbrio entre os Poderes. O Cimi é vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil.
O principal alvo dos protestos é a PEC 215/00, que “inclui entre as competências exclusivas do Congresso Nacional a aprovação de demarcação das terras tradicionalmente ocupadas pelos índios e a ratificação das demarcações já homologadas”, e tramita na Câmara em conjunto com outras 11 matérias. A PEC 38/99, que tramita no Senado, é semelhante: transfere a responsabilidade para o Senado, e não para o Congresso.
Segundo o presidente da Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo, Gercino da Silva Filho, entre as principais causas da violência no campo, estão a presença de pistoleiros nas fazendas, os despejos sem ordens judiciais e a grilagem de terras (apropriação indevida de áreas públicas por meio da falsificação de documentos).
Para João Capiberibe (PSB-AP), que solicitou a audiência, a violência é resultado da ausência do Estado.
— É assim em muitas favelas do Rio de Janeiro, é assim no campo. Vira faroeste — exemplificou Capiberibe.
Ao destacar que assassinatos no meio rural são uma constante, o senador lembrou a morte de Chico Mendes, em 1988, e da irmã Dorothy Stang, em 2005. Ele associou a violência dos últimos anos ao avanço da fronteira agrícola.
Assassinatos
Citando o relatório Violência contra os Povos Indígenas no Brasil, divulgado pelo Cimi no mês passado, Cleber Buzatto afirmou que 51 índios foram assassinados no Brasil em 2011, sendo 32 em Mato Grosso do Sul. Esse número poderia ter sido maior, caso tivessem sido consumadas 94 tentativas de assassinato, sendo 85 só naquele estado.
Como exemplo da violência naquela região, Buzatto citou o caso de Nísio Gomes, cacique guarani-caiuá que atuava como defensor dos direitos indígenas e está desaparecido desde novembro. Segundo índios, o cacique foi morto a tiros e seu corpo foi levado por pistoleiros.
Os números do Cimi, no entanto, foram diferentes dos apresentados por Gercino. Um exemplo: de acordo com os dados apresentados por Gercino, houve no ano passado 12 homicídios provocados por motivação agrária — a discrepância chama a atenção porque os dados da comissão são mais abrangentes, já que não se restringem aos indígenas.
Segundo Gercino, a diferença existe porque a Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo considera apenas os assassinatos causados por conflitos agrários, enquanto o Cimi teria registrado todos os homicídios no campo, como se todos fossem decorrência desse tipo de conflito. O representante do Cimi observa que talvez os dados apresentados por Gercino não contemplem adequadamente os conflitos fundiários que envolvem os povos indígenas, concentrando-se nos casos com trabalhadores rurais não indígenas.
Fonte: Jornal do Senado
Em 3.7.2012
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