STJ: Usucapião. Reserva legal – inscrição no CAR – necessidade.
É necessário o prévio registro da reserva legal no Cadastro Ambiental Rural como condição para o registro da sentença de usucapião no Registro de Imóveis.
A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou o Recurso Especial nº 1.356.207 – SP, onde se decidiu ser necessário o prévio registro da reserva legal no Cadastro Ambiental Rural (CAR) como condição para o registro da sentença de usucapião no Registro de Imóveis. O acórdão teve como Relator o Ministro Paulo de Tarso Sanseverino e o recurso foi, por unanimidade, julgado provido.
No caso em tela, o Estado de São Paulo interpôs recurso em face de acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça paulista, onde se dispensou a averbação de reserva legal na matrícula imobiliária para reconhecimento de aquisição originária em ação de usucapião extraordinária. Inconformado com o decisum, o Estado de São Paulo sustentou, em suas razões, a violação do art. 16, II e § 8º, da Lei nº 4.771/65; do art. 176, § 1º da Lei nº 6.015/73 e do art. 1.228 do Código Civil, sob o argumento de ser obrigatória a averbação da reserva legal e do descumprimento da função socioambiental da propriedade.
Ao julgar o Recurso Especial, o Relator observou que, por uma construção jurisprudencial, respaldada em precedentes do STJ, firmou-se o entendimento de que a averbação de reserva legal seria condição para o registro de qualquer ato de transmissão, desmembramento ou retificação de área de imóvel rural. Apontou que o caso, entretanto, não trata, literalmente, de uma transmissão de propriedade, mas de aquisição originária desta por usucapião de imóvel sem matrícula. Posto isto, destacou a manifestação do Ministério Público, que opinou pelo provimento do recurso, por entender que seu parecer trouxe correta interpretação ao art. 16, § 8º da Lei nº 4.771/65, ao afirmar que tal artigo está em perfeita sintonia com o princípio hermenêutico in dubio pro natura, que deve reger a interpretação da lei ambiental, para priorizar o sentido da lei que melhor atenda à proteção do meio ambiente. Afirmou, também, que o princípio in dubio pro natura constitui uma exceção à regra hermenêutica de que as normas limitadoras de direitos, como são as normas ambientais, devem ter interpretação estrita, sendo tal exceção justificada pela magnitude da importância do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado (art. 1º, III c/c 225 da Constituição Federal).
Posto isto, o Relator observou que o Código Florestal revogado mencionava que apenas a transmissão, o desmembramento e a retificação de área de imóvel rural exigiam a prévia averbação da reserva legal na matrícula imobiliária e que uma interpretação restrita deste dispositivo poderia levar à conclusão de que a aquisição originária, por não estar prevista neste rol, estaria excluída da necessidade da referida averbação, reduzindo a eficácia da norma ambiental. Contudo, segundo o Relator, é possível extrair outro sentido do texto, tomando a palavra “transmissão” em sentido amplo e abrangendo, também, a usucapião. Desta forma, esse sentido mais amplo está em sintonia com o princípio in dubio pro natura, pois, havendo diversos sentidos de um dispositivo legal, deve-se privilegiar aquele que conferir maior proteção ao meio ambiente. Nessa linha de raciocínio, seria o caso de se dar provimento ao Recurso Especial, impondo a averbação da reserva legal como condição para o registro da sentença de usucapião.
Porém, o Relator afirmou que não se pode ignorar que, após a interposição do recurso, entrou em vigor o novo Código Florestal (Lei nº 12.651/2012), instituindo o CAR e dispensando a averbação de reserva legal no Registro de Imóveis. Neste caso, entendeu que a nova Lei não pretendeu reduzir a eficácia da norma ambiental, mas, somente, alterar o órgão responsável pelo “registro” da reserva legal, que antes era o Registro Imobiliário e agora passou a ser o órgão ambiental responsável pelo CAR. Ademais, verificou que a parte final do art. 16, § 8º, do Código Florestal revogado foi praticamente reproduzida no art. 18, caput, in fine, do novo Código Florestal, tendo havido apenas a supressão da hipótese de “retificação de área” e que tal supressão não atenuou a eficácia da norma em relação às outras hipóteses previstas na Lei anterior e repetidas na Lei nova, esclarecendo, finalmente, que “o registro no CAR pode ser feito pelo possuidor, não se exigindo título de propriedade (cf. art. 29, § 1º, inciso I, da Lei 12.651/12).”
Diante do exposto, o Relator votou pelo provimento do recurso.
Seleção: Consultoria do IRIB.
Fonte: Base de dados de Jurisprudência do IRIB.
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