Justiça reconhece propriedade de área apontada como sesmaria do século XVII em São Luís
Decisão é da 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão
A disputa pela propriedade de um imóvel de 476 hectares, equivalente em tamanho a uma quantidade próxima de campos de futebol em suas dimensões máximas (120m x 90m), na área do Itaqui-Bacanga, em São Luís, foi decidida pela 5ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Maranhão (TJMA), que reconheceu como particular o terreno que o Estado do Maranhão reivindicava como público.
O litígio envolve terras apontadas pelo atual dono do domínio do imóvel como originalmente cedidas ao vigário provincial e aos demais religiosos do Convento de Nossa Senhora do Carmo, por meio de carta de sesmaria, na época das capitanias hereditárias, há quatro séculos, posteriormente confirmada pelo então rei de Portugal.
Pelo sistema de sesmaria, terras eram cedidas a pessoas, que deveriam mantê-las produtivas. Caso contrário, as áreas eram retomadas.
O Estado sustentou ser detentor do domínio útil de uma área de 11 mil hectares, cedida gratuitamente pela União, sob o regime de aforamento, por decreto federal de 1970, local onde foi implantado o Distrito Industrial de São Luís.
Afirmou que, ao fazer o levantamento físico-jurídico de um dos três módulos do sub-distrito siderúrgico, com mil hectares de extensão, constatou registros imobiliários sobrepostos, dentre eles da pessoa contra quem propôs ação anulatória de registro de imóvel, com reivindicação do domínio útil da área correspondente.
A alegação do Estado foi de não ter sido verificada na documentação do registro imobiliário a comprovação dominial da área, tendo em vista inexistência de sesmaria ou qualquer outra concessão real. Acrescentou que o registro paroquial feito a partir de 1854 não conferia ao então detentor do imóvel sua propriedade.
O réu, por sua vez, alegou que a documentação atesta que a carta de sesmaria foi ratificada pelo governador da Capitania do Maranhão, Francisco Coelho de Carvalho, e depois pelo governador e capitão-geral do Estado do Maranhão, Antonio Albuquerque Coelho de Carvalho, em 15 de outubro de 1698, e confirmada pelo rei de Portugal, à época, Dom Pedro II – não confundir com o segundo imperador do Brasil, que nasceu somente no século XIX.
PROPRIEDADE PRIVADA - Na ação em primeira instância, o juiz Carlos Henrique Veloso, da 2ª Vara da Fazenda Pública, confirmou que um documento demonstra com clareza que, desde 1698, o imóvel passou a integrar a propriedade privada dos religiosos, condição em que continuou com a edição da Lei Imperial nº 601, de 1850.
O magistrado prossegue dizendo que, após quase cem anos da edição da lei anterior, a matéria foi novamente regulamentada pelo Decreto nº 9.760, de 5 de setembro de 1946. Acrescenta que o Decreto Federal nº 66.227, de fevereiro de 1970, prova o reconhecimento da União aos imóveis de propriedade privada inclusos nos limites da área do Itaqui-Bacanga.
Ao analisar a cadeia de domínio da área, o juiz observou que um registro de 1916, constante nos autos, não faz referência ao registro anterior nem à origem do imóvel; que há um registro paroquial de 1857, sem constar qualquer referência ao título de aquisição do imóvel do Convento de Nossa Senhora do Carmo. Considerou unilateral a declaração do “registro de vigário” e que faltou o título de transmissão.
Lembrou, porém, que a propriedade privada é suscetível de usucapião desde longas datas, e que seria necessário cumprir apenas o requisito da posse mansa e pacífica, ainda que sem justo título, por mais de 30 anos, segundo legislação da época, nas disposições do Código Civil de 1916.
Observou que as sucessivas transmissões de domínios e posses levaram 88 anos sem qualquer contestação. De forma direta, o juiz disse que a propriedade privada, que antes era dos integrantes do convento, foi transmitida legalmente para o réu por meio de várias outras transmissões legais, concluindo que, hoje, o imóvel não pertence à União, nem ao Estado, mas ao atual dono.
O juiz concluiu que a transmissão da atual posse ocorreu de forma justa e boa-fé em janeiro de 1975. Em razão disso, julgou improcedentes os pedidos feitos pelo Estado que, inconformado, recorreu ao TJMA.
LEI DE TERRAS - O desembargador Ricardo Duailibe, relator da apelação cível, destacou que a Lei de Terras procurou respeitar o primeiro regime de propriedade do Brasil, o das sesmarias, bem como a ocupação primária de terras por particulares para moradia e cultivo do solo.
Embora tenha concordado que o registro paroquial não é o meio apropriado para comprovar a aquisição de domínio, o relator disse que, na ausência de qualquer prova que desfaça a veracidade das informações, considera-se meio de prova autêntico de ocupação privada das terras, tendo em vista que, na época, apenas as terras públicas desocupadas foram consideradas áreas devolutas.
Acrescentou que o atual dono comprovou que, desde 1698, o imóvel se tornou propriedade privada, sendo transmitida legalmente ao seu patrimônio, por meio de transmissões legais e ordenadas.
O relator votou de forma desfavorável ao recurso do Estado, entendimento acompanhado pelos desembargadores Maria das Graças Duarte (revisora) e Raimundo Barros, na mesma linha do parecer da Procuradoria Geral de Justiça.
Fonte: TJMA
Em 5.5.2014
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