Marco Temporal: Senado Federal aprova PL n. 2.903/2023 e texto segue para Sanção Presidencial
Sobre o tema, Supremo Tribunal Federal fixa tese para Repercussão Geral em sentido contrário ao PL aprovado.
O Plenário do Senado Federal aprovou ontem, 27/09/2023, o Projeto de Lei n. 2.903/2023 (PL), de autoria do ex-Deputado Federal Homero Pereira, que estabelece a data da promulgação da Constituição Federal de 1988 para a demarcação de terras indígenas. O texto segue para Sanção Presidencial e contraria a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Recurso Extraordinário n. 1.017.365 (RE), que rejeitou por 9 votos a 2 a tese do Marco Temporal. Na mesma data da aprovação do PL, a Corte fixou a tese para Repercussão Geral.
O Marco Temporal no Senado Federal
De acordo com a notícia publicada pela Agência Senado, sob a Relatoria do Senador Marcos Rogério (PL-RO), o texto foi aprovado no Senado Federal por 43 votos favoráveis contra 21. Segundo Marcos Rogério, o tema foi debatido de forma profunda e exaustiva e o projeto é uma oportunidade de devolver segurança jurídica ao Brasil do campo. O Senador afirmou ser esta uma decisão política. “Hoje, estamos reafirmando o papel desta Casa. Com esse projeto, o Parlamento tem a oportunidade de dar uma resposta para esses milhões de brasileiros que estão no campo trabalhando e produzindo”, afirmou. Marcos Rogério ainda salientou que a decisão STF em considerar o Marco Temporal como inconstitucional não vincula o Poder Legislativo.
Sobre eventual afronta ao STF, o Presidente do Senado Federal, Senador Rodrigo Pacheco, declarou não haver sentimento revanchista com a Suprema Corte. “Sempre defendi a autonomia do Judiciário e o valor do STF. Mas não podemos nos omitir do nosso dever: legislar”, declarou Pacheco.
Segurança Jurídica X Inconstitucionalidade
Diversos Senadores definiram a aprovação do PL como uma forma de dar uma satisfação à sociedade, além de trazer paz e segurança jurídica ao país e permitir que o Senado Federal reassuma seu papel de legislar.
Por outro lado, para o Senador Jaques Wagner (PT-BA), é inócuo votar um projeto que tem um sentido contrário ao que o STF decidiu como constitucional. Por sua vez, o Senador Randolfe Rodrigues (REDE-AP) argumentou ser a aprovação do PL uma “inconstitucionalidade flagrante”. “Retroceder a demarcação é mais que inconstitucional. Por óbvio, será acionada a Suprema Corte”, declarou Rodrigues.
No mesmo sentido, a Senadora Eliziane Gama (PSD-MA) afirmou que o PL tenta modificar a Constituição Federal, o que somente pode ser realizado por meio de Proposta de Emenda à Constituição. Para a Senadora, “se é mudança na Constituição, tem que ser PEC [proposta de emenda à Constituição]. O que estamos votando hoje, o STF claramente derrubou por nove votos a dois. Este projeto está fadado ao veto presidencial.”
STF fixa tese para Repercussão Geral
No mesmo dia, o STF fixou a tese de Repercussão Geral no Recurso Extraordinário em que o Tribunal rejeitou a possibilidade de adotar a tese do Marco Temporal. De acordo com o Ministro Edson Fachin, em notícia publicada pelo STF, “a tese de julgamento foi gradativamente construída e conta com contribuições dos 11 integrantes do Tribunal” e, para a Ministra Rosa Weber, a tese fixada foi elaborada de forma colegiada, o que, em seu entendimento, “a fortalece aos olhos da sociedade”.
A tese fixada servirá de parâmetro para a resolução de, pelo menos, 226 casos semelhantes que estão suspensos.
Veja a tese fixada pelo STF:
“I - A demarcação consiste em procedimento declaratório do direito originário territorial à posse das terras ocupadas tradicionalmente por comunidade indígena;
II - A posse tradicional indígena é distinta da posse civil, consistindo na ocupação das terras habitadas em caráter permanente pelos indígenas, das utilizadas para suas atividades produtivas, das imprescindíveis à preservação dos recursos ambientais necessários a seu bem-estar e das necessárias a sua reprodução física e cultural, segundo seus usos, costumes e tradições, nos termos do §1º do artigo 231 do texto constitucional;
III - A proteção constitucional aos direitos originários sobre as terras que tradicionalmente ocupam independe da existência de um marco temporal em 5 de outubro de 1988 ou da configuração do renitente esbulho, como conflito físico ou controvérsia judicial persistente à data da promulgação da Constituição;
IV – Existindo ocupação tradicional indígena ou renitente esbulho contemporâneo à promulgação da Constituição Federal, aplica-se o regime indenizatório relativo às benfeitorias úteis e necessárias, previsto no art. 231, §6º, da CF/88;
V – Ausente ocupação tradicional indígena ao tempo da promulgação da Constituição Federal ou renitente esbulho na data da promulgação da Constituição, são válidos e eficazes, produzindo todos os seus efeitos, os atos e negócios jurídicos perfeitos e a coisa julgada relativos a justo título ou posse de boa-fé das terras de ocupação tradicional indígena, assistindo ao particular direito à justa e prévia indenização das benfeitorias necessárias e úteis, pela União; e quando inviável o reassentamento dos particulares, caberá a eles indenização pela União (com direito de regresso em face do ente federativo que titulou a área) correspondente ao valor da terra nua, paga em dinheiro ou em títulos da dívida agrária, se for do interesse do beneficiário, e processada em autos apartados do procedimento de demarcação, com pagamento imediato da parte incontroversa, garantido o direito de retenção até o pagamento do valor incontroverso, permitidos a autocomposição e o regime do art. 37, §6º da CF;
VI – Descabe indenização em casos já pacificados, decorrentes de terras indígenas já reconhecidas e declaradas em procedimento demarcatório, ressalvados os casos judicializados e em andamento;
VII – É dever da União efetivar o procedimento demarcatório das terras indígenas, sendo admitida a formação de áreas reservadas somente diante da absoluta impossibilidade de concretização da ordem constitucional de demarcação, devendo ser ouvida, em todo caso, a comunidade indígena, buscando-se, se necessário, a autocomposição entre os respectivos entes federativos para a identificação das terras necessárias à formação das áreas reservadas, tendo sempre em vista a busca do interesse público e a paz social, bem como a proporcional compensação às comunidades indígenas (art. 16.4 da Convenção 169 OIT);
VIII – A instauração de procedimento de redimensionamento de terra indígena não é vedada em caso de descumprimento dos elementos contidos no artigo 231 da Constituição da República, por meio de procedimento demarcatório até o prazo de cinco anos da demarcação anterior, sendo necessário comprovar grave e insanável erro na condução do procedimento administrativo ou na definição dos limites da terra indígena, ressalvadas as ações judiciais em curso e os pedidos de revisão já instaurados até a data de conclusão deste julgamento;
IX - O laudo antropológico realizado nos termos do Decreto nº 1.775/1996 é um dos elementos fundamentais para a demonstração da tradicionalidade da ocupação de comunidade indígena determinada, de acordo com seus usos, costumes e tradições, na forma do instrumento normativo citado;
X - As terras de ocupação tradicional indígena são de posse permanente da comunidade, cabendo aos indígenas o usufruto exclusivo das riquezas do solo, dos rios e lagos nelas existentes;
XI - As terras de ocupação tradicional indígena, na qualidade de terras públicas, são inalienáveis, indisponíveis e os direitos sobre elas imprescritíveis;
XII – A ocupação tradicional das terras indígenas é compatível com a tutela constitucional ao meio ambiente, sendo assegurados o exercício das atividades tradicionais dos indígenas;
XIII – Os povos indígenas possuem capacidade civil e postulatória, sendo partes legítimas nos processos em que discutidos seus interesses, sem prejuízo, nos termos da lei, da legitimidade concorrente da FUNAI e da intervenção do Ministério Público como fiscal da lei”
Fonte: IRIB, com informações da Agência Senado e do STF.
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