Quarta Turma determina que TJCE julgue disputa por terras envolvendo Diocese do Crato e imobiliária que loteou terreno
Diocese alegou que, pela legislação canônica, os negócios jurídicos da Igreja Católica só podem ser feitos pelo bispo da diocese, além de apontar várias outras irregularidades na constituição e no uso da procuração usada na venda/compra do terreno.
Por unanimidade, a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) determinou que o Tribunal de Justiça do Ceará (TJCE) julgue o processo em que a Diocese do Crato pede a nulidade da venda de um terreno de 746 mil m², na cidade de Juazeiro do Norte (CE), negociado por meio de procuração outorgada por sacerdote a uma empresa de empreendimentos imobiliários que loteou e vendeu os imóveis.
Ao dar provimento ao recurso especial da diocese para afastar as nulidades processuais apontadas no acórdão recorrido, o colegiado entendeu não haver necessidade de litisconsórcio passivo com os mais de 750 compradores dos terrenos em disputa e intervenção do Ministério Público no caso.
Segundo os autos, em 2002, um sacerdote da diocese outorgou procuração em favor de empresário que utilizou o documento para formalizar a escritura de compra e venda de parte do terreno em disputa. Posteriormente, o mesmo empresário utilizou a procuração para vender a si mesmo outra parte das terras.
Ao questionar na Justiça a venda do terreno, a diocese alegou que, pela legislação canônica, os negócios jurídicos da Igreja Católica só podem ser feitos pelo bispo da diocese, além de apontar várias outras irregularidades na constituição e no uso da procuração usada na venda/compra do terreno.
A sentença considerou nulo o negócio jurídico por entender que o instrumento de procuração que serviu para a transferência do imóvel não apresentou os requisitos próprios de escritura pública e que a representação legal da pessoa jurídica que ajuizou a ação só é exercida validamente pelo bispo diocesano, como consta dos regramentos da instituição.
Entretanto, o TJCE anulou de ofício o processo por considerar imprescindíveis a citação dos supostos litisconsortes passivos necessários – os compradores do empreendimento imobiliário urbano denominado "Loteamento Vila Real II" – e a intervenção do Ministério Público na hipótese.
Diocese preservou compradores dos lotes
Para o relator do processo no STJ, ministro Antonio Carlos Ferreira, os adquirentes dos lotes do terreno em disputa não podem ser considerados litisconsortes passivos necessários no caso analisado, tendo o acórdão recorrido violado os artigos 3º, 47 e 158 do Código de Processo Civil de 1973.
Isso porque, disse o magistrado, a diocese – ao tomar providências judiciais contra o negócio que considerou ilegal – seguiu na direção de preservar os mais de 750 adquirentes dos lotes e não requereu a reintegração do imóvel ou o desfazimento do loteamento, tampouco a nulidade dos contratos decorrentes do empreendimento imobiliário.
Além disso, acrescentou, a entidade religiosa deu quitação aos compradores quanto aos valores pagos pelos lotes, reservando para si o direito de ação visando ao ressarcimento contra a imobiliária, honrando e dando continuidade aos termos dos contratos celebrados entre empresa e os compradores de boa-fé nos mesmos moldes em que pactuados.
"Tal declaração, plenamente válida e eficaz em relação aos terceiros porque os beneficia", afirmou o ministro, "delimitou com maior precisão o objetivo da lide e a parte a ser atingida pela prestação jurisdicional requerida, que seria, apenas, a ré".
Dessa forma, segundo Antonio Carlos Ferreira, os julgados sobre a hipótese não poderão atingir desfavoravelmente os contratos assinados pelos terceiros adquirentes dos lotes, "circunstância que lhes retira o interesse jurídico de ingressar no processo a título de litisconsortes passivos necessários".
Ausência do Ministério Público no processo
Em relação à conclusão do acórdão de que deveria haver intervenção obrigatória do Ministério Público no processo diante da natureza da demanda, Ferreira lembrou que a jurisprudência do STJ orienta que a ausência do MP em processo no qual deva intervir somente acarreta nulidade quando houver efetivo prejuízo decorrente de tal vício processual.
"No presente caso, além de não ter sido demonstrado nenhum prejuízo ao processo ou às partes, a presente demanda não se enquadra nas hipóteses que demandam a intervenção do Parquet, estando caracterizado litígio envolvendo exclusivamente interesses particulares entre a autora e a empresa ré", explicou.
O ministro lembrou ainda que, nos casos em que houver indícios de crime, o magistrado remeterá cópias de peças dos processos ao órgão acusador para apurar os fatos, nos termos do artigo 40 do Código de Processo Penal.
Ao dar provimento ao recurso especial para afastar as nulidades reconhecidas no acórdão recorrido, os ministros da Quarta Turma determinaram o retorno dos autos ao TJCE para que prossiga no julgamento dos recursos de apelação.
Fonte: STJ.
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