STJ: Alienação fiduciária. Consolidação da propriedade em nome do credor – leilões – ausência.
"Se a posse do imóvel, pelo devedor fiduciário, é derivada de um contrato firmado com o credor fiduciante, a resolução do contrato no qual ela encontra fundamento torna-a ilegítima, sendo possível qu
O Superior Tribunal de Justiça (STJ) julgou, através de sua Terceira Turma, o Recurso Especial nº 1.155.716 – DF, que tratou sobre a possibilidade de reintegração na posse, por parte da credora fiduciária, anteriormente ao leilão previsto na Lei nº 9.514/97. O acórdão, que teve como Relatora a Ministra Nancy Andrighi, foi julgado improvido por unanimidade.
Trata-se, na origem, de ação de reintegração de posse ajuizada pela credora fiduciária, tendo por objeto o imóvel vendido por ele aos recorrentes, mediante alienação fiduciária em garantia. Tendo em vista a inadimplência destes, a credora constituiu-os em mora mediante notificação e, não havendo pagamento, consolidou o imóvel em sua propriedade, conforme art. 26, § 7º, da Lei nº 9.514/97. Em seguida, estabeleceu datas para a realização dos leilões extrajudiciais, nos termos do art. 27, da citada lei.
Os recorrentes, por sua vez, alegando irregularidade na intimação, antes da ação possessória ajuizada pela credora fiduciária, propuseram outra ação, pelo procedimento ordinário, objetivando suspender os leilões extrajudiciais, sendo deferida liminar neste sentido. Independentemente da realização do leilão, a credora fiduciária solicitou reintegração na posse do bem.
A Relatora, em decisão proferida em medida cautelar anterior, entendeu que o cerne de toda a discussão é o momento em que deve ser determinada a reintegração da credora na posse do imóvel, caso haja inadimplemento da obrigação. Argumentou que todos os atos decorrentes da Lei nº 9.514/97 seguem uma ordem lógica, afirmando que "se tudo correr como determina a lei, em hipótese alguma a reintegração na posse do imóvel poderá ocorrer antes da realização dos leilões de que trata o art. 27." Contudo, no caso em tela, a ordem dos atos não pôde ser obedecida, pois, por força de incorreta publicação dos editais, os leilões públicos acabaram por não acontecer, surgindo a questão se a reintegração na posse do imóvel, prevista na Lei supra mencionada, em seu art. 30, pode ocorrer sem os leilões. De acordo com o entendimento da Relatora em tal decisão, a leitura isolada do citado art. 30 leva a crer que é possível a reintegração na posse sem os leilões. Porém, a Lei deve ser interpretada de maneira sistemática, havendo duas disposições, conforme apontado pelos recorrentes. A primeira, decorrente do art. 37-A, da Lei nº 9.514/97, onde o recorrente argumenta que não há sentido no deferimento da reintegração na posse antes dos leilões, uma vez que a própria Lei fixa a data destes leilões como marco inicial para a exigibilidade da taxa de ocupação, paga pelo devedor-fiduciante. A segunda é a norma contida no art. 34, do Decreto-lei nº 70/66, onde o recorrente sustenta que, se é possível a purgação da mora até o leilão, não há sentido em se desocupar o imóvel antes disso.
Nas contrarrazões deste Recurso Especial, a credora fiduciária opõe-se à pretensão dos recorrentes sob novo fundamento, sustentando que o espírito da Lei nº 9.514/97 é conferir celeridade e efetividade ao credor-fiduciário e que a consolidação do imóvel em seu nome sem a reintegração na posse é providência inócua e sem sentido. Sustenta, ainda, que além de não receber pelo imóvel, este continua sendo utilizado pelos recorrentes há dois anos, sem nenhum ônus. Ademais, os débitos referentes ao condomínio e respectivos tributos estão sendo suportados por ela, experimentando significativo prejuízo. Por fim, sustenta que, em decorrência do rompimento da relação fiduciária por inexecução culposa do devedor-fiduciante, a posse deixa de existir a justo título, caracterizando esbulho e justificando a ação de reintegração da posse.
Ao analisar tais argumentos, entendeu a Relatora que assiste razão ao recorrido (credora-fiduciária), pois a resolução contratual fez com que os devedores perdessem o direito à posse do bem. Diante disso, não há como manter o entendimento anterior, uma vez que, rompida a relação contratual não há falar-se em posse legítima, podendo-se interpretar a permanência do recorrente (devedor-fiduciante) no imóvel como ato de esbulho.
Por fim, destaca-se o seguinte trecho do decisum:
"À questão levantada pelos recorrentes, acerca de que destino deve ser dado ao imóvel entre o prazo da consolidação da propriedade em nome do credor-fiduciante, e a data dos leilões judiciais, a resposta é simples: deve ser dado ao imóvel sua natural destinação econômica. A permanência daquele que promoveu esbulho do bem no imóvel não atende a essa destinação."
Íntegra da decisão
Seleção: Consultoria do IRIB
Fonte: Base de dados de Jurisprudência do IRIB
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